Conceitos, funções e princípios da Administração Pública e suas relações com a Lei de Responsabilidade Fiscal

Resumo: O objetivo do trabalho é apresentar, com base em revisão bibliográfica, conceitos, funções, objetivos e princípios da Administração Pública e suas relações com a Lei de Responsabilidade Fiscal. O estudo proposto tomou como abordagem e revisão doutrina relativa ao Direito administrativo e ao Direito Financeiro e Tributário, assim como revisão de teorias relativas à ciência da Administração.

Palavras-chave: administração pública; responsabilidade fiscal; direito financeiro.

Abstract: The objective is to present, based on literature review, concepts, functions, objectives and principles of Public Administration and its relations with the Fiscal Responsibility Law. The proposed study took as approach and review doctrine concerning Administrative Law and the Financial and Tax Law, well as a review of theories relating to the science of Administration.

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Keywords: public administration; fiscal responsibility; financial law.

Sumário: 1. Introdução; 2. Administração Pública e Responsabilidade Fiscal; 2.1 Conceitos e funções da Administração e da Administração Pública; 2.2 Princípios da Administração Pública; 2.3 Lei de Responsabilidade Fiscal; 3. Considerações finais; Referências.

1. Introdução

A exigência do trato responsável da coisa pública, seja no âmbito fiscal, social ou patrimonial, não é uma imposição única do sistema jurídico brasileiro. As manifestações públicas e cívicas registradas no Brasil em meados de 2013 refletem o clamor das ruas e das redes sociais, expõem a indignação dos cidadãos com a corrupção instalada na máquina pública e evidenciam a rejeição popular ao sistema político vigente no país.

A presente abordagem apresentará conceitos, funções, objetivos e princípios da Administração Pública e sua relação com a Lei de Responsabilidade Fiscal. Será possível, a partir deste estudo, aprofundar o debate sobre a responsabilidade na gestão fiscal e o equilíbrio das contas públicas, assim como a relação dessa responsabilidade com dispositivos e fundamentos do ordenamento jurídico brasileiro atinentes a Administração Pública direta e indireta.

Para esse fim, far-se-á uso de doutrina relativa ao Direito administrativo e ao Direito Financeiro e Tributário, assim como revisão de teorias relativas à ciência da Administração.

2. Administração Pública e Responsabilidade Fiscal

Este capítulo está dividido em três seções, que versão quanto aos conceitos e funções da Administração e da Administração Pública, sobre os princípios da Administração Pública e quanto a Lei de Responsabilidade Fiscal.

2.1 Conceitos e funções da Administração e da Administração Pública

 “Administração é o atingimento das metas organizacionais de modo eficiente e eficaz por meio do planejamento, organização, liderança e controle dos recursos organizacionais”. A definição de Daft (2010:06) engloba as quatro funções da Administração – planejar, organizar, dirigir e controlar – e os seus objetivos – a eficiência e a eficácia.

Com base nos conceitos de Daft (2010:06-08), pode-se inferir que planejar é a “função gerencial relacionada à definição de metas para o futuro desempenho organizacional e a decisão sobre tarefas e recursos necessários para alcança-las”; organizar é a função “que se refere à atribuição de tarefas, agrupamento de tarefas em departamentos e alocação de recursos para os departamentos”; liderar é a “função administrativa que envolve o uso de influência para motivar os empregados para atingir as metas da organização”; e controlar é a função “relativa ao monitoramento das atividades dos funcionários, mantendo a organização nos trilhos em direção às suas metas, fazendo correções quando necessário”. Robbins (2000:40) empresta significação concisa para o entendimento dos objetivos da Administração ao esclarecer que “eficiência significa fazer as coisas direito, e eficácia significa fazer a coisa certo”.

No âmbito público, Di Pietro (2012:50) admite que a expressão Administração Pública pode ser compreendida em sentido subjetivo, formal ou orgânico e em sentido objetivo, material ou funcional:

“a) em sentido subjetivo, formal ou orgânico, ela designa os entes que exercem a atividade administrativa; compreende pessoas jurídicas, órgãos e agentes públicos incumbidos de exercer uma das funções em que se triparte a atividade estatal: a função administrativa;

b) em sentido objetivo, material ou funcional, ela designa a natureza da atividade exercida pelos referidos entes; nesse sentido, a Administração Pública é a própria função administrativa que incumbe, predominantemente, ao Poder Executivo”.

Segundo a doutrinadora citada (2012:50), a Administração Pública também pode ser compreendia em sentido amplo ou em sentido restrito:

“a) em sentido amplo, a Administração Pública, subjetivamente considerada, compreende tanto os órgãos governamentais, supremos, constitucionais (Governo), aos quais incumbe traçar os planos de ação, dirigir, comandar, como também os órgãos administrativos, subordinados, dependentes (Administração Pública, em sentido estrito), aos quais incumbe executar os planos governamentais; ainda em sentido amplo, porém objetivamente considerada, a Administração Pública compreende a função política, que traça as diretrizes governamentais e a função administrativa, que as executa;

b) em sentido estrito, a Administração Pública compreende, sob o aspecto subjetivo, apenas os órgãos administrativos e, sob o aspecto objetivo, apenas a função administrativa, excluídos, no primeiro caso, os órgãos governamentais e, no segundo, a função política”.

Carvalho Filho (2012:04-05), que admite classificação da função administrativa, na Administração Pública, em três critérios (subjetivo, objetivo material e objetivo formal), defende que tecnicamente essa função “é aquela exercida pelo Estado ou por seus delegados, subjacentemente à ordem constitucional ou legal, sob regime de direito público, com vistas a alcançar os fins colimados pela ordem jurídica”.

Mello (2011:153) argui que a Administração Pública pode ser centralizada e descentralizada. A primeira situação ocorre quando a atividade administrativa “é exercida pelo próprio Estado, ou seja, pelo conjunto orgânico que lhe compõe a intimidade”. Na segunda ocorrência a atividade gerencial é executada “por pessoa ou pessoas distintas do Estado”. Ainda segundo o mesmo autor, descentralização e desconcentração são conceitos diferentes: a descentralização “pressupõe pessoas jurídicas diversas” enquanto que “a desconcentração está sempre referida a uma só pessoa, pois cogita-se da distribuição de competências na intimidade dela, mantendo-se, pois, o liame unificador da hierarquia”.

Outra classificação levantada por Mello (2011:156-157) é a da Administração direta e indireta. Citando Decreto-lei 200, de 1967, o jurista anota que a Administração direta é a “que se constitui dos serviços integrados na estrutura administrativa da Presidência da República e dos Ministérios” e a Administração indireta “é a que compreende as seguintes categorias de entidades dotadas de personalidade jurídica própria: a) Autarquias; b) Empresas Públicas; c) Sociedades de Economia Mista; d) Fundações Públicas”.

Sob o prisma da Administração, Nascimento (2010:09-10) diferencia Administração Pública burocrática de Administração Pública gerencial. Para o autor, a Administração Pública burocrática concentra-se no processo; é auto-referente; define os procedimentos para a contratação de pessoal, compra de bens e serviços; satisfaz as demandas dos cidadãos; tem controle de procedimentos. Doutro modo, a Administração Pública gerencial orienta-se para resultados; é voltada para o cidadão; combate o nepotismo e a corrupção; não adota procedimentos rígidos; define os indicadores de desempenho; utiliza contratos de gestão. Nascimento concorda que a Administração Pública gerencial responde a “busca de meios capazes de enfrentar a crise fiscal do Estado”, como “estratégia para reduzir custos e tornar mais eficiente a administração dos serviços que cabem ao Estado” e “como instrumento de proteção ao patrimônio público”.

2.2 Princípios da Administração Pública

Conquanto o art. 37 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 reze que a Administração Pública, direta e indireta, em quaisquer dos poderes e de quaisquer esferas, obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, doutrina e jurisprudência aceitam os nomeados “princípios reconhecidos”, quais sejam: da supremacia do interesse público; da autotutela; da indisponibilidade; da continuidade dos serviços públicos; da segurança jurídica; e da precaução. Carvalho Filho (2012:39-42) acrescenta a este rol, conforme Quadro 1., os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.

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2.3 Lei de Responsabilidade Fiscal

Crepaldi e Crepaldi (2009:263) sustentam que “um setor público organizado e disciplinado é condição para a estabilidade de preços, para o fomento do crescimento econômico sustentável, com óbvias consequências sobre a geração de emprego e renda e o bem estar social”.

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A Lei Complementar nº 101, de 04 de maio de 2000, chamada Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), ‘estabelece normas de finanças públicas voltadas para a responsabilidade na gestão fiscal’ da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, abrangendo os poderes Executivo, Legislativo, Judiciário e também o Ministério Público.

Ampliando a interpretação do art. 1º da LRF, que em seu caput “estabelece normas de finanças públicas voltadas para a responsabilidade na gestão fiscal, com amparo no Capítulo II do Título VI da Constituição”, Crepaldi e Crepaldi (2009:266) identificam como objetivos da norma referida:

“- Garantir a gestão pública planejada e transparente;

– Propiciar a prevenção de riscos e correção de desvios capazes de afetar o equilíbrio das contas públicas;

– Propiciar o cumprimento de metas de resultados entre receitas e despesas;

– Estabelecer critérios, condições e limites para a renúncia de receitas, geração de despesas com pessoal, da seguridade social e outras, dívidas consolidada e mobiliária, operações de crédito, inclusive por antecipação de receita, concessão de garantia e inscrição em Restos a Pagar;

– Combater o déficit limitando as despesas de pessoal, dificultando a geração de novas despesas, impondo ajustes de compensação para a renúncia de receitas e exigindo mais condições para repasses entre governos e destes para instituições privadas;

– Reduzir o nível da dívida pública induzindo à obtenção de superávits primários, restringindo o processo de endividamento, nele incluído o dos Restos a Pagar, requerendo limites máximos, de observância contínua, para a dívida consolidada”.

A LRF atendeu ao art. 163 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 que demandava lei complementar para regular: I – finanças públicas; II – dívida pública externa e interna, incluída a das autarquias, fundações e demais entidades controladas pelo Poder Público; III – concessão de garantias pelas entidades públicas; IV – emissão e resgate de títulos da dívida pública; V – fiscalização financeira da administração pública direta e indireta; VI – operações de câmbio realizadas por órgãos e entidades da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios; VII – compatibilização das funções das instituições oficiais e de crédito da União, resguardadas as características e condições operacionais plenas das voltadas ao desenvolvimento regional.

Para tanto, o §1º do art. 1º da Lei 101/2000 esclarece e impõe:

“A responsabilidade na gestão fiscal pressupõe a ação planejada e transparente, em que se previnem riscos e corrigem desvios capazes de afetar o equilíbrio das contas públicas, mediante o cumprimento de metas de resultados entre receitas e despesas e a obediência a limites e condições no que tange a renúncia de receita, geração de despesas com pessoal, da seguridade social e outras, dívidas consolidada e mobiliária, operações de crédito, inclusive por antecipação de receita, concessão de garantia e inscrição em Restos a Pagar.”

Motta e Fernandes (2001:36) atribuem à responsabilidade fiscal o dever da Administração Pública de atender às demandas dos usuários de serviços públicos, não sendo, portanto, objeto do encargo gerencial público apenas a responsabilidade patrimonial do Estado. Neste sentido, cabe anotação de Crepaldi e Crepaldi (2009) que arrolam como princípios da Lei de Responsabilidade Fiscal o planejamento, a transparência, a participação popular, o equilíbrio, a preservação do patrimônio público, a limitação de despesas e o controle do endividamento público, conforme Quadro 2.

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Em seu art. 59, a LRF determina que “o Poder Legislativo, diretamente ou com o auxílio dos Tribunais de Contas, e o sistema de controle interno de cada Poder e do Ministério Público” são os responsáveis pela fiscalização e pelo cumprimento das suas normas.

3. Considerações finais

A análise da temática permitiu a reunião de conceitos e informações relevantes ao debate da Administração Pública planejada e transparente. Conforme apresentado, o gerenciamento dos recursos e dos serviços públicos suplanta os limites dos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, exigindo a observância da supremacia do interesse público, da autotutela, da indisponibilidade, da continuidade desses serviços públicos, da segurança jurídica, da precaução, da razoabilidade e da proporcionalidade.

Ferramenta complementar a Constituição de 1988, e ao Direito Administrativo, a Lei de Responsabilidade Fiscal atende a ética na gestão pública e vai ao encontro dos reclames populares (da sociedade) quando responde ao interesse dos usuários dos serviços públicos, assim como de toda a sociedade, com bases no planejamento, na transparência, na participação popular, no equilíbrio, na preservação do patrimônio público, na limitação de despesas e no controle do endividamento público.

 

Referências
BRASIL. Constituição, 1988. Constituição da República Federativa do Brasil. São Paulo: Saraiva, 2012.
BRASIL. Lei Complementar nº 101 de 04 de maio de 2000. Estabelece normas de finanças públicas voltadas para a responsabilidade na gestão fiscal e dá outras providências. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/lcp101.htm Acesso em 22 jul. 2013.
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 25 ed. São Paulo: Atlas, 2012.
CREPALDI, Silvio Aparecido; CREPALDI, Guilherme Simões. Direito Financeiro: teoria e prática. Rio de Janeiro: Forense, 2009.
DAFT, Richard L. Administração. São Paulo: Cengage Learning, 2010.
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 25 ed. São Paulo, Atlas, 2012.
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 28 ed. São Paulo: Malheiros, 2011.
MOTTA, Carlos Pinto Coelho; FERNANDES, Jorge Ulisses Jacoby. Responsabilidade Fiscal: Lei Complementar n. 101 de 04/05/2000. 2 ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2001.
NASCIMENTO, Edson Ronaldo. Gestão Pública: gestão pública aplicada: União, Estados e Municípios, gestão pública no Brasil, de JK à Lula, gestão orçamentária e financeira, a gestão fiscal responsável, tributação e orçamento, tópicos especiais em contabilidade pública, gestão das contas nacionais, gestão ecológica e ambiental. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2010.
ROBBINS, Stephen Paul. Administração: mudanças e perspectivas. São Paulo: Saraiva, 2000.

Informações Sobre os Autores

Wellington Ferreira de Melo

Possui graduação em Administração pela Fundação Universidade do Tocantins 2010 especialização em Gestão Econmica e Estratégias de Negócios pelas Faculdades Integradas de Patos 2012; Acadêmico de Direito pela Universidade Federal de Campina Grande e mestrado em Sistemas Agroindustriais pela Universidade Federal de Campina Grande

Cicero Marcelo Bezerra dos Santos

Professor universitário e advogado, Especialista em Direito da Administração Municipal, atualmente, é coordenador adjunto do Curso de Direito UDI/URCA, Prof. De Direito Do consumidor e Proc. Do Trabalho. No curso de Ciências Econômicas, leciona Técnicas da Tributação e Orçamento.. Organizador de Eventos, Encontros, Ciclo de Palestras e Semanas Científicas da URCA-UDI.

Ricardo Schmidt Filho

Professor Adjunto I da Unidade Acadêmica de Economia e Finanças UAECON -UFCG e colaborador do Programa de Pós-graduação em Sistemas Agroindustriais CCTA-UFCG; doutor em Desenvolvimento Econômico pela UFPR

Francilda Alcantara Mendes

mestranda em Desenvolvimento Regional Sustentável pela UFC; especialista em Direito Processual Civil

Aparecido John Marculino Monteiro

Acadêmico de Direito CCJS-UFCG

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