Resumo: O Estado é titular da capacidade ativa de tributar, contudo ele mesmo impõe limitações ao seu poder de gerar tributos, os princípios são a fonte basilar dessas limitações, dentre os quais destacar-se-á para o presente trabalho o Princípio da Capacidade Contributiva. Assim, o presente trabalho tem como objetivo verificar o conflito existente entre capacidade a,tiva de tributar do Estado, no que tange a cobrança de imposto indireto e o princípio da capacidade contributiva, o primeiro regulado pela Carta Magna e o segundo pelo Código Tributário Nacional.
Palavras-chaves: sistema tributário nacional. capacidade contributiva. imposto indireto.
Abstract: The state holds the active capacity to tax, but he imposes limitations on its power to generate taxes, the principles are the fundamental source of these limitations, among which will stand out for the present work the Principle of Contributory capacity. Thus, this study aims to verify the conflict between active capacity to tax the state, regarding the collection of indirect taxes and the principle of ability to pay, the first regulated by the Constitution and the second by the National Tax Code.
Keywords: national tax system. ability to pay. indirect tax.
Sumário: 1. Introdução. 2. Conceito e Fontes do Direito Tributário. 3. Relação entre Direito Tributário e Direito Constitucional. 4. Princípios do Direito Tributário. 4.1. Princípio da Capacidade Contributiva. 5. Tributos. 5.1. Teoria Tripartida e Pentapartida. 5.2. Espécies de Tributo. 6. Conflito entre o Princípio da Capacidade Contributiva e a Cobrança de Imposto Indireto. 7. Medidas Adequadas para Sanar o Conflito. 8. Considerações Finais. 9. Referências.
1 Introdução
O Brasil é um país de desigualdades, cuja alta carga tributária oprime principalmente a população economicamente mais sensível, em virtude de tal fato existem limitações ao poder de tributar, dentre eles está a o Princípio da Capacidade Contributiva, que observa aspectos econômicos peculiares de cada contribuinte para a incidência do tributo, desse princípio pode-se extrair a premissa de que quem ganha mais, paga mais e quem ganha menos, paga menos.
Assim, a Constituição da República Federativa do Brasil é, no mundo todo, a que mais institui limitações ao poder de tributar, seja através da proibição direta de se impor tributos ou de determinação expressa de se isentar ou de não tributar, portanto as engrenagens do sistema tributário nacional funcionam, na feliz expressão de Aliomar Baleeiro, através de “freios e amortecedores”, pois o Estado, detentor do poder ativo de tributar, se abstém de instituir o tributo em face das limitações que ele mesmo criou e legitimou.
Deste modo, integram os freios e amortecedores do sistema tributário nacional os princípios que limitam o poder de tributar, sendo que, dentre eles, tem maior relevância o Princípio da Legalidade, contudo para o presente trabalho destacar-se-á o Princípio da Capacidade Contributiva, o qual juntamente com “certeza, comodidade e economicidade, já inspiram códigos e constituições por mais de duzentos anos, porque mesclam não só padrões mínimos de ética e de justiça, como de técnica e razoabilidade.” (BALEEIRO, 2005, p.03).
Ocorre que, apesar de a CRFB/88 positivar o Princípio da Capacidade Contributiva no que tange a cobrança do imposto indireto, o qual consiste no imposto embutido em produtos e serviços, o contribuinte é tributado sem que haja qualquer análise de sua capacidade econômica, de modo que independente da situação financeira que ostente, o imposto será cobrado através de um mesmo padrão, sem que haja isonomia.
Logo, cobrar tributos sem considerar as características pessoais da situação econômico financeira de cada contribuinte, não fere apenas o princípio da capacidade contributiva, mas fere também o princípio da isonomia, pois a isonomia consiste em dispensar tratamento igual aos iguais e tratamento desigual aos desiguais.
2 Conceito e fontes do direito tributário
O Direito Tributário consiste no ramo do direito público, que regula a relação entre o fisco, que é a denominação dada ao Estado quando no exercício da tributação, e o contribuinte, que é todo sujeito passível de ser tributado. Assim, o “Direito Tributário tem por finalidade limitar o poder de tributar e limitar o poder do cidadão contra os abusos desse poder”[1].
Destarte, o Direito Tributário se caracteriza como ramo do direito público em virtude da posição de supremacia que o Estado exerce em relação ao contribuinte, a qual se justifica pela defesa do interesse público em detrimento do interesse privado, pois ao instituir tributos o Estado visa “a obtenção compulsória de recursos necessários a consecução dos fins que o ordenamento jurídico lhe impõe”[2].
Assim, o vínculo entre o Fisco e o contribuinte regulado pelo Direito Tributário é de natureza obrigacional, o Estado figura no polo ativo da obrigação tributária, sendo titular do direito; enquanto o contribuinte atua no polo passivo, sendo objeto desta obrigação uma prestação, que pode ser de dar ou de fazer[3].
No que tange a origem do Direito Tributário, suas fontes podem ser materiais ou formais, as fontes materiais, também denominadas de fontes reais do Direito Tributário, correspondem aos elementos tributáveis por lei, assim Rui Barbosa Nogueira, em citação de Eduardo Sabbbag, define as fontes reais da seguinte maneira:
“as fontes reais se constituem dos suportes fáticos das imposições tributárias, sendo a subjacência sobre que incide a tributação, afinal, a própria riqueza ou complexo dos bens enquanto relacionados com as pessoas, que, depois de serem discriminadas na lei tributária (patrimônio, renda, transferências), passam a constituir ‘fatos geradores dos tributos’. As fontes reais ou materiais são também denominadas em doutrina ‘pressupostos de fato da incidência’, fatos inoponíveis, ou melhor, ou melhor, tributáveis”. (NOGEUIRA apud SABBAG, 2009, p.157)
Já as fontes formais abrangem a legislação tributária e estão enumeradas no art. 96, do Código Tributário Nacional, portanto, são fontes formais primárias do Direito Tributário a Constituição da República Federativa do Brasil, as emendas constitucionais, as leis ordinárias, as leis complementares, as leis delegadas, as medidas provisórias, os decretos legislativos, resoluções do Senado, convênios interestaduais do ICMS, tratados e convenções internacionais e decretos.
Observa-se ainda que existem as fontes formais secundárias do Direito Tributário, enumeradas pelo art. 100, do CTN, as quais sevem apenas como complemento das fontes formais primárias, visto que não podem extinguir, majorar, modificar ou criar tributos. São fontes formais secundárias do direito tributário os atos normativos, as decisões administrativas com eficácia normativa, práticas reiteradas das autoridades administrativas e convênios.
3 Relação entre direito tributário e direito constitucional
A classificação do direito em ramos é meramente didática, pois como sabido o Direito é uma ciência una e indivisível, por isso o Direito Tributário se relaciona com outros ramos do Direito, dentre eles com o Direito Constitucional. Deste modo, o Direito Constitucional, de acordo com Dirley da Cunha Júnior, “delineia o sistema tributário nacional, dando o conceito de tributo, discriminando a competência tributária e estabelecendo um regime tributário, através da fixação de limites ao poder de tributar”[4] [sic].
Destaca-se que, como já visto, que a CRFB/88, integra o rol das fontes formais do Direito Tributário, e contém um título próprio dispondo sobre Direito Tributário, qual seja, o Título VI da CRFB/88, Da Tributação e do Orçamento, o qual é composto de 02 (dois) capítulos, 08(oito) seções e 24 (vinte e quatro) artigos, que regulamentam desde o Sistema Tributário Nacional até as finanças públicas, tratando dos princípios gerais da tributação, bem como impondo limitações ao poder de tributar e regulando a capacidade tributária ativa dos entes da federação, sem contudo, instituir tributos.
Diante do exposto, inegável a relação existente entre o Direito Tributário e o Direito Constitucional, esses ramos do Direito se aproximam de tal forma que alguns artigos do CTN e da CRFB/88 confundem-se em suas disposições, não foi por outro motivo que aquele foi recepcionado por esta, com status de Lei complementar, quando da sua promulgação. Verifica-se que mesmo havendo a recepção do CTN pela CRFB/88, a Carta Magna provocou alterações no Sistema Tributário Nacional.
4 Princípios do direito tributário
O Estado é ente soberano que representa a nação em face de outras nações e exerce poder sobre todos aqueles circunscritos em seu território, assim, a fim de manter-se economicamente, além de exercer atividade econômicas, através de, por exemplo, empresas públicas, ele estabelece tributos, dos quais o imposto é uma espécie. Portanto, o tributo está diretamente ligado ao Princípio da Soberania Estatal.
Desta forma, o Estado no uso e gozo de seu poder de instituir tributos[5], com a anuência popular, haja vista que os tributos são instituídos pelo Estado, mas através dos representantes escolhidos pelo povo, acorda com os demais entes da Federação[6], sobre questões tributárias, a fim de evitar a bitributação.
Portanto o Estado possui poder tributário, que é a capacidade de instituir tributos, delegada pela Constituição da República Federativa do Brasil, com certas limitações, à União, aos Estados Membros, aos Municípios e ao Distrito Federal.
Assim, objetivando proteger o contribuinte do abuso de poder, daqueles para os quais a CRFB/88 atribui competência tributária, há princípios universais que regem a tributação, são eles a legalidade, a legitimidade, a anterioridade, a igualdade, a competência, a capacidade contributiva, a vedação do confisco e a liberdade de tráfego.
Ressalta-se que todos esses princípios são empregados em prol do contribuinte e não do Estado, conforme verifica-se pelas descrições abaixo:
O Princípio da Legalidade[7] funciona como um regulador à criação do tributo, posto que segundo ele, o tributo poderá ser instituído ou majorado somente em virtude de lei. Observar-se que a Legalidade reveste todas as etapas de criação de um tributo, desde o fato gerador, a base de cálculo, a alíquota[8], os sujeitos ativos e passivos até a data de pagamento.
O Princípio da Anterioridade inadmite a cobrança do tributo imediatamente depois a sua instituição ou majoração, devendo esta ser feita após o período de vacância de 90 (noventa) dias, após o exercício do tributo majorado ou instituído, conforme Emenda Constitucional nº 42/03.
O Princípio da Igualdade Tributária faz alusão ao art. 5º da CRFB/88, segundo o qual todos são iguais perante a lei, destarte no âmbito tributário ele se dá em razão da proporcionalidade da cobrança do tributo, portanto, quem pode mais paga mais, quem pode menos paga menos, admitindo-se para tanto, o emprego das isenções.
O Princípio da Vedação do Tributo com efeito confiscatório determina que o tributo deve ser um ônus suportável, pois a finalidade dele não é punitiva, como a multa, portanto não deve extrapolar a razoabilidade impondo sacrifício ao contribuinte.
No que tange ao Princípio da Capacidade Contributiva, pode-se afirmar que ele abrange os princípios da Isonomia e da vedação do confisco, em razão da relevância para o presente trabalho, será tratado em tópico a parte.
4.1 Princípio da capacidade contributiva
O Princípio da Capacidade Contributiva, sendo um princípio básico do sistema tributário, foi difundido já no século XVIII, em Londres, por Adam Smith, economista inglês, através da obra Inquérito sobre a Natureza e as Causas da Riqueza das Nações[9].Nas constituições brasileiras tal princípio aparece pela primeira vez na Carta Magna de 1946[10], já no que tange a Constituição atual, o Princípio da Capacidade Contributiva, foi tipificado no §1º, do art. 145.
Assim, com base na Constituição de 1988, pode-se afirmar: o Princípio da Capacidade Contributiva leva em conta a possibilidade que o contribuinte possui de suportar o tributo, pois o tributo não deve ser instrumento de pauperização do contribuinte, mas deve repousar sobre uma base de cálculo suave e uma alíquota razoável. Portanto, segundo Vittorio Cassone, ele é:
“um princípio dirigido ao legislador infraconstitucional, no sentido de que, ao criar o imposto, deve levar em conta, sempre que possível, o caráter pessoal, ou seja, as características do contribuinte, estabelecendo graduação baseada na capacidade contributiva ou econômica.”[11]
Nesse sentido, Aliomar Baleeiro afirma que “a capacidade contributiva é princípio que serve de critério ou de instrumento a concretização dos direitos fundamentais individuais, quais sejam, a igualdade e o direito de propriedade ou vedação do confisco” ( Baleeiro, 2005, p.689).
Assim, pelo princípio da capacidade contributiva, caberia ao legislador estabelece limite à tributação, graduando o tributo de acordo com a aptidão que o contribuinte tem para pagar o tributo, contudo tal princípio tem sido constantemente violado, principalmente em razão da cobrança do imposto indireto.
A redação do art. 145, §1º da CRFB/88 dispõe que:
“Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte.” (grifo nosso)
Quando o legislador utiliza a expressão “sempre que possível” ele não deixa o ente tributante escolher quando deve ser aplicado ou não o Princípio da Capacidade Contributiva, ao revés, “o advérbio sempre acentua o grau da imperatividade e abrangência do dispositivo, deixando claro que, apenas sendo impossível, deixará o legislador de considerar a pessoalidade para graduar o imposto de acordo com capacidade econômica subjetiva do contribuinte” (Baleeiro, 205, p.694).
Embora a doutrina majoritariamente defenda que uma das hipóteses de impossibilidade de aplicar a capacidade contributiva seria na cobrança do imposto indireto, suportado pelo consumidor final, acredita-se aqui ser possível sim aplicar a capacidade econômica subjetiva na cobrança do imposto indireto, em razão da possibilidade de o consumidor final ser identificado, como se verá mais adiante.
5 Tributos
O Código Tributário Nacional traz consigo, no art. 3º, a definição de tributo como “toda prestação pecuniária compulsória, moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrava plenamente vinculada”. Desse conceito compreende-se que o tributo é obrigação, ex lege, de dar dinheiro, não podendo ser in natura ou in labore, dotado de “compulsoriedade, não dando azo a autonomia de vontade”[12], cobrado mediante lançamento.
O Tributo é ínsito ao regime democrático de governo, pois cobrado com anuência dos contribuintes, os quais revestidos pelo direito do sufrágio, elegem representantes que hão de estabelecer o tributo, desde a sua base de cálculo até a sua incidência.
Verifica-se ainda que objetivo do tributo não é a pauperização do contribuinte, mas arrecadar rendimentos para a manutenção do Estado, oferecendo ao cidadão serviços básicos, necessários a mantença de uma vida digna, por essa razão, não se pode criar espécies de tributos indistintamente.
Assim, hodiernamente existem no Brasil uma quantidade limitada de espécies de tributo, existindo duas teorias quanto a quantidade de espécies de tributo instuídos pela legislação brasileira, conforme explanado a seguir:
5.1 Teoria tripartida e pentapartida
A Carta Magna, em seu art.145, dispõe que os entes tributantes poderão criar impostos, taxas e contribuições de melhoria, consoante esse dispositivo está o art. 5º do CTN, o qual dispõe que constituem tributos as taxas, os impostos e as contribuições de melhoria. Por esse motivo surgiu na doutrina quem defendesse a Teoria Tripartida, segundo a qual existem apenas três espécies de tributos, já citadas acima.
Ocorre que, com fulcro nos arts. 3º e 4º do CTN, os quais definem tributo e os elementos de caracterização da natureza jurídica do tributo; e com o advento dos empréstimos compulsórios e das contribuições parafiscais, surge a Teoria Pentapartida, segundo a qual existem cinco espécies de tributos: taxas, impostos, contribuições de melhoria, empréstimos compulsórios e contribuições parafiscias.
Destaca-se que além dessas duas teorias de classificação das espécies de tributo existem outras, contudo essas são as de maior relevância, observando-se que é a Teoria Pentapartida é defendida por crassa maioria doutrinária.
5.2 Espécies de tributo
Como visto no tópico acima, a maioria da doutrina concorda que existem cinco espécies de tributo:
a)Imposto: é tributo que incide em razão de fato gerador determinado por lei, basta portanto que haja subsunção do ato praticado pelo contribuinte a um fato gerador instituído in legis. Assim, os impostos podem ser de natureza federal[13], cuja competência é da União, de natureza estadual[14], cuja competência é do Estado-Membro e do Distrito Federal, e de natureza municipal[15], cuja competência é dos Municípios e do Distrito Federal. O imposto pode ser classificado em direto e indireto.[16]
b)Taxa: é tributo que exige para sua incidência uma contraprestação do Estado, nas palavras de Eduardo Sabbag, “taxa é tributo imediatamente vinculado à ação estatal, atrelando-se à atividade pública”. Assim existem duas classificações das taxas, a taxa de polícia, decorrentes de atos de fiscalização da Administração Pública (ex.: taxa de alvará); e a taxa de serviço, decorrente da prestação de serviço público específico e divisível (ex.: taxa de iluminação pública).
c) Contribuição de melhoria: trata-se de tributo cobrado dos proprietários de imóveis beneficiados em virtude da realização de obras públicas, portanto, esse tributo decorre da valorização imobiliária que a obra gerou para o contribuinte.
d) Empréstimo compulsório: é tributo federal criado através de lei completar para cobrir despesas extraordinárias, por motivo de calamidade pública, de guerra externa ou sua iminência, ou quando se fizer necessário obter receitas para investimento público de caráter urgente e de relevante interesse nacional.
e) Contribuições parafiscais: instituídos por um ente tributante, em geral, pela União, mas cobrados por uma entidade parafiscal, em virtude do caráter especial da atividades que elas desenvolvem. A contribuição sindical é um exemplo de contribuição parafiscal.
6 Conflito entre o princípio da capacidade contributiva e a cobrança de imposto indireto
O Direito Tributário é um ramo do Direito Público que emanou do Direito Financeiro e tem como objeto a arrecadação de tributos, os quais são fonte principal das receitas públicas. Assim, o Estado ao agregar aos seus cofres os ativos tributários advindos dos contribuintes, não o faz de modo arbitrário, pois se o fizesse não estaria exercendo o poder de tributar, mas sim o confisco.
Assim, a relação existente entre o contribuinte e o Estado, no exercício do poder de tributar, é uma relação jurídica[17], regulada por normas, as quais tanto o Estado quanto o contribuinte devem observar, portanto o pagamento de um tributo é dever jurídico do contribuinte, seu não cumprimento implica em sanções, por outro lado o Estado não pode tributar arbitrariamente, pois existem limitações ao poder de tributar.
Diante disso, a Constituição Federal limita o poder de tributar, inclusive através de princípios, dentre os quais, o da capacidade tributária, que se encontra vinculado ao da isonomia, disposto no art.150, inc. II, da Carta Magna. Logo, ao tributar o Estado considerará o nível econômico do contribuinte, a fim de que o tributo seja e pareça justo.
Desta forma, na visão de Vittorio Cassone, “Não raras vezes se apresenta contraste entre o princípio da capacidade contributiva e o princípio da reserva legal, …, o ideal de justiça seria expresso com a prevalência do princípio da capacidade contributiva”.[18]
Conceitua-se tributo como toda prestação pecuniária, com fulcro em lei, sem caráter sancionatório, cobrada mediante lançamento, cujas espécies, segundo a teoria pentapartida, são: taxa, contribuição de melhoria, empréstimo compulsório, contribuição e imposto, esse último é o mais importante para fins desse trabalho.
Assim, imposto, ao revés da taxa, é toda situação tributável, independente de contraprestação do Estado, logo, não é vinculado, através dele visa-se arrecadar receitas para custear despesas públicas em geral. Portanto em virtude de o imposto ser tributo unilateral, para que ele seja cobrado, basta à subsunção do fato gerador.
Nesse sentido, Eduardo Jardim define imposto como “modalidade de tributo que hospeda como hipótese de incidência uma conduta particular, desatrelada de qualquer atividade estatal, dotada de conteúdo econômico e reveladora de capacidade contributiva, cujas receitas, por via de regra, preordenam-se a prever o orçamento público”
Diante disso, o imposto classifica-se em direto, quando ele é suportado pelo contribuinte que subsumiu o fato gerador (exemplo: IPVA e IPTU); e em indireto, quando o contribuinte onerado não ensejou o fato gerador, pois o ônus do imposto à ele foi transferido pelo contribuinte de direito, (v.g., ICMS e IPI), normalmente quem arca com o ônus do imposto indireto é o consumidor final.
Assim, em impostos diretos, há observância do Estado quanto ao princípio em destaque, mas na cobrança dos impostos indiretos o Estado, no exercício do poder de tributar, fecha os olhos à capacidade contributiva do ente tributado, expondo-os ao mesmo ônus independentemente da condição econômica que cada um ostente.
Deste modo, enquanto no imposto direto a carga tributária é graduada de acordo com a capacidade econômica do contribuinte, no imposto indireto não se faz tal adequação, em virtude de inexistir a utilização, pelo ente tributante, de meios que afiram a capacidade contributiva do ente que suporta a carga do imposto.
A partir do exposto acima, verifica-se que na cobrança do imposto indireto há violação do princípio da capacidade contributiva, pois para que haja subsunção desse princípio, também denominado por alguns autores de princípio da capacidade tributária, é mister que a alíquota aplicada a base de cálculo se adeque as condições econômicas do contribuinte. Portanto a cobrança do imposto indireto é indevida, cabendo restituição do indébito ao contribuinte onerado.
7 Medidas adequadas para sanar o conflito
Observa-se que o imposto indireto viola o Princípio da Capacidade Contributiva em virtude de o contribuinte que o paga não ser identificado, trata-se pois de sanar esse violação de através de medida simples, para tanto basta instituir formas de identificar o consumidor final, que é quem suporta o ônus do tributo indireto, deste modo, verificar-se-ia a capacidade econômica financeira do contribuinte, a fim de que o Princípio da Capacidade Contributiva seja aplicado.
A tecnologia atual nos abre um leque de possibilidades para identificar o contribuinte que é onerado pelo imposto indireto, portanto identificar esse contribuinte torna-se tarefa mais fácil do que já fora. Dentre as formas de identificação do consumidor final pensa-se que a mais adequada é o registro do contribuinte, através de seu CPF, no documento da nota fiscal.
Tal procedimento é muito simples e é adotado com outras finalidades, por exemplo, no estado de São Paulo, onde o contribuinte no momento de efetuar a compra, registra o número do seu CPF na nota fiscal, com o objetivo de receber de volta 30% do valor pago a título de ICMS recolhido pelo estabelecimento que realizou a venda.
Esse procedimento integra o programa da Nota Fiscal Paulista e tem por objetivo incentivar o consumidor a pedir a nota fiscal com o fim de evitar a sonegação do imposto pelo comerciante, para tanto destaca-se que não basta que o consumidor insira o seu CPF na nota fiscal, é necessário também que ele se cadastre no programa.
Outra solução viável é efetuar um cadastro do contribuinte onerado pelo imposto indireto, atribuindo à ele um número e uma carteira de identificação, o qual quando utilizado, gerasse dedução ou não do tributo indireto, de acordo com a capacidade econômica financeira do contribuinte. Estabelecer-se-ia, para esse fim, uma atualização cadastral de acordo um lapso de tempo pré-definido, objetivando avaliar mudanças no quadro econômico financeiro do contribuinte.
8 Considerações finais
Entre a população brasileira existem diversos níveis econômicos, por esse motivo não é adequado tributar todos os contribuintes da mesma forma, sem levar em consideração características peculiares de cada um, pois tal fato constitui violação ao Princípio da Capacidade Contributiva, de forma que o tributo cobrado onera mais a uns do que a outros, pois não se pode colocar no mesmo patamar de tributação um indivíduo que recebe um salário mínimo por mês e outro que recebe algo em torno de cem vezes mais.
Deste modo, mister adequar cobrança do imposto indireto a capacidade econômica financeira do contribuinte, adotando medidas simplórias, todavia eficazes, mesmo que, à primeira vista, haja um trabalho maior do ente tributante para identificar o contribuinte onerado pelo imposto indireto. Pois, consoante entendimento de Aliomar Baleeiro:
“O plano econômico, a reforma tributária, fiscal e administrativa terão de se submeter aos princípios e valores da Constituição. Por isso são com ela inconciliáveis quaisquer planos, projetos e reformas recessivos, que acentuem o desemprego, a miséria e a desigualdade social entre grupos e regiões, pois quer o preâmbulo da Constituição Federal de 1988, quer seus art.1º ao 3º, constituem a República Federativa do Brasil em Estado Democrático de Direito, no qual a igualdade, a justiça, a solidariedade e o desenvolvimento são metas prioritárias” (Baleeiro, 2005, p.4)
Destarte, verifica-se que algumas mudanças na maneira de tributar se fazem prioritárias, cobrar o tributo sem avaliar a capacidade econômica financeira do contribuinte fere não só o Princípio da Capacidade Contributiva, mas também o Princípio da Igualdade, contribuído para o quadro desigualdade social e, por conseguinte, atingindo, em alguns casos, a dignidade da pessoa humana do contribuinte.
Informações Sobre o Autor
Larissa Rocha Silveira
Advogada Graduada em Direito pela Universidade Católica do Salvador