Considerações acerca da constitucionalidade da Lei Complementar do Estado de Roraima n° 149, de 16 de outubro de 2009

Resumo: O presente artigo tem como objetivo expor algumas considerações acerca da  constitucionalidade ou não da Lei Complementar do Estado de Roraima n° 149/09, diante da sistemática constitucional de distribuição da competência legislativa entre União e Estados. A Constituição Federal distribuiu a competência legislativa para tratar de matéria ambiental de forma concorrente entre a União e os Estados, restando para esses apenas suplementar as normas gerais editadas por aquela. A Lei Complementar referida traz disposições de natureza permissiva que, segundo a Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e os estudiosos, é matéria peculiar de normas gerais federais.  Essas disposições permissivas são contrárias às normas gerais federais acerca da mesma matéria. Apresenta conclusão no sentido de sofrer a Lei referida de vício de inconstitucionalidade e chama a atenção para a repercussão social negativa da prática de atos com base nessa.


Palavras-chave: Competência Legislativa. Normas Gerais Federais. Constitucionalidade da Lei Complementar do Estado de Roraima n° 149/09.


Abstract: This article aims to expose some thoughts about the constitutionality the State of Complementary Law No. 149/09 of Roraima, on the constitutional system of distribution of legislative powers between the Union and States. The Federal Constitution distributed the legislative competence to deal with environmental matters concurrently between the Union and the States, leaving only those additional to the general rules issued by it. Complementary Law provides that provisions of permissive nature, according to the jurisprudence of the Supreme Court and scholars, is a matter of particular federal general rules. These provisions are in conflict with lax federal general about the same matter. Presents the conclusion to the effect that the law suffer from addiction constitutionality and draws attention to the negative social consequences from acts based on this Law with the possibility of subsequent cancellation of these through a declaration of unconstitutionality via concentrated control.


Keywords:  Legislative Authority. Federal General Standards. Constitutionality of State Complementary Law No. 149/09 of Roraima.Ouvir


Sumário: Introdução. 1. Distribuição das competências estatais em matéria ambiental. 2. Delimitação conceitual das normas gerais federais e das normas suplementares dos Estados. 3. Da análise da constitucionalidade da Lei Complementar do Estado de Roraima n. 149/2009 sob o ponto de vista da competência para legislar. 4. Da incompatibilidade da sistemática estabelecida pela Lei Complementar Estadual de Roraima n. 149/09 para obtenção de licença única de operação para imóveis rurais com as normas gerais federais acerca da matéria. Conclusão


INTRODUÇÃO


A Constituição Federal estabeleceu competência concorrente entre União e Estados para legislar acerca do meio ambiente. No entanto, os critérios de delimitação dessa competência não foram bem definidos no texto constitucional, o que tem implicado eventuais usurpações da competência legislativa Federal pelos Estados, resultando em vícios de inconstitucionalidade de algumas Leis estaduais.


O presente artigo científico tem como objetivo expor algumas considerações acerca da constitucionalidade ou não da Lei Complementar do Estado de Roraima n° 149, de 16 de outubro de 2009, em cotejo com a sistemática de delimitação da competência legislativa entre os entes da federação em matéria de proteção ao meio ambiente prevista na Constituição Federal.


Inicialmente serão tecidos breves comentários acerca da distribuição das competências material e legislativa dos entes da federação em matéria de meio ambiente. De forma um pouco mais detida, será feita uma exposição do que são as normas gerais federais e quais são os critérios firmados pelos tribunais e estudiosos para identificá-las, já que a Constituição Federal não o fez a contento. Após, serão comentados os principais dispositivos da Lei Complementar acima mencionada bem como serão apontados eventuais vícios de constitucionalidade.


1. DISTRIBUIÇÃO DAS COMPETÊNCIAS ESTATAIS EM MATÉRIA AMBIENTAL


A Constituição Federal trata das competências estatais em matéria ambiental em seu Título III, onde traz disposições acerca da organização do Estado. No intuito de melhor sistematizar a delimitação e o exercício dessas competências, o legislador  constituinte optou por dividi-la em material e legislativa.


Em se falando de matéria ambiental, a competência material ou administrativa, consiste no poder-dever do Estado de agir concretamente no sentido de proteger o meio ambiente, ou seja, “de fazer a gestão ambiental e de implementar políticas públicas pertinentes” (MACHADO, 2007, p.10). Está prevista no artigo 23, III, IV, V, VI e VII da Lei Maior e, com o fito de proporcionar uma mais ampla e completa defesa ao meio ambiente, sob o pálio do federalismo cooperativo, foi prevista na forma de competência comum para a União, Estado, Distrito Federal e Municípios. 


Em que pese o intuito do legislador constitucional de otimizar a proteção do meio ambiente através da sistemática da colaboração entre os entes da federação em suas funções executivas ou materiais, a prática apresenta essa competência comum como uma verdadeira armadilha. Como bem destaca Antunes (2008, p. 80), “a atribuição de todos acaba se transformando na atribuição de ninguém”, na medida em que “não há, na Constituição, um critério fundado na possibilidade de uma prestação de serviço mais adequada ou de maior proteção ao meio ambiente”.


O fato é que a competência comum buscou estabelecer um modelo de cooperação entre as esferas de poder – federalismo cooperativo, sendo que o ordenamento jurídico infraconstitucional não se moldou no sentido de viabilizar essa cooperação de forma efetiva, uma vez que apenas após mais de duas décadas da promulgação da CF/88 é que foi publicada a competente Lei Complementar n. 140/2011 com a finalidade de fixar as normas “para a cooperação entre União, Estados, Distrito Federal e os Municípios, tendo em vista o equilíbrio do desenvolvimento e do bem-estar em âmbito nacional”, conforme previsto no parágrafo único do art. 23 da CF.


A competência legislativa no ordenamento jurídico constitucional brasileiro de uma forma geral foi delimitada com base em diversos critérios podendo-se falar em competência remanescente, exclusiva, privativa, concorrente, suplementar e reservada. Em se tratando de competência legislativa ambiental, o legislador constituinte valeu-se da forma concorrente de delimitação, que consiste em uma sistemática em que compete à União editar normas gerais e aos Estados e ao Distrito Federal – DF a edição de normas suplementares, ficando estabelecido que, na ausência de uma norma geral federal, os Estados e o DF poderão exercer a competência legislativa plena. Caso venha a ser posteriormente editada uma lei federal, os dispositivos da norma estadual que versarem sobre disposições contrárias a ela terão sua eficácia suspensa. Essa sistemática está claramente prevista no art. 24 da CF.


Apesar de não haver expressa previsão de que os municípios poderão participar da edição de normas ambientais, em razão do disposto no art. 30, I e II, é induvidoso que poderão fazê-lo, desde que a título de suplementação das legislações federais e estaduais e em assuntos de interesse local.  Nesse sentido Fiorillo (2009, p. 131) afirma que “Não se deve perder de vista que aos Municípios também é atribuída competência legislativa suplementar determinando o art. 30, II competir a eles suplementar a legislação federal e estadual no que couber”. Com a mesma opinião Antunes (2009, p. 89) assevera que “está claro, na minha análise, que o meio ambiente está incluído no conjunto de atribuições legislativas e administrativas municipais e, em realidade, os Municípios formam um elo fundamental na complexa cadeia de proteção ambiental”.


O exercício dessa competência legislativa concorrente é constantemente permeado por conflitos de competência entre os entes da federação em razão do fato de que a expressão “‘normas gerais’ utilizada pelo § 1° do art. 24 a Constituição Federal é um conceito jurídico indeterminado, e a doutrina e a jurisprudência têm encontrado certa dificuldade no preenchimento de seu conteúdo” (FARIAS, 2007). Assim, antes de se analisar especificamente o teor da Lei Complementar do Estado de Roraima n° 149/2009 e a sua consonância com os ditames constitucionais, faz-se pertinente o delineamento jurídico das normas gerais federais e das normas suplementares dos Estados.


2. DELIMITAÇÃO CONCEITUAL DAS NORMAS GERAIS FEDERAIS E DAS NORMAS SUPLEMENTARES DOS ESTADOS


Com a finalidade de traçar um delineamento para o conceito juridicamente indeterminado de “norma geral”, estudiosos têm sustentado a existência de alguns critérios que se prestam a diferenciar as ditas normas gerais federais das normas suplementares dos Estados e dos Municípios.


As normas gerais devem esposar um regramento uniforme para todo o território nacional, sob pena de serem geradas situações de desequilíbrio entre os diversos entes da federação. Com propriedade, Greco (2003, p. 27) assevera que “normas gerais são normas uniformes, isonômicas, aplicáveis a todos os cidadãos e a todos os Estados”. Tavares (2007, p.19), por sua vez, afirma que:


“As “normas gerais” devem se reportar ao interesse fundamental da ordem federativa. Como a Federação brasileira têm por fundamento a solidariedade, que exige a colaboração de todos os seus integrantes, existe a necessidade de uniformização de certos interesses como base desta cooperação. Desta maneira, toda matéria que ultrapassar o interesse particular de um ente federado porque é comum, ou seja, interessa a todos, ou envolver conceituações que, se fossem particularizadas num âmbito sub-nacional, gerariam conflitos ou dificuldades nacionalmente, é matéria de norma geral.”


Não se deve olvidar, no entanto, que, em se tratando de normas gerais ambientais, esse critério deve ser entendido com a ressalva de que poderão elas se referir apenas a uma dada região ou ecossistema sem, como óbvio, dissociar-se do interesse geral e desde que sejam pautadas em razões de ordem técnica no afã de dar maior proteção ao bem tutelado. Nesse sentido Machado (2009, p. 116) sustenta que “a norma geral federal ambiental não precisa necessariamente abranger todo o território brasileiro”, de forma que ela pode “abranger somente um ecossistema, uma bacia hidrográfica ou somente uma espécie vegetal ou animal”.


Observa-se aqui o primeiro critério de identificação de uma norma geral, qual seja, a necessidade de aplicação uniforme em todo o território nacional ou em uma determinada região do país.


O Supremo Tribunal Federal – STF no exercício de sua jurisdição constitucional firmou como um outro critério caracterizador das normas gerais o caráter proibitivo ou permissivo da norma, como se pode observar da análise dos seguintes trechos das decisões proferidas, respectivamente, nos autos da ação declaratória de inconstitucionalidade – ADIN n. 2.396-9/MS e da ADIN n. 3.035-3/RR:


“É que ao determinar a proibição de fabricação, ingresso, comercialização e estocagem de amianto ou de produtos à base de amianto, destinados à construção civil, o Estado do Mato Grosso do Sul excedeu a margem de competência concorrente que lhe é assegurada para legislar sobre produção e consumo (art. 24, V); proteção do meio ambiente e controle da poluição (art. 24, VI); e proteção e defasa da saúde (art. 24, XII).”


“Também é plausível a alegação de inconstitucionalidade no que toca às matérias de competência legislativa concorrente. A lei estadual estabelece normas restritivas quanto ao cultivo, manipulação e industrialização de OGM´s tendo em vista, entre outros aspectos, preocupações de índole sanitária e ambiental. Também estabelece regras restritivas quanto ao financiamento do cultivo e manipulação de OGM´s em desacordo com a lei federal. Tais matérias, em um primeiro exame, estão sujeitas à disciplina concorrente da União e Estados.”


Com efeito, não se pode admitir, de uma forma geral, normas proibitivas ou permissivas diferenciadas em cada um dos entes federados, sob pena de malferir o equilíbrio da federação. Sobre esse critério, Bercovici (2007, p. 86) sustenta que:


“Dentre os elementos até agora elencados, este se afigura como o mais certo e seguro. Portanto, norma geral é norma que admite ou veda determinada conduta no sentido de que se determinada lei federal admitir certa prática, não caberá à lei estadual estabelecer o contrário; se determinada lei federal proibir certa prática, a lei estadual não poderá permiti-la.”


Em se tratando de matéria ambiental, no entanto, esse critério deve ser aplicado de maneira mitigada, uma vez que se vislumbra ser possível a existência de normatização estadual ou até municipal mais restritiva que a geral federal, de forma a ser atribuída maior proteção ao meio ambiente a depender do juízo político-ambiental do ente federativo local. Nesse sentido, Forillo (2009, p. 131) sustenta que “a competência legislativa em matéria ambiental está sempre privilegiando a maior e mais efetiva preservação do meio ambiente, independentemente do ente do ente público que a realize”. Com o mesmo raciocínio, Farias (1999, p. 356) sustenta que o princípio in dubio pro natura deve inspirar a interpretação conjunta das normas gerais federais e das normas suplementares locais, concluindo que:


“teleologicamente, assegura-se a possibilidade de norma estadual estabelecer proibições, onde a lei federal permita, bem como que a lei federal estabeleça patamares mínimos de proteção ambiental a serem observados em todo o País, dando-se efetividade à proteção ambiental e ao desenvolvimento auto-sustentável.”


Destaque-se que a mitigação referida não se estende às normas estaduais mais permissivas, de forma que não poderá ser atribuído tratamento mais benevolente que o estabelecido na norma geral federal em sede de legislação suplementar estadual ou municipal, sob pena de se possibilitar uma “guerra legislativa” em que Estados e Municípios utilizar-se-iam de uma legislação mais benevolente para atrair empreendedores com pouca consciência ambiental para exercerem sua atividades em seus territórios.


Não se pode deixar de registrar que o alto nível de abstração também foi considerado pelo STF, especificamente pelo Ministro Carlos Velloso ao proferir decisão nos autos da ADIN n. 927-RS, como um dos critérios caracterizadores das normas gerais. No entanto, esse critério, isoladamente, não se presta para caracterizar uma norma geral, haja vista que não é fácil “determinar quais são as normas de maior abstração, quando de toda lei ainda se costuma exigir a nota da abstração” (BERCOVICI, 2007, p. 84).


À luz desses critérios, passa-se a analisar a Lei Complementar do Estado de Roraima n° 149/09 e comentar acerca da sua constitucionalidade sob o ponto de vista da competência para legislar.


3. DA ANÁLISE DA CONSTITUCIONALIDADE DA LEI COMPLEMENTAR DO ESTADO DE RORAIMA N. 149/09 SOB O PONTO DE VISTA DA COMPETÊNCIA PARA LEGISLAR


A Lei Complementar do Estado de Roraima n° 149/09 criou o Programa Roraimense de Regularização Ambiental Rural – RR SUSTENTÁVEL e disciplinou as etapas do Processo de Licenciamento Ambiental de Imóveis Rurais.


Em seu primeiro capítulo, estabeleceu a criação do Programa Estadual de Regularização Ambiental. Veja-se a redação dos artigos 1° e 2° da Lei ora comentada:


“Art. 1º Fica criado o Programa Roraimense de Regularização Ambiental Rural – RR SUSTENTÁVEL, com o objetivo de promover a regularização ambiental das propriedades e posses rurais e sua inserção no Sistema de Cadastramento Ambiental Rural e/ou Licenciamento Ambiental de Propriedades Rurais – SLAPR.


Art. 2º Os empreendimentos em operação e que não possuem licença ambiental na data de publicação desta Lei Complementar deverão regularizar sua situação, em consonância com o órgão ambiental licenciador.


§1º Os titulares dos empreendimentos referidos no caput deste artigo deverão requerer a regularização junto ao órgão ambiental competente, no prazo máximo de 365 (trezentos e sessenta e cinco) dias, contados a partir da data de publicação desta Lei Complementar.


§2º O proprietário ou possuidor de imóvel rural que aderir ao RR SUSTENTÁVEL, no decorrer do prazo fixado no §1º, não será autuado pelo passivo ambiental.


§3º Para fins de adesão ao RR SUSTENTÁVEL, o proprietário ou possuidor rural deverá requerer à Fundação Estadual do Meio Ambiente – FEMACT, a formalização da adesão, através de Termo de Ajustamento de Conduta – TAC.


§4º O TAC terá como objeto fixar prazo de seis meses para o devido cadastramento ambiental rural e, após aprovação do mesmo, prazo equivalente para apresentação de Projetos que visem promover as necessárias correções de suas atividades, mediante as exigências legais impostas pelas autoridades competentes.


§5º Os projetos ambientais apresentados nos prazos do TAC poderão ser reformulados pelos proponentes e reapreciados pela FEMACT.


§6º Os prazos firmados no TAC poderão ser prorrogados por igual período, para reformulação pelos proponentes e reapreciação pela FEMACT.”


Previu, portanto, a possibilidade de regularização dos empreendimentos rurais em operação que não possuem licença ambiental, prevendo um prazo de até 365 dias após a publicação da Lei para requerimento ao órgão ambiental competente. Permitiu ao possuidor ou proprietário dos imóveis rurais que adiram ao Programa operar suas atividades antes de concluído o processo de licenciamento e não ser autuado por isso (art. 2°, parágrafo 3°). Trouxe como forma de adesão ao programa a apresentação ao órgão Estadual do Meio Ambiente de Roraima – FEMACT- de Termo de ajustamento de conduta – TAC, que estabeleça ao empreendedor um prazo de seis meses para o cadastramento rural e, após a aprovação desse, prazo igual para a apresentação de projetos que tenham como fim promover a adequação legal das suas atividades. Previu ainda a prorrogação dos prazos do TAC para eventuais reformulações do Projeto e reapreciação da FEMACT.


O capítulo segundo trouxe disposições, a uma primeira vista, eminentemente procedimentais. No artigo terceiro previu-se que o processo de licenciamento ambiental de imóveis rurais deverá obedecer às etapas de Cadastramento Ambiental Rural – CAR e expedição de Licença Ambiental Única – LAU:


“Art. 3º O processo de licenciamento ambiental de imóveis rurais obedecerá às seguintes etapas:


I – Cadastro Ambiental Rural – CAR; e


II –Licença Ambiental Única- LAU.”


A seção I desse capítulo versa sobre o CAR, prevendo que esse acontecerá junto ao órgão Estadual do Meio Ambiente – FEMACT- por meio eletrônico, mediante declaração do interessado, “atestando a situação atual do imóvel”. Veja-se a redação da Lei:


“Art. 4º O Cadastro Ambiental Rural – CAR, consiste no registro dos imóveis rurais junto à FEMACT, por meio eletrônico, para fins de controle e monitoramento.


Art. 5º Para o cadastramento ambiental rural, o interessado, assistido por responsável técnico, com recolhimento de Anotação de Responsabilidade Técnica – ART, específica, deverá:


I – preencher o formulário com os dados do imóvel rural – área total da propriedade e/ou posse (APRT), área de preservação permanente (APP), área de reserva legal (ARL) e área para uso alternativo do solo (AUAS), disponibilizando a imagem digital da propriedade ou posse indicando suas coordenadas geográficas, e memorial descritivo;


II – declarar a existência de eventual passivo da área de reserva legal e de preservação permanente; e


III – apresentar cópia autenticada dos documentos pessoais do proprietário ou possuidor, do responsável técnico, do comprovante de posse e/ou certidão atualizada da matrícula.


Art. 6º O CAR, que terá efeito meramente declaratório, atestando a situação atual do imóvel, não se constituirá em prova da posse ou propriedade, nem servirá para autorizar desmatamento e/ou exploração florestal, para os quais será exigida a Licença Ambiental Única.


§1º No reconhecimento da posse, para fins de regularização ambiental, será suficiente contar com a posse ou ocupação de forma mansa e pacífica, com a demonstração da exteriorização da propriedade por, no mínimo 01 (um) ano e 01 (um) dia, atestada por autoridade Municipal e assinatura dos confinantes da área.


§2º O proprietário ou possuidor e o responsável técnico responderão administrativa, civil e penalmente pelas declarações prestadas no CAR se constatada a inexatidão de suas informações, salvo na hipótese de retificação promovida espontaneamente no respectivo cadastro.


§3º O CAR tem caráter permanente, devendo ser atualizado sempre que houver alteração na situação física, legal ou de utilização do imóvel rural, tais como, transferência de domínio, desmembramento, transmissão da posse, averbação, retificação, relocação de reserva legal ou alteração do tipo de exploração.


Art. 7º O CAR constitui requisito para o processamento dos pedidos de licenciamento de empreendimentos e atividades potencialmente poluidoras localizadas no interior da propriedade ou posse rural.”


A seção II do mesmo capítulo estabelece de forma pormenorizada as normas acerca da Licença Ambiental Única – LAU, atribuindo validade a essa pelo prazo de 10 anos. O cadastramento Ambiental Rural – CAR – é posto como pré-requisito para a concessão da LAU. Uma vez aprovado o CAR, atribuiu-se ao possuidor/proprietário de imóvel rural providenciar a localização e a averbação da reserva legal em prazos que variam de um a três anos, a depender do tamanho da propriedade:


“Art. 8º A FEMACT, no exercício de sua competência de controle, expedirá a Licença Ambiental Única – LAU, para fins de planejamento, instalação, operação e regularização de empreendimentos rurais, com validade de 10 (dez) anos, na qual são indicadas todas as atividades que poderão ser exploradas na referida posse e/ou propriedade.


Art. 9º O empreendedor deverá apresentar ao órgão ambiental estadual proposta de recuperação da área de preservação permanente degradada, a qual priorizará a regeneração natural da vegetação e/ou plantio de espécies nativas.


Art. 10. Aprovado o cadastramento, o proprietário e/ou possuidor de imóvel rural deverá providenciar a localização e averbação da reserva legal, mediante a apresentação dos documentos exigidos no roteiro disponibilizado pela FEMACT, nos seguintes prazos:


I – 01 (um) ano para propriedades acima de 3.000ha (três mil hectares);


II – 02 (dois) anos para propriedades acima de 500 (quinhentos) até 3.000ha (três mil hectares);


III –03 (três) anos para propriedades de até 500ha (quinhentos hectares).


Parágrafo único. O não atendimento à exigência prevista no caput deste artigo implicará no cancelamento da adesão ao RR SUSTENTÁVEL, suspensão do CAR e aplicação das sanções, com a adoção das medidas legais pertinentes.


Art. 11. A locação da reserva legal ficará condicionada à aprovação da FEMACT, devendo ser consideradas:


I – a função social da propriedade;


II – a proximidade com áreas protegidas estaduais ou federais, quando limítrofes com estas, ressalvadas as


situações anteriores à criação da área protegida; e


III – a formação de corredores ecológicos.


Art. 12. A área de reserva legal aprovada pelo órgão ambiental do Estado deverá ser averbada pelo proprietário, à margem da inscrição da matrícula do imóvel, no cartório de registro imobiliário competente, sendo vedada a alteração de sua destinação nos casos de transmissão, a qualquer título, ou de desmembramento da área.


§1º No caso de posse, o interessado deverá firmar com o Estado de Roraima Termo de Compromisso da Averbação da Reserva Legal – TCARL, conforme art.16, §§ 8º e 10 da Lei 4.771, de 15 de setembro de 1965.


§2º O proprietário deverá apresentar à FEMACT, no prazo de 60 (sessenta) dias, após aprovação da localização da reserva legal, o protocolo da solicitação administrativa, visando à efetiva averbação da reserva legal junto ao Cartório de Registro de Imóveis competente, sob pena de suspensão do cadastro, cancelamento da adesão ao RR SUSTENTÁVEL e aplicação das penalidades cabíveis.


Art. 13. Poderá ser instituída reserva legal, em regime de condomínio, entre propriedades contíguas, respeitado o percentual legal em relação a cada imóvel, mediante aprovação do órgão estadual competente e as devidas averbações referentes a todos os imóveis envolvidos.”


Ainda na Seção II, especificamente nos artigos 14 a 17, há previsão de que o proprietário ou possuidor de imóvel rural com área de reserva legal inferior ao percentual mínimo previsto na legislação deverá adotar medidas de recuperação do bioma onde está inserido o seu imóvel (dentro do próprio imóvel ou em outro localizado na mesma micro-bacia hidrográfica ou, na impossibilidade disso, na mesma bacia hidrográfica) como forma de reparação ao meio ambiente pela degradação de parte da reserva legal prevista. Há previsão, todavia, no sentido de que haverá desoneração do empreendedor quanto ao dever de adotar essas medidas mediante depósito, em conta bancária específica, de valor a ser firmado pelo Instituo de Terras e Colonização do Estado de Roraima – ITERAIMA, com previsão de parcelamento. As receitas oriundas desses depósitos devem ficar vinculadas às despesas com a regularização de Unidades de Conservação.


O Capítulo III foi dedicado às disposições finais. Previu-se a suspensão da prescrição de todos os ilícitos administrativos praticados com a efetivação voluntária do CAR pelo empreendedor bem como a proibição das autoridades administrativas de promoverem a autuação pelas infrações ambientais praticadas até a data da publicação da Lei Complementar em comento. Ainda foi estabelecida norma permissiva no sentido de reduzir em noventa por cento a multa ambiental aplicada ao empreendedor rural que após a comprovada recuperação total do dano ambiental. Nesse capítulo, especificamente no art. 22, há, mais uma vez, previsão de que a regularização do passivo ambiental, no que toca à reparação do dano ambiental mediante reposição florestal, poderá ser realizada mediante plantio pelo próprio produtor ou depósito em conta específica do Fundo Estadual do Meio Ambiente – FEMA- de valores que terão como referencial a quantidade de cinquenta metros cúbicos de madeira por hectare a um custo por de 01 (uma) UFERR por metro cúbico. Há previsão ainda de um período de carência de um ano para início do pagamento da primeira parcela, contada a partir da emissão da Licença Ambiental Única. Por fim, é digna de nota a previsão constante no art. 27 no sentido de que, caso a FEMACT não viabilize o firmamento do Termo de Ajustamento de Conduta- TAC- com o empreendedor rural em um prazo de até 30 dias após o requerimento do interessado, o TAC será reputado como ajustado nos termos propostos pelo interessado. Com o fim de possibilitar uma melhor visão contextual do disposto nesse Capítulo, transcrevo abaixo os seus principais artigos:


“Art. 18. O CAR, feito espontaneamente pelo proprietário ou possuidor rural, suspende a prescrição do ilícito administrativo praticado durante o período definido para a regularização do passivo ambiental, não se efetuando a autuação do cadastrante, salvo se o mesmo deixar de promover as medidas corretivas com as quais se comprometeu.


§1º Somente fará jus aos benefícios previstos neste artigo o interessado que aderir ao RR SUSTENTÁVEL, efetuando, voluntariamente, o cadastro do imóvel rural de sua propriedade ou posse, no prazo de (01) um ano, a contar da publicação desta Lei Complementar.


§2º Na hipótese de autuação anterior ao cadastramento, a assinatura do TAC, a ser firmado com o Estado de Roraima, suspenderá a execução dos respectivos autos de infração, bem como, a prescrição do ilícito administrativo praticado, sendo o proprietário ou possuidor rural beneficiado com a redução de 90% (noventa por cento) do valor da multa aplicada, se comprovada a reparação total do dano ambiental que deu causa à autuação.


§3º Em sendo interrompido o cumprimento das obrigações assumidas no TAC para a regularização do passivo ambiental, o valor da multa, atualizada monetariamente, será proporcional ao dano não reparado.


§4º VETADO.


§5º Não tendo se efetivado a autuação do proprietário ou possuidor rural e constatado, através de laudo técnico, o integral cumprimento da recuperação, da desoneração ou da compensação ajustada, será extinta a punibilidade pela infração administrativa correspondente.(…)


Art. 25. O disposto nesta Lei Complementar se aplica aos passivos ambientais de reserva legal e área de preservação permanente consolidados até a publicação da presente Lei Complementar.


Art. 26. VETADO.


Art. 27. O TAC previsto nesta norma deverá ser firmado pela FEMACT, no prazo de até 30 (trinta) dias, após seu requerimento, pelo interessado, sob pena de ser considerado ajustado, nos termos propostos.”


São esses os dispositivos da Lei Complementar do Estado de Roraima n° 149/09 que são dignos de nota e demandam análise e estudo. 


4. DA INCOMPATIBILIDADE DA SISTEMÁTICA ESTABELECIDA PELA LEI COMPLEMENTAR ESTADUAL DE RORAIMA N. 149/09 PARA OBTENÇÃO DE LICENÇA ÚNICA DE OPERAÇÃO PARA IMÓVEIS RURAIS COM AS NORMAS GERAIS FEDERAIS ACERCA DA MATÉRIA


Em uma primeira análise da Lei Complementar ora comentada, pode-se até achar que se trata de uma norma eminentemente procedimental, direcionada meramente ao poder executivo do Estado de Roraima. Acontece que, ao se passar a uma análise mais detida de tal diploma legal, percebem-se normas que se chocam com a legislação geral federal, adentrando na competência legislativa reservada para a União. 


A legislação ambiental geral federal prevê o Licenciamento Ambiental como um instrumento de prevenção da degradação ambiental na medida em que permite ao empreendedor identificar os efeitos negativos ao meio ambiente da atividade exercida e adotar medidas para evitá-los, resguardando assim o direito ao uso e gozo da propriedade e de livre iniciativa do empreendedor, porém, com resguardo do direito fundamental de todas a um meio ambiente hígido. Como bem destaca Antunes (2008, p.145), o licenciamento ambiental “é atividade diretamente relacionada ao exercício de direitos constitucionalmente assegurados, tais como o direito de propriedade e o direito de livre iniciativa econômica que deverão ser exercidos com respeito ao meio ambiente.”. Por causa disso, o ordenamento jurídico brasileiro exige que o licenciamento seja obtido antes da operação das atividades econômicas:


LEI Nº 6.938, DE 31 DE AGOSTO DE 1981:


Art. 10 – A construção, instalação, ampliação e funcionamento de estabelecimentos e atividades utilizadoras de recursos ambientais, considerados efetiva e potencialmente poluidores, bem como os capazes, sob qualquer forma, de causar degradação ambiental, dependerão de prévio licenciamento de órgão estadual competente, integrante do Sistema Nacional do Meio Ambiente – SISNAMA, e do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis – IBAMA, em caráter supletivo, sem prejuízo de outras licenças exigíveis.”


“RESOLUÇÃO CONAMA Nº 237, DE 19 DE DEZEMBRO DE 1997.


Art. 1º – Para efeito desta Resolução são adotadas as seguintes definições:(…)


II – Licença Ambiental: ato administrativo pelo qual o órgão ambiental competente, estabelece as condições, restrições e medidas de controle ambiental que deverão ser obedecidas pelo empreendedor, pessoa física ou jurídica, para localizar, instalar, ampliar e operar empreendimentos ou atividades utilizadoras dos recursos ambientais consideradas efetiva ou potencialmente poluidoras ou aquelas que, sob qualquer forma, possam causar degradação ambiental.”


DECRETO Nº 6.514, DE 22 DE JULHO DE 2008.


Art. 66.  Construir, reformar, ampliar, instalar ou fazer funcionar estabelecimentos, atividades, obras ou serviços utilizadores de recursos ambientais, considerados efetiva ou potencialmente poluidores, sem licença ou autorização dos órgãos ambientais competentes, em desacordo com a licença obtida ou contrariando as normas legais e regulamentos pertinentes: Multa de R$ 500,00 (quinhentos reais) a R$ 10.000.000,00 (dez milhões de reais). 


Parágrafo único.  Incorre nas mesmas multas quem:


I – constrói, reforma, amplia, instala ou faz funcionar estabelecimento, obra ou serviço sujeito a licenciamento ambiental localizado em unidade de conservação ou em sua zona de amortecimento, ou em áreas de proteção de mananciais legalmente estabelecidas, sem anuência do respectivo órgão gestor; e (Redação dada pelo Decreto nº 6.686, de 2008).


II – deixa de atender a condicionantes estabelecidas na licença ambiental.”


“LEI Nº 9.605, DE 12 DE FEVEREIRO DE 1998.


Art. 60. Construir, reformar, ampliar, instalar ou fazer funcionar, em qualquer parte do território nacional, estabelecimentos, obras ou serviços potencialmente poluidores, sem licença ou autorização dos órgãos ambientais competentes, ou contrariando as normas legais e regulamentares pertinentes:


Pena – detenção, de um a seis meses, ou multa, ou ambas as penas cumulativamente.” (grifos não constantes nos originais)


Trata-se de normas não meramente procedimentais, que estabelecem a proibição de exercer atividades efetiva ou potencialmente lesivas ao meio ambiente antes de efetivamente emitida a licença ambiental, com grau elevado de abstração e que demandam aplicação uniforme em todo o território nacional. Evidente o seu caráter de norma geral federal em matéria ambiental, de forma que devem ser observadas pelas legislações dos Estados. Nesse sentido, bem destaca Machado (2009, p.285):


“As normas e critérios gerais para o licenciamento, estabelecidos pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente – CONAMA, devem dar para todo o país os fundamentos do licenciamento. Essa competência do órgão colegiado federal – no qual estão representados os Estados- é relevante, pois evitará que Estados possam ser menos exigentes que outros no momento da instalação de empresas ou renovação do licenciamento.”


Pela sistemática da Lei Complementar Estadual-RR 149/09, para obter a expedição da LAU, o interessado deverá aderir ao programa RR Sustentável através da formalização de termo de ajustamento de conduta – TAC- a ser firmado com a FEMACT no prazo de 365 dias a partir da publicação da Lei. O TAC terá como objeto fixar prazo de seis meses para a realização do CAR. Após a aprovação desse, terá ainda mais seis meses para a apresentação de projetos que tenham como objeto a adequação de suas atividades aos ditames legais. Há ainda previsão de reformulações dos projetos apresentados bem como de prorrogação dos prazos do TAC por mais seis meses. Prevê-se, portanto, um prazo de dois anos e meio até que o interessado esteja diante de um projeto de readequação de suas atividades aos ditames legais. Até então, o empreendedor rural estará exercendo suas atividades sem a necessária licença ambiental por longo período sem, todavia, que as autoridades ambientais possam exercer o seu poder-dever de fiscalização (art. 18), o que vai de encontro flagrantemente às normas gerais federais acima colacionadas. Some-se a isso o fato de que o requerimento de expedição de licença ambiental poderá redundar em um indeferimento da licença ambiental.


Sem maiores delongas, é fácil concluir pela incompatibilidade dessa sistemática ao disposto na legislação geral federal acerca do licenciamento ambiental, que deve ser prévio ao início das atividades, conforme acima exposto.


A Lei complementar do Estado de Roraima ora comentada ainda traz tratamento mais favorável ao empreendedor que iniciou as suas atividades fora dos ditames legais em detrimento daqueles que se adequaram previamente às exigências legais para o exercício de suas atividades. Quanto a essa questão, é importante mencionar que o Tribunal de Contas da União, em seu Acórdão n° 1623/2006, determinou que devem ser adotadas medidas para evitar que os processos de regularização a posteriori sejam mais atrativos que o processo normal de licenciamento. Como o RR Sustentável cria anistia para aqueles que operam atividades lesivas ao meio ambiente sem licença ambiental e ainda prevê vasto prazo para regularização e posterior obtenção da licença, está atribuindo tratamento mais vantajoso para os que não buscaram iniciar as suas atividades dentro dos parâmetros legais, na medida em que aqueles que foram autuados,   submetendo-se às sanções respectivas antes da implantação do Plano de Regularização Roraima Sustentável e arcaram com o custo da obtenção prévia das licenças necessárias sofrerão encargos ambientais maiores do que aqueles que se mantiveram na ilegalidade e agora terão apenas que arcar com os custos da obtenção da licença, em prazo de até dois anos e meio.


Some-se a isso o fato de que os programas estaduais de regularização ambiental de propriedades rurais não poderão, sob pena de adentrar na competência legislativa da União de editar normas gerais que visam a dar tratamento uniforme a todo o território nacional ou região desse, deflagrar verdadeira competição no sentido de atrair empreendedores sem consciência ambiental para seus Estados através de benevolências quanto aos infratores da legislação ambiental sob o título de estar promovendo a regularização ambiental em seus territórios (VILAS-BOAS, 2008).


A União, através do Decreto n° 7.029, de dezembro de 2009, criou o Programa Federal de Apoio à Regularização Ambiental de Imóveis Rurais denominado “Mais Ambiente”. Previu o referido Decreto, em seu artigo 6°, § 2°, que, a partir da data da adesão ao programa, “o proprietário ou possuidor rural não será autuado com base nos artigos 43, 48, 51 e 55 do Decreto 6.514/08, desde que a infração tenha sido cometida até o dia anterior à data de publicação do Decreto e que sejam cumpridas as obrigações previstas no Termo de Adesão e Compromisso”. Trata-se de norma geral federal permissiva que deverá ser aplicada uniformemente em todo o território nacional. Em se tratando de norma federal geral, não são competentes os Estados para Legislar  livremente acerca de Programas de Regularização Ambiental, sobretudo estabelecendo tratamento mais permissivos que o previsto na norma geral federal, sob pena de usurpação de competência legislativa da União.


Com efeito, a Lei Complementar Estadual-RR 149/09, em seu artigo 2°, § 2°, prevê que o proprietário ou possuidor de imóvel rural que aderir ao Programa Roraima Sustentável dentro do prazo na mesma Lei fixado não será autuado por todo o seu passivo ambiental. Ora, como exposto, compete à norma geral federal estabelecer os limites das permissões em trato de matéria ambiental e o Decreto n° 7.029, de dezembro de 2009, que estabelece o Programa Mais Ambiente fez isso, ao estabelecer que apenas não sejam autuados aqueles que tivessem praticados apenas as condutas previstas nos artigos 43, 48, 51 e 55 do Decreto 6.514/08. Não poderia, pois, o Estado de Roraima ter previsto não autuação por todo passivo ambiental dos infratores proprietário ou possuidores de imóveis rurais, por configurar norma permissiva, de caráter geral – conforme exposto, editada por Estado.


A despeito da existência de outros vícios de constitucionalidade no texto da Lei Complementar ora estudada, os que acima foram destacados acabam por macular o disposto em toda ela, haja vista o alto nível de inter-relação entre todos os dispositivos que a compõem.


CONCLUSÃO


Por todo o exposto, é forçoso concluir que a Lei Complementar do Estado de Roraima n° 149/09, que criou o Programa Roraimense de Regularização Ambiental Rural – RR SUSTENTÁVEL e disciplinou as etapas do Processo de Licenciamento Ambiental de Imóveis Rurais, padece de vício de inconstitucionalidade, na medida em que indevidamente dispôs sobre questões afetas às normas gerais federais e que já foram regulamentadas de maneira distinta nesse âmbito. 


O fato é que as Leis possuem presunção de constitucionalidade e terão efeitos tidos como válidos até que sejam declaradas inconstitucionais pelo poder Judiciário. Porém, deve-se atentar para o fato de que eventual pronunciamento pela inconstitucionalidade de uma Lei em sede de controle concentrado, via ação declaratória de inconstitucionalidade ou constitucionalidade, tem efeitos retroativos, tornando inválidos quaisquer atos praticados com base na Lei retirada do ordenamento jurídico, o que viria a frustrar as intenções e expectativas de toda a sociedade roraimense, especialmente, dos beneficiários diretos de suas disposições.


 


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Informações Sobre o Autor

Paulo de Tarso Souza de Gouvêa Vieira

Procurador Federal. Professor Universitário. Bacharel em Direito pela UFPE, Especialista em Direito Público pela Universidade Maurício de Nassau – PE e Mestrando em Direito Ambiental pela Universidade do Estado do Amazonas – UEA


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