Resumo: Breves considerações sobra a prova no Âmbito da justiça desportiva
Palavras-chave: Meios de prova; Provas que gozam de presunção de veracidade; Prova cinematográfica; Prova documental; Exibição de coisa ou documento; Prova testemunhal; Prova pericial; Prova de inspeção; Busca da verdade dos fatos.
O CBJD – Código Brasileiro de Justiça Desportiva, em seu capítulo VIII, regulamenta os meios de prova no âmbito da Justiça Desportiva.
Assim como ocorre na Justiça Comum – e não poderia ser diferente – a prova tem como objetivo a busca pela verdade dos fatos. Ocorre, contudo, que não raras vezes essa busca está condicionada à capacidade das partes em produzi-las de modo suficiente ao convencimento dos auditores, os seus destinatários, e isso nem sempre é tarefa fácil.
O Codex desportivo admite em seu artigo 56 a produção de todos os meios de prova legais, inclusive aqueles não especificados no CBJD.
A pretensão do legislador ao dispor dessa forma é garantir às partes o direito constitucional ao contraditório, ante a presunção relativa de veracidade empregada à súmula, uma vez que possibilita a apresentação de elementos que contradigam o relato do árbitro.
Com texto similar ao artigo 334 do Código de Processo Civil, o parágrafo único do artigo 57 do CBJD estabelece que “Independem de prova os fatos: I – notórios; II – alegados por uma parte e confessados pela parte contrária; III – que gozarem da presunção de veracidade”.
Os fatos notórios e os confessados pela parte contrária dispensam considerações, eis que incontroversos.
Todavia, aqueles que gozam de presunção relativa de veracidade, ou seja, os que admitem provas em contrário, merecem certas considerações.
O artigo 58 do CBJD dispõe que terão presunção de veracidade “a súmula, o relatório e as demais informações prestadas pelos membros da equipe de arbitragem, bem como as informações prestadas pelos representantes da entidade desportiva, ou por quem lhes faça as vezes”.
Hodiernamente, os clubes têm produzido cada vez mais provas capazes de ilidir esses documentos. Como exemplo, há a prova cinematográfica, comumente utilizada nos julgamentos dos Tribunais Desportivos do país, principalmente dos de Futebol.
Muito embora não fosse necessário, considerando a natureza juris tantum da presunção relativa de veracidade, o parágrafo primeiro do artigo 58 deixa claro que tal presunção não constitui verdade absoluta.
Dessa forma, caso o auditor, durante o julgamento, constate equívocos, contradições ou inconsistências na súmula, poderá desconsiderar a presunção de veracidade e absolver o denunciado. Tanto é assim, que o parágrafo segundo do artigo em comento estabelece que “quando houver indício de infração praticada pelas pessoas referidas no caput, não se aplica o disposto neste artigo”.
Nessa hipótese, caberá à Procuradoria a análise do caso concreto, a fim de avaliar a necessidade de nova denúncia, dessa vez, em face do árbitro, com base no artigo 266 do CBJD.
Nesse eito, é válido lembrar que as informações prestadas pelo árbitro possuem maior relevância em relação às demais, como determina o parágrafo terceiro do artigo 58: “Se houver discrepância entre as informações prestadas pelos membros da equipe de arbitragem e pelos representantes da entidade desportiva, ausentes demais meios de convencimento, a presunção de veracidade recairá sobre as informações do árbitro, com relação ao local da disputa de partida, prova ou equivalente, ou sobre as informações dos representantes da entidade desportiva, nas demais hipóteses”.
Vale destacar que a utilização de prova cinematográfica pela Procuradoria para embasar as denúncias já foi bastante discutida antes do advento do novo CBJD, que acabou por regulamentar a matéria, incluindo o artigo 58-B. Um dos argumentos contrários era de que a decisão do árbitro em campo não poderia ser objeto de revisão pelo Tribunal, sob pena de se instaurar uma insegurança jurídico-desportiva.
Prevaleceu, assim, a regra de que as decisões da equipe de arbitragem não são passíveis de modificação pelos órgãos judicantes da Justiça Desportiva, possuindo caráter definitivo:
“Art. 58-B. As decisões disciplinares tomadas pela equipe de arbitragem durante a disputa de partidas, provas ou equivalentes são definitivas, não sendo passíveis de modificação pelos órgãos judicantes da Justiça Desportiva.”
Todavia, há exceção possibilitando à Procuradoria denunciar situações que tenham escapado à atenção da equipe de arbitragem, evitando-se o reexame do fato, como garante o parágrafo único do indigitado artigo:
“Art.58-B (…)
Parágrafo Único. Em caso de infrações graves que tenham escapado à atenção da equipe de arbitragem, ou em caso de notório equívoco na aplicação das decisões disciplinares, os órgãos judicantes poderão, excepcionalmente, apenar infrações ocorridas na disputa de partidas, provas ou equivalentes.”
Como exemplo, tem-se o julgamento do atleta Airton, do Clube de Regatas do Flamengo, realizado em 22 de Julho de 2011, tendo sido apenado com suspensão de quatro partidas, por ter praticado agressão que não foi objeto de análise pela equipe de arbitragem. Veja-se:
“PROCESSO Nº 34/2011 – Jogo: Fluminense FC (RJ) X CR Flamengo (RJ) categoria profissional, realizado em 10 de julho de 2011 – Campeonato Brasileiro- Serie A – Denunciados: Airton Ribeiro Santos, atleta do CR Flamengo, incurso no Art. 254-A § 1º inciso I do CBJD; Rodrigo Nunes de Sá, árbitro, incurso no Art. 259 do CBJD. – AUDITOR RELATOR DR. PAULO BRACKS.
RESULTADO: “Por maioria de votos, suspender por 04 partidas, Airton Ribeiro Santos, atleta do CR Flamengo, por infração do Art. 254-A § 1º inciso I do CBJD, contra o voto do Auditor Dr. Jose Teixeira Fernandes, que desclassificava para o Art. 254 do CBJD e o suspendia por 01 partida; suspender por 15 dias, Rodrigo Nunes de Sá, árbitro, por infração do Art. 259 do CBJD, contra o voto do Auditor Dr. Jose Fernandes, que desclassificava a infração para o Art. 260 do CBJD e aplicava a pena de advertência. Por determinação da Presidência da Quarta Comissão Disciplinar do STJD, Dr.ª Renata Quadros, a pedido do Dr. Giuliano Bozzano, defensor do arbitro, a suspensão, será contada a partir de 25 de julho de 2011”. (grifos nossos).
No que concerne à prova documental, compete à parte interessada a sua produção, nos termos do artigo 61 do CBJD.
Quanto à exibição de coisa ou documento é permitido ao Presidente do órgão judicante que, a pedido da parte, terceiro interveniente ou Procuradoria, ordene a sua exibição desde que necessário à apuração dos fatos. Tal possibilidade deve ser analisada com extremo bom-senso pelo Presidente do órgão judicante, a fim de evitar manobras protelatórias. Deverá ser observada a pertinência de tal requerimento; se a parte demonstrou que, de fato, diligenciou buscando a obtenção de tal prova por meios próprios; e, ainda, a relevância de tal requerimento. A concessão desse pleito é de inteira discricionariedade do Presidente do órgão judicante, cabendo a ele, e somente a ele, tal apreciação.
O CBJD não determina até que momento deve ser realizado tal pedido. Porém, em respeito aos princípios norteadores do direito desportivo, em especial ao da celeridade, da economia processual e do devido processo legal, entende-se que – embora se mantendo a subjetividade do prazo – deverá ser formulado com bom-senso, ou seja, com uma antecedência razoável para que o Presidente do órgão judicante possa tomar as medidas que entender necessárias sem prejuízo da sessão de julgamento.
O CBJD ainda permite que toda pessoa possa servir como testemunha, exceto o incapaz, o impedido ou o suspeito, sendo certo que o incapaz, excepcionalmente, poderá ser ouvido quando o interesse do desporto exigir, sem, contudo, prestar compromisso.
O Código limita a três o número de testemunhas por parte, não podendo exceder a nove, se houver mais de três interessados na lide.
A produção de prova testemunhal deverá ser requerida até o início da sessão de julgamento, assim como a das provas audiovisuais, onde se inclui a cinematográfica.
Há ainda a possibilidade de produção de prova pericial, consistente em exame e vistoria, nos termos dos artigos 68 e 69 do CBJD, a qual, contudo, deverá ser indeferida de plano pelo Presidente do órgão judicante quando: “I – o fato não depender do conhecimento especial de técnico; II – for desnecessária em vista de outras provas produzidas ou passíveis de produção; III – for impraticável; IV – for requerida com fins meramente protelatórios”.
Por fim, o artigo 70 do CBJD prevê a prova de Inspeção, cabendo ao relator promover a sua realização, de ofício, a requerimento da Procuradoria ou da parte interessada, a fim de buscar esclarecimento sobre fato que interesse à decisão da causa, sendo-lhe facultado requerer auxílio de outros auditores. Após a conclusão da inspeção, o relator mandará lavrar auto circunstanciado mencionando tudo quanto for útil ao julgamento da causa.
Como se vê, a produção de provas é de extrema relevância na busca pela verdade dos fatos em prestígio ao princípio constitucional do contraditório, na medida em que sem ela o auditor fica adstrito a julgar, apenas, com base no conteúdo da súmula, o que por vezes, resultará em um julgamento sem justiça.