Resumo: A violência doméstica contra a mulher traduz male histórico que decorre de deplorável situação de domínio. Sabe-se da desigualdade histórica que a mulher vem sofrendo em relação ao homem. Nesse sentido, o desiderato deste ensaio consiste no enfrentamento das discussões mais palpitantes acerca da Lei de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher. Para tanto, procede-se à análise de decisão emanada do Supremo Tribunal Federal nos autos da Ação Direta de Inconstitucionalidade 4.424/DF, além do decisum proferido pela Corte Constitucional nos autos da Ação Declaratória de Constitucionalidade 19/DF, investiga-se os argumentos pró e contra a constitucionalidade da Lei Maria da Penha, e avaliam-se os posicionamentos concernentes à natureza da ação penal no crime de lesão corporal praticado com violência doméstica e familiar contra a mulher, para ao final serem atingidos alguns acabamentos no que tange ao assunto.
Palavras-chave: Direito Processual Penal. Direito Penal. Violência Doméstica e Familiar.
Abstract: Domestic violence against women reflects historical problem that runs from appalling domain. We know the historical inequality that the woman has suffered in relation to man. In this sense, the wish of this article is to face the most stimulating discussions about the Domestic Violence against Women Law. To do so, it proceeds to the analysis of decision issued by the Supreme Court in the case of the Direct Action of Unconstitutionality 4.424/DF, beyond decisum delivered by the Constitutional Court the record of the Declaratory Action of Constitutionality 19/DF, investigates the pros and against the constitutionality of the Maria da Penha Law, and evaluates the positions concerning the nature of the crime of criminal injury committed with domestic violence against women, and achieves some finishes with respect to the subject.
Keywords: Criminal Procedural Law. Criminal Law. Familiar and Domestic Violence.
Resumen: La violencia doméstica contra las mujeres refleja la historia de hombres que se ejecuta desde el dominio atroz. Sabemos que la desigualdad histórica que la mujer ha sufrido en relación con el hombre. En este sentido, el deseo de este artículo es hacer frente a los debates más interesantes sobre la Ley de la violencia doméstica contra la mujer. Para ello, procede al análisis de la decisión emitida por la Corte Suprema en el caso de la acción directa de inconstitucionalidad 4.424/DF, más allá de decisum dictada por el Tribunal Constitucional el expediente de la acción declarativa de Constitucionalidad 19/DF, investiga los pros y en contra de la constitucionalidad de la Ley Maria da Penha, y evalúa las posiciones sobre la naturaleza del delito de lesiones cometido con violencia doméstica contra las mujeres, hasta el final algunos acabados se logran con respecto al tema.
Palabras clave: Derecho Procesal Penal. Derecho Penal. Violencia Doméstica y Familiar.
Sumário: 1. Linhas iniciais – 2. Julgados paradigmáticos – 3. Constitucionalidade da Lei Maria da Penha – 4. Ação penal da lesão corporal praticada com violência doméstica e familiar contra a mulher – 5. Escorço final
1. Linhas iniciais
O desiderato deste ensaio consiste no enfrentamento da discussão acerca da constitucionalidade da Lei de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, conhecida popularmente como Lei Maria da Penha, bem como analisar a natureza da ação penal de lesão corporal praticada nesse contexto.
Para tanto, proceder-se-á à análise de decisão emanada do Supremo Tribunal Federal em 09/02/2012, nos autos da Ação Direta de Inconstitucionalidade 4.424/DF, relatada pelo Ministo Marco Aurélio, além do decisum proferido pela Corte Constitucional na mesma data e relatado pelo mesmo julgador, nos autos da Ação Declaratória de Constitucionalidade 19/DF.
A fim de cumprir esse mister, será realizada análise dos acórdãos paradigmáticos, (a) investigando os argumentos pró e contra em torno da constitucionalidade da Lei Maria da Penha, (b) avaliando os posicionamentos concernentes à natureza da ação penal no crime de lesão corporal praticado com violência doméstica e familiar contra a mulher, para ao final (c) atingir alguns acabamentos no que tange ao assunto.
2. Julgados paradigmáticos
Os julgados a serem dissecados nesse trabalho consistem na decisão emanada do Supremo Tribunal Federal em 09/02/2012, nos autos da Ação Direta de Inconstitucionalidade 4424/DF, relatada pelo Ministro Marco Aurélio, e no julgamento proferido pela Corte Constitucional na mesma data, nos autos da Ação Declaratória de Constitucionalidade 19/DF, relatado pelo mesmo julgador.
3. Constitucionalidade da Lei Maria da Penha
Estabelece o artigo 1º da Lei de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher:
“Art. 1º. Esta Lei cria mecanismos para coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do § 8º do art. 226 da Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Violência contra a Mulher, da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher e de outros tratados internacionais ratificados pela República Federativa do Brasil; dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; e estabelece medidas de assistência e proteção às mulheres em situação de violência doméstica e familiar.”
A Lei Maria da Penha inaugurou uma fase de ações afirmativas em favor da mulher na sociedade brasileira. A Lei de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher traduz mecanismo especial de proteção conferida pela Constituição à pessoa do sexo feminino.
Não se trata de blindagem desarrazoada. A referida norma está em consonância com a proteção que cabe ao Estado dar a cada membro da família, segundo dicção da Constituição Federal:
“Art. 226.
§ 5.º. Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher.
§ 8.º. O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações.”
Ademais, na seara internacional, a Lei se encontra em perfeita harmonia com a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher (Convenção de Belém do Pará (Decreto 1.973/96), e com a Convenção sobre a Eliminação de todas as formas de Discriminação contra a Mulher (Decreto 4.377/02).
Em que pese essas óbvias considerações, há quem considere a Lei Maria da Penha inconstitucional. Segundo parcela dos juristas, a Lei promove a discriminação entre homem e mulher ao proteger apenas as mulheres em detrimento dos homens.
Contudo, a norma deve ser interpretada generosamente para robustecer os comandos constitucionais – a lei possui feição simbólica, e por essa razão não admite amesquinhamento.
Nessa esteira, não há dúvidas que a referida lei protege somente a mulher. O homem até pode ser vítima de violência doméstica e familiar, contudo apenas a mulher recebe uma proteção diferenciada – a pessoa do sexo masculino é tutelada penas normas gerais do Código Penal.
Isso porque, em que pese o homem também poder ser vítima da violência doméstica, essa agressão não decorre de razões de ordem social e cultural. Por tal motivo, não se fazem necessárias discriminações positivas ao gênero masculino, pois a razão de ser das medidas compensatórias consiste em remediar desvantagens históricas de um passado discriminatório, o que não ocorre no caso da pessoa do sexo masculino.
As ações afirmativas são medidas especiais que têm por objetivo assegurar progresso adequado de certos grupos raciais, sociais ou étnicos ou de indivíduos que necessitem de proteção e que possam ser necessárias e úteis para proporcionar a tais grupos ou indivíduos igual gozo ou exercício de direitos humanos e liberdades fundamentais. Logo, percebe-se que a edição da lei protetiva consubstancia-se em verdadeira ação afirmativa (discriminação positiva) em favor da mulher.
Não há dúvidas sobre o histórico de discriminação enfrentado pela mulher na seara afetiva. As agressões sofridas são significativamente maiores do que as que acontecem contra homens em situação similar. A violência perpetrada no lar raramente atinge o marido e, quando isso acontece, é de diminuta consequência. Seus destinatários preferenciais são mulher, filhos e idosos.
Nessa esteira, o próprio princípio da igualdade contém uma proibição de discriminar e impõe ao legislador a proteção da pessoa mais frágil no quadro social. Outrossim, não há inconstitucionalidade em legislação que fornece especial proteção à mulher, assim como não há qualquer problema constitucional na tutela especial do menor e do idoso. Em relação a essas duas últimas categorias, os diplomas legais protetivos já existem no ordenamento jurídico há algum tempo, e sobre eles não se criou toda essa celeuma (Estatuto da Criança e do Adolescente – Lei 8.069/90 – e Estatuto do Idoso – Lei 10.741/03, respectivamente).
A condição hipossuficiente da mulher no contexto familiar é fruto da cultura patriarcal, que facilita sua vitimização em situações de violência doméstica. Nesse panorama, torna-se necessária a intervenção do Estado em seu favor, de maneira a proporcionar os meios para o reequilíbrio das relações imanentes ao âmbito familiar.
Ao criar tais mecanismos especiais de proteção, tomando como base o gênero da vítima, o legislador utilizou o meio adequado e necessário para coibir e prevenir a violência doméstica contra a mulher. Não se afigura desproporcional ou ilegítimo a utilização do sexo como critério de diferenciação, visto que a mulher se encontra em posição eminentemente vulnerável no tocante a constrangimentos físicos e morais.
Ademais, a norma em exame nada mais é do que o corolário da incidência do princípio da proibição de proteção insuficiente dos direitos fundamentais.
A norma protetiva coaduna-se com o princípio da isonomia e atende à ordem jurídica, especialmente ao se levar em conta o necessário combate ao desprezo às famílias, considerada a mulher como sua célula básica.
O postulado constitucional da igualdade material (substancial ou real) preconiza que as desigualdades fáticas existentes entre as pessoas devem ser reduzidas por meio da promoção de políticas públicas e privadas. Destarte, ao se tratar desigualmente os desiguais, promove-se a igualdade material, em detrimento da igualdade formal.
Nessa esteira, a Lei Maria da Penha promove a igualdade em seu sentido material, sem restringir de maneira desarrazoada o direito das pessoas pertencentes ao gênero masculino.
Não é desnecessário sublinhar que reconhecer a condição hipossuficiente da mulher não implica invalidar sua capacidade de reger a própria vida. Trata-se, em verdade, de forma de garantir a intervenção estatal positiva, voltada à sua proteção e não à sua tutela.
4. Ação penal na lesão corporal praticada com violência doméstica e familiar contra a mulher
Questão igualmente polêmica no meio jurídico consiste na natureza jurídica da ação penal nos crimes de lesão corporal (art. 129 do Código Penal), delito que provavelmente representa o maior número de casos relacionados à violência doméstica e familiar contra a mulher.
Quanto à lesão corporal leve ou culposa, a regra geral é que se procede mediante representação, ou seja, a ação penal é pública condicionada, por força do artigo 88 da Lei 9.099/95:
“Art. 88. Além das hipóteses do Código Penal e da legislação especial, dependerá de representação a ação penal relativa aos crimes de lesões corporais leves e lesões culposas.”
Se não existisse esse dispositivo, a ação penal no crime de lesão corporal leve ou culposa seria pública incondicionada, considerando que o Código Penal não exige representação para este crime (art. 129 c/c art. 100, §1º do Código Penal).
Todavia, o artigo 41 da Lei 11.340/06 vedou expressamente a aplicação da Lei dos Juizados Especiais (Lei 9.099/95) aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher, o que impede a incidência do artigo 88, que atribui à ação penal no crime de lesão corporal leve ou culposa a natureza pública condicionada. Isso significa que à lesão corporal leve ou culposa aplica-se a regra geral que incide na lesão corporal grave ou gravíssima, qual seja, de ação penal pública incondicionada.
Há quem diga que a ação penal nesse delito permanece sendo pública condicionada, conclusão a que se chega pela interpretação do artigo 12 da Lei de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, que reza:
“Art. 12. Em todos os casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, feito o registro da ocorrência, deverá a autoridade policial adotar, de imediato, os seguintes procedimentos, sem prejuízo daqueles previstos no Código de Processo Penal:
I – ouvir a ofendida, lavrar o boletim ocorrência e tomar a representação a termo, se apresentada.”
Também auxilia esse entendimento a exegese do artigo 16 da Lei Maria da Penha, que preceitua:
“Art. 16. Nas ações penais públicas condicionadas à representação da ofendida de que trata esta Lei, só será admitida a renúncia à representação perante o juiz, em audiência especialmente designada com tal finalidade, antes do recebimento da denúncia e ouvido o Ministério Público.”
Interessante notar a impropriedade técnica do termo renúncia, porque se o direito de representação já foi exercido (tanto que foi oferecida a denúncia), não há falar-se em renúncia. Parece que o legislador quis referir-se à retratação da representação, que é possível mesmo após o oferecimento daquela condição específica de procedibilidade da ação penal.
Assim, se a Lei Maria da Penha estabelece uma audiência especial para a retratação da representação, demonstra que a ação penal na lesão corporal leve praticada com violência doméstica e familiar contra a mulher é pública condicionada, pois não faria sentido prever a possibilidade de retratação da representação se essa condição não fosse exigida.
Para essa corrente, o artigo 41 da Lei só veda medidas despenalizadoras que não integrem a vontade da mulher (como transação penal e suspensão condicional do processo). Dessa forma, verificada a agressão com lesão corporal leve ou culposa, pode a vítima, depois de acionada a autoridade pública, recuar e retratar-se em audiência especificamente designada com essa finalidade, desde que em momento anterior ao recebimento da denúncia. A justificativa para esse raciocínio é que se mostra importante que a mulher tenha poder de decidir se deseja instaurar ou não a persecução penal, por razões de política criminal e de proteção da família.
Destaque-se também o fato de que eventual existência de vício de vontade da mulher ofendida, ao proceder à retratação, não pode ser tida como regra. Ou seja, os casos em que a mulher se retrata da representação por pressão do marido ou companheiro configuram exceção, que não se mostra aptos a justificar a adoção de determinado posicionamento jurídico.
Ademais, persistir com um processo penal que a vítima não deseja levar adiante gera o risco de gerar movimentação inútil da máquina estatal, à medida que a mulher conciliada com seu agressor dificilmente irá colaborar com a instrução probatória em prejuízo do cônjuge ou companheiro, culminando em absolvição por insuficiência de provas.
Além do mais, posicionamento diverso contraria a tendência brasileira da admissão de um Direito Penal de Intervenção Mínima, subtraindo meios de restaurar a paz no lar. Público e incondicionado o procedimento policial e o processo criminal, seu prosseguimento, no caso de a ofendida desejar extinguir os males de certas situações familiares, só viria piorar o ambiente doméstico, impedindo reconciliações.
No entanto, segundo a visão da doutrina majoritária e do Supremo Tribunal Federal, essa visão não deve prosperar.
A violência doméstica contra a mulher decorre de deplorável situação de domínio, provocada, geralmente, pela dependência econômica da mulher. Sabe-se da desigualdade histórica que a mulher vem sofrendo em relação ao homem. Tanto que, até 1830, o Direito Penal Brasileiro chegava ao ponto de permitir ao marido matar a mulher quando a encontrasse em flagrante adultério. Entretanto, o sistema jurídico pátrio vem evoluindo e encontrou seu ápice na Constituição de 1988, ao assegurar em seu texto a igualdade entre homem e mulher.
Deve-se atribuir interpretação conforme a Constituição aos artigos. 12, I, 16 e 41 da Lei 11.340/06, com a finalidade de consagrar a natureza incondicionada da ação penal em caso de crime de lesão corporal praticado mediante violência doméstica e familiar contra a mulher.
Isso porque, se a ação penal fosse considerada condicionada, esta circunstância acabaria por esvaziar a proteção constitucional assegurada às mulheres.
Como se não bastasse, o projeto de lei que originou a norma previa representação, porém foi alterado, razão pela qual se entende que a vontade do legislador é que a ação penal permaneça pública incondicionada.
Além disso, a pena mínima do crime do artigo 129, §9º é superior a dois anos, não se encaixando no limite material da Lei 9.099/95, não havendo que se falar em ação penal pública condicionada.
Demais disso, é comum que mulheres, quando o crime dependa de representação, registrem ocorrência na delegacia, mas, posteriormente, reconciliadas com seus companheiros ou maridos, retratem da representação e impeçam a ação penal (Souza Nucci, 2008, p. 1138).
Assim, toda lesão corporal praticada contra mulher no âmbito das relações domésticas é crime de ação penal incondicionada, isto é, o Ministério Público pode dar início à ação penal sem necessidade de representação da vítima.
Na prática, isso significa que, se uma mulher sofrer lesões corporais no âmbito das relações domésticas e procurar a delegacia relatando o ocorrido, o delegado não deve fazer com que ela assine uma representação, uma vez que não existe mais essa condição de procedibilidade para tais casos. Bastará que a autoridade policial colha o depoimento da mulher e, com base nisso, havendo elementos indiciários, instaure o inquérito policial.
Como já exposto, em caso de lesão corporal leve ou culposa que a mulher for vítima, em violência doméstica, o procedimento de apuração na fase pré-processual é o inquérito policial, e não o termo circunstanciado.
É dizer, se a mulher que sofreu lesão corporal leve de seu cônjuge ou companheiro, arrependida e reconciliada, procura o delegado, o promotor ou o juiz afirmando o desejo de que o inquérito ou o processo não tenha prosseguimento, esta manifestação não terá efeito jurídico algum, devendo a tramitação continuar normalmente.
Se chegar a conhecimento da autoridade pública que qualquer mulher teve sua integridade física violada no âmbito doméstico e familiar, o Estado é obrigado a iniciar a persecução penal para apurar o fato, ainda que contra a vontade da mulher (manifestação de vontade que, nesse particular, passa a ser absolutamente irrelevante).
Da aplicação desse entendimento não se conclui que todos os crimes praticados contra a mulher, em sede de violência doméstica, são de ação penal incondicionada. Continuam existindo crimes que são de ação penal condicionada, como a ameaça.
Permitir à mulher decidir sobre o início da persecução penal significa desconsiderar a assimetria de poder decorrente de relações histórico-culturais, contribuindo para a diminuição de sua proteção e a prorrogando o quadro de violência e discriminação contra a pessoa do sexo feminino. Bem assim, implica relevar os graves impactos emocionais impostos à vítima, impedindo-a de romper com o estado de submissão.
5. Escorço final
Do exame dos juízos demonstrados, conclui-se que a Lei Maria da Penha está de acordo com a Constituição, tendo inaugurado uma fase de ações afirmativas em favor da mulher na sociedade brasileira. A Lei de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher traduz mecanismo especial de proteção conferida pela Constituição à pessoa do sexo feminino.
De outra banda, chega-se à conclusão que o delito de lesão corporal praticado com violência doméstica e familiar deve ser de ação penal pública incondicionada.
A Lei Maria da Penha possui fundamentação expressa de prevenir, punir e erradicar a violência contra a mulher, nos termos do artigo 3º, §2º da norma.
Nesse ínterim, não constitui exagero inferir que não cabe à mulher violentada definir se o agressor deve ou não ser punido, porquanto quase sempre há hierarquia entre vítima e autor do delito de violência doméstica. O problema de conduta não reside na mulher que apanha, senão no homem que bate.
Na esteira do raciocínio delineado, fica evidente que a decisão sobre a persecução penal do agente que espalha a violência no próprio lar consiste em tarefa do Estado, e não da fragilizada ofendida. Por esse motivo, Somente pela adoção desse entendimento é que se pode concretizar a efetiva punição do agressor doméstico pelo Estado, fazendo cessar o ciclo de dominação do homem sobre a mulher hipossuficiente.
Referências
Antonni, Rosmar, Távora, Nestor. Curso de Direito Processual Penal. Salvador: JusPodivm, 2009.
Pinto, Ronaldo Batista, Cunha, Rogério Sanches. Violência doméstica. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007.
Dias, Maria Berenice. A Lei Maria da Penha na Justiça. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007.
Mirabete, Júlio Fabbrini. Processo penal. São Paulo: Atlas, 2001.
Pacheco, Denilson Feitoza. Direito processual penal. Niterói: Impetus, 2006.
Roxin, Claus. Política criminal y sistema del derecho penal. Barcelona: Bosch, 1972.
Nucci, Guilherme Souza. Leis penais e processuais penais comentadas. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008.
Informações Sobre o Autor
Henrique Hoffmann Monteiro de Castro
Delegado da Polícia Civil do Mato Grosso. Professor do Centro de Estudos e Aperfeiçoamento Funcional do Ministério Público de Minas Gerais. Ex-Oficial da Polícia Militar de Santa Catarina. Ex-Analista do Ministério Público de Minas Gerais. Ex-Advogado. Especializando em Direito Penal e Processual Penal pela Universidade Gama Filho. Especialista em Segurança Pública pelas Faculdades Barddal. Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais