Contrato de experiência e a estabilidade acidentária

Resumo: Alguns doutrinadores e a jurisprudência nega a concessão da garantia de emprego aos trabalhadores acidentados na vigência do contrato de experiência. Todavia, é necessário reavaliar os entendimentos aplicados, o quanto antes, pois não está em consonância aos ditames constitucionais que proclamam a redução dos riscos inerentes ao trabalho, bem como a garantia da saúde, da higiene laboral, e por fim, a dignidade da pessoa humana.


Sumário: Introdução – 1 Contrato de Trabalho; 2 Contrato de Experiência; 3 Estabilidade Provisória; 4 Estabilidade Acidentária no contrato de experiência; 5 Considerações finais; Referências.


Introdução


O presente trabalho aborda a possibilidade da estabilidade acidentária no contrato de experiência, no sentido de fazer uma reflexão sobre tal tema, o qual tem grande relevância na sociedade brasileira.


O contrato de experiência é um tipo de contrato com prazo determinado, no qual o contratado sabe o dia do inicio e fim da prestação do serviço, ao menos que, seja contratado por prazo indeterminado ou tal contrato ultrapasse os 90 dias previstos em lei.


O contrato de experiência tem a finalidade do empregador verificar, testar, avaliar o novo contratado no sentido de contratá-lo, caso aprovado, por prazo indeterminado.


Acontece que, o empregado seja contratado por prazo indeterminado ou experiência está sob os riscos do acidente de trabalho desde o 1º dia de trabalho, de maneira que, é plenamente cabível a estabilidade provisória também aos contratados pelo prazo de experiência, afinal o risco do negócio não deve recair sobre o obreiro.


O direito do trabalho tem o papel de proteger o trabalhador frente às arbitrariedades, abuso do poder, violação dos direitos e garantias, realizados pelos empregadores, pois é incontestável que o empregado acaba sofrendo danos irreparáveis em razão dessa falta de estabilidade expressa em lei.


Alguns doutrinadores e a jurisprudência nega a concessão da garantia de emprego aos trabalhadores acidentados na vigência do contrato de experiência.
Todavia, é necessário reavaliar os entendimentos aplicados, o quanto antes, pois não está em consonância aos ditames constitucionais que proclamam a redução dos riscos inerentes ao trabalho, bem como a garantia da saúde, da higiene laboral, e por fim, a dignidade da pessoa humana.


Insta, destacar que, o objetivo deste trabalho não é exaurir a discussão acerca dos argumentos do cabimento ou não da estabilidade acidentária no contrato de experiência, mas sim, dar a oportunidade aos operadores do Direito realizar um estudo aprofundado sobre tal tema.


1. Contrato de Trabalho


O Art. 442 da CLT preceitua apenas que o contrato individual de trabalho é um pacto expresso ou tácito, que visa regular, gerir a relação de emprego. Alguns doutrinadores criticam a denominação contrato individual de trabalho, tendo em vista a possibilidade de existir o contrato plúrimo, como ocorre com o contrato de equipe.


Na argentina, a Lei nº 20.744 de 1974, estabelece que o contrato de trabalho fica configurado sempre que uma pessoa física fique obrigada a realizar atos, prestar serviços em favor da outra e sob a dependência desta, durante certo período mediante remuneração.


A Consolidação das Leis Trabalhista ora usa a expressão relação de emprego ora emprega o termo relação de trabalho, nesse sentido, pontua-se que, a relação de trabalho é gênero e a relação de emprego espécie.


O contrato de trabalho envolve qualquer prestação de serviço seja como autônomo, eventual, avulso, dentre outras. Já a relação de emprego consiste na relação de empregado e empregador, tendo como requisitos: continuidade, subordinação, onerosidade, pessoalidade e alteridade.


Octavio Magano[1] conceitua a relação de emprego como:


“O negocio jurídico pelo qual uma pessoa física se obriga, mediante remuneração, a prestar serviços, não eventuais, a outra pessoa ou entidade, sob a direção de qualquer das ultimas”.


A ilustre professora Alice Monteiro de Barros[2] entende que:


“O contrato de trabalho é o acordo expresso (escrito ou verbal) ou tácito firmado entre uma pessoa física (empregado) e outra pessoa física, jurídica ou entidade (empregador), por meio do qual o primeiro se compromete a executar, pessoalmente, em favor do segundo um serviço de natureza não-eventual, mediante salário e subordinação jurídica. Sua nota típica é a subordinação jurídica. É ela que irá distinguir o contrato de trabalho dos contratos que lhe são afins e, evidentemente, o contrato subordinado do trabalho autônomo.”


O contrato de trabalho visa regular a prestação do serviço de uma pessoa física a uma pessoa jurídica ou física, não eventual, remunerada, subordinada, personalíssima, e sem risco do negócio ao empregado.


A continuidade da prestação do serviço significa que o serviço não será eventual, é de trato sucessivo, de execução continuada, que não se finda com a realização de um único ato. A subordinação é o poder que o empregador possui em face do obreiro, de modo que, exerce suas atividades com autonomia, tem a capacidade diretiva de controlar a empresa. A onerosidade é a obrigação que o empregador tem de remunerar o serviço prestado pelo empregado e a alteridade é o risco do negócio assumido pelo empregador que não deve recair sobre o obreiro, de maneira que, o empregado não participa dos prejuízos da empresa. E por fim, a pessoalidade que é obrigação do serviço prestado ser intuiti personae, tendo pessoa certa e determinada, não podendo fazer-se substituir por outra.


O Código Civil Pátrio, no Art. 104, tem como requisitos para validar o negócio jurídico a capacidade do agente, licitude do objeto e o consentimento das partes, ficando proibido o trabalho do menor de 16 anos, salvo na condição de aprendiz, desde que tenha completado 14 anos, além de haver normas que lhe protegem prevista na CLT e Estatuto da Criança e Adolescente.


Como dito linhas acima, o contrato terá validade apenas se o objeto for lícito, em conformidade com a lei, ordem pública e bons costumes, de maneira que, a atividade ilícita configura um delito.


Contudo, a jurisprudência não é pacifica em relação aos efeitos resultantes da prestação de serviço em atividade ilícita, a posição mais acertada, em minha opinião, entende que o contrato de trabalho só será nulo, caso o trabalhador tenha consciência da ilicitude da prestação do serviço.


E por fim, como requisito da validade do contrato, é o consentimento, o qual, é fator primordial para qualquer pacto, tendo em vista que as partes precisam ter seu livre arbítrio, evitando assim, qualquer tipo de vício como: erro, dolo, coação, simulação ou fraude.


2. Contrato de Experiência


O contrato de trabalho tem como regra ser por prazo indeterminado, em virtude do princípio da continuidade. O contrato por prazo determinado contém o termo prefixado ou da execução do serviço ou realização do acontecimento já prevista, conforme prevê o Art. 443, § 1º da CLT.


Nesse ínterim, a Consolidação das Leis Trabalhista estabelece, expressamente, no Art. 443, § 2º, as hipóteses de contratação por prazo determinado, quais sejam, serviço transitório que justifique a predeterminação do prazo; atividades empresariais transitória; contrato de experiência, sob pena de torna-se contrato indeterminado, caso não cumpra o prazo estabelecido.  


O serviço de natureza transitória consiste em algo efêmero, breve, temporário, de acordo as necessidades da prestação de serviço por parte do empregador, pois é o serviço que é transitório e não a atividade empresarial.


Já as atividades empresariais, constante no Art. 443, §2º, “b” da CLT, trata-se da transitoriedade da empresa, tendo em vista a existência de empresas que devido a época do ano, por exemplo, precisa aumentar sua produção ou que temporariamente explora algo diverso do normal.  Ou seja, a atividade empresarial é transitória.


O contrato de experiência é uns dos tipos de contrato por prazo determinado que seu termo é ajustado na contratação, no qual tem o objetivo de verificar e avaliar o novo empregado para que possa ter certeza da capacidade, aptidão, competência, comportamento e possa contratá-lo por prazo indeterminado.


Alguns doutrinadores divergem no sentido de tal contrato de experiência ser cabível apenas para prestação de trabalho qualificado, sendo inadmissível em relação ao trabalhador físico. Tal entendimento não é adotado pelo TST, pois a Corte entende que o período de experiência serve não apenas para aferir a qualificação técnica, mas também uma avaliação subjetiva a respeito do comportamento, entrosamento, requisitos tão importante nos dias atuais.


Os doutrinadores não são unânimes na definição da natureza jurídica do contrato de experiência, pois uns entendem que trata-se de um contrato preliminar, no qual o contrato indeterminado será realizado, caso o empregador fique satisfeito com o empregado. Entretanto, salienta-se que, o contrato de experiência trata-se de uma avaliação subjetiva e objetiva por parte do empregador, e o contrato preliminar consiste num contrato definitivo ficando pendente de algumas pontuações, o que não é o caso.


Outros entendem que, é um contrato pendente de condição resolutiva, na possibilidade do empregado não atender aos requisitos do empregador. Alguns afirmam que o contrato de experiência está inserido no contrato indeterminado como uma cláusula acidental, logo fica subordinada a uma condição suspensiva. E por fim, ilustres doutrinadores como Alice Monteiro de Barros, considera que o contrato de experiência é um contrato especial, tendo em vista ser uma das exceções do contrato de trabalho prevista no Art. 443, § 2º, da CLT. 


O contrato de experiência não poderá exceder 90 dias sob pena de tornar-se contrato por prazo indeterminado. Em regra, o contrato de trabalho não requer uma formalidade, podendo ser expresso ou tácito, de sorte que, o único contrato que o legislador exigiu, obrigatoriamente, a existência de contrato escrito foi na existência de contrato temporário.


Na Consolidação das Leis Trabalhista não exclui o empregador de anotar a CTPS do empregado no prazo de 48 horas, mesmo o obreiro estando em contrato de experiência. Pontua-se que, o fato do empregador não fazer a devida anotação na CTPS do empregado não tem o condão de tornar o contrato de experiência nulo, transformando-o em prazo indeterminado. Apenas tal omissão gera uma penalidade de ordem administrativa, conforme estabelece o Art. 29 da CLT.


Todavia, alguns doutrinadores entendem que a anotação na CTPS do empregado é condição para validade do contrato de experiência, apesar de não existir norma legal que exija tal formalidade.


O contrato de experiência permite a prorrogação somente por uma vez, é claro, antes de expirar e não ultrapassar o prazo de 90 dias, consoante Art. 451 CLT e Súmula 188 TST. Ademais, o TST tem o posicionamento de permitir a prorrogação tácita do contrato, tendo em vista uma parte da jurisprudência e doutrina considerar que uma cláusula que permita a prorrogação automática do contrato é prejudicial ao empregado, haja vista a insegurança.


Ademais, destaca-se que, o contrato de experiência só poderá ser renovado desde que seja para nova função, além da vedação de um contrato temporário transformar-se em um contrato por experiência, tendo em vista que o empregador já examinou o empregado tanto objetivamente quanto subjetivamente, de modo que, o contrato de experiência perde objeto.


3. Estabilidade Provisória


A estabilidade do emprego é instituto do direito do trabalho que tem a capacidade de proteger o empregado no sentido de limitar o poder de despedida do empregador, apesar de haver exceções como: justa causa, motivo de força maior, entre outras.


A estabilidade pode está prevista na legislação trabalhista, norma coletiva, regulamento da empresa, sendo um direito do empregado permanecer na empresa prestando seus serviços mesmo que o empregador não tenha mais interesse no seu trabalho.


Como citado acima, há varias formas de estabilidade, podendo ser: legal, contratual, prevista em convenção ou acordo coletivo, regulamento da empresa.


A estabilidade legal pode ser decenária que era aquela concedida a determinados empregados com mais de 10 anos de serviço junto ao mesmo empregador e que não manifestassem a opção pelo regime do FGTS. E a provisória que é a garantia do emprego aos empregados, em caráter temporário, em virtude de alguma circunstância, como: ao empregado dirigente sindical, empregada urbana, rural, avulsa e doméstica no ciclo gravídico, empregado eleito para o cargo de direção das CIPA, empregado acidentado, dirigentes de cooperativas de empregados, empregados membros da CCP, empregados membro do conselho curador do FGTS, empregado representante no Conselho Nacional da Previdência Social.


O presente trabalho não tem o objetivo de discorrer sobre todas as possibilidades da estabilidade provisória, e sim, apenas sobre a estabilidade do empregado acidentado.


A lei de nº 8.213 de 1991 estabeleceu a garantia ao empregado acidentado após a cessação do auxilio doença acidentário pelo prazo de 12 meses após a alta da pericia desde que o afastamento tenha sido superior a 15 dias, percebido o auxilio doença acidentário, salvo se constatar após a despedida, doença profissional que guarde relação de causalidade com a execução do contrato de emprego, conforme previsto na Súmula nº 378, inciso II, do TST.


A lei citada tem o objetivo de proteger o empregado, pois há resistência do empregador após o retorno da alta médica do empregado acidentado para exercer suas funções anteriores, as quais, dependendo do acidente de trabalho, incapacita-o, devendo então, haver a reabilitação do funcionário.


A estabilidade do empregado acidentado tem o cunho de proporcionar o trabalhador uma segurança na preservação do seu trabalho


4. Estabilidade acidentária no contrato de experiência.


Até o advento da Lei 9.601 de 1998, a jurisprudência dominante entendia existir incompatibilidade entre o contrato determinado e a estabilidade provisória. No art. 1º, § 4 da citada lei prevê a estabilidade provisória a todos aqueles estabelecidos na CLT além do empregado acidentado durante o contrato de prazo determinado.


Entretanto, alguns doutrinadores entendem não ser cabível a estabilidade provisória nos contratos de termo determinado, tendo em vista que o empregado desde a contratação tem ciência do término do pacto.


Nessa linha, segue o entendimento de Alice Monteiro de Barros[3]:


“… a garantia de emprego não poderia ser levada ao extremo de assegurar ao empregado uma prorrogação do contrato a termo, sobrepondo-se ao limite do contrato estabelecido de boa-fé.”


Sergio Pinto Martins[4] considera que:


“No contrato de prazo determinado ou de experiência não há direito à garantia de emprego prevista no art. 118 da Lei nº 8.213/91, pois as partes conhecem antecipadamente a data do término do contrato, e não há despedida arbitrária ou sem justa causa, mas o fim normal do pacto laboral.”


Em contraposição, aos argumentos dos ilustres doutrinadores, pontua-se que, o contrato de experiência tem a finalidade do empregador avaliar os requisitos objetivos e subjetivos do empregado para a função, contudo, desde o inicio do trabalho o obreiro está passível de sofrer um acidente de trabalho.


O Artigo 118 da Lei nº 8.213/91 estabelece apenas que havendo acidente de trabalho e o trabalhador fique afastado do trabalho por mais de 15 dias, já faz jus ao recebimento do auxilio doença acidentário, e por consequência, a estabilidade provisória.


Salienta-se que, a citada lei não faz qualquer ressalva referente ao contrato por prazo determinado, tendo em vista que o fato do obreiro está trabalhando mediante contrato a termo ou por prazo indeterminado, de nada modifica a situação, pois é certo que a readaptação e reinserção no mercado de trabalho subsistirão de qualquer forma.


A vedação à estabilidade provisória nos contratos de experiência viola todas as garantias constitucionais que visam preservar a saúde e a segurança do trabalhador, haja vista a dificuldade do retorno do empregado acidentado no mercado de trabalho.


Salienta-se que, que o Artigo 7º, XXII, da Constituição Federal prevê aos trabalhadores a redução dos riscos inerentes ao trabalho por meio de normas de saúde, higiene e segurança. Neste sentido, fica patente e evidente a preocupação do legislador no tocante a proteção ao trabalhador na Carta Magna de 1988, garantindo direitos sociais mínimos, normas que reduzam os riscos de acidentes de trabalho e doenças ocupacionais.


Portanto, o risco do negócio não deve recair sobre o empregado acidentado, afinal o obreiro afastou-se do trabalho em decorrência do acidente de trabalho devendo o ônus e risco ser invertido ao empregador.


Logo, é desrazoável negar ao obreiro acidentado o direito de permanência no emprego após a cessação do benefício previdenciário tão somente pelo fato do pacto avençado ter sido firmado com termo final definido. 


 Deste modo, independentemente da modalidade contratual, o acidente de trabalho, normalmente, deixa sequelas que acabam dificultando a reinserção no mercado de trabalho, mesmo sendo considerado apto pela Previdência Social, que diga-se de passagem, comete inúmeras injustiças e excrescências médicas, principalmente, com a alta programada do paciente sem a pericia.


Nesse maré, é fundamental para a dignidade da pessoa humana o cabimento da estabilidade acidentária nos contratos de experiência, como forma evidente de garantir ao trabalhador acidentado a tutela constitucional à saúde, direitos sociais.


Afinal, a não concessão da estabilidade acidentaria pune o trabalhador duas vezes, pois além de ficar incapacitado para realizar suas atividades não faz jus à garantia do emprego, o que é um absurdo.


Nessa compasso, segue alguns julgados do Tribunal Regional do Trabalho da 5º Região e do Tribunal Superior do Trabalho que garante a estabilidade provisória nos contratos de experiência: 


“ACIDENTE DE TRABALHO NO CURSO DO CONTRATO DE EXPERIÊNCIA. ESTABILIDADE. CABIMENTO. Na interpretação das leis há de se observar que a norma especial prevalece sobre a geral. Destarte, o artigo 476 da Consolidação das Leis do Trabalho e o artigo 63 da Lei nº 8.213/91 constituem normas especiais de caráter tutelar e devem prevalecer sobre a regra geral consagrado no art. 472, § 2º da CLT. Em verdade, embora o contrato de experiência seja em regra contratoà termo, o seu objetivo maior é permitir o conhecimento mútuo dos contratantes com o objetivo de continuidade da relação labora. Assim, a ocorrência de acidente do trabalho no curso do contrato de experiência obsta que empregado e empregador desfrutem deste período de conhecimento e adequação necessário para se estabelecer, ou não, um contrato de trabalho duradouro por tempo indeterminado. Não existe, por conseguinte, incompatibilidade entre o contrato de experiência e a estabilidade acidentária.” (TRT, 2º Turma, RO: 00674-2008-102-05-00-3,Desembargadora: Dra. Luiza Lomba)

“ACIDENTE DE TRABALHO. PERÍODO DE EXPERIÊNCIA. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. SUSPENSÃO CONTRATUAL. ESTABILIDADE PROVISÓRIA NO EMPREGO. ARTIGO 118 DA LEI Nº 8.213/91. COMPATIBILIDADE COM O CONTRATO DE TRABALHO TEMPORÁRIO DE EXPERIÊNCIA. PACTO CELEBRADO COM ÂNIMO DE CONTINUIDADE. Discute-se a possibilidade de se aplicar a estabilidadeprovisória prevista no artigo 118 da Lei nº 8.213/91 a empregado submetido a contrato de trabalho temporário de experiência. No caso sob exame, o contrato encontrava-se em vigor quando ocorreu o infortúnio evento imprevisível e capaz de impedir que o contrato alcançasse o termo final predeterminado pelas partes. O artigo 472, § 2º, da Consolidação das Leis do Trabalho deve ser interpretado de forma sistemática, em consonância com outras normas de caráter tutelar consagradas no ordenamento jurídico pátrio, entre elas o artigo 476 da Consolidação das Leis do Trabalho e o artigo 63 da Lei nº 8.213/91. Tais dispositivos consagram proteção especial ao trabalhador acidentado, devendo prevalecer sobre outras normas, de caráter genérico, como o artigo 472, § 2º, da CLT, cuja aplicabilidade restringe-se aos períodos de afastamento não resultantes de acidente de trabalho. De se notar, entretanto, que a estabilidade acidentária é compatível com o contrato a termo somente quando este for celebrado a título de experiência, porquanto, neste caso, presente o ânimo de continuidade da relação de emprego. Conquanto não se possa antecipar se a experiência será exitosa ou não, o incidente ocorrido no curso desse contrato a termo frustra totalmente a possibilidade de permanência do trabalhador no emprego após o período de experiência. Ora, o ânimo de permanência no emprego, que resulta da celebração do contrato de experiência, é o elemento que distingue esta modalidade de contrato a termo das demais hipóteses para efeito de incidência da norma garantidora da estabilidade acidentária. Assim, o acidente de trabalho ocorrido por culpa do empregador, que detém o encargo de estabelecer mecanismos tendentes a evitar infortúnios no ambiente laboral – cumprindo as normas de saúde, segurança e higiene -, bem como a responsabilidade social do detentor dos meios de produção pelos riscos do empreendimento inferida da exegese do artigo 170, inciso III, da Carta Política -, coloca sob ônus do empregador a manutenção do vínculo empregatício enquanto o obreiro estiver em período de incapacidade ou redução da capacidade laborativa que, de acordo com a norma preconizada no artigo 118 da Lei nº 8.213/91, tem a duração de um ano. Não se olvide, ainda, que o juiz aplicará a lei ate n dendo aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum (artigo 5º da Lei de Introdução ao Código Civil). Ao aplicador da lei, portanto, cabe lançar mão do método teleológico, para encontrar o sentido da norma que realize os fins sociais por ela objetivados. Assim, não se realizará os fins sociais da lei de proteção ao trabalhador se este, vítima de acidente laboral, for lançado ao mercado de trabalho. A dificuldade de colocação desse trabalhador no mercado de trabalho afeta o ideal de realização de justiça social e atenta contra o princípio da dignidade da pessoa humana consagrado no artigo 1º, III, da Constituição da República. Recurso de revista conhecido e provido.” (TST,RR – 1762/2003-027-12-00.8, 1ª Turma, Relator Ministro: Lelio Bentes Corrêa, DJ 04/04/2008.)

“RECURSO DE REVISTA. CONTRATO POR PRAZO DETERMINADO. ACIDENTE DE TRABALHO. GARANTIA PROVISÓRIA NO EMPREGO. 1 – Há direito à garantia provisória no emprego, na hipótese de contrato por prazo determinado, ante o acidente de trabalho, nos termos do art. 118 da Lei nº 8.213/91. 2 – A força normativa da Constituição Federal, que atribui especial destaque às normas de saúde e segurança do trabalhador (art. 7º, XXII e XXVIII), impõe a interpretação sistemática da legislação infraconstitucional que trata da matéria,reconhecendo a compatibilidade entre o contrato por prazo determinado e a garantia provisória no emprego. 3 – O art. 118 da Lei nº 8.213/91 é aplicável, porque o afastamento relacionado ao acidente de trabalho integra a essência sócio-jurídica da relação laboral. 4 – O contrato por prazo determinado não se transforma em contrato por prazo indeterminado, sendo direito do trabalhador somente a garantia provisória no emprego pelo prazo de um ano, contado da data do término do benefício previdenciário. 5 – Recurso de revista a que se nega provimento.” (TST, RR- 162100-35.2006.5.12.0032,5ª Turma, Relatora Ministra: Kátia Magalhães Arruda, DJ 25/02/2011)

“RECURSO DE REVISTA. CONTRATO DE EXPERIÊNCIA. ACIDENTE DE TRABALHO. ESTABILIDADE PROVISÓRIA. Tratando-se de acidente de trabalho ocorrido na vigência de contrato de experiência, existe garantia de estabilidade no emprego, conforme previsto no artigo 118 da Lei nº 8.213/91, pois, por força do disposto no artigo 7º, XXII, da CF, que transfere ao empregador a obrigação de adotar medidas que visem à saúde, higiene e segurança do trabalhador, torna-se imperioso uma interpretação mais flexível das normas infraconstitucionais que tratam da matéria, para reconhecer a compatibilidade entre o contrato de experiência e a garantia provisória no emprego decorrente de acidente de trabalho. Ressalva do Relator. Recurso de revista conhecido e desprovido.” (TST, RR 112500-47.2009.5.09.0089, 6º Turma, Relator Ministro: Aloysio Corrêa da Veiga, DJ 11/02/2011)

É uma violação constitucional não garantir a estabilidade acidentária ao empregado mesmo ele estando em contrato de experiência, afinal o empregado em experiência realiza as mesmas atividades dos empregados em contrato indeterminado,
corre os mesmos riscos de acidente de trabalho, além do contrato de experiência existir um ânimo de continuidade da relação de emprego.


Ademais, é inaceitável existir uma lei trabalhista que proíba tal direito ao trabalhador, tendo em vista todas as dificuldades enfrentadas pelos empregados no Brasil, somado ainda, a reintegração ao mercado de trabalho após um acidente, desemprego, entre outros.


Conceder a estabilidade no contrato de experiência não tem a capacidade de modificar a natureza e objetivo de tal contrato, tem apenas o papel de proporcionar o trabalhador garantias essências a sua sobrevivência, pois não visa transformar o contrato em prazo indeterminado, mas tão somente readaptá-lo, se for o caso, e reinserir no mercado de trabalho.


5. Considerações Finais


O contrato de experiência é um contrato por prazo determinado, no qual a legislação não garante a estabilidade acidentária, tendo em vista que tal contrato tem seu termo final definido desde a contratação.


Contudo, haja vista o empregado está sob o risco do acidente de trabalho desde o inicio da prestação dos serviços, não importando a modalidade contratual do emprego, e com a finalidade de proteger o trabalhador, afinal é a parte menos favorecida do contrato, a doutrina e jurisprudência moderna vem entendendo ser cabível a estabilidade acidentária nos contratos de experiência, pois o risco do negócio deve recair sobre o empregador.


Afinal, o legislador na Constituição Federal de 1988 teve grande preocupação nos quesitos referentes às garantias e direitos dos trabalhadores, no sentido de editar normas com o objetivo de reduzir os riscos inerentes ao trabalho.


A Lei de nº 8.213 de 1991 estabeleceu a garantia ao empregado acidentado após a cessação do auxilio doença acidentário pelo prazo de 12 meses após a alta da pericia desde que o afastamento tenha sido superior a 15 dias, percebido o auxilio doença acidentário, salvo se constatar após a despedida, doença profissional que guarde relação de causalidade com a execução do contrato de emprego, conforme previsto na Súmula nº 378, inciso II, do TST, de maneira que, não veda tal estabilidade aos contratos determinados.


Sendo assim, é cabível a estabilidade provisória ao empregado acidentado no contrato de experiência no sentido do obreiro após a alta médica permanecer no mercado de trabalho e readaptar-se as dificuldades, caso seja reduzida sua capacidade laborativa. 


Diante dos argumentos, ora expostos, concluímos pelo cabimento da estabilidade provisória nos contratos de experiência, tendo em vista uma interpretação constitucional e infraconstitucional, bem como uma análise social das dificuldades apresentados pelo empregado acidentado.


 


Referências

BRASIL. Lei nº5.452, de 1 de maio de 1943. Aprova a Consolidação das Leis do Trabalho.

BRASIL. Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991. Dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social e dá outras providências.

BRASIL. Lei nº 9.601, de 21 de janeiro de 1998. Dispõe sobre o contrato de trabalho por prazo determinado e dá outras providências.

CARRION, Valentin. Comentários à Consolidação das Leis do Trabalho. 34º edição: São Paulo: Ed. Saraiva, 2009.

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DE ALMEIDA, André Luiz Paes. Direito do Trabalho. 6º edição: São Paulo: Ed. Rideel, 2009.

DE BARROS, Alice Monteiro. Curso de Direito do Trabalho. 5º edição. São Paulo: Ed. LTR, 2009.

DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 7º edição: São Paulo: Ed. LTR, 2008.

MAGANO, Octávio Bueno. Manual de Direito do Trabalho: 4º edição. São Paulo: Ed. LTR, 1991.

MARTINS, Sergio Pinto. Direito do Trabalho. 19º edição. São Paulo: Ed. Atlas, 2004.

 

Notas:

[1]MAGANO, Octávio Bueno. Manual de Direito do Trabalho: 4º edição. São Paulo: Ed. LTR, 1991.

[2]DE BARROS, Alice Monteiro. Curso de Direito do Trabalho. 5º edição. São Paulo: Ed. LTR, 2009.  

[3]DE BARROS, Alice Monteiro. Curso de Direito do Trabalho. 5º edição. São Paulo: Ed. LTR, 2009.

[4]MARTINS, Sergio Pinto. Direito do Trabalho. 19º edição. São Paulo: Ed. Atlas, 2004.


Informações Sobre o Autor

Alberto Ribeiro Mariano Júnior

Advogado. Pós-Graduando em Direito do Estado pela Universidade Federal da Bahia


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