A Contribuição Sindical, inicialmente denominada de imposto sindical (art. 138 da CF 1937), está prevista no art. 578 da CLT, e consiste em receita recolhida em favor do sistema sindical. É paga anualmente, de forma compulsória, conforme época, valores e procedimentos definidos pela CLT (artigos 578 a 610), sendo devida “por todos aqueles que participarem de uma determinada categoria econômica ou profissional ou de uma profissão liberal” (art. 579 da CLT).
É considerada pela doutrina e pela jurisprudência uma contribuição parafiscal, tributo que, na lição de Ruy Barbosa Nogueira, é um misto entre imposto e taxa, sendo cobrada por “autarquias, órgãos paraestatais de controle da economia, profissionais ou sociais, para custear seu financiamento autônomo” [1].
Jane Berwagner, por sua vez, refere que “contribuição é uma espécie de taxa fixada pelo Estado com destinação específica de custear determinados interesses estatais. (…) se destina a criar rendas para uma determina atividade considerada de interesse público. As contribuições podem ser de vários tipos, como são exemplos as contribuições de melhoria, previdenciária, confederativa e sindical” [2].
O CTN faz expressa menção a respeito da contribuição sindical, no art. 217, acrescentado pelo Decreto-lei nº 27 de 1966, dispondo que: “As disposições desta Lei, notadamente as dos arts. 17, 74, § 2º, e 77, parágrafo único, bem como a do art. 54 da Lei nº. 5.025, de 10 junho de 1966, não excluem a incidência e a exigibilidade: I – da ‘contribuição sindical’, denominação que passa a ter o Imposto Sindical de que tratam os arts. 578 e segs. da Consolidação das Leis do Trabalho, sem prejuízo do disposto no art. 16 da Lei nº. 4.589, de 11 de dezembro de 1964”.
Encontra fundamento constitucional no art. 149, litteris: “Compete exclusivamente à União instituir contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias profissionais ou econômicas como instrumento de sua atuação nas respectivas áreas, observado o disposto nos arts. 146, III, e 150, I e III, e sem prejuízo do previsto no art. 195, § 6º, relativamente às contribuições a que alude o dispositivo”.
E ainda no art. 8º, inciso IV: “A assembléia geral fixará a contribuição que, em se tratando de categoria profissional, será descontada em folha, para custeio do sistema confederativo da representação sindical respectiva, independentemente da contribuição prevista em lei”[3].
Nesse sentido, aliás, a jurisprudência do STF: “SINDICATO. CONTRIBUIÇÃO SINDICAL DA CATEGORIA: RECEPÇÃO. A recepção pela ordem constitucional vigente da contribuição sindical compulsória, prevista no art. 578 CLT e exigível de todos os integrantes da categoria, independentemente de sua filiação ao sindicato resulta do art. 8º, IV, in fine, da Constituição; não obsta à recepção a proclamação, no caput do art. 8º, do princípio da liberdade sindical, que há de ser compreendido a partir dos termos em que a Lei Fundamental a positivou, nos quais a unicidade (art. 8º, II) e a própria contribuição sindical de natureza tributária (art. 8º, IV) – marcas características do modelo corporativista resistente – , dão a medida de sua relatividade (cf. MI 144, Pertence, RTJ 147/868, 874); nem impede a recepção questionada a falta de lei complementar prevista no art. 146, III, CF, à qual alude o art. 149, à vista do disposto no art. 34, § § 3º e 4º, das Disposições Transitórias (cf. RE 146.733, Moreira Alves, RTJ 146/684, 694)” (STF – 1ª Turma, RE nº 180.745/SP, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ de 08.05.1998).
O fato gerador da contribuição em exame é pertencer ao sistema confederativo como membro integrante de categoria econômica – atividade produtiva – , ou categoria profissional – trabalhador vinculado à determinada atividade produtiva.
O recolhimento da contribuição sindical deve ser feito a partir da guia de arrecadação expedida pela entidade sindical, de acordo com as instruções editadas pelo Ministério do Trabalho (artigos 583 e 605 da CLT), o qual é responsável pela fiscalização da arrecadação da contribuição sindical, tendo em vista que 20% desta contribuição são destinadas ao Estado, para a Conta Especial Emprego e Salário (art. 589, IV, da CLT – atualmente, por força do disposto no art. 4º da Lei 9.322/96, dita quota é depositada em favor do Fundo de Amparo ao Trabalhador – FAT, sendo utilizada no reaparelhamento das Delegacias Regionais do Trabalho e com programas inseridos no âmbito da sua competência.)[4].
Oportuno, registrar que, dada a sua natureza, aplica-se à contribuição sindical as normas gerais de direito tributário, condicionando-se “ela, obviamente, também às regras do lançamento, cf. dito no referido artigo 146, III, letra b (apuração e documentação do crédito correspondente), disciplinado no art. 142 do CTN, que é, ato privativo da autoridade administrativa prevista em lei, no caso, a autoridade regional do Ministério do Trabalho, tal como previsto nos arts. 598 e 606 da CLT. A modalidade de lançamento aplicável à contribuição sindical é a do tipo por homologação, prevista no art. 150 do Código, já que, por força do art. 582 e 586 da CLT, são os empregadores obrigados a, sem prévio exame da autoridade administrativa, descontá-la de seus empregados e a recolhê-la diretamente à Caixa Econômica Federal, que as repassará em favor dos respectivos credores. Vale dizer: uma vez efetuado o recolhimento, caberá à citada autoridade conferir o procedimento do empregador e declarar se está ele correto. Caso tenha sido adequado, homologará o pagamento (recolhimento) havido, mas se, todavia, a contribuição não foi espontaneamente recolhida, ou se recolhida, não o tenha sido de forma correta, ocorrerá, então, o lançamento de ofício, a cargo da mesma autoridade regional do Ministério do Trabalho, que lavrará o auto de infração ou de lançamento, assegurando-se ao empregador acusado o amplo direito de defesa administrativa (cf. art. 145 do CTN). Transitada em julgado a decisão administrativa que julgar eventual impugnação oferecida ao lançamento, será o crédito, com a exata observância dos requisitos previstos no art. 202 do citado Código, inscrito em dívida ativa, pela referida autoridade, caso antes não tenha sido recolhido, dela se extraindo a necessária certidão (certidão de dívida ativa), com força executiva, para fins de cobrança judicial pelas entidades sindicais respectivas (cf. art. 606 da CLT), que são, preferentemente, os Sindicatos. Somente na hipótese de não constituído este, é que a sujeição ativa passa a ser, pela ordem, da Federação e da Confederação respectiva, não prescindindo, todavia, do lançamento e da inscrição do crédito em dívida ativa” [5].
Assim, havendo inadimplência quanto à contribuição, compete ao Ministério do Trabalho fazer o lançamento para dar exigibilidade e liquidez, e, posteriormente, expedir a certidão de dívida para conferir certeza à contribuição, valendo a citada certidão como título executivo extrajudicial para cobrança do débito (art. 606 da CLT c/c artigos 583 e 586 do CPC e art. 3º da Lei 6.830/80).
A cobrança judicial da contribuição inadimplida é feita pelos entes sindicais profissionais ou econômicos, na forma do disposto na Lei 6.830/80, sendo estendidos aos sindicatos os privilégios da Fazenda Pública, exceto quanto ao foro especial (art. 606, § 2º, da CLT).
Nesse contexto, a utilização da ação monitória pra cobrança judicial da contribuição sindical se revela inadequada, porquanto, embora o procedimento monitório seja processo de cognição sumária que visa abreviar a formação do título executivo e agilizar a prestação jurisdicional; o título executivo, no caso, é formado pelo procedimento administrativo de responsabilidade do Ministério do Trabalho. Não há, portanto, interesse processual da entidade sindical, no manejo da ação monitória.
De referir que a eleição da via judicial adequada, não é faculdade da parte, constituindo, outrossim, condição essencial da ação (art. 267, inciso VI, expressa no interesse de agir). É matéria de ordem pública, não estando à disposição das partes (art. 267, § 3º, da CLT), exceto nas estritas hipóteses legais (art. 292, § 2º, do CPC).
Ocorre, porém, que há algum tempo o Ministério do Trabalho se nega a expedir a certidão de dívida ativa, sob a justificativa de que para tanto teria que determinar o enquadramento sindical das empresas, e isto importa ingerência do Estado na organização sindical, o que é vedado pela CF de 1988, no art. 8º (consoante conclusão expressa na Nota/MGB/CONJUR/TEM/Nº 30/2003).
Como resolver, então, esta questão?
Saliento que, segundo doutrinadores de escol, contrariamente à conclusão do Ministério do Trabalho, a eficácia do art. 606 da CLT não foi afetada pela CF/88.
Sérgio Pinto Martins sustenta que “foi recepcionado pela Constituição de 1988 o art. 606 da CLT que indica que a contribuição sindical, para ser cobrada judicialmente, necessita de que o Ministério do Trabalho a inscreva como título de dívida, mediante certidão expedida pela referida autoridade, em que o contribuinte é individualizado, indicando-se o débito e designando-se a entidade a favor da qual é recolhida a importância da contribuição sindical, de acordo com o respectivo enquadramento sindical (parágrafo 1º do art. 606 da CLT). O parágrafo 2º do art. 606 da CLT demonstra que a cobrança judicial da dívida ativa da contribuição sindical tem os mesmos privilégios gozados pela Fazenda Pública, nos termos da Lei nº 6.830/80, com a única exceção de que não há foro especial para a cobrança da dívida, como ocorre em relação àquela entidade” [6].
Orlando Gomes e Elson Gottschalk afirmam que “O recolhimento ao Banco do Brasil, à Caixa Econômica Federal ou em estabelecimentos bancários autorizados obedece ao sistema de guias, de acordo com as instruções do Ministro do Trabalho, extraídas em quatro vias. Em caso de falta de pagamento, as entidades sindicais podem promover a respectiva cobrança judicial, mediante ação executiva, valendo como título da dívida a certidão expedida pelo DNT ou pelas delegacias regionais nos estados e territórios. Os sindicatos possuem, para esse fim, os privilégios da Fazenda Pública (isenção de selos), mas não têm foro especial. A quitação do imposto sindical é condição teórica para admissão no emprego; concorrência pública ou administrativa; para o fornecimento às repartições; para licenças de funcionamento de escritórios de agentes autônomos e profissionais liberais e alvarás de licença ou localização de qualquer atividade” [7].
Esclarecem, ainda, que a manutenção da contribuição sindical no ordenamento jurídico importa criação de “figura híbrida de uma pessoa de Direito Privado nutrida por tributos públicos extra-orçamentários. Outorgaram-se-lhe poderes e capacidade processual para a cobrança da dívida ativa, com iguais privilégios da Fazenda Pública, mas se lhe não concede foro especial. As certidões, o levantamento das dívidas, tudo é feito pelos órgãos públicos, mas na cena judiciária quem aparece é a personagem de que falamos ainda há pouco [sindicato]. Em nenhum país democrático, que preza a liberdade sindical, jamais se institui semelhante tributação” [8].
Diante do exposto, em que pese o entendimento dos Tribunais de Justiça e do STJ, que até a EC 45/04 detinham a competência para processar e julgar a matéria em estudo, e admitiam, sem muito esclarecer as suas razões[9], o procedimento monitório para cobrança do tributo destinado aos sindicatos, entendo incabível o uso de tal via (ação monitória), na medida em que esta visa conferir eficácia de título judicial para documentos particulares, não dotados de tal efeito, circunstância que limita a sua utilização ao âmbito das relações jurídicas estabelecidas entre particulares.
Ademais, ainda que se cogitasse do manejo da monitória para rápida constituição do título executivo, porquanto os sindicatos dispõem de prova documental do crédito (art. 1102-a do CPC), tratando-se de procedimento de cognição sumária, não restaria assegurada a ampla defesa ao réu, essencial na constituição da obrigação tributária, porquanto a verificação da ocorrência do fato gerador, a determinação da matéria tributável, a apuração do montante devido, bem como a identificação dos sujeitos ativo e passivo requerem procedimento de cognição exauriente, com eventual discussão acerca da representação sindical, o que requer observância do contraditório e da ampla de defesa, os quais são assegurados no lançamento tributário (art. 142 do CTN c/c art. 5º, LV, da CF).
Constata-se, assim, que a negativa do Ministério do Trabalho em expedir a certidão de dívida constitui ato ilegal, que desafia a impetração de Mandado de Segurança por parte das entidades sindicais, perante as Varas do Trabalho, objetivando a expedição da referida certidão, para posteriormente ingressar com a ação executiva.
Entretanto, caso não seja possível a utilização do Mandado de Segurança, porque decorrido o prazo de 120 dias, ou a prova do direito não esteja previamente constituída, penso que a ação que melhor atende à formação do título para cobrança da contribuição sindical é a ação de cobrança, sujeita ao rito ordinário, que propicia ampla dilação probatória, bem como a devida discussão e exame de todos os aspectos fáticos e jurídicos que envolvem a matéria.
A alteração da competência da Justiça do Trabalho, a partir da EC 45/04, outorgou à Justiça do Trabalho a competência para conhecer e julgar as lides de representação sindical (art. 114, III, CF), na qual se insere a contribuição sindical. S.m.j, e com todo o respeito aos Tribunais que, até então, vinham julgando essa matéria, penso que cabe uma nova reflexão acerca do processamento para cobrança da contribuição sindical, tendo em vista que a Justiça do Trabalho tem como especialização as questões envolvendo as relações de trabalho, sendo a representação sindical e a respectiva contribuição (que é devida, inclusive, por profissionais liberais) desdobramentos destas relações.
Nessa senda, entendo que esta Justiça está mais próxima e mais afeita as discussões referentes à contribuição sindical, competindo a ela um reexame da jurisprudência consolidada pela Justiça Estadual e pelo STJ, de sorte a adequá-la ao procedimento que lhe é próprio e está inteiramente descrito na CLT, que é “código” por excelência da Justiça do Trabalho.
Notas:
Informações Sobre o Autor
Carlos Alberto Robinson
Desembargador Vice-Presidente do TRT da 4ª Região, Formado em Direito pela Universidade Federal de Santa Maria (1966-70), Pós-graduação pela Fac. de Direito da Universidade de Buenos Aires (1995-96), Ex-professor do Departamento de Direito da UFSM.