Da abrangência dos efeitos das sanções de suspensão temporária prevista no art. 87 da Lei 8.666/93

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Resumo: Durante muito tempo o posicionamento do Tribunal de Contas quanto a abrangência dos efeitos da sanção de suspensão temporária de licitar e contratar com a Administração era consolidado no sentido de ser esta restrita no âmbito no ente/órgão aplicador da penalidade; diversamente do que ocorre com a sanção tipificada no inciso IV do mesmo dispositivo legal, em que a limitação se dá perante toda a Administração Pública. Porém, uma nova corrente interpretativa, liderada pelo STJ tem tido reflexo em alguns recentes julgados do TCU, que vem decidindo de forma diversa da corrente tradicional, estendendo a abrangência dos efeitos da sanção do inciso III a toda a Administração Pública. A análise destas duas correntes será o estudo do presente trabalho.

Palavras chaves: contratos administrativo- não cumprimento- penalidade- efeitos.

Sumário: 1- Introdução; 2- Corrente Tradicional do TCU; 3- Corrente Moderna do STJ e 4- Conclusão.

1.   INTRODUÇÃO

O artigo 87 da lei 8.666/93 prevê as penalidades que podem ser aplicadas quando a empresa contratada deixa de executar, total ou parcialmente, o contrata firmado junto com a Administração Pública.

Pois bem.

Dentre as penalidades ali incertas a tipificada no inciso III será objeto do presente estudo, em especial quanto a extensão dos seus efeitos perante a Administração Pública, vejamos:

 

Art. 87.  Pela inexecução total ou parcial do contrato a Administração poderá, garantida a prévia defesa, aplicar ao contratado as seguintes sanções:

I – advertência;

II – multa, na forma prevista no instrumento convocatório ou no contrato;

III – suspensão temporária de participação em licitação e impedimento de contratar com a Administração, por prazo não superior a 2 (dois) anos;

IV – declaração de inidoneidade para licitar ou contratar com a Administração Pública enquanto perdurarem os motivos determinantes da punição ou até que seja promovida a reabilitação perante a própria autoridade que aplicou a penalidade, que será concedida sempre que o contratado ressarcir a Administração pelos prejuízos resultantes e após decorrido o prazo da sanção aplicada com base no inciso anterior.

 Quando a empresa é penalizada nos moldes do inciso III, está ela impedida de contratar com toda a Administração Pública ou somente com o ente sancionador?

A jurisprudência do Tribunal de Contas da União vinha tendo entendimento consolidado de que a penalidade contida no inciso III do artigo 87 da lei 8666/93 se limitava tão somente ao ente que houvesse aplicado a sanção.

Quanto à penalidade tipificada no inciso IV, do mesmo dispositivo legal, a abrangência refletia além do ente sancionador, alcançando também todas as demais esferas da Administração Pública.

Esta diferenciação se dava principalmente pela interpretação literal dos dispositivos supracitados. Isto porque, o tratar da suspensão temporária (penalidade do inciso III), o legislador utiliza a palavra “Administração”; diferentemente, porém, quando trata da declaração de idoneidade (penalidade do inciso IV) quando o termo utilizado é “Administração Pública”. Levando em consideração os conceitos apresentados pelo legislador – interpretação autentica – estabelecida no artigo 6° da Lei 8666/93 em seus incisos XI e XII.

Entretanto, uma nova corrente liderada pelo Superior Tribunal de Justiça – guardião maior da legislação infraconstitucional – trouxe uma nova interpretação quanto aos efeitos das sanções dos incisos III do artigo 87 da lei 8666/93, estendendo-os a todos os entes da Administração Pública, não se restringindo apenas ao ente sancionador. Corrente esta que vem refletindo nos atuais julgados do Tribunal de Contas da União é o que se observa no acórdão 2218/2011 proferido nos autos do processo n° 025430/2009-5.

Tal posicionamento tem por base uma interpretação teleológica e sistemática da lei 8.666/93 com a Constituição Federal.

Feita esta breve introdução passaremos a analise de cada uma das correntes ora citadas.

2.   CORRENTE TRADICIONAL DO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO (TCU)

Iniciaremos o estudo pela corrente tradicional adotada pela doutrina majoritária e que vinha sendo o entendimento consolidado do Tribunal de Contas da União:

De acordo com esta corrente a suspensão temporária para a participação em licitação e impedimento para contratar com a Administração Publica, prevista no inciso II, do artigo 87 da lei 8666/93 tem seus efeitos restritos ao ente sancionador.

Desta forma, a empresa penalizada não estaria impedida de participar de outros processos licitatórios e de contratar com a Administração Pública, desde que não fosse com entes/órgãos da mesma Administração Pública que aplicou a penalidade.

Lado outro, quando a penalidade aplicada fosse aquela do inciso IV – “declaração da inidoneidade para licitar ou contratar com a Administração pública”  radiava para toda a Administração Pública.

Os defensores desta corrente sustentam que o legislador ao prever as sanções, o fez de forma diversa, de tal modo que diversos também seriam seus efeitos, pois, utiliza no primeiro caso o termo “Administração” e no segundo “Administração Pública”.

E o próprio legislador conceitua tais termos no artigo 6° da Lei 8666/93, in verebis:

“Art. 6° para fins desta lei considera-se:(…)

XI- Administração pública – Administração Direta e Indireta da União, dos Estados, Distrito Federal, e dos Municípios, abrangendo inclusive as entidades de personalidade jurídica privada sob controle do Poder público e das fundações por ele instituídas ou mantidas;

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XII – Administração- órgão, entidade ou unidade administrativa, pelo qual a Administração Pública opera e atua concretamente.”

Verifica-se, pois, que ao empregar o termo Administração o legislador o faz de forma mais restrita  enquanto o termo Administração Pública revela mais amplo.

Outro argumento defendido por esta corrente, está no fato de tratar de norma sancionadora e que ao interpretar tais normas o exegeta deve fazê-la de forma restritiva uma vez que não se admite interpretação extensiva, pois atinge bens, patrimônio e atividade restringindo direitos individuais. Assim, não tendo o legislador previsto, não cabe ao intérprete faze-lo sob pena de incidir em ilegalidade.

Por fim, encerram seus argumentos, apontando que não se pode dar o mesmo alcance às penalidades dos incisos III e IV, pois infringem a regra da dosimetria da pena já que as tais sanções apresentam diferentes graus de intensidade e ao igualar a abrangência de seus efeitos não haverá mais distinção entre as referidas sanções.

Corroborando este entendimento o legislador ao prever a autoridade competente para aplicação da sanção o fez de forma distinta, que demonstra que a segunda sanção é mais rigorosa que a primeira já que para esta o competente é o órgão contratante, enquanto para a aquela é de competência exclusiva do Ministro de Estado, Secretário Estudo ou Município, dependendo do caso.

Neste sentido são, a maioria, dos julgados proferidos pelo Tribunal de Contas da União, conforme se observa na coletânea abaixo selecionada:

                          

A sanção prevista no art. 87, inciso III, da Lei 8.666/93 produz efeitos apenas em relação ao órgão ou entidade sancionador, enquanto a prevista no art. 7º da Lei 10.520/02 produz efeitos no âmbito do ente federativo que a aplicar. Representação versando sobre pregão eletrônico promovido pelo Serviço Federal de Processamento de Dados – Regional de São Paulo (Serpro/SP) apontara possível restrição à competitividade decorrente de disposição editalícia vedando a participação de empresas “que estejam com o direito de licitar e contratar suspenso com o SERPRO e/ou outros órgãos da Administração Pública, bem como tenham sido declaradas inidôneas pela mesma”. Em juízo de mérito, realizadas as oitivas regimentais após concessão da cautelar pleiteada pelo representante, o relator esclareceu que o Plenário do TCU vem “reafirmando a ausência de base legal para uma interpretação da norma que amplie os efeitos punitivos do art. 87, inciso III [suspensão temporária de participação em licitação e impedimento de contratar com a Administração, por prazo não superior a dois anos], da Lei 8.666/1993 a todos os entes e órgãos da Administração Pública (Acórdãos 3.243/2012, 3.439/2012, 3.465/2012, 842/2013, 739/2013, 1.006/2013 e 1.017/2013, todos do Plenário)”. A propósito, relembrou que o voto condutor do Acórdão 3.439/2012-Plenário sintetizou os elementos nos quais se funda a posição do TCU sobre a matéria: “a) as sanções do art. 87 da Lei 8.666/93 estão organizadas em ordem crescente de gravidade e, ao diferenciar aspectos como duração, abrangência e autoridade competente para aplicá-las, o legislador pretendia distinguir as penalidades dos incisos III e IV [declaração de inidoneidade para licitar ou contratar com a Administração Pública]; b) em se tratando de norma que reduz o direito de eventuais licitantes, cabe interpretação restritiva; c) o art. 97 da Lei de Licitações, ao definir que é crime admitir licitação ou contratar empresa declarada inidônea, reforça a diferenciação entre as penalidades de inidoneidade e suspensão temporária/impedimento de contratar, atribuindo àquela maior gravidade”. Noutro giro, versando agora sobre os limites de sanção correlata prevista na Lei do Pregão (Lei 10.520/02, art. 7º – impedimento de licitar e contratar com a União, Estados, Distrito Federal ou Municípios), e diante da possibilidade de que o Serpro/SP venha a conferir demasiado alcance a esse dispositivo, consignou o relator que “a jurisprudência deste Tribunal (Acórdãos do Plenário 739/2013, 1.006/2013 e 1.017/2013) é firme no sentido de que tal penalidade impede o concorrente punido de licitar e contratar apenas no âmbito do ente federativo que aplicou a sanção, em consonância com o que dispõe o art. 40, inciso V e § 3º, da IN SLTI 2/2010”. Nesse sentido, e tendo em vista que as falhas verificadas não comprometeram efetivamente a competitividade do certame e tampouco frustraram o objetivo da contratação, o Plenário do TCU, acolhendo a proposta do relator, considerou parcialmente procedente a representação, revogando a cautelar expedida e cientificando o Serpro/SP de que “a sanção prevista no inciso III do art. 87 da Lei 8.666/1993 produz efeitos apenas em relação ao órgão ou entidade sancionador, enquanto a prevista no art. 7º da Lei 10.520/2002 produz efeitos apenas no âmbito interno do ente federativo que a aplicar”. Acórdão 2242/2013-Plenário, TC 019.276/2013-3, relator Ministro José Múcio Monteiro, 21.8.2013.

A sanção prevista no inciso III do art. 87 da Lei nº 8.666/93 produz efeitos apenas no âmbito do órgão ou entidade que a aplicou. Representação formulada por empresa apontou possíveis irregularidades na condução do Pregão Presencial nº 11/2011, promovido Prefeitura Municipal de Cambé/PR, que teve por objeto o fornecimento de medicamentos para serem distribuídos nas Unidades Básicas de Saúde e na Farmácia Municipal. Entre as questões avaliadas nesse processo, destaque-se a exclusão de empresas do certame, em razão de terem sido apenadas com a sanção do art. 87, III, da Lei nº 8.666/93 por outros órgãos e entidades públicos. Passou-se, em seguimento de votação, a discutir o alcance que se deve conferir às sanções estipuladas nesse comando normativo (“suspensão temporária de participação em licitação e impedimento de contratar com a Administração”). O relator, Ministro Ubiratan Aguiar, anotara que a jurisprudência do Tribunal havia-se firmado no sentido de que a referida sanção restringia-se ao órgão ou entidade que aplica a punição. A sanção prevista no inciso IV do mesmo artigo, relativa à declaração de inidoneidade para licitar ou contratar com a Administração Pública, produziria efeitos para os órgãos e entidades das três esferas de governo. O relator, a despeito disso, ancorado em precedente revelado por meio do Acórdão nº 2.218/2011-1ª Câmara, de relatoria do Ministro Walton Alencar Rodrigues, e na jurisprudência do dominante do STJ, encampou o entendimento de que a sanção do inciso III do art. 87 também deveria produzir efeitos para as três esferas de governo. O primeiro revisor, Min. José Jorge, sustentou a necessidade de se reconhecer a distinção entre as sanções dos incisos III e IV, em função da gravidade da infração cometida. Pugnou, ainda, pela modificação da jurisprudência do TCU, a fim de se considerar que “a sociedade apenada com base no art. 87, III, da Lei nº 8.666/93, por órgão/entidade municipal, não poderá participar de licitação, tampouco ser contratada, para a execução de objeto demandado por qualquer ente público do respectivo município”. O segundo revisor, Min. Raimundo Carreiro, por sua vez, ao investigar o significado das expressões “Administração” e “Administração Pública” contidos nos incisos III e IV do art. 87 da Lei nº 8.666/1993, respectivamente, assim se manifestou: “Consoante se lê dos incisos XI e XII do art. 6º da Lei nº 8.666/93, os conceitos definidos pelo legislador para ‘Administração Pública’ e para ‘Administração’ são distintos, sendo o primeiro mais amplo do que o segundo. Desse modo, não creio que haja espaço hermenêutico tão extenso quanto tem sustentado o Superior Tribunal de Justiça nos precedentes citados no voto do relator no que concerne ao alcance da sanção prevista no inciso III do art. 87”. Mencionou, também, doutrinadores que, como ele, privilegiam a interpretação restritiva a ser emprestada a esse comando normativo. Ressaltou, ainda, que as sanções dos incisos III e IV do art. 87 da multicitada lei “guardam um distinto grau de intensidade da sanção”, mas que “referidos dispositivos não especificaram as hipóteses de cabimento de uma e de outra sanção …”. Segundo ele, não se poderia, diante desse panorama normativo, admitir que o alcance de ambas sanções seria o mesmo. Chamou atenção para o fato de que “a sanção prevista no inciso III do art. 87 é aplicada pelo gestor do órgão contratante ao passo que a sanção do inciso IV é de competência exclusiva do Ministro de Estado, do Secretário Estadual ou Municipal, conforme o caso”. E arrematou: “ … para a sanção de maior alcance o legislador exigiu também maior rigor para a sua aplicação, ao submetê-la à apreciação do titular da respectiva pasta de governo”. Acrescentou que a sanção do inciso III do art. 87 da Lei de Licitações não poderia ter alcance maior que o da declaração de inidoneidade pelo TCU (art. 46 da Lei nº 8.443/1992). Por fim, invocou o disposto no inciso XII do art. 6º da Lei de Licitações, que definiu “Administração” como sendo “órgão, entidade ou unidade administrativa pela qual a Administração Pública opera e atua concretamente”, para refutar a proposta do primeiro revisor, acima destacada. O Tribunal, então, ao aprovar, por maioria, a tese do segundo revisor, Min. Raimundo Carreiro, decidiu: “9.2. determinar à Prefeitura Municipal de Cambé/PR que nas contratações efetuadas com recursos federais observe que a sanção prevista no inciso III do art. 87 da Lei nº 8.666/93 produz efeitos apenas em relação ao órgão ou entidade contratante”. Acórdão nº 3243/2012-Plenário, TC-013.294/2011-3, redator Ministro Raimundo Carreiro, 28.11.2012.

Em síntese, conclui-se que os argumentos da primeira corrente estudada se resumem em: a) Termos empregados em cada inciso- Administração e Administração pública; b) Natureza sancionatória da norma que exige  interpretação restritiva; c) Gravidade das sanções; d) Competência para aplicação.

3.   CORRENTE MODERNA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA (STJ)

Passemos para o estudo da segunda corrente liderada pelo Superior Tribunal de Justiça.

Com vários precedentes[1] o Superior Tribunal de Justiça tem entendido diversamente, para esta Corte, a extensão dos efeitos da penalidade do inciso III, assim como a do inciso IV, deve ser alcançar toda Administração Pública e não somente ao ente aplicador da penalidade. Entendimento este que tem sido acolhido por alguns julgados do TCU.

Tal corrente debate os argumentos apresentados pela primeira, com os seguintes argumentos:

Os conceitos apresentados pelo artigo6°, XI e XII, de “Administração Pública” e “Administração” não tratam de conceitos diversos, mas sinônimos. Isto porque, de acordo com o STJ a Administração Pública é uma e que a descentralização da Administrativa nada mais é que uma forma de atuação do estado para melhor atender sua finalidade.

Vejamos o que dizem alguns de seus julgados:

É irrelevante a distinção entre os termos Administração Pública e Administração, por isso que ambas as figuras (suspensão temporária de participar em licitação (inc. III) e declaração de inidoneidade (inc. IV) acarretam ao licitante a não-participação em licitações e contratações futuras. A Administração Pública é una, sendo descentralizadas as suas funções, para melhor atender ao bem comum. A limitação dos efeitos da 'suspensão de participação de licitação' não pode ficar restrita a um órgão do poder público, pois os efeitos do desvio de conduta que inabilita o sujeito para contratar com a Administração se estendem a qualquer órgão da Administração Pública” (REsp 151.567 / RJ, Relator: Ministro Peçanha Martins).

“Como bem acentuado pela Insigne Subprocuradora-Geral da República, Dra. Gilda Pereira de Carvalho Berger, não há ampliação punitiva ao direito da Recorrente, tão-somente a irrepreensível aplicação da letra da lei: ‘(…) verifica-se que a sanção de suspensão prevista no inciso II, do art. 87, na forma com que foi disposta, aplica-se a todo e qualquer ente que, componha a Administração Pública, seja direta ou indireta, mesmo porque esta se mostra una, apenas descentralizada para melhor executar suas funções:’ (fl. 189) A Administração Pública é a acepção subjetiva de Estado-administrador e sua natureza executiva é única. Apenas as suas atribuições são distribuídas de forma descentralizada, para melhor gerir o interesse de sua comunidade.”  (STJ – RMS 9707 / PR, Relatoria: Ministra Laurita Vaz).

Dentre os doutrinadores defensores desta corrente cita-se Marçall Justen Filho, que em sua obra “Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos”, 8ª edição, fls. 106 e 107 ao comentar sobre a distinção nos conceitos de Administração e Administração Pública, levantado pela primeira corrente ensina que: “é irrelevante e juridicamente risível".

Marçall, na mesma obra, ao comentar a respeito das sanções dos incisos III e IV do artigo 87 esclarece em fls. 626/627:

"11) A Supensão Temporária e a Declaração de inidoneidade As sanções dos incs. III e IV são extremamente graves e pressupõem a prática de condutas igualmente sérias. 11.1) Necessidade de precisar os pressupostos de sancionamento Como visto acima e como será reafirmado no comentário ao art. 88, a aplicação das sanções dos incs. III e IV depende de discriminação precisa, através de lei, dos pressupostos de sua aplicação. Não se admite escolha discricionária por parte da Administração Pública quanto a tais pressupostos. Enquanto uma lei não dispuser sobre o tema, não caberá aplicar essas sanções. 11.2) Distinção entre as figuras dos incs. III e IV A lei que regulamentar as figuras deverá distinguir a suspensão temporária de participar em licitação (inc. III) da declaração de inidoneidade (inc. IV). Ambas as figuras acarretam consequências similares. Nos dois casos, veda-se ao particular a participação em licitações e contratações futuras. Seria possível estabelecer uma distinção de amplitude entre as duas figuras. Aquela do inc. III produziria efeitos no âmbito da entidade administrativa que a aplicasse; aquela do inc. IV abarcaria todos os órgãos da Administração Pública. Essa interpretação deriva da redação legislativa, pois o inc. III utiliza apenas o vocábulo 'Administração', enquanto o inc. IV contém 'Administração Pública'. No entanto, essa interpretação não apresenta maior consistência, ao menos enquanto não houver regramento mais detalhado. Aliás, não haveria sentido em circunscrever os efeitos da 'suspensão de participação de licitação' a apenas um órgão específico. Se um determinado sujeito apresenta desvios de conduta que o inabilitam para contratar com a Administração Pública, os efeitos dessa ilicitude se estendem a qualquer órgão. Nenhum órgão da Administração Pública pode contratar com aquele que teve seu direito de licitar 'suspenso'. A menos que lei posterior atribua contornos distintos à figura do inc. III essa é a conclusão que se extrai da atual disciplina legislativa.

Portanto, tem-se que, deve ser realizada uma interpretação teleológica e analítica dos princípios aplicados à Licitação. Neste sentido dispõe o artigo 3° da Lei 8.666/93, que reforça alguns princípios constitucional, que são de observância obrigatória tanto pela Administração Pública como também pelo Administrado, dentre eles o da moralidade administrativa:

Art. 3o  A licitação destina-se a garantir a observância do princípio constitucional da isonomia, a seleção da proposta mais vantajosa para a administração e a promoção do desenvolvimento nacional sustentável e será processada e julgada em estrita conformidade com os princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhes são correlatos

De acordo com a Lei de Licitações a licitação te por finalidade a obtenção da proposta mais vantajosa para a Administração Pública que consiste naquela que observa os princípios da eficiência, economicidade e moralidade.

As penalidades tipificadas nos incisos III e IV visam afastar do procedimento licitatório aquelas empresas que tenham revelado atentatórias às diretrizes acima expostas. Sendo esta a finalidade primordial da penalidade, por qual razão defender a possibilidade de a empresa penalizada poder participar de licitações e realizar contratados com os demais entes da Administração Pública? A restrição da suspensão a apenas ao ente sancionador, vai de encontro com os demais princípios aplicáveis à Administração Pública e contra a própria lógica da sanção.

 O Superior Tribunal de Justiça no REsp 151.567/RJ, quanto ao tema assim se pronunciou:

‘A premissa em que se fundamenta o julgado, ou seja, a diferença conceitual entre órgão da administração pública e órgão da administração, em que se assenta a conclusão de que a penalidade aplicada por este último tem a sua eficácia limitada à jurisdição administrativa do órgão sancionador, não se compadece com o sistema instituído pela lei de regência, até porque o princípio da moralidade administrativa, insculpido no art. 3º da Lei 8.666/93, não se harmoniza com a idéia de que a improbidade, decorrente da inadimplência do licitante no cumprimento do contrato, tenha por limite a jurisdição administrativa do órgão sancionador.’

No mesmo sentido, o já aludido RMS 9707 / PR, de relatoria da Ministra Laurita Vaz:

‘A garantia da honorabilidade e probidade dos licitantes é qualidade indissociável ao trato da coisa pública. O resguardo da Administração à regularidade da concorrência pública denota, sobretudo, o respeito ao interesse comum.

Ora, se a lei exige do administrador que aja com probidade ao promover a licitação pública, com maior razão que também se prescreva ao particular essa exigência.’

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Urge salientar que tramita no Congresso o projeto de Lei PL 7709/2009 que acrescenta o inciso IV ao artigo 28 da Lei 8666/93 a fim de que na fase de habilitação seja exigida do licitante declaração de que não está incurso nas sanções previstas nos incisos III e IV, e acrescenta parágrafo único ao dispositivo 28, nos seguintes termos:

‘Parágrafo único. Não poderá licitar nem contratar com a Administração Pública pessoa jurídica cujos diretores, gerentes ou representantes, inclusive quando provenientes de outra pessoa jurídica, tenham sido punidos na forma do § 4º do art. 87 desta Lei, nos limites das sanções dos incisos III e IV do mesmo artigo, enquanto perdurar a sanção.’

Outro ponto importante é que a extensão dos efeitos da penalidade do inciso III tem o proposito de preservar a Administração quanto à fraude e prejuízos ao erário. Visa, pois, dar efetividade a sanção anteriormente imposta.

Em relação ao nível de gravidade a segunda corrente sustenta que, diferentemente do alegado pela primeira corrente, o fato de estender os efeitos da restrição a toda Administração Pública não tira a singularidade de cada penalidade, uma vez que tal fato não as iguala.

Apontam-se as seguintes diferenças:

15300a

A gradação das penalidades é diversa, independente, da extensão ou não do impedimento de licitação e contração a toda Administração Pública. Pois, de acordo com esta corrente a gradação das penalidades referem-se os aspectos acima expostos e não à extensão de seus efeitos.

4.   CONCLUSÃO

Feitas estas considerações verifica-se que a segunda corrente- mais moderna- tem apontado no cenário jurídico com fortes argumentos, porém, apesar de liderada pelo STJ encontra grande resistência por parte do Tribunal de Contas da União, onde ainda predomina a primeira corrente conforme se observa nos julgados daquele tribunal.

 

Referências
Marçall Justen Filho -“Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos”, 8ª edição.
Acórdão TC 013.294/2011-3 do Tribunal de Contas da União.
Julgados do STJ    REsp 151.567 / RJ, Relator: Ministro Peçanha Martins
STJ – RMS 9707 / PR, Relatoria: Ministra Laurita Vaz
REsp 174.274 / SP, Relator: Ministro Castro Meira

Nota:
[1] REsp 151.567 / RJ, Relator: Ministro Peçanha Martins
STJ – RMS 9707 / PR, Relatoria: Ministra Laurita Vaz
REsp 174.274 / SP, Relator: Ministro Castro Meira


Informações Sobre o Autor

Luanna Pomarico

Advogada Fundacional. Pós-Graduanda em Direito Público pela Faculdade de Direito Prof. Damásio Evangelista de Jesus. Cursando Aperfeiçoamento em Licitações e Contratos Públicos na Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho UNESP


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