Da desnecessidade da intimação prévia do executado no cumprimento de sentença regido pela Lei nº 11.232/2005 para a incidência da multa

Resumo: A lei n 11.232/2005 que alterou o CPC nos dispositivos que disciplinam a execução de títulos judiciais trouxe elementos que buscam estimular o cumprimento da obrigação como a incidência de multa de 10 sobre o valor do débito. Como não disciplinou expressamente a necessidade de intimação do executado para a aplicação da multa a doutrina e a jurisprudência tem demonstrado diversos entendimentos.

Do Processo de Execução. Considerações sobre as alterações legislativas.

A disciplina legal do processo de execução sofreu profundas alterações em 2005 com o advento da Lei nº 11.232. O objetivo da reforma foi trazer auto-executividade às sentenças condenatórias, tal como já havia ocorrido em relação às obrigações de fazer e não fazer com a disciplina legal do artigo 461 e 461-A do Código de Processo Civil. De fato, estes dispositivos legais trouxeram uma carga executória à sentença, estabelecendo meios específicos de coerção para o cumprimento da avença.

A disciplina da execução dos títulos judiciais deslocou-se para o capítulo que dispõe sobre o processo de conhecimento, com o claro intuito do legislador de demonstrar que os meios executórios são feitos no mesmo processo, sem mais a necessidade de inaugurar novo processo executório.

1.1. A disciplina legal do processo de execução revogada

O Código de Processo Civil em sua redação original tinha um Livro especialmente destinado ao Processo de Execução. Era o Livro II – Do Processo de Execução. A disciplina deste Livro demonstra claramente que o processo de execução era autônomo, com regras próprias e princípios próprios. O Título I – Da Execução em Geral trazia regramentos que se aplicavam genericamente a todas as modalidades de execução, quais sejam, quem eram as partes legitimadas a promover a execução, qual a competência do juízo para conhecer do processo de execução, a divisão em títulos executivos judiciais e extrajudiciais, a disciplina sobre a responsabilidade patrimonial e quem a possui e por fim os atos que o juiz pode tomar a fim de garantir a satisfação do crédito. Havia também no mesmo título a disciplina legal da liquidação de sentença, que era feita também por processo autônomo com a citação do devedor (artigo 603, parágrafo único, CPC na redação original).

O Título II tratava mais especificamente da execução com o nome de “Das Diversas Espécies de Execução”, trazendo no Capítulo I disposições gerais para todas as formas de execução com regramentos tais como, requisitos da petição inicial, deveres do credor e causas de nulidade da execução. O Capítulo II tratava das execuções de entrega de coisa, o seguinte sobre a execução de obrigação de fazer e não fazer.

A execução por quantia, que é o que interessa ao objeto deste trabalho era tratada no Capítulo IV – A Execução de Quantia Certa contra Devedor Solvente. Este capítulo disciplinava primeiramente o que considerava como bens impenhoráveis, subentendendo-se assim, que todos os demais que não constavam expressamente do dispositivo legal poderiam ser objeto de expropriação no processo de execução.

O artigo 652 dizia que o devedor será citado para pagar o débito em vinte e quatro horas ou nomear bens à penhora. Caso o oficial de justiça não encontre o devedor poderá arrestar os bens suficientes para garantir a execução caso em que deverá haver intimação do executado do arresto (artigo 653).

O arresto efetivado pelo oficial de justiça ou os bens nomeados pelo devedor são levados à penhora, que podem ser arrematados ou adjudicados, convertendo-se os bens em dinheiro e entregando-se ao devedor.

Satisfeita a execução, ela é extinta.

O devedor tem meios de defender-se deste procedimento por meio dos embargos, que possuíam regramento em um Título próprio, o Título III denominado “Dos Embargos do Devedor”. Os embargos eram opostos pelo devedor e autuados em apartado, possuindo, portanto, clara natureza jurídica de ação. Poderia, também, o devedor opor embargos à adjudicação e à arrematação depois de efetivada a penhora.

1.1.1. A diferença entre a execução de títulos judiciais e extrajudiciais

Verifica-se que o regramento do processo de execução de títulos judiciais e extrajudiciais é o mesmo, com a aplicação de rito idêntico a ambos os títulos executivos. Os meios expropriatórios colocados em prol do credor são idênticos, não havendo divisão na disciplina legal.

A única diferença que existia na lei revogada dizia respeito à matéria dos embargos do devedor, sendo que, tratando-se de execução fundada em títulos judiciais o devedor somente poderia argüir em seus embargos (artigo 741): “a falta ou nulidade de citação no processo de conhecimento, se a ação lhe correu à revelia; inexigibilidade do título; ilegitimidade das partes; cumulação indevida de execuções; excesso de execução, ou nulidade desta até a penhora; qualquer causa impeditiva, modificativa ou extintiva da obrigação, como pagamento, novação, compensação com execução aparelhada, transação ou prescrição, desde que supervenientes à sentença; incompetência do juízo da execução, bem como suspeição ou impedimento do juiz”. Além destas hipóteses, poderá o devedor argüir a inexigibilidade do título judicial em virtude de lei ou ato normativo declarados inconstitucionais.

Já no processo de execução fundado em título executivo extrajudicial o devedor poderia argüir como matéria de defesa qualquer fundamento, sem a observância do rol taxativo descrito no artigo 741, pois o artigo 745 assim disciplinava, in verbis:

“Art. 745. Quando a execução se fundar em título extrajudicial, o devedor poderá alegar, em embargos, além das matérias previstas no art. 741, qualquer outra que lhe seria lícito deduzir como defesa no processo de conhecimento.”

Verifica-se, portanto, que o devedor poderia rediscutir a causa em processo de execução mesmo após ter firmado contrato com o credor, ou ter a oportunidade de defender-se na ação de conhecimento.

1.2. A Lei nº 11.232 de 22 de dezembro de 2005

A Lei nº 11.232 de 2005 que recebeu a ementa “Altera a Lei nº 5.869 de 11 de janeiro de 1973, Código de Processo Civil, para estabelecer a fase de cumprimento das sentenças no processo de conhecimento e revogar dispositivos relativos à execução fundada em título judicial, e dá outras providências” iniciou-se através do Projeto de Lei nº 3253/2004, apresentado na Câmara dos Deputados em 29 de março de 2004 pelo Instituto Brasileiro de Direito Processual Civil.

Em 07 de abril de 2004 o então projeto de lei foi encaminhado à Comissão de Constituição de Justiça e Cidadania

Teve tramitação prioritária e de sua redação original sofreu cinco emendas modificativas que alteraram a redação do §2º do artigo 475-B, o §2º do artigo 475-L, do inciso IV do artigo 475, do artigo 463 e 475-L.

Apenas um mês após, em 05 de agosto de 2004 foi encaminhado o projeto ao Senado Federal que após aprovada foi submetida ao Presidente da República para sanção sendo promulgada em 22 de dezembro de 2005.

A Exposição de Motivos desta lei demonstra que o projeto foi elaborado pelo Instituto Brasileiro de Direito Processual, assinado por Athos Gusmão Carneiro, Sálvio de Figueiredo Teixeira, Petrônio Calmon Filho e Fátima Nancy Andrighi. O objetivo da lei era claramente eliminar a dualidade das ações, estabelecendo meios executivos no processo de conhecimento, conforme ilustra o item 3 da exposição de motivos:

“É tempo, já agora, de passarmos do pensamento à ação em tema de melhoria dos procedimentos executivos. A execução permanece o ‘calcanhar de Aquiles’ do processo. Nada mais difícil, com freqüência, do que impor no mundo dos fatos os preceitos abstratamente formulados no mundo do direito.

Com efeito: após o longo contraditório no processo de conhecimento, ultrapassados todos os percalços, vencidos os sucessivos recursos, sofridos os prejuízos decorrentes da demora (…) o demandante logra obter ao fim a prestação jurisdicional definitiva, com o trânsito em julgado da condenação da parte adversa. Recebe então a parte vitoriosa, de imediato, sem tardança maior, o ‘bem da vida’ a que tem direito? Triste engano: a sentença condenatória é título executivo, mas não se reveste de preponderante eficácia executiva. Se o vencido não se dispõe a cumprir a sentença, haverá iniciar o processo de execução, efetuar nova citação, sujeitar-se à contrariedade do executado mediante ‘embargos’, com sentença e a possibilidade de novos e sucessivos recursos.

Tudo superado, só então o credor poderá iniciar os atos executórios propriamente ditos, com a expropriação do bem penhorado, o que não raro propicia mais incidentes e agravos.

Ponderando, inclusive, o reduzido número de magistrados atuantes em nosso país, sob índice de litigiosidade sempre crescente (pelas ações tradicionais e pelas decorrentes da moderna tutela aos direitos transindividuais), impõe=se buscar maneiras de melhorar o desempenho processual (sem fórmulas mágicas, que não as há), ainda que devamos, em certas matérias (e por que não?), retomar por vezes caminhos antigos (e aqui o exemplo do procedimentos do agravo, em sua atual técnica, versão atualizada das antigas 'cartas diretas' …), ainda que expungidos rituais e formalismos anacrônicos.”[1]

Assim, com este objetivo de simplificar a busca da satisfação do credor que foi instituído no direito processual civil brasileiro o cumprimento de sentença, revogando-se os artigos de lei que tratavam do processo de execução autônomo nos títulos judiciais.

No entanto, como bem critica Humberto Theodoro Júnior, a reforma que busca o sincretismo processual, evitar a dualidade das ações é bem vindo, mas não é milagrosa. A reforma processual não tem o condão de, por si só, diminuir ou erradicar a morosidade da justiça.

“Entre a mudança da norma e a transformação da realidade dos serviços judiciários, vai uma distância muito grande, que não se cobre apenas pela edição de textos legislativos. Temos reiteradamente advertido para o fato de que a demora e ineficiência da justiça – cuja erradicação se coloca como a principal inspiração da reforma do processo de execução – decorre principalmente de problemas administrativos e funcionais gerados por uma deficiência notória da organização e do aparelhamento burocrático do Poder Judiciário brasileiro. Influem muito mais na pouca eficácia e presteza da tutela jurisdicional as etapas mortas e as diligências inúteis, as praxes viciosas e injustificáveis, mantidas por simples conservadorismo, que fazem com que os processos tenham que durar muito mais do que o tolerável e muito mais mesmo do que o tempo previsto na legislação vigente.”[2]

Assim, acertada a crítica feita por este doutrinador eis que não é tolerável manter o pensamento de que a responsabilidade é tão somente da legislação, de forma que a mera reforma legislativa, sem administração seria suficiente para a mudança de um cenário há anos imposto.

1.3. O procedimento do cumprimento de sentença

Cumprimento de sentença é “a denominação escolhida para a reforma da atividade processual dos títulos executivos judiciais (art. 475-N) (…).”[3]

A fase do cumprimento de sentença foi deslocada para o Livro I – do Processo de Conhecimento, diminuindo – mas não esvaziando – a disciplina legal do Livro II – Do Processo de Execução.

O artigo 475-I do CPC dispõe que o cumprimento de sentença de quantia certa será estabelecido conforme os artigos seguintes. No artigo seguinte há a disposição de que o devedor terá prazo de quinze dias para cumprir a obrigação e se não o fizer o valor do débito será acrescido de 10 por cento.

O credor fará um requerimento no processo de conhecimento noticiando a falta de pagamento voluntário. Não será necessário o ajuizamento da ação de execução tal como ocorria no regime revogado.

Será expedido mandado de penhora e avaliação em que o oficial de justiça penhorará quantos bens bastem para a satisfação da execução sendo que da efetivação da penhora o executado será intimado na pessoa de seu advogado ou na sua falta por mandado ou pelo correio (§1º do artigo 475-J, CPC). Poderá o executado oferecer impugnação no prazo de quinze dias que somente poderá versar sobre (artigo 475-L), in verbis:

“I – falta ou nulidade da citação, se o processo correu à revelia;

II – inexigibilidade do título;

III – penhora incorreta ou avaliação errônea;

IV – ilegitimidade das partes;

V – excesso de execução;

VI – qualquer causa impeditiva, modificativa ou extintiva da obrigação, como pagamento, novação, compensação, transação ou prescrição, desde que superveniente à sentença.”

O §1º deste dispositivo legal dispõe que ainda será considerado inexigível o título que for fundado em lei ou ato normativo declarados inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal ou por interpretação conforme a Constituição declarada pela Magna Corte.

Ao contrário da antiga disposição legal sobre os embargos, a impugnação não terá efeito suspensivo como regra, somente terá se houver o requerimento do executado e “desde que relevantes seus fundamentos e o prosseguimento da execução seja manifestamente suscetível de causar ao executado grave dano de difícil ou incerta reparação.”

A competência para o conhecimento do cumprimento de sentença será do juiz ou tribunal competente para análise do processo de conhecimento e nos casos de sentença penal condenatória, sentença arbitral ou de sentença estrangeira, será do juízo cível competente, nos termos do artigo 475-P do Código de Processo Civil.

O artigo 475-R que fecha este tema no Código de Processo Civil estabelece que serão aplicáveis os dispositivos constantes do processo de execução para títulos extrajudiciais no que couber em uma clara demonstração de paridade dos dois sistemas executórios.

1.3.1. Da (des)necessidade da intimação do executado para a incidência da multa

Muito se discute na doutrina e na jurisprudência se a incidência da multa prevista no artigo 475-J do CPC de 10% sobre o valor do débito é automática ou se depende de prévia intimação do executado para o pagamento.

Humberto Theodoro Júnior entende que o prazo de quinze dias para o pagamento voluntário do devedor sem a incidência da multa se dá a partir do trânsito em julgado da decisão. Caso o devedor queira evitar a multa, deverá fazer o pagamento no prazo legal, ou interpor recurso, que caso não concorde com a decisão terá o direito constitucional de recorrer e por isso não pode ser penalizado.[4]

Nesta sequência de ideias, este doutrinador entende que é desnecessária a prévia intimação do devedor para o início do prazo legal:

“O cumprimento de sentença não se instaura como uma nova ação que exigisse citação ou intimação do devedor. É apenas continuidade do processo que a sentença condenatória não teve o condão de encerrar. Publicada e intimada a sentença, seus efeitos se projetam sobre a continuidade dos atos que lhe seguem. O prazo de cumprimento, portanto, não decorre de uma nova instância. É conseqüência da normal intimação do julgado.”[5]

O Superior Tribunal de Justiça já decidiu pela desnecessidade da intimação do devedor para a incidência da multa legal.[6]

Ernane Fidelis dos Santos também entende que o prazo para o pagamento se inicia a partir do trânsito em julgado da decisão.[7]

Araken de Assis, no mesmo entendimento ensina que o prazo estipulado pelo artigo 475-J do CPC é um “prazo de espera” em que o credor não pode promover a execução e sim esperar o cumprimento voluntário da obrigação. O prazo, segundo este doutrinador, começa a fluir a partir da data em que houve a exigibilidade da obrigação, ou seja, quando não couber mais recurso ou se o recurso interposto não tiver efeito suspensivo. Se a decisão judicial for ilíquida, o prazo somente flui a partir da decisão em que a tornar líquida, desde que transitada em julgado ou seus efeitos não tiverem sido suspensos.[8]

Cumpre ressaltar que, embora os autores acima citados entendam que é desnecessária a intimação do executado para que comece a fluir o prazo de quinze dias para a incidência da multa, eles se diferem em um ponto. Humberto Theodoro Júnior entende que somente começa a fluir o prazo a partir do trânsito em julgado da decisão, de forma que somente há a multa de 10% nas execuções definitivas. Araken de Assis, ao contrário, amplia sua incidência para as execuções provisórias também, esclarecendo que somente será possível tal imposição se o recurso interposto contra a decisão não era dotado de efeito suspensivo.

Nelson Nery Júnior integrando a maioria da doutrina, em uma terceira corrente, entende que a intimação do devedor é imprescindível para o início do prazo, mas poderá ser feita na pessoa do advogado e de ofício pelo juiz:

“O devedor deve ser intimado para que, no prazo de quinze dias a contar da efetiva intimação, cumpra o julgado e efetue o pagamento da quantia devida. A intimação do devedor deve ser feita na pessoa de seu advogado, que é o modo determinado pela Reforma da L 11.232/05 para comunicação do devedor na liquidação de sentença e na execução para cumprimento da sentença.”[9]

Fredie Didier Júnior entende no mesmo sentido que Nelson Nery:

“Parece que a melhor interpretação é a que exige a intimação do devedor, que pode ser feita pela imprensa oficial, dirigida ao seu advogado, consoante a tendência que se vem firmando em nosso ordenamento (p. ex: arts. 57, 316, 475-A, §1º, 475-J, §1º, 659, §5º etc).”[10]

Este doutrinador continua, solucionando o problema em que o executado sabendo da necessidade de sua intimação para a incidência de multa por má-fé desconstitui seu patrono logo após finda a fase de conhecimento. Neste caso, provada a má-fé pode aplica-se a sanção prevista no artigo 18 do CPC e o determinado no art. 39, parágrafo único em que é válida a intimação ocorrida no endereço indicado nos autos se ocorrida a mudança não houve comunicação.[11]

Rolf Madaleno também ensina que é necessária a intimação do devedor, podendo ser na pessoa do advogado, não apenas para dar inicio ao prazo de quinze dias para a incidência da multa, mas também para “dar cumprimento ao julgado e efetividade à sentença condenatória.” [12]

Maria Berenice Dias, no entanto, partidária de uma terceira corrente na doutrina, entende que é necessária a intimação do réu para a incidência da multa prevista no artigo 475-J do CPC:

“Porém, indispensável a intimação do réu. Não há como pretender que ele, no prazo de 15 dias contados da intimação da sentença, compareça espontaneamente em juízo e deposite o valor que entenda devido para não ficar sujeito à multa. Precisa ser intimado pessoalmente para ser constituído em mora. Só então começará a fluir o prazo para o cumprimento da sentença. A intimação serve também para dar ciência ao devedor da incidência da multa, caso não proceda ao pagamento no prazo de 15 dias. Não basta a intimação de seu procurador. Descabido impor-lhe o ônus de procurar seu cliente para que ele faça o pagamento.”[13]

Respeitados os entendimentos em sentido contrário, percebe-se que o objetivo do legislador não foi manter a antiga citação do executado para pagar ou nomear bens a penhora estabelecida na execução por quantia certa contra devedor solvente revogada. O procedimento do cumprimento de sentença veio com o intuito de acelerar o processo pela busca da satisfação do devedor, sem ferir o devido processo legal e com ele o contraditório. O cumprimento de sentença, como o próprio nome diz, parte de uma sentença de um processo de conhecimento a quem foi garantido o devido processo legal e a publicidade das suas decisões. O obrigado tem conhecimento do dever que lhe é imposto desde a intimação da sentença, de forma que não é razoável impor ao credor uma nova espera com um novo ato de intimação pessoal. Isso se justifica ainda mais na ação de alimentos que o obrigado sabe do seu dever de sustento a partir do reconhecimento da paternidade, sendo relembrado na intimação para o pagamento dos alimentos provisórios e na intimação da sentença final.

O Tribunal de Justiça de São Paulo já decidiu sobre a desnecessidade da intimação prévia do executado para a incidência da multa, tampouco de nova intimação, bastando a intimação da sentença e trânsito em julgado:

“Multa. Ação de cobrança. Cumprimento de sentença. Termo inicial. Trânsito em julgado da decisão judicial. Intimação do advogado acerca da decisão definitiva pela imprensa oficial. Ciência do causídico quanto à data do trânsito em julgado (trinta dias a partir da publicação). Dever de informar e alertar o cliente sobre as conseqüências da inércia no cumprimento espontâneo da obrigação. Interpretação do art. 475-J da Lei n. 11.232/05. Aplicação legítima da multa de 10% sobre o valor principal. Agravo de instrumento não provido, com fundamentos diversos.

Multa. Cumprimento da sentença. Título judicial ilíquido dependente de meros cálculos aritméticos. Desnecessidade de intimação para cumprimento da obrigação. Presença dos elementos necessários ao cálculo do valor devido. Exeqüibilidade da decisão judicial a partir do trânsito em julgado Interpretação do art. 475-J da Lei n. 11.232/05. Aplicação legítima da multa de 10% sobre o valor principal. Agravo de instrumento não provido, com fundamentos diversos. Dispositivo: Nega-se provimento ao recurso, com fundamentos diversos da decisão combatida, vencido o 2º Desembargador.[14]

Conclusão

Pode-se destacar que a lei nº 11.232 de 2005 que alterou a lei nº 5.869 de 1973 trouxe mudanças significativas para o cenário jurídico, de forma que a introdução da fase de cumprimento de sentença em processo de conhecimento bem como a revogação dos dispositivos relativos à execução fundada em titulo judicial trouxe auto-executividade às sentenças condenatórias, estabelecendo, inclusive, meios específicos de coerção ao cumprimento da obrigação.

Tal mudança visou eliminar a dualidade das ações, estabelecendo meios executivos no processo de conhecimento, melhorando, dessa forma, o desempenho processual e trazendo maior celeridade à busca da satisfação do credor, uma vez que se torna desnecessária a instauração de processo de execução autônomo nos títulos judiciais.

Nota-se, portanto, que essa alteração legislativa atendeu principalmente ao principio da celeridade processual, de sorte que eliminou etapas viciosas e injustificáveis do processo proporcionando, ao credor, maior rapidez na prestação jurisdicional.

Como já mencionado, o cumprimento de sentença é a denominação escolhida para a reforma da atividade processual dos títulos executivos judiciais. Com a nova lei, o credor fará um requerimento no processo de conhecimento noticiando a falta de pagamento voluntário, evitando, com isso, a necessidade do ajuizamento da ação de execução como ocorria na lei revogada.

A fase de cumprimento de sentença inicia-se a partir de uma sentença prolatada em processo de conhecimento a quem foi garantido os princípios constitucionais do contraditório e do devido processo legal. Intimado da sentença, o devedor já tem conhecimento da obrigação que lhe foi imposta, evitando, assim, a espera de um novo ato de intimação pessoal.

Por todo o exposto, diante da alteração legislativa que visou, sobretudo, acelerar o processo na busca na satisfação do devedor, sem deixar de observar os princípios constitucionais do contraditório e do devido processo legal, conclui-se pela desnecessidade da intimação prévia do executado para a incidência da multa. Atendendo ao princípio da celeridade processual, poderá no cumprimento de sentença haver desde já a busca pelo patrimônio do devedor, garantindo o contraditório para após a garantia do juízo.

 Com isso, busca-se evitar a demora e a ineficiência da justiça, gerados, principalmente, pela deficiência da organização e do aparelho burocrático do Poder Judiciário. Evitando o conservadorismo, surgem ao longo do tempo novas leis, capazes de simplificar procedimentos desnecessários e praxes viciosas que tornam o curso do processo lento e ineficaz, como a nº 11.232 de 2005, que longe de ser a solução para a morosidade da Justiça, trouxe melhorias ao processo executório especialmente na busca pela satisfação do credor.

 

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Notas
 
[1] In <www.camara.gov.br>. Acesso em 17-11-2011.

[2] Processo de Execução e Cumprimento de Sentença, p. 536.

[3] Rolf Madaleno, Direito de Família, p. 238.

[4] Op. cit., p. 572.

[5] Ibidem, p. 573.

[6] Resp. 954.859/RS, 3ªT, STJ, rel. min. Humberto Gomes de Barros, j. 16.08.2007, DJU 27.08.2007, p. 252, in Humberto Theodoro Júnior, Processo de Execução e Cumprimento de Sentença, p. 574.

[7] As Reformas de 2005 e 2006 do Código de Processo Civil, p. 57.

[8] Op. cit., p. 213-214.

[9] Código de Processo Civil Comentado e Legislação Extravagante, p. 733.

[10] Curso de Direito Processual Civil, p. 516.

[11] Ibidem, p. 516.

[12] Direito de Família, p. 239.

[13] Op. cit., p. 505.

[14] Agravo de Instrumento nº0117964-34.2011.8.26.0000, 19ª Câmara de Direito Privado, TJSP, des. Rel. Ricardo Negrão, j. 13-12-2011 in <www.tj.sp.gov.br> Acesso em 09-01-2012. 


Informações Sobre o Autor

Viviane Remondes Caruso

Defensora pública do Estado de São Paulo e pós-graduada em direito processual civil pela Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo.


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