Da desnecessidade de restituição dos valores ao INSS, em caso de desaposentação

O objetivo deste estudo é mostrar que a Previdência é superavitária e que os descontos previdenciários e as alíquotas são decorrentes de leis. Os trabalhadores, empregadores e os aposentados que voltam ao trabalho têm suas alíquotas ali estabelecidas.[1]


Para comprovar que não há nenhuma razão para a devolução dos valores recebidos a título de aposentadoria por ocasião da desaposentação, demonstraremos, com exemplo extraído de um caso concreto, que a posição de quem acredita que a devolução é necessária está equivocada e que os valores recolhidos para a Seguridade Social após a aposentadoria são suficientes para cobrir a diferença do valor do novo benefício durante anos.


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Não se vê ninguém dizendo que a Previdência Social está se locupletando à custa dos segurados em razão da contribuição compulsória dos aposentados, mas se vêem entendimentos, de que ora discordamos, que asseguram que, se não houver devolução dos valores recebidos, haverá dupla onerosidade à Autarquia, o que de fato não procede.


A empresa recolhe 20% sobre a folha de pagamento que, somados à contribuição do empregado, que varia de acordo com a faixa salarial – 8%, 9% ou 11% – pode chegar a 31%.


Conforme estudos e censos demográficos, estima-se que até 2010 7,2 milhões de aposentados estarão de volta ao mercado de trabalho. Já estamos em 2008.


Utilizaremos números reais e não estimados, e ater-nos-emos aos 4,5 milhões de aposentados que, segundo os dados ali relatados, é o número de aposentados que já estão no mercado de trabalho.


Pois bem. Imaginem-se 4,5 milhões de aposentados trabalhando, recolhendo 8, 9 ou 11% para a Previdência Social, cujos empregadores recolhem 20% de cada um deles. Este valor é devolvido ao segurado de alguma forma? Há contraprestação por parte da Previdência Social? A quanto monta? Quanto dinheiro isto representa? E a questão mais importante: não há nenhuma contraprestação para o segurado que compulsoriamente recolhe para a Previdência Social após a aposentadoria.


Vejamos um caso concreto para ilustrar o entendimento acima exposto.


Determinado segurado obteve aposentadoria por tempo de contribuição (espécie 42) em 13/01/1998 e ainda permanece trabalhando na mesma empresa desde que se aposentou, continuando a recolher normalmente as contribuições previdenciárias, sempre pelo teto de contribuição, à alíquota de 11%. Sua Carteira de Trabalho comprova o contrato de trabalho ininterrupto e os demonstrativos de pagamento mensais mostram o recolhimento para a Previdência Social desde 1997, mesmo estando aposentado.


Durante estes 9 anos, 11 meses e 7 dias que sucederam a aposentadoria, a empresa também recolheu a sua alíquota, de 20%.


O segurado tinha, em 13/01/1998, quando se aposentou por tempo de serviço, 31 anos, 10 meses e 22 dias de contribuição ao RGPS que, somados aos 9 anos, 11 meses e 7 dias – cômputo da data da aposentadoria até a data de ingresso com a ação judicial – totalizam 41 anos, 9 meses e 29 dias continuamente contribuindo ao RGPS.


Elaborado o cálculo da nova RMI (Renda Mensal Inicial)[2] constatou-se que o segurado deveria estar recebendo, a título de aposentadoria, a importância de R$ 2.254,79 (dois mil, duzentos e cinqüenta e quatro reais e setenta e nove centavos), uma vez que continuou contribuindo, mesmo após a aposentação, sempre pelo teto.


Apesar disso, o segurado recebe atualmente a importância de R$ 1.468,60 (um mil quatrocentos e sessenta e oito reais e sessenta centavos) a título de aposentadoria por tempo de contribuição, apurando-se uma diferença mensal em seu orçamento de R$ 786,19 (setecentos e oitenta e seis reais e dezenove centavos).


Voltando à linha aqui traçada, o segurado recolhe hoje, considerando o teto de contribuição de R$ 3.038,99, conforme tabela abaixo[3], a importância de R$ 334,29 mensalmente, à alíquota de 11%.

























Tabela de Contribuição dos Segurados Empregado, Empregado Doméstico e Trabalhador Avulso, para Pagamento de Remuneração a partir de

1º de Março de 2008


Salário de Contribuição (R$)


Alíquota para fim de recolhimento ao INSS (%)


até R$ 911,70


8,00 %


de R$ 911,71 a R$ 1.519,50


9,00 %


de R$ 1.519,51 até R$ 3.038,99


11,00%


Portaria MF/MPS nº 77, de 12 de março de 2008

Teto de Contribuição para o INSS: R$ 334,29



Como o segurado sempre recolheu pelo teto, imagine-se o valor de R$ 334,29 multiplicado por 119 meses (equivalentes a 9 anos e 11 meses) + 20% do empregador, no valor de R$ 607,79 mensais.


São R$ 607,79 + 334,19 X 119 meses (a grosso modo, pois os valores teriam que ser atualizados mês a mês, de acordo com o teto de contribuição de cada período). Desse simples cálculo obtivemos o valor de recolhimento de R$ 112.095,62.


Considerando ainda que a diferença entre o benefício atual do referido segurado e o benefício pretendido é de R$ 786,19, verificamos que o valor arrecadado, já em poder dos cofres da Previdência, é suficiente para pagar o segurado por cerca de mais 11 anos, sem contar a atualização monetária, a idade avançada e a expectativa de vida e ainda sem atentar para o fato de que o segurado continua e continuará trabalhando e contribuindo por tempo indeterminado.


Ora, como ainda pode-se dizer que a desaposentação onera duplamente a Previdência? Não há como concordar com esta posição. Este valor hipotético, simulado apenas para ilustrar, foi arrecadado pela Previdência e jamais será devolvido ao aposentado, senão pela desaposentação.


Eis as formas possíveis de receber a contraprestação da Previdência: por meio do Poder Judiciário, ajuizando uma Ação de Desaposentação, ou regulando a matéria no Congresso Nacional.


Imagine-se ainda que mais de 4 milhões de segurados podem estar na mesma situação ou em situação similar. Quanto isso representa atualmente para os cofres públicos?


Não há necessidade de devolução de valores, pois o novo cálculo é resultado de um novo período de contribuições para a Previdência Social. Agrega-se ao tempo recolhido no passado um novo período, cujos descontos previdenciários já foram efetivados, bem como os recolhimentos patronais. Não há nenhuma insegurança nisso.


No caso da desaposentação visando aposentadoria em outro regime previdenciário, o entendimento é pela não-devolução, como no exemplo do julgado abaixo transcrito de CASTRO E LAZZARI, em que se afirma:


“Entendemos que não há necessidade da devolução dessas parcelas, pois não havendo irregularidade na concessão do benefício recebido, não há o que ser restituído. Como paradigma, podemos considerar a reversão, prevista na Lei nº 8.112/90, que não prevê a devolução dos proventos percebidos.”


Levando-se em consideração a reversão prevista na Lei 8.112/90, a analogia com o instituto da desaposentação é válida, pois em ambos os casos a restituição é indevida, em razão da renúncia ao benefício.


Outra razão que sustenta a não-devolução é o caráter alimentar do benefício previdenciário.


O entendimento pela não-devolução dos valores é quase pacífico em alguns tribunais:


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“PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA PELO REGIME GERAL DA PREVIDÊNCIA SOCIAL – RENÚNCIA. CONTAGEM DE TEMPO PARA FINS DE APOSENTADORIA ESTATUTÁRIA. POSSIBILIDADE. CONCESSÃO DE CERTIDÃO DE TEMPO DE SERVIÇO. ART. 96, INC. III, DA LEI 8.213/91. REMESSA OFICIAL TIDA POR INTERPOSTA. 1. Remessa oficial, tida por interposta de sentença proferida na vigência da Lei nº 9.469, de 10 de julho de 1997. Não incide, na hipótese, o § 3º do artigo 475 do CPC, tendo em vista que a sentença não se fundamentou em jurisprudência do plenário ou súmula do Supremo Tribunal Federal, ou tribunal superior competente. 2. O art. 96, inc. III, da Lei 8.213/91 impede a utilização do mesmo tempo de serviço para obtenção de benefícios simultâneos em sistemas distintos, e não da renúncia a uma aposentadoria e concessão de certidão de tempo de serviço para obtenção de aposentadoria estatutária. 3. Inexiste vedação a renúncia de benefício previdenciário e conseqüente emissão de contagem de tempo de serviço para fins de averbação desse período junto a órgãos públicos, a fim de obter-se aposentadoria estatutária, por mais vantajosa, sem que o beneficiado tenha que devolver qualquer parcela obtida em decorrência de outro direito regularmente admitido, conforme pacífica jurisprudência. Precedentes (EIAC 2000.34.00.029911-9/DF, RESP 692.628/DF e RMS 14.624/RS). 4. O exame da questão incide sobre direito subjetivo do autor, não importando aumento de vencimentos ou extensão de vantagens a servidores públicos sob fundamento de isonomia, vedados pela Súmula nº 339 do Supremo Tribunal Federal. 5. Apelação a que se nega provimento. (AC 2002.34.00.006990-1/DF, 2ª Turma do TRF 1ª Região, Des. Aloísio Palmeira Lima, Publicação 26/04/2007, p. 15)”


“PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. INEXISTÊNCIA DE NULIDADE DA SENTENÇA. SUSPENSÃO DA APOSENTADORIA PARA EXERCÍCIO DE ATIVIDADE LABORAL COM RETRIBUIÇÃO MAIS VANTAJOSA. POSSIBILIDADE. 1. “Somente a ausência de  fundamentação, não ocorrente na espécie, é que enseja a decretação de nulidade da sentença com base no art. 458, II, não a fundamentação sucinta.” (RESP 255271/GO, rel. Min. CESAR ASFOR ROCHA). 2. O segurado tem direito de, a qualquer momento, obter a suspensão do pagamento da aposentadoria a fim de perceber vencimento de atividade laboral mais vantajosa. 3. Essa renúncia temporária aos proventos resguarda os interesses da pessoa humana e independe da aquiescência da Autarquia Previdenciária. 4. Apelação e remessa oficial não providas. (AC 1999.01.00.046460-6/DF, 2ª Turma TRF1, Juiz Federal (convocado) Carlos Alberto Simões Tomaz, DJ 09/06/2005, p. 64)”


O Judiciário tem contemplado as ações que visam a DESAPOSENTAÇÃO com sentenças procedentes, em sua grande maioria, e existem decisões favoráveis no STJ (Superior Tribunal de Justiça). Portanto, a restituição dos valores percebidos deixará de ser obstáculo à desaposentação. Pode-se porém optar pelo pedido de procedência da ação constante no modelo de Petição inicial  inserido no item 7 do Capítulo V – QUESTÕES PROCESSUAIS, em que é condicionado à não-devolução de qualquer valor.


 


Notas:

[1] Texto extraído do livro: Nova Aposentadoria, Silmara Londucci, Cleber Verde e Abel Magalhães, Ed. Baraúna, São Paulo, 2008.

[2]  Vide Capítulo V – Questões Processuais – 6 – Cálculo da desaposentação.

[3]  Fonte: http://www.centropaulasouza.sp.gov.br/crh/Sapp/Tabelas/tabela_inss.htm.


Informações Sobre os Autores

Cleber Verde Cordeiro Mendes

Deputado Federal, Servidor Público Federal – Gerente Executivo do INSS, Integrante da Comissão de Direitos Humanos e Minorias no Congresso Nacional, Integrante da Comissão de Seguridade Social e Família – Congresso Nacional, Coordenador da Frente Parlamentar em Defesa dos Aposentados e Pensionistas

Abel Magalhães

Bacharel em Ciências Contábeis pela Faculdade São Luis (1983), Advogado atuante na área previdenciária e trabalhista em São Paulo e Acadâmico em Economia pela Faculdade São Luis, São Paulo

Silmara Londucci

Advogada atuante na área previdenciária, trabalhista e cível em São Paulo, graduada em Direito em 2000. Pós-Graduanda em Direito Público e Direito Empresarial pela Faculdade de Direito Damásio de Jesus – Complexo Jurídico Damásio de Jesus, São Paulo


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