O presente trabalho tem por escopo demonstrar uma nova forma de extinção da punibilidade dos denominados crimes de natureza fiscal, em decorrência da prescrição tributária prevista no art. 174, do Código Tributário Nacional, cujos efeitos residem no art. 156, V, do mesmo diploma legal.
Diferentemente do fenômeno que ocorre com a “prescrição” no Direito Civil, que fulmina apenas o direito de ação, mas permanecendo o direito material, seja o crédito ou uma outra obrigação a ser cumprida, no Direito Tributário referido instituto (prescrição) tem um alcance sinalagmático, ou seja, atinge tanto o direito de ação, quanto também é causa de extinção do crédito tributário, conforme se percebe da regra inserta no art. 156, V, do CTN, in verbis:
“Art. 156. Extinguem o crédito tributário:
I – o pagamento;
II – a compensação;
III – a transação;
IV – remissão;
V – a prescrição e a decadência;”
Pois bem. Feitas estas digressões iniciais, passa-se à análise do bem tutelado pelo direito penal tributário. Embora a doutrina aponte cerca de quatro ou cinco bens jurídicos que são tutelados pelo direito penal tributário, só um merece relevo, qual seja, aquele que prevê a proteção ao adimplemento da suposta obrigação tributária emanada do fato jurídico tributário, popularmente conhecido como “fato gerador”.
E porque referida carga protecionista se encontra neste bem? Devido ao fato de ser a arrecadação a fonte secundária de maior destaque para mantença do Estado. Tanto assim o é que os núcleos-tipo dos delitos tributários quase sempre indicam, de forma direta ou transversa, as condutas “suprimir ou reduzir” o pagamento de tributo.
No entanto, a partir do entendimento traçado no julgamento pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no HC 81.611/DF, firmou-se que para que reste caracterizada a existência dos crimes previstos na Lei nº 8.137/90, precisamente os elencados no art. 1º, que é inarredável o exaurimento da via administrativa para formação do crédito tributário, e diante de tal situação se possa identificar o quantum debatur suprimido ou reduzido pelo suposta conduta incidentalmente delitiva praticada pelo contribuinte.
Outrossim, tem entendido o Superior Tribunal Justiça que a “decadência” é causa impeditiva da propositura e manutenção da ação penal nesta espécie de delito, haja vista a impossibilidade de se exigir o cumprimento do suposto crédito tributário, que inclusive sequer chegou a ser constituído.
Abaixo se transcreve aresto prolatado no REsp 789506 / CE, que trata do tema acima exposto:
RECURSO ESPECIAL. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. AÇÃO PENAL. CRÉDITO FISCAL. DECADÊNCIA. IMPOSSIBILIDADE DE LANÇAMENTO. CRIME MATERIAL. FALTA DE JUSTA CAUSA. TRANCAMENTO. PRECEDENTES. 1. Os crimes definidos no art. 1.º, da Lei n.º 8.137/1990, a teor do entendimento consagrado pelo Supremo Tribunal Federal, são materiais ou de resultado, somente se consumando com o lançamento definitivo do crédito fiscal. 2. Nesse contexto, decaindo a administração fiscal do direito de lançar o crédito tributário, em razão da decadência do direito de exigir o pagamento do tributo, tem-se que, na hipótese, inexiste justa causa para o oferecimento da ação penal, em razão da impossibilidade de se demonstrar à consumação do crime de sonegação tributária. 3. Recurso desprovido. (grifei)
Neste diapasão, há de se considerar que a prescrição prevista no art. 174, do CTN, gera o efeito extintivo do crédito tributário, conforme vaticina o art. 156, V, do mesmo diploma legal, que por sua vez obsta a Administração Fazendária de exigir o pagamento do tributo (crédito tributário).
Desta forma, o fato da Administração Fazendária quedar-se inerte na perseguição do crédito tributário pela via da ação executiva, deixando que se opere o instituto da “prescrição”, por si só, é causa a justificar a “extinção da punibilidade dos crimes da Lei nº 8.137/90”, dada à impossibilidade de se exercer a cobrança judicial forçada, e com isso fulminando a suposta relação jurídica existente.
Sobre a extinção da relação jurídica entre contribuinte e Fisco em razão de ter se operado o instituto da prescrição, colaciona-se a seguir, recente acórdão do Egrégio Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul na Apelação Cível neste sentido, in verbis:
NÚMERO: 70021393665 Inteiro Teor Decisão: Acórdão. RELATOR: Henrique Osvaldo Poeta Roenick. EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. EXECUÇÃO FISCAL. IPTU. PRESCRIÇÃO. ENFRENTAMENTO DE OFÍCIO. POSSIBILIDADE. No direito tributário a prescrição extingue o próprio crédito, conforme regra do art. 156, V, do CTN (relação material tributária). E por extinção do crédito tributário, resta extinta a própria obrigação tributária (art.113, § 1.º, do CTN). Assim, possível reconhecer de ofício a prescrição em sede tributária, pois extinta está à própria relação de direito.(grifei) DATA DE JULGAMENTO: 12/12/2007. PUBLICAÇÃO: Diário de Justiça do dia 08/01/2008
Contudo, para que não paire dúvida a respeito da tese aqui defendida, é importante destacar o fato de que dispõe o contribuinte do direito potestativo de pagar o suposto crédito “a qualquer tempo”, por óbvio antes do cumprimento da pena, e se ver livre da pretensão punitiva do Estado, interpretação que se extraí da dicção do § 2º, do art. 9º, da Lei nº 10.684 – de 30 de maio de 2003, abaixo transcrito:
“Art. 9o É suspensa a pretensão punitiva do Estado, referente aos crimes previstos nos arts. 1o e 2o da Lei no 8.137, de 27 de dezembro de 1990, e nos arts. 168A e 337A do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, durante o período em que a pessoa jurídica relacionada com o agente dos aludidos crimes estiver incluída no regime de parcelamento.
§ 1o……
§ 2o Extingue-se a punibilidade dos crimes referidos neste artigo quando a pessoa jurídica relacionada com o agente efetuar o pagamento integral dos débitos oriundos de tributos e contribuições sociais, inclusive acessórios.”
Ademais, sobre a faculdade de o contribuinte pagar o suposto crédito tributário a “qualquer tempo”, livrando-se da pretensão punitiva, merece relevo o comentário publicado no informativo de jurisprudência do STF, sobre o voto do Ministro Joaquim Barbosa no julgamento HC 83414/RS como transcrito:
“O ministro Joaquim Barbosa observou, ainda, que com a edição da Lei 10.684/03, não é mais necessário pagar o tributo devido antes que se encerre o processo administrativo, “para que o cidadão não venha a ser processado criminalmente”.
Explicou que o parágrafo 2º do artigo 9º previu a extinção da punibilidade a partir da quitação dos tributos devidos, a qualquer tempo. O dispositivo estabelece que “extingue-se a punibilidade dos crimes referidos neste artigo quando a pessoa jurídica relacionada com o agente efetuar o pagamento integral dos débitos oriundos de tributos e contribuições sociais, inclusive acessórios”. (grifei)
Destarte, quedando-se inerte a Administração Fazendária a ponto de fazer com que se opere a prescrição tributária, e conseqüentemente a extinção do suposto crédito tributário, havendo ação penal em curso para apuração da prática de delitos previstos na Lei nº 8.137/90, uma vez comunicado formalmente ao Juízo processante referido fato, deve este de imediato, extinguir o feito com fulcro nas disposições do art. 61, do Código de Processo Penal, pelos seguintes motivos: a um, por não mais existir crédito tributário a ser tutelado pelo direito penal tributário; a dois, pela impossibilidade do contribuinte pagar o que não mais existe e se ver livre da punição estatal; a três, pelo fato de ser também a prescrição, uma das causas de extinção do crédito tributário elencadas nos incisos do art.156, do Código Tributário Nacional.
Entretanto, o recebimento de crédito tributário extinto pelo instituto da prescrição é causa de enriquecimento sem causa, pois não existe previsão legal para que a Administração Fazendária receba crédito inexistente.
Todavia, de forma diversa, a insistência na manutenção da ação penal com intuito de reaver suposto crédito já extinto pelo instituto da “prescrição tributária”, é conduta caracterizadora do tipo previsto no art. 316, § 1º, do Código Penal (Excesso de Exação), o que é abominado pelo princípio da legalidade tributária.
Recife, 06 de janeiro de 2008.
Bacharel em História pela FUNESO-PE, Advogado e Pós-Graduado em Direito Tributário e Administrativo pela ESMAPE – Escola Superior da Magistratura de Pernambuco.
Como reverter um indeferimento do INSS? Para reverter um indeferimento do INSS, o segurado pode…
O auxílio-doença é um benefício pago pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) a trabalhadores…
A cirurgia bariátrica é um procedimento indicado para pessoas com obesidade grave que não obtiveram…
A recusa da seguradora em pagar a indenização prevista em contrato pode trazer uma série…
Entrar com uma ação judicial contra uma seguradora pode ser um processo necessário quando há…
Quando uma seguradora se nega a pagar a indenização que o segurado acredita ter direito,…