Dyego Macedo Albuquerque
RESUMO: O presente estudo busca apresentar temas doutrinários e jurisprudenciais relevantes sobre concursos públicos, de modo a compilá-los em uma lei geral de concursos públicos, a fim de coibir práticas arbitrárias de bancas examinadoras e da administração pública. Recorreu-se às obras dos autores Celso Bandeira de Melo, (2002), Di Pietro (2006), Dantas (2015), Matheus Carvalho (2019), bem como foram apresentadas jurisprudências dos tribunais superiores. Nesse sentido, como forma de garantir o princípio da isonomia e da legalidade, conclui-se pela necessidade de uma lei regulando temas recorrentes e controvertidos relativos a concursos públicos.
Palavra-chave: Lei. Concurso público. Administração pública. Banca examinadora.
Abstract: The present study seeks to present doctrinal and jurisprudential themes relevant to procurement, in order to compile them into a general law on procurement, in order to restrain arbitrary practices of examining boards and public administration. We used the works of authors Celso Bandeira de Melo (2002), Di Pietro (2006), Dantas (2015), Matheus Carvalho (2019), as well as were presented precedents of higher courts.
Keywords: Law. Public Tender. Public administration. Examination Board.
Sumário: Introdução. 1. Da isonomia e da impessoalidade aplicados aos concursos. 2. Do direito à nomeação. 3. Da preterição de candidatos. 4. Do controle de legalidade das questões de prova. 5. Temas diversos. Conclusão. Referências
Introdução
Este artigo aborda a temática dos concursos públicos relativos ao direito à nomeação, ao controle de legalidade pelo judiciário sobre as questões de provas e outros temas recorrentes nos tribunais, tais como, a existência de cláusula de barreira, o exame psicotécnico, a investigação social, a restrição à tatuagem e a motivação do gabarito das questões.
Em virtude do vazio legislativo referente ao tema, os tribunais pátrios possuem grandes demandas judiciais relativas aos concursos públicos, dentre elas, os requerimentos para pleitar a nomeação, em razão da inércia da Administração em nomear ou pela preterição de candidatos aprovados; a alteração de gabarito em questões objetivas ou subjetivas; questionar as cláusulas de barreira, o exame psicotécnico e a investigação social.
É necessária uma lei prevendo os casos em que a administração deve nomear. Atualmente, os tribunais superiores já se pronunciaram quanto ao direito subjetivo à nomeação de candidatos aprovados dentro do número de vagas, bem como a nomeação de candidatos e a abertura de novo concurso, quando no prazo de validade do concurso anterior, e a preterição de candidatos aprovados por servidores temporários.
Além disso, algumas bancas examinadoras, por falta de norma regulamentadora, agem com arbitrariedade na correção de questões, adotando gabaritos flagrantemente não condizentes com a realidade jurídica, ou não embasados em doutrina majoritária ou jurisprudência dominante, bem como, no pior cenário, não apresentam a fundamentação do gabarito ou do espelho de correção.
Nesse sentido, diz Celso Antonio Bandeira de Melo “que o Princípio da Motivação impõe a administração Pública o dever de expor as razões de direito e de fato pelas quais tomou a providência adotada.” (Mello, Celso Antonio Bandeira, 2002).
O edital é a “lei” do concurso público, mas isso não retira da Administração e da banca examinadora o dever de agir em conformidade com a legalidade e com os princípios da administração pública. Daí a importância de uma lei regulamentando os parâmetros objetivos de avaliação e correção, com base em critérios legais, jurisprudenciais e em doutrina majoritária.
Nesses termos O objetivo desse artigo é mostrar a importância de uma lei geral de concursos públicos como forma de coibir práticas abusivas de bancas examinadoras e da administração pública e de garantir os direitos do candidato. Para alcançar tal objetivo, utilizou-se as obras de autores em direito administrativo, especialistas em concursos e artigos científicos publicados em meio eletrônico.
Primeiramente, é fundamental entender que a Constituição Federal de 1988 contém em seu art. 37, II, a necessidade de concurso público para preenchimento dos cargos ou empregos públicos. Assim, a Constituição primou pelo mérito pessoal, isonomia e impessoalidade administrativa como forma de acesso na administração pública.
A isonomia aplicada aos concursos públicos significa que todos têm acesso aos cargos e empregos públicos com condições iguais a todos, salvo quando a natureza do cargo exigir, desde que com previsão legal. Nesse sentido, o Supremo Tribunal Federal editou a súmula 638, que diz “que O limite de idade para a inscrição em concurso público só se legitima em face do art. 7º, XXX, da Constituição, quando possa ser justificado pela natureza das atribuições do cargo a ser preenchido”.
O entendimento acima estende-se em relação ao sexo, altura mínima, entre outras restrições.
Vale ressaltar que tais restrições somente devem ser estipuladas por lei, não sendo suficiente a previsão no edital do concurso.
Ademais, o art. 37, caput, da CF elenca um rol de princípios ligados à administração pública, dentre os quais encontra-se a impessoalidade, que visa garantir a obtenção de atos administrativos sem favoritismos ou questões pessoais. Ou seja, o concurso público visa selecionar candidatos em virtude de méritos pessoais, mediante provas ou provas e títulos.
Vistas as considerações iniciais quanto aos princípios constitucionais, faz-se necessário abordar o direito de nomeação.
Sabe-se que o Supremo Tribunal Federal já se manifestou sobre o tema, por meio da súmula 15, onde aponta que “Dentro do prazo de validade do concurso, o candidato aprovado tem direito à nomeação, quando o cargo for preenchido sem observância da classificação.” Além disso, o RE 837.311, rel. min. Luiz Fux, afirma que:
O surgimento de novas vagas ou a abertura de novo concurso para o mesmo cargo, durante o prazo de validade do certame anterior, não gera automaticamente o direito à nomeação dos candidatos aprovados fora das vagas previstas no edital, ressalvadas as hipóteses de preterição arbitrária e imotivada por parte da administração, caracterizada por comportamento tácito ou expresso do Poder Público capaz de revelar a inequívoca necessidade de nomeação do aprovado durante o período de validade do certame, a ser demonstrada de forma cabal pelo candidato. Assim, o direito subjetivo à nomeação do candidato aprovado em concurso público exsurge nas seguintes hipóteses:
I – Quando a aprovação ocorrer dentro do número de vagas dentro do edital;
II – Quando houver preterição na nomeação por não observância da ordem de classificação;
III – Quando surgirem novas vagas, ou for aberto novo concurso durante a validade do certame anterior, e ocorrer a preterição de candidatos de forma arbitrária e imotivada por parte da administração nos termos acima.
Assim, diferentemente do candidato aprovado dentro do número de vagas, o qual tem direito subjetivo à nomeação, o candidato aprovado fora do número de vagas (cadastro de reserva, por exemplo) tem mera expectativa de direito.
Contudo, de acordo com ministro Luiz Fux, se “o Estado manifesta inequívoco interesse, inclusive com previsão orçamentária, de realizar novo concurso, o que era mera expectativa de direito tornou-se direito líquido e certo”. Dessa forma, o candidato aprovado fora do número de vagas passa a ter direito subjetivo à nomeação quando: surgirem novas vagas durante a validade do concurso; houver interesse da administração em preencher tais vagas; houver preterição de candidatos de forma arbitrária; e houver disponibilidade orçamentária.
Quanto à preterição de candidatos, ocorre quando a administração convoca candidatos aprovados em novo concurso ou convoca, em caráter precário, novos servidores, quando permanece válido o concurso anterior. Na primeira hipótese, o julgado acima é claro no sentido de haver preterição de forma arbitrária e imotivada, uma vez que deve ser dada preferência aos candidatos aprovados no concurso anterior. Na segunda, existem vários julgados do STJ que apontam para ilegalidade de tal conduta. Isto é, confere aos candidatos preteridos direito líquido e certo à nomeação ao cargo pleiteado, conforme a seguir:
RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO PARA O CARGO DE PROFESSOR. CONTRATAÇÕES, A TÍTULO PRECÁRIO, DURANTE A VALIDADE DO CERTAME. CONVOLAÇÃO DA EXPECTATIVA DE DIREITO À NOMEAÇÃO E POSSE EM DIREITO LÍQUIDO E CERTO.
(…)
“RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO PARA O CARGO DE PROFESSOR. CONTRATAÇÕES, A TÍTULO PRECÁRIO, DURANTE A VALIDADE DO CERTAME. CONVOLAÇÃO DA EXPECTATIVA DE DIREITO À NOMEAÇÃO E POSSE EM DIREITO LÍQUIDO E CERTO. PRECEDENTES.
(…)
Nesse sentido, comprovada a existência de vagas e demonstrada a necessidade de pessoal, em razão da contratação temporária para exercício da função, surge o direito líquido e certo dos candidatos à nomeação, podendo ser manejada ação judicial visando à nomeação dos candidatos.
Nesse contexto, a nova lei elencaria em seu conteúdo as situações acima analisadas, quais sejam, os princípios constitucionais da isonomia e impessoalidade do concurso público, dentre outros; as hipóteses de exceção ao princípio da isonomia e o direito de nomeação dos candidatos, com as peculiaridades existentes.
Outro ponto crucial no estudo é o que trata do controle de legalidade pelo judiciário das questões de prova.
O STF, por meio do RE 632853/CE, com repercussão geral reconhecida, “fixou a tese de que os critérios adotados por banca examinadora de um concurso não podem ser revistos pelo Poder Judiciário”.
No mesmo sentido o STJ, no AgRg no AREsp: 187044 AL, ao afirmar que “restringe-se à averiguação da legalidade do procedimento, não sendo-lhe possível substituir a referida banca para reexaminar o conteúdo das questões formuladas, os critérios de correção das provas ou a resposta do gabarito final”.
Nota-se, então, que os tribunais superiores não examinam os critérios das bancas, a opção por determinada doutrina ou as questões jurisprudenciais controvertidas, mas somente se houver ilegalidade ou erros materiais. Desse modo, as bancas examinadoras possuem carta branca para certos abusos, tais como, adotar doutrina ou jurisprudência minoritária, quase desconhecida, ou isolada, ou adotar temas controvertidos na doutrina e na jurisprudência. Isso significa uma afronta à razoabilidade, uma vez que não é dado ao candidato adivinhar qual a corrente a banca adota como correta.
Não há ilegalidade, por si, em adotar entendimentos minoritários ou controvertidos, desde que previsto no edital, por meio de bibliografia adotada pelo examinador das matérias.
Nesse ponto, a nova lei facultaria à banca examinadora gabaritar como correta a alternativa com entendimento doutrinário e jurisprudencial majoritário, sem indicação de bibliografia, ou adotar quaisquer entendimentos, desde que seja dada ao candidato a oportunidade de conhecer a bibliografia adotada pela banca.
Dessa forma, a lei ampliaria substancialmente o controle judicial sobre o conteúdo das questões de concurso. O conteúdo das provas passaria a ser questão de legalidade, por expressa disposição da nova norma, e não de mérito, como alguns entendem ser atualmente.
Nesse aspecto, vale lembrar que o judiciário não exerce controle de mérito dos atos administrativos. Entretanto, a banca examinadora, contratada pelo poder público, não exerce mérito administrativo em relação ao conteúdo das questões. O mérito do ato administrativo do concurso público reside na conveniência ou oportunidade de abrir o concurso e de possibilitar o preenchimento de vagas pelos candidatos aprovados. O ato discricionário do concurso é caracterizado pelos elementos motivo e objeto. O motivo é a necessidade fática de contratação de pessoas para o serviço público e a autorização legal para tanto, enquanto o objeto é o próprio concurso. Portanto, o conteúdo das questões e os critérios adotados pela banca não se revestem de mérito administrativo, ao contrário, têm caráter de ato vinculado, pois devem estar de acordo com a lei, a doutrina e a jurisprudência.
Assim sendo, o edital de concurso público não tem o condão de elaborar questões em desacordo com a lei e a doutrina ou jurisprudência majoritária, bem como não outorga à banca examinadora a possibilidade de corrigir questões de cunho subjetivo com posições flagrantemente conflitantes, isoladas ou ilegais. A banca examinadora não tem o poder de decidir ser conveniente ou oportuno contrariar a lei e os entendimentos jurisprudenciais e doutrinários dominantes.
Existem, ainda, outros temas polêmicos afetos aos concursos públicos que a lei poderia regulamentar. Citam-se alguns: a existência de cláusula de barreira; o exame psicotécnico; a investigação social; a restrição à tatuagem; e a motivação do gabarito das questões.
O STF já decidiu que é constitucional as cláusulas de barreiras, conforme decisão no RE 635.739. Na ocasião, o ministro Gilmar Mendes afirmou ter amparo constitucional as regras restritivas em edital de concursos públicos, quando fundadas em critérios objetivos relacionados ao mérito do desempenho do candidato. Ou seja, é possível o edital do concurso limitar o acesso ao candidato que não atingiu um grau mínimo na etapa anterior. Nesse ponto, a lei poderia regulamentar os casos em que a cláusula de barreira não se aplicaria, tal como, a vedação à limitação de candidatos pela banca quando as vagas disponibilizadas no edital sejam inferiores à real necessidade da administração.
O exame psicotécnico também já foi alvo de análise pelo STF. A Súmula n. 686, que foi convertida em Súmula Vinculante n. 43, mantendo-se o teor: “Só por lei se pode sujeitar a exame psicotécnico a habilitação de candidato a cargo público”. Nesse sentido, é possível exigir esse tipo de exame quando há lei anterior assim determinando e desde que a natureza das atribuições do cargo o justifique. Além disso, não pode ser realizado segundo critérios subjetivos do avaliador, que resultem em discriminação dos candidatos, daí serem fundamentais a objetividade e a cientificidade. Nesse caso, a nova lei de concursos regulamentaria a matéria, dando concretude à súmula vinculante.
Semelhante é a questão da investigação social, que exige lei anterior de determinado cargo prever a avaliação social como uma das etapas para a seleção do candidato para o preenchimento do cargo público. No entanto, é necessário definir os critérios alvos da avaliação social. Nesse aspecto, o Supremo Tribunal de Justiça afirma que “a mera instauração de inquérito policial ou de ação penal contra o cidadão não pode implicar, em fase de investigação social de concurso público, sua eliminação da disputa”. No mais, injusto é o caso de um candidato que é eliminado somente porque o nome está inscrito nos órgãos de proteção ao crédito, como o Serasa e SPC, por exemplo. Portanto, a futura lei delimitaria as hipóteses em que caberia a investigação social, de modo a ser compatível com o princípio da presunção de inocência e razoabilidade.
Com relação à tatuagem, a Corte Suprema, no julgamento foi proferido no RE 898.450, estabeleceu a seguinte tese: “Editais de concurso público não podem estabelecer restrição a pessoas com tatuagem, salvo situações excepcionais, em razão de conteúdo que viole valores constitucionais”.
No que tange à motivação dos atos administrativos, é imprescindível que a administração justifique seus atos, apresentando as razões que o fizeram decidir sobre os fatos, com observância da lei.
No entanto, há na doutrina divergência quanto à motivação dos atos administrativos discricionários. Alguns entendem que a motivação cabe somente nos atos vinculados, enquanto outros entendem caber em qualquer tipo de ato, seja vinculado ou discricionário. O STF já se debruçou sobre o tema:
“EMENTA: DIREITO ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL.MANDADO DE SEGURANÇA. APREENSÃO DE VEÍCULO ESTACIONADO EM LOCAL PROIBIDO. TERMO DE APREENSÃO SEM DISPOSITIVOS LEGAIS. VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA MOTIVAÇÃO QUE REGE TODOS OS ATOS ADMINISTRATIVOS E DO DIREITO DA AMPLA DEFESA.NULIDADE DE ATO. REEXAME NÃO PROVIDO.DECISÃO UNÂNIME. 1-Termo de Apreensão sem constar os dispositivos que demonstram a infração cometida. Exigência necessária em virtude do direito que se tem em saber a motivação que gerou a imposição da penalidade. 2-Violação flagrante do princípio da motivação que rege todos os atos administrativos. 3-Reexame Necessário não provido. 4-Decisão Unânime. Processo: REEX 379915220068170001 PE 0037991-52.2006.8.17.0001; Relator(a): José Ivo de Paula Guimarães; Julgamento: 12/04/2012; Órgão Julgador: 8ª Câmara Cível; Publicação: 76.”
Por esse julgado, resta claro o posicionamento da Suprema Corte no sentido que todos os atos administrativos devem ser motivados. Di Pietro corrobora com esse entendimento, ao descrever que motivação é “a demonstração, por escrito, de que os pressupostos de fato realmente existiram.” (DI PIETRO, 2006). A importância dessa decisão reflete diretamente na motivação da banca examinadora do gabarito das questões.
Ora, o concurso público é um ato administrativo. Sendo assim, é dever da administração, na figura da banca examinadora, motivar seus atos. Isto é, motivar as razões que a levaram a adotar o gabarito ou o espelho de correção como correto. Não basta, desse modo, publicar o gabarito das questões. É necessário que a banca fundamente sua escolha, principalmente quando se trata de questões subjetivas e orais, em que é possível ao candidato apresentar entendimentos majoritários, minoritários ou controvertidos.
Aliás, a motivação dos atos administrativos efetiva o princípio da publicidade, possibilitando o controle do ato pela sociedade, bem como garante ao candidato ingressar com recurso, pois apontado pela banca examinadora a sua opção por uma alternativa como correta, permite ao recorrente melhores fundamentos para atacar tal escolha.
O advogado especializado em concurso público, Alessandro Dantas, em sua obra “Concurso público: controle das provas discursivas pelo Poder Judiciário”, defende que o poder das bancas não é irrestrito. Assim, as decisões da banca devem ser coerentes com a realidade dos fatos e com a doutrina e jurisprudência dominantes. Continua o autor ao afirmar que
ao corrigir uma prova discursiva a Banca Examinadora deverá motivar a nota atribuída ao candidato. Segundo a teoria dos motivos determinantes os fatos que servirem de suporte à decisão administrativa integram a validade do ato. Logo, enunciados os motivos que ensejaram a atribuição daquela nota, esta só será válida se as justificativas tiverem procedência. Isso quer dizer que o padrão de resposta deve refletir com precisão os conceitos consolidados das disciplinas avaliadas, não cabe a Banca Examinadora determinar o que é certo ou errado, mudando a realidade das coisas.” (DANTAS, 2015, pág.02).
Não há dúvida, portanto, que a falta de motivação do ato é passível de nulidade insanável, uma vez que atinge elemento de ato (forma) não objeto de convalidação. Ademais, a falsa motivação também pode gerar nulidade, de acordo com a teoria dos motivos determinantes, que, de acordo com Matheus Carvalho “ os motivos apresentados como justificadores da prática do ato administrativo vinculam este ato e, caso os motivos apresentados sejam viciados, o ato será ilegal” (Matheus Carvalho, 2019).
Vale comentar que parte da doutrina entende que a motivação é obrigatória apenas quando a lei impõe. Assim, sustenta José dos Santos Carvalho Filho que “só se poderá considerar a motivação obrigatória se houver norma legal expressa nesse sentido” (José dos Santos Carvalho Filho, 2009).
Nesse diapasão, a sugerida lei inovaria ao prever a obrigatoriedade de motivação do gabarito ou espelho de correção adotado pela banca, tanto em provas objetivas quanto em subjetivas, em consonância com o princípio da motivação previsto no art. 2º da Lei 9.874/99 (Lei do processo administrativo federal).
Conclusão
Por todo o exposto, percebe-se a imprescindível necessidade de uma lei que regulamente os concursos públicos, de modo a garantir os direitos do candidato. Os editais não podem ter um caráter de lei absoluta, muito menos infringir os dispositivos legais, doutrinários e jurisprudenciais.
A nova lei serviria de espelho das decisões sumuladas, do entendimento dominante nos tribunais superiores e da doutrina majoritária, a fim de consolidar os principais pontos relacionados aos concursos públicos e de desafogar o judiciário, uma vez que os candidatos não precisariam mais, em tese, recorrer ao judiciário para garantir seus direitos.
Em que pese as decisões judiciais servirem de orientação para prática dos atos administrativos, no Brasil, a lei possui papel psicológico fundamental na vida do cidadão, estabelecendo padrões de comportamento e de conduta coletiva. Sem falar no fato de que a lei tem o papel de coibir possíveis práticas abusivas das bancas examinadoras.
Assim, a lei conteria em seu bojo, dentre outras, as principais questões referentes aos concursos públicos, quais sejam, o direito de nomeação do candidato, o controle judicial das questões de prova, a existência de cláusula de barreira, o exame psicotécnico, a investigação social, a restrição à tatuagem e a motivação do gabarito das questões.
REFERÊNCIAS
CARVALHO, Matheus. Manual de Direito Administrativo. 6ª. Ed. Editora Juspodivm, 2019.
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 18. Ed. São Paulo: Editora Atlas, 2005.
DANTAS, Alessandro. Concurso público: controle das provas discursivas pelo Poder Judiciário. Revista Jus Navigandi, Teresina, ano 18, n. 3617, 27 maio 2013. Disponível em:. Acesso em: 6 dez. 2015.
MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo – 15. ed. – São Paulo: Malheiros, 2002. p. 70.
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, p.111.
ESTEVES, Hugo Campitelli Zuan. Jurisprudência precisa avançar para enfrentar questões de concursos públicos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5608, 8 nov. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/61838. Acesso em: 12 ago. 2019.
SILVEIRA, Sérgio de Figueirêdo. Preterição em face da contratação de temporários. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4350, 30 maio 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/33066. Acesso em: 13 ago. 2019.
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