Resumo: A presente pesquisa objetiva investigar alguns aspectos da relação do homem com o ambiente do trabalho, fazendo-se um contraponto do direito internacional dos direitos humanos à constitucionalização do direito ambiental no Brasil. Perquire-se a caracterização do meio ambiente do trabalho adequado, salubre e seguro como direito humano, mediante análise de robusta atuação jurídico-normativa da Organização das Nações Unidas (ONU) e da Organização Internacional do Trabalho (OIT). Posteriormente, verifica-se que os influxos teórico-valorativos do denominado “Direito Internacional do Meio Ambiente do Trabalho” contribuíram, decisivamente, para o reconhecimento e ulterior fortalecimento do direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado pela Carta Política de 1988. Neste contexto, apesar de o direito ao meio ambiente constituir-se, do ponto de vista jurídico, em direito uno, indivisível e interdependente, identifica-se, cristalinamente, o aspecto do meio ambiente do trabalho como “espécie” autônoma do “gênero” meio ambiente, frente a sua relevância e interrelação direta com outros direitos fundamentais, tais como a vida e a saúde, consonante os valores sociais do trabalho e da dignidade da pessoa do trabalhador.
Palavras-chave: Meio Ambiente do Trabalho; Constitucionalização; Direitos Fundamentais; Direitos Humanos.
Abstract: This research aims to investigate some aspects of man's relationship with the work environment, making a counterpoint of international law of human rights to the constitutionalization of environmental law in Brazil. Perquire the characterization of suitable work environment, safe and secure as a human right, through analysis of robust performance legal-normative of the United Nations (UN) and International Labour Organization (ILO). Later, shows that inflows of theoretical-valorative of the called the "International Law of the work environment" contributed decisively to the recognition and strengthening subsequent of the fundamental right to an ecologically balanced environment by the Policy Letter of 1988. In this context, although the right to environment constitute, the legal point of view, in the single right, indivisible and interdependent, identifies, crystal, the aspect of the work environment as standalone “kind” of the "gender" environment, compared to its direct relevance and interrelationship with other fundamental rights, such as life and health, in line with social values of labor and the dignity of the worker.
Keywords: Work Environment; constitutionalization; Fundamental Rights; Human Rights.
Sumário: Introdução. 1. Meio ambiente (gênero) e meio ambiente do trabalho: aspectos conceituais e doutrinários. 2. Do processo de internacionalização do meio ambiente sob o aspecto do meio ambiente do trabalho. 2.1. Precedentes históricos do processo de internacionalização dos direitos humanos sob a ótica do meio ambiente. 2.2. A evolução do direito ambiental sob a perspectiva do Direito Internacional Público e dos Direitos Humanos. 2.3. O surgimento do Direito Internacional do Meio Ambiente do Trabalho. 3. Da constitucionalização do Direito Ambiental sob o aspecto do meio ambiente do trabalho. 3.1. O meio ambiente do trabalho na Constituição Federal de 1988. 3.2. O direito fundamental ao meio ambiente do trabalho e a dignidade da pessoa do trabalhador. 3.3. A interdependência, indivisibilidade e inter-relação dos direitos fundamentais sob a ótica do direito ambiental do trabalho. Considerações Finais.
INTRODUÇÃO
No ano de 1972, a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano abriu o precedente para os Estados começarem a reconhecer o meio ambiente com o status de direito e dever fundamental, indispensável à condição satisfatória da vida, daí por que o apelo aos governos e aos povos para que reúnam seus esforços para preservar e melhorar o meio ambiente em benefício do Homem e de sua posteridade. Desta maneira, sob a perspectiva do sistema global de proteção internacional dos direitos humanos, desencadearam-se as primeiras tentativas de estabelecerem diálogos e de elaborarem diretrizes e políticas que resultaram na gradativa absorção de elementos ambientais pelo sistema jurídico, como bens a serem legitimamente protegidos.
No decorrer da pesquisa, debruça-se sobre o surgimento do Direito Internacional do Meio Ambiente do Trabalho, notadamente pelo estudo dos influxos normativos oriundos da Organização Internacional do Trabalho (OIT), agência especial da ONU, e que tem como missão primordial a promoção do trabalho decente e produtivo para homens e mulheres, em condições de liberdade, equidade, segurança e dignidade humanas. Neste sentido, como o homem-trabalhador passa boa parte da sua vida útil no ambiente laboral, faz-se mister a garantia jurídico-constitucional de um meio ambiente do trabalho adequado, salubre e seguro.
Neste contexto, após a evolução do direito ambiental sob a perspectiva internacional, inicia-se o seu processo de constitucionalização em diversos países do globo. No Brasil, a Constituição da República de 1988 constituiu-se no marco jurídico responsável pelo rompimento com os paradigmas históricos individualistas do Estado Liberal até então predominantes no país, transmudando-se para a compreensão do Estado Democrático de Direito – Estado Transformador – e, juntamente com este, a consagração de valores de respeito à dignidade humana, à solidariedade e ao desenvolvimento humano. Assim, em seu artigo 225, caput, reconheceu o direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado como bem comum de todo o povo brasileiro, bem como faz menção expressa ao meio ambiente do trabalho no seu artigo 200, inciso VIII.
Por conseguinte, a pesquisa investiga a existência do aspecto do “meio ambiente do trabalho” enquanto espécie autônoma do gênero “meio ambiente”, embora se reconheça, inequivocamente, que o meio ambiente deve ser encarado como direito humano fundamental indivisível e interdependente. Mas enfim, perscruta a indagação no decorrer da investigação: “E o que significa dizer que o meio ambiente do trabalho é um direito fundamental”?
1. MEIO AMBIENTE (GÊNERO) E MEIO AMBIENTE DO TRABALHO: ASPECTOS CONCEITUAIS E DOUTRINÁRIOS.
A denominação “meio ambiente” (milieu ambiant) surgiu pela primeira vez na obra Études progressives d’un naturalista, datada de 1835, pelo francês Geoffroy de Saint-Hilaire, e foi utilizada por Augusto Comte em sua obra Curso de filosofia positiva [1]. Carla Gomes afirma, no entanto, que a temática do meio ambiente somente veio à tona no mundo jurídico nos anos 70, e pelos piores motivos:
“O ambiente é um assunto que, pelas piores razões, entrou no mundo jurídico nos anos 70 do século passado e tem-se mantido “na moda” desde então. Debatem-se à saciedade problemas como a destruição da camada de ozono, a gestão da água potável, a desertificação dos solos, o desaparecimento de milhares de espécies, animais e vegetais. Realizam-se conferências, promovem-se manifestações, celebram-se convenções sobre protecção do ambiente. Criam-se Ministérios e serviços especializados com vista à prossecução de políticas de conservação da natureza, gestão de recursos naturais, de promoção dos valores ambientais. Não jonal, diário ou semanário, nem revista de actualidades que dispense uma rubrica sobre protecção do ambiente. Até a indústria cinematográfica se vem rendendo ao tema, com filmes mais intimistas (como Gorillas in the mist, 1989) ou mais populares (The day after tomorrow, 2004). Os juristas, na dupla qualidade de profissionais do Direito e de cidadãos, não lhe poderiam ser indiferentes” [2].
Por conseguinte, alguns Autores argumentam que a expressão “meio ambiente” seria redundante ou pleonástica, na medida em que a palavra “ambiente” já contém o sentido da palavra “meio”. José Afonso da Silva defende, contudo, a utilização da palavra composta “meio ambiente”, asseverando que se manifesta mais rica de sentido ao se expressar como conexão de valores do que a simplesmente a palavra “ambiente”. Desta forma, conceitua o meio ambiente como “a interação do conjunto de elementos naturais, artificiais e culturais que propiciem o desenvolvimento equilibrado da vida em todas as suas formas. A integração busca assumir uma concepção unitária do ambiente, compreensiva dos recursos naturais e culturais” [3].
Registra-se, ainda, que José Afonso da Silva apresenta no seu conceito de meio ambiente somente três aspectos, quais sejam: o meio ambiente artificial; o meio ambiente cultural e o meio ambiente natural. Assim, o meio ambiente do trabalho seria “espécie” do “gênero” meio ambiente artificial, embora o referencie com tratamento especial em face de ser o local onde se desenrola boa parte da vida do trabalhador [4].
Diferentemente, Celso Fiorillo defende a existência de quatro aspectos do meio ambiente, incluindo no rol o meio ambiente do trabalho, que é o “local onde as pessoas desempenham suas atividades laborais, sejam remuneradas ou não, cujo equilíbrio está baseado na salubridade do meio e na ausência de agentes que comprometem a incolumidade físico-psíquica dos trabalhadores, independentemente da condição que ostentem (homem ou mulheres, maiores ou menores de idade, celetistas, servidores públicos, autônomos etc)” [5].
Na mesma esteira, José Roberto Marques também defende a existência do meio ambiente do trabalho como aspecto do meio ambiente em apartado, e não somente englobado pelo aspecto do meio ambiente artificial. Afirma o Autor que “diante de inúmeros textos legislativos que insinuam e indicam a existência de um aspecto do meio ambiente, relativo ao trabalho, fundado em características próprias e não confundidas com as dos outros, não se pode negar que merece ser tratado separadamente, e não englobadamente com outro, embora todos os aspectos do meio ambiente sejam interdependentes” [6].
Portanto, apesar de didaticamente válida a divisão do meio ambiente, salienta-se que tal concepção deve compreender todo o conteúdo possível, ou seja, mediante o reconhecimento da interdependência e da interrelação entre todos os aspectos do meio ambiente e o ser humano, notadamente quando se trata de meio ambiente laboral [7].
Por sua vez, Fábio Fernandes, após elencar o conceito de diversos autores, afirma que o “meio ambiente de trabalho é, na verdade, o local de trabalho do trabalhador, podendo ocorrer em um meio ambiente artificial ou construído, ou mesmo em um ambiente natural, emboa sua ocorrência seja menos frequente, haja vista a existência, quase sempre, de alguma intervenção humana que possibilite a sua fruição” [8].
Adiante, Paulo Afonse Leme propõe a autonomia científica do Direito Ambiental, além de sua interdisciplinariedade com os demais ramos do Direito, conceituando ambiente como sendo “a expressão de uma visão global das intenções e das relações dos seres vivos entre eles e com seu meio, não é surpreendente que o Direito do Ambiente seja um direito de caráter horizontal, que recubra os diferentes ramos clássicos do Direito (Direito Civil, Direito Administrativo, Direito Penal, Direito Internacional), e um Direito de interações, que se encontra disperso nas várias regulamentações. Mais do que um novo ramo do Direito com seu próprio corpo de regras, o Direito do Ambiente tende a penetrar todos os sistemas jurídicos existentes para orientá-los num sentido ambientalista” [9].
Na perspectiva do direito ambiental econômico, Cristiani Derani afirma que o conceito de meio ambiente não se reduz ao ar, à água, à terra, ou aos demais elementos do meio ambiente físico ou facilmente perceptível. Defende ainda a Autora a visão antropocêntrica do meio ambiente, embora o homem não integre formalmente o seu conceito[10].
Em oposição à visão antropocêntrica defendida por Derani, registra-se a visão ecocêntrica do meio ambiente, ou seja, os seres humanos fazem parte da natureza e dela não são fundamentalmente diversos nem desvinculados. Fábio Fernandes afirma que “a visão ecocêntrica pode ser definida como o homem centrado em sua casa – oikos = casa em grego, ou seja, o homem centrado no todo ou no planeta como sua morada. […] Os adeptos dessa visão rejeitam a separação dualista entre ser humano e natureza, pois esta para eles possui um valor intrínseco, independente de sua utilidade ou malefício aos seres humanos. Apoiando-se nessa visão biocêntrica e ecocêntrica, os ecossistemas e a diversidade ecológica devem ser preservados em virtude deles mesmos” [11].
Por sua vez, Carlos Alberto Molinaro afirma que o ambiente é um “lugar de encontro” dos seres e das coisas, sendo, portanto, sujeito de direito, independentemente do sujeito que interroga sobre o direito, adotando uma posição denominada de “cosmocêntrica”. Aduz o Autor que “vivemos no universo que nos permitiu e nos permite existir” e, para a manutenção desta ordem equilibrada, exige-se a garantia do mínimo existencial e a vedação da degração ambiental, conjugação necessária para a mantença da sobrevivência humana [12].
Do ponto de vista legislativo, a Lei nº 6.938/1981, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, tratou definir meio ambiente no seu artigo 3º, inciso I, como “o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas” [13]. Nesta esteira, partindo do pressuposto do conceito legislativo, Cirlene Zimmermann conceitua o meio ambiente do trabalho enquanto espécie do meio ambiente, sendo o “conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química, biológica e psíquica (acréscimo indispensável por envolver relações humanas), que permite abrigar e rege a vida dos trabalhadores, ou seja, a conjunção de todos os fatores que interferem no bem-estar do obreiro” [14].
Registra-se, também, a conceituação do meio ambiente do trabalho (MAT) na jurisprudência do STJ, conforme explicita Élida Séguin:
“O STJ, julgando conflito de competência nº 16.243, São Paulo, conceituou o Meio Ambiente do Trabalho como o complexo de bens de uma empresa, objeto de diretos relativos à saúde e à integridade física dos trabalhadores. O MAT é formado pelo complexto de bens, instrumentos e meios, de natureza material e imaterial, de uma empresa e suas práticas de produção ante a normatização de determinadas atividades e suas repercussões no Meio Ambiente, ligado ao exercício de atividades produtivas, dentro e fora das paredes da empresa. Caracteriza-se por ser o local onde o ser humano exerce atividades produtivas, com ou sem vínculo empregatício. Mesmo visando o lucro e a competitividade, deve ter como objetivo a preservação ambiental e a integridade física, social e psicológica dos trabalhadores” [15].
Neste diapasão, após a sucinta análise conceitual do meio ambiente, quer seja no aspecto legal, jurisprudencial ou doutrinário, constata-se, inequivocamente, a existência do aspecto do “meio ambiente do trabalho”, enquanto espécie autônoma do gênero “meio ambiente”. Contudo, o meio ambiente deve ser encarado de forma indivisível e interdepedente, interagindo com o ser humano numa relação por vezes simbiótica, ou seja, implicando em uma interrelação íntima e obrigatória.
2. DO PROCESSO DE INTERNACIONALIZAÇÃO DO MEIO AMBIENTE SOB O ASPECTO DO MEIO AMBIENTE DO TRABALHO
2.1. Precedentes históricos do processo de internacionalização dos direitos humanos sob a ótica do meio ambiente
Na ordem dos precedentes históricos do processo de internacionalização dos direitos humanos têm-se o Direito Humanitário, a Liga das Nações e a Organização Internacional do Trabalho (OIT). Inicialmente, o Direito Humanitário, também denominado de Direito Internacional da Guerra, procurou fixar limites à atuação do Estado, na medida em que previa assegurados os direitos fundamentais aos militares postos fora de combate por motivos diversos (feridos, prisioneiros, dentre outros) e à população civil. Assim, configurou-se como a primeira expressão de cunho internacional que impunha limites ao poder Estatal em benefício da proteção humanitária, ainda que se tratasse de conflitos bélicos [16].
Por conseguinte, a Liga das Nações, criada após a 1ª Guerra Mundial, também mantinha o intuito de relativizar a soberania absoluta dos Estados em prol da proteção à paz e à cooperação entre os povos, tendo como preâmbulo de sua Convenção o que se segue: “As partes contratantes, no sentido de promover a cooperação internacional e alcançar a paz e a segurança internacionais, com a aceitação da obrigação de não recorrer à guerra, com o propósito de estabelecer relações amistosas entre as nações, pela manutenção da justiça e com extremo respeito para com todas as obrigações decorrentes dos tratados, no que tange à relação dentre povos organizados uns com os outros, concordam em firmar este Convênio da Liga das Nações” [17].
No entanto, do ponto de vista jurídico dos direitos sociais e trabalhistas, e, por via de consequência, com repercussões diretas no meio ambiente, sobretudo o ambiente do trabalho, o principal precedente histórico de internacionalização dos direitos humanos foi a criação da Organização Internacional do Trabalho (OIT) no ano de 1919, como parte do Tratado de Versalhes que pôs fim à 1ª Guerra Mundial [18]. Nada obstante, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) transformou-se, posteriormente, em uma Agência especial da Organização das Nações Unidas (ONU), que somente veio a ser constituída no ano de 1945, consolidando o processo de internacionalização dos direitos humanos no período pós-guerra [19].
Neste contexto, a OIT tem por missão promover oportunidades para que homens e mulheres tenham acesso a um trabalho decente e produtivo, em condições de liberdade, equidade, segurança e dignidade humanas, perpassando, por óbvio, na existência de um meio ambiente adequado e salubre [20]. Portanto, tais premissas erigidas pela OIT constituem-se em condição fundamental para a superação da pobreza; para a redução das desigualdades sociais; para a garantia da governabilidade democrática; para o desenvolvimento do direito ambiental e da economia, sustentavelmente harmônicos e correlatos [21]. Nesta esteira, Arnaldo Süssekind afirma que todos os programas de ação e medidas tomadas pela OIT no âmbito do domínio econômico devem ser apreciados do ponto de vista do progresso social e do bem-estar dos indivíduos [22].
2.2. A evolução do direito ambiental sob a perspectiva do Direito Internacional Público e dos Direitos Humanos
A matéria tratada no presente tópico diz respeito ao denominado “Direito Internacional dos Direitos Humanos” [23], distinguindo-se do Direito Internacional Público em geral, na medida em que “este busca tradicionalmente disciplinar relações de reciprocidade e equilíbrio entre Estados, por meio de negociações e concessões recíprocas que visam ao interesse dos próprios Estados pactuantes” [24], enquanto que aquele “objetiva garantir o exercício dos direitos da pessoa humana” [25].
Assim, o Direito Internacional dos Direitos Humanos surgiu em meados do século XX, em decorrência das atrocidades cometidas no decorrer da Segunda Guerra Mundial, emergindo da necessidade de reconstrução do valor dos direitos humanos como paradigma ético a orientar a Ordem Jurídica internacional. Nesta perspectiva universalista, evidencia-se o ser humano como indivíduo dotado de status de sujeito de direito internacional, conferindo-lhe direitos e obrigações no plano externo.
Outrossim, a reabertura internacional ao indivíduo é destacada por Canotilho, afirmando que, “não obstante a tradição de algumas dimensões internacionais na proteção dos direitos fundamentais, o direito internacional clássico considerava o «indivíduo» como «estranho» ao processo dialético-normativo deste direito. Hoje, a introdução dos standards dos direitos do homem no direito internacional – garantia e defesa de um determinado standard para todos os homens – obrigou ao desenvolvimento de um direito internacional individualmente (não estadualmente) referenciado. Para lá da proteção diplomática e da proteção humanitária, desenvolve-se uma teoria jurídico-contratual internacional da justiça, tendo por objetivo alicerçar uma nova dimensão de vinculatividade na proteção dos direitos do homem” [26].
Neste sentido, no atual processo histórico de humanização do Direito Internacional, Cançado Trindade afirma com propriedade na existência de verdadeira revolução jurídica de conteúdo ético impressa no Direito Público Interno que, “el reconocimiento de los individuos como sujetos tanto del derecho interno como del Derecho Internacional representa una verdadera revolución jurídica, a la cual tenemos para estar plenamente consciente de sus derechos, para – cuando necesario – enfrentar por sí mismo la opresión y las injusticias del orden establecido, y para construir un mundo mejor para sus descendientes, las generaciones futuras. Esta revolución jurídica viene, en fin, dar un contenido ético a las normas tanto del derecho público como del Derecho Internacional” [27].
Por outro giro, no que se refere ao início do caminho evolutivo do direito ambiental, Leila Devia comenta acerca do desenvolvimento do direito internacional ambiental, apresentando didaticamente o caminho percorrido do ponto de vista jurídico-histórico:
“Los orígenes de la protección ambiental internacional se sitúan a finales del siglo XIX. A esta etapa, buena parte de la doctrina la denomina ‘utillitarista’, ejemplo de ella es la Convención de París del 19 de marzo de 1902 sobre la protección de los pájaros útiles para la agricultura, que protege exclusivamente aquellas aves que benefician a la agricultura. Otro período que podemos clasificar en paisajístico y estético. En esta etapa se intenta proteger los espacios naturales y las riquezas biológicas, ejemplo de ello es el Convenio de Washington del año 1940 para la protección de la flora, la fauna y las bellezas panorámicas naturales en los países de América. En el tratado, se prevé lá creación de paques nacionales y la protección de especies de la fauna salvaje. Después de la Segunda Guerra Mundial, comienza la preocupación por la contaminación de los recursos naturales y culturales, ejemplo de ello, es el Tratado de Washington sobre la Antártida de 1959 y los primeros intentos para luchar contra la contaminación marina (Convenio de Londres, de 12 de mayo de 1954, para la prevención de la contaminación marina por hidrocarburos). Luego, entramos a una etapa que concibe al medio ambiente como patrimonio común y que afecta todos. La intensidad del sistema económico de producción y consumo produjo dos graves problemas, la contaminación global y las diferencias entre los países desarrollados y los países en vías de desarollo, en cuanto al abordaje legal e institucional y al financiameiento de la degradación ambiental” [28].
Adiante, Carla Amado Gomes afirma que “a atenção primeira às questões da protecção ambiental foi prestada no plano internacional, em virtude da crescente sensibilização dos Estados para a prevenção das situações de poluição transfronteiriça, especialmente marinha e atmosférica”[29]. Por conseguinte, tem-se a importância que tais problemas de resolução de conflitos ambientais de vizinhança tiveram para construção do marco jurídico regulatório do direito ambiental no plano internacional:
“À perspectiva de resolução de conflitos de vizinhança a que corresponderam estas iniciativas localizadas, sucedeu-se uma abordagem mais abrangente, com a aprovação, no ano de 1968, no seio do Conselho da Europa, de três importantes documentos relativos à protecção da água e do ar. A percepção global do problema ambiental – sobretudo na perspectiva da progressiva escassez de recursos no confronto com as previsões de crescimento demográfico nos países menos desenvolvidos – levou que o Conselho da Europa decretasse o ano de 1970 como Ano de protecção da Natureza, e justificou a convocação, em 1972, da Conferência de Estocolmo pela Assembleia Geral das Nações Unidas, acontecimento que constituiu a cimeira pioneira na abordagem para-mundial das questões da proteção ambiental” [30].
Destacando a importância da Conferência de Estocolmo da ONU para a internacionalização do direito ambiental, Fábio Fernandes adverte que até então, a questão ambiental ainda não se colocava como uma preocupação comum, da mesma maneira que era dada pouca atenção ao bem-estar ecológico. Nesta esteira, a segurança ecológica passou a ser uma das preocupações principais das Nações Unidas, assim como os temas da paz; dos direitos humanos; e do desenvolvimento equitativo. De forma precursora, a Conferência Ambiental de 1972 introduziu na agenda internacional a preocupação com o modelo tradicional de desenvolvimento econômico em detrimento do meio ambiente sustentável, sob pena de esgotamento completo dos recursos naturais, pondo em risco a vida no planeta [31].
No mesmo sentido, afirma José Afonso da Silva que “este novo direito fundamental foi reconhecido pela Declaração do Meio Ambiente, adotada pela Conferência das Nações Unidas, em Estocolmo, em junho de 1972, cujos 26 princípios constituem prolongamento da Declaração Universal dos Direitos do Homem” [32]. Portanto, além dos tradicionais direitos fundamentais clássicos do Estado Liberal, como a liberdade e a igualdade, identificou-se o surgimento de novos direitos, denominados de direitos de 3ª geração [33] ou direitos de fraternidade ou de solidariedade, dentre os quais o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado [34].
Norma Sueli Padilha também assevera que a proteção ambiental está indissociavelmente interligada aos direitos humanos, pois os problemas ambientais são multidimensionais, incluindo os aspectos humanos, que por sua vez, também são direta ou indiretamente afetados pelos danos ambientais. Nada obstante, registra a Autora a necessidade de diálogo entre o Direito e a Ecologia, haja vista que a proteção jurídica do meio ambiente não deve subsumir-se à visão limitada do antropocentrismo exacerbado. Neste sentido, o direito ao meio ambiente equilibrado, enquanto um direito de solidariedade, impõe o respeito e a proteção a todas as formas de vida, e não só a vida humana [35].
Adiante, advieram consequências positivas posteriores a Estocolmo-1972 para os novos rumos do Direito Ambiental, notadamente nas ações da Organização das Nações Unidas (ONU) [36], que, dentre outras medidas, veio a convocar, de 10 em 10 anos, novas Conferências mundiais dedicas à proteção do ambiente, gerando, por conseguinte, inúmeras Declarações e Acordos internacionais.
Inicialmente, destaca-se a Conferência do Rio de 1992, também denominada de ECO-92, que teve por missão precípua promover a elaboração e ratificação de um conjunto de instrumentos internacionais de proteção setorial do ambiente, traduzindo, portanto, em um novo “despertar” dos Estados desenvolvidos para as implicações da assunção indiscriminada de obrigações de proteção do meio ambiente. Neste sentido, Carla Gomes destaca as notórias diferenças de Estocolmo-72 e do Rio-92, principalmente no que se refere à coexistência entre meio ambiente e desenvolvimento econômico:
“À utopia de Estocolmo – que apresentava o desenvolvimento económico como veículo de promoção da qualidade ambiental (cf, princípio 08) – sucedia-se o realimos do Rio. Continuando embora a estabelecer uma estreita relação entre direito ao ambiente e direito à qualidade de vida, a Declaração do Rio conferiu ao primeiro um novo matiz, marcadamente economicista. […] O direito ao ambiente revela-se, assim, no plano do Direito Internacional, como um refém do desenvolvimento económico. […] É, por isso, forçoso concluir que a insustentável leveza da grande parte dos compromissos ambientais – muitos, tais como declarações e cartas de princípios de alcance mundial, incorporados em normas de sof law – , a volatilidade do “princípio do desenvolvimento sustentado”, o relativismo geográfico da efectividade da protecção do ambiente, aliados a uma posição jurídica intensamente permeável ao conceito metamorfoseante de “qualidade de vida”, põem em causa a seriedade da proclamação de um “direito ao ambiente” [37].
Silvia Coria destaca que a Rio-92 foi a primeira de uma série de conferências realizadas na década dos anos 90, demonstrando um novo enfoque de trabalho da ONU nas diversas matérias correlacionadas ao desenvolvimento sustentável. Afirma a Autora que, “entre ellas se destacan la Conferencia Internacional sobre Población y Desarrolo (El Cairo 1994). La Cumbre de Desarollo Social (Copenhagen 1995); la Cuarta Conferencia Mundial sobre Mujeres (Beijing 1995); y Hábitat II – la Cumbre de las Ciudades – que tuvo lugar en Estambul, Turquía, en Junio de 1996. Juntas ellas reflejan un cambio en las prioridades de la ONU hacia el desarrolo que ahora se centra en la gente y adopta criterios de sustentabilidad”[38].
Em seguida, destaca-se a Conferência de Joanesburgo no ano de 2002, também denominado de Rio +10 ou Cúpula mundial sobre o desenvolvimento sustentável, na África do Sul, com a participação de aproximadamente 190 países, onde se discutiu a implantanção e os resultados da Conferência Rio 92. Conforme afirma Fábio Fernandes, referindo-se aos resultados da Conferência de 2002, que “a cúpula, como um todo, foi tratada por jornalistas e ambientalistas como uma grande decepção, considerando os resultados que eram esperados pelas delegações dos países participantes” [39]. Nada obstante, “embora se tenha constatado que a melhora dos índices ambientais ao longo desse processo foi muito discreta, considera-se que a Rio 92 e a Rio +10 foram um marco importante para a proteção internacional do meio ambiente, pois além de chamar a atenção da opinião pública mundial para os problemas ambientais, deu novo impulso aos tratados e acordos internacionais sobre a matéria” [40].
Augusto Paz destaca a atuação da Comissão para o Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas (CDS) na Conferência Rio+10, afirmando a importância do seu papel político para o futuro exame do progresso de implementação da Agenda 21 na sua totalidade. Afirma o Autor que, “las presentaciones y las intervenciones enfatizaron que el proceso de evaluación de 2002 podría tener el potencial de incrementar el nivel de compromiso de los gobiernos y de los socios de la sociedad civil hacia el desarrolo sostenible. La CDS recomendó que este examen debía tener como resultado decisiones ejecutivas así como un nuevo y fortalecido compromiso y apoyo político al desarrolo sostenible” [41].
Em 2012, ocorreu no Brasil a recente Conferência Rio +20, destacando a participação efetiva dos trabalhadores, assim como dos seus sindicatos, para a promoção do desenvolvimento sustentável, especialmente em sua dimensão social, tendo o item nº 51 do seu documento final asseverado que, “Destacamos la importancia de la participación de los trabajadores y los sindicatos en la promoción del desarrollo sostenible. Como representantes de los trabajadores, los sindicatos son importantes asociados en la facilitación del logro del desarrollo sostenible, especialmente su dimensión social. La información, la educación y la capacitación en materia de sostenibilidad a todos los niveles, incluido el lugar de trabajo, son esenciales para reforzar la capacidad de los trabajadores y los sindicatos para apoyar el desarrollo sostenible” [42].
Por conseguinte, apesar de também criticada pelos tímidos resultados concretos, a Conferência Rio +20, ao contrário do que ocorreu na Conferência Rio 92, foi destacada pela intensa participação da sociedade civil, da iniciativa privada e de organizações ligadas à defesa do meio ambiente, principalmente em tempos de crise econômica internacional e de contenção de despesas dos respectivos governos signatários [43].
Em resumo, apesar de se constatar o caminho progressivamente virtuoso percorrido pelo direito ambiental no plano internacional sob o norte da dogmática do direito internacional dos direitos humanos, ainda se verifica “uma dialética entre apologia e a utopia, que se manifesta na oposição entre a soberania dos Estados e a sua responsabilidade comum de protecção do ambiente, entre a necessidade de salvaguardar as economias nacionais e os imperativos ecológicos planetários” [44].
2.3. O surgimento do Direito Internacional do Meio Ambiente do Trabalho
Atualmente, a sociedade organizada mundial almeja proteger o meio ambiente e os recursos naturais com normas de caráter interno e de caráter internacional. Reconhece-se a fragilidade que reveste o ambiente ante a crescente industrialização e o poderio da atividade econômico-financeira em busca de novos mercados transfronteiriços. Neste contexto, Gustavo Cassola Perezutti reforça a importância do surgimento do Direito Internacional do Meio Ambiente, afirmando que se trata de “conjunto de normas internacionales cuyo fin es la protección del meio ambiente en general, en caso de deterioro de los recursos naturales, aumento demográfico, impacto ambiental de las tecnologias peligrosas, modelos de producción y de consumo insostenibles, etcétera” [45].
Em uma visão prospectiva, a feliz nomenclatura ora utilizada – Direito Internacional do Meio Ambiente do Trabalho – revela gradativamente a importância do tema no cenário jurídico mundial, afirmando Fábio Fernandes “de maneira a se tornar, no futuro, senão em um ramo do Direito Internacional Público, ao menos assumindo um papel de proeminência no âmbito do Direito Internacional do Trabalho e no Direito Internacional do Meio Ambiente” [46].
Inicialmente, na gama de documentos internacionais que versam sobre a proteção do meio ambiente do trabalho, insurge-se a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, preconizando no artigo XXIII, item 01, que “Toda pessoa tem direito ao trabalho, à livre escolha de emprego, a condições justas e favoráveis de trabalho e à proteção contra o desemprego” (grifo acrescido) [47].
Por conseguinte, conforme já salientada a importância da Organização Internacional do Trabalho (OIT) nos tópicos anteriores desta pesquisa, reitera-se que tal instituição iniciou o processo de internacionalização do Direito do Trabalho e, consequentemente, espairando reflexos positivos no arcabouço jurídico-ambiental laboral. Neste sentido, destaca Florisbal de Souza Del’Olmo a intensa atuação normativa da OIT em prol do meio ambiente do trabalho, quer por meio de convenções ratificadas pelos Estados-membros (natureza coercitiva), quer por meio de recomendações (natureza sugestiva) [48].
Na mesma esteira, afirma Arnaldo Süssekin acerca do esforço de uniformização e universaliação das normas protetivas do trabalho promovido pela OIT. Assevera o Autor que “à Conferência Internacional do Trabalho, como Assembleia Geral da OIT, compete elaborar e aprovar as normas que constituem a regulamentação internacional do trabalho, da seguridade social e das questões que lhes são conexas, com a finalidade de fomentar a universalização da justiça social. Essa atividade normativa, que se instrumentaliza por meio de convenções e recomendações, é a principal razão de ser da Organização” [49].
No entanto, adverte Fábio Fernandes que “o princípio da soberania é a base fundamental das relações entre Estados e, portanto, do Direito Internacional. Sem a adesão ao tratado multilareal aberto, por ato soberano, o Estado não estará vinculado ao respectivo instrumento, o qual, obviamente, não poderá gerar, no plano interno, os direitos e obrigações estabelecidos em suas normas” [50]. Desta forma, verifica-se que as Convenções e Recomendações da OIT oferecem importantes subsídios para a formação de um Direito Internacional do Meio Ambiente do Trabalho, destacando-se que o Brasil já ratificou diversas convenções importantes, internalizando-as no direito pátrio [51].
Ademais, outro importante registro no âmbito da OIT ocorreu no ano de 1976, ou seja, a aprovação do Programa Internacional para melhorar as condições de Trabalho e Meio Ambiente de Trabalho (PIACT) [52], executado em sintonia com o Progama das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), propiciando a realização de estudos técnicos e científicos para a realização das vindouras Convenções [53]. Assim, assinalou Arnaldo Süssekind:
“[…] são amplos e variados os objetivos do PIACT, sendo que, além dos aspectos já referidos, presta assistência técnica direta a governos, organizações de empregadores e de trabalhadores e instituições de formação profissional para a elaboração e execução de programas de melhoria das condições e do meio ambiente de trabalho, preocupando-se, não apenas com a preservação de acidentes do trabalho e moléstias profissionais, mas também, com a adaptação do meio ambiente do trabalho às capacidades físicas e mentais dos trabalhadores, às formas de organização racional de trabalho e à ergonomia e às condições do meio onde vive o trabalhador (habitação, alimentação, saúde, educação, serviços sociais, lazer, etc.)” [54].
Por oportuno, destaca-se a Convenção nº 155 sobre a segurança e a saúde dos trabalhadores e meio ambiente de trabalho, realizada em Genebra no ano de 1981, composta por 22 artigos, onde se utilizou por 09 (nove) vezes a expressão “meio ambiente do trabalho” e por 04 (quatro) vezes o termo “local de trabalho”, demonstrando, portanto, a plena incorporação do conceito no âmbito internacional [55]. Na mesma direção, Anita Torres destaca que “a Convenção nº 155 veio ampliar o conceito de meio ambiente do trabalho para fins de segurança e saúde dos trabalhadores, sendo necessário considerar a agressão ao local de trabalho, proveniente do meio circunvizinho, como otros fatores, como a poluição do ar, gerada pelo estabelecimento industrial” [56].
Outrossim, Cirlene Zimmermann assente que “por meio dessas convenções, a OIT estabelece diretrizes mínimas em matéria de segurança e saúde dos trabalhadores, que devem ser buscadas pelos Estados interessados na proteção e na preservação do seu mais importante fator de produção: o ser humano trabalhador” [57]. Desta forma, o Direito Internacional do Meio Ambiente do Tralho ergue-se como elemento de coesão entre os direitos trabalhistas e o direito ambiental, irradiando argamassa principiológica e normativa para o fortalecimento do direito interno protetivo dos Estados.
3. DA CONSTITUCIONALIZAÇÃO DO DIREITO AMBIENTAL SOB O ASPECTO DO MEIO AMBIENTE DO TRABALHO
3.1. O meio ambiente do trabalho na Constituição Federal de 1988
Os influxos do Dirreito Internacional Ambiental e dos Direitos Humanos refletiram no âmbito do direito constitucional brasileiro a partir da promulgação da Constituição de Federal de 1988, que se consubstancioiu em um grande avançao na proteção jurídica do meio ambiente nacional [58]. Outrora, carecia ao direito ambiental brasileiro sistematização e integração das normas ambientais infraconstitucionais. Norma Sueli Padilha assevera:
“As Constituições brasileiras, anteriores ao texto constitucional de 1988, não lograram dar nenhum destaque ou importância a questão ambiental, não fazendo uma referência, sequer, ao “meio ambiente” de forma direta, tampouco demonstrando preocupação com relação a utilização irracional e degradadora de recursos ambientais, não dedicando ao meio ambiente, enquanto bem jurídico autônomo, qualquer proteção jurídica específica. […] |O passo decisivo para sistematização do Direito Ambiental Constitucional brasileiro foi realmente dado pela Constituição Brasileira de 1988, que, além de fazer referências explícitas e diretas em várias partes do texto constitucional, impondo deveres ao Estado e à sociedade, com relação ao meio ambiente dedicou-lhe um capítulo próprio (Capítulo VI) dentro da Ordem Social (Título VIII)” [59].
No mesmo sentido, magistrais são os ensinamentos de Antônio Herman Benjamim, mencionando o fenômeno da constitucionalização do ambiente e da ecologização da constituição brasileira:
“[…] A riqueza de “terra e arvoredos”, que surpreendeu e, possivelmente, encantou Pero Vaz de Caminha em 1500, finalmente foi reconhecida pela Constituição Brasileira de 1988, passados 488 anos da chegada dos portugueses ao Brasil. […] Na verdade, saltou-se do estágio da miserabilidade ecológico-constitucional, própria das Constituições liberais anteriores, para outro que, de modo adequado, pode ser apelidado de opulência ecológico-constitucional. […] É no artigo 225 que se encontra o núcleo principal da proteção do meio ambiente na Constituição de 1988. […] Não se pode esquecer que o artigo 225 é apenas o porto de chegada ou ponto mais saliente de uma série de outros dispositivos que, direta ou indiretamente, institutem uma verdadeira malha regulatória que compõe a ordem pública ambiental” [60].
Sucintamente, o meio ambiente agasalhado pela Carta Política de 1988 envolve seus diversos aspectos conceituais e doutrinários, quais sejam: a) aspecto natural (artigo 225); b) aspecto cultural (artigos 215 e 216); c) aspecto artificial (artigos 182 e 183) e aspecto do trabalho (artigo 200, VIII); todos possuindo regulamentação própria e institutos jurídicos diversos, apesar de complementares [61]. No entanto, além das normas constitucionais citadas e de outros dispositivos esparsos no texto constitucional, reitera-se a existência de diversos tratados internacionais ratificados pelo Brasil que versam, especificamente, sobre o meio ambiente, inclusive no aspecto do trabalho, constituindo-se, porteriormente, em direito interno mediante procedimento legislativo próprio, conforme já foi objeto de pesquisa em tópicos anteriores.
Adiante, Flávia Piovesan comenta tal inovação trazida pela Carta de 1988 acerca da inclusão dentre os direitos constitucionalmente protegidos aqueles que são enunciados nos tratados internacionais cujos Brasil é signatário, integrando o chamado “bloco de constitucionalidade”, de acordo com a norma elencada no §2.º, do art.5.º [62], caracterizada como cláusula constitucional aberta [63]. Igualmente, explana a Autora que, com o advento do §3.º, do art.5.º, da CF/88, por ingerência da Emenda Constitucional nº 45/2004, reiterou-se o entendimento de que todos os tratados internacionais de proteção aos direitos humanos são materialmente constitucionais, podendo, agora, acrescer a qualidade de formalmente constitucionais, equiparando-se às emendas à Constituição, no âmbito formal [64].
O aspecto do meio ambiente do trabalho foi formalmente erigido à categoria constitucional no artigo 200, inciso VIII, ao estabelecer que uma das atribuições do Sistema Único de Saúde consiste em colaborar na proteção do ambiente, nele compreendido o do trabalho. Depreende-se, portanto, a estreita relação entre meio ambiente laboral e a Seguridade Social, que compreende o direito à saúde, o direito à previdência social e o direito à assistência social [65]. No mesmo sentido, Arion Sayão Romita destaca que “a proteção ao meio ambiente do trabalho é, portanto, expressamente reconhecida pela Lei Maior como consequência da proclamação do direito à saúde” [66].
Ademais, também se verifica a nítida interdependência entre o meio ambiente do trabalho; a segurança e a medicina do trabalho; assim quanto aos direitos sociais trabalhistas, expressando-se através da imposição constitucional na redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança (artigo 7º, XXII) bem como na previsão do adicional de remuneração para as atividades penosas, insalubres ou perigosas, na forma da lei (artigo 7º, XXIII). Verifica-se, portanto, que “o ambiente do trabalho é protegido por uma série de normas constitucionais, expressas e implícitas, além de normas legais destinadas a garantir-lhe condições de salubridade e de segurança” [67].
Em uma visão ampliada, o ambiente externo em que vive e convive o trabalhador também deve ser considerado no conceito de Meio Ambiente de Trabalho (MAT), conforme registra Cirlene Zimmermann:
“O MAT, portanto, é qualquer local em que o homem exerce uma atividade laboral, em que sua força de trabalho se converte em fator de produção, motivo pelo qual até mesmo a residência do trabalhador, que foi transformada em lugar de trabalho em razão de algumas atividades trabalhistas modernas, envolvendo as inovações tecnológicas (teletrabalho), ou mesmo outras tarefas tidas por inferiores (como os serviços terceirizados de costura de sapatos, por exemplo), deve ser considerada no estudo do MAT” [68].
Tem-se a ilação, inequivocamente, que tal proteção qualificada é justificada pelo fato de que o meio ambiente do trabalho é o local onde se desenrola boa parte da vida do trabalhador, cuja qualidade de vida está intrinsecamente dependente à respectiva qualidade do meio ambiente de trabalho [69].
3.2. O direito fundamental ao meio ambiente do trabalho e a dignidade da pessoa do trabalhador
Inicialmente, perquire-se a diferenciação do que se entende doutrinariamente por “direito fundamental” e por “direiro humano”, a fim de se evitar impropriedade ou ambivalências linguísticas técnico-jurídicas. Desta forma, Fábio Konder Comparato afirma na possibilidade de aparente pleonamos da expressão “direitos humanos” ou “direitos fundamentais”, contudo adota a distinção elaborada pela doutrina jurídica germânica. Assim, os direitos fundamentais (grundrechte) “são os direitos humanos reconhecidos como tais pelas autoridades às quais se atribui o poder político de editar normas, tanto no interior dos Estados quanto no plano internacional; são os direitos humanos positivados nas Constituições, nas leis, nos tratados internacionais. Segundo outra terminologia, fala-se em direitos fundamentais típicos e atípicos, sendo estes os direitos humanos ainda não declarados em textos normativos” [70].
No mesmo sentido, Paulo Bonavides apresenta a seguinte indagação: “podem as expressões direitos humanos, direitos do homem e direitos fundamentais ser usadas indiferentemente?”. Em seguida, afirma o constitucionalista a ocorrência do uso promíscuo das expressões na literatura jurídica. Em suma, os direitos fundamentais são reconhecidos e qualificados como tal pelo respectivo direito vigente estatal, em regra, positivados no instrumento constitucional. Os direitos humanos seriam os direitos fundamentais no âmbito internacional, ainda não reconhecidos pelo direito interno. Por fim, os direitos do homem seriam a matéria prima dos futuros direitos fundamentais, ou seja, os direitos do homem livre e isolado, direitos que possui em face do Estado[71].
Por conseguinte, Antônio Enrique Perez Luño, após afirma que a nomenclatura “direitos fundamentais” surgiu da França no ano de 1770, através de movimento político-cultural que desembocaria na Revolução Francesa e na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789, discorre:
“La expressión há alcanzado luego especial relieve en Alemania, donde bajo el título de los Grundrechte se ha articulado el sistema de relaciones entre el individuo y el Estado, en cuanto fundamento de todo el orden jurídico-político. Éste es su sentido en la Grundgesetz de Bonn de 1949. De ahí que gran parte de la doctrina entienda que los derechos fundamentales son aquellos derechos humanos positivizados en las constituciones estatales. […] En todo caso, se puede advertir una cierta tendencia, no absoluta, a reservar la denominación “derechos fundamentales” para designar los derechos humanos positivados a nivel interno, en tanto que la fórumula “derechos humanos” es la más usual en el plano de las declaraciones y convenciones internacionales”[72].
Assim, o direito humano ao meio ambiente do trabalho já foi reconhecido pelo direito interno brasileiro, positivado no texto constitucional por intermédio do artigo 225 c/c artigo 200, inciso VIII, constituindo-se, portanto, em legítimo direito fundamental dotado de força normativa potencializada. Na mesma esteira, afirma Arion Sayão Romita, que “o ambiente de trabalho seguro constitui direito fundamental dos trabalhadores. As normas a ele aplicáveis são dotadas de cogência absoluta e asseguram aos trabalhadores direitos indisponíveis, ante o caráter social que revestem e o interesse público que as inspira” [73].
Neste diapasão, destaca-se a indagação de Evanna Soares: “E o que significa dizer que o meio ambiente do trabalho é um direito humano fundamental?”. Responde a Autora que tal qualificação jurídica impõe ao Poder Público tratamento prioritário para a tutela material assim como processual, devendo ser direito defendido por todos, primordialmente os trabalhadores e os empregadores. Ademais, trata-se de direito irrenunciável e inegociável, não sendo possível cogitar na pauta de redução dos custos patronais eventuais medidas mitigadoras da saúde do trabalhador e da segurança no trabalho[74].
Nesta esteira, é certo que o artigo 225 da Constituição Brasileira constitui-se no texto-base de todo o sistema de proteção constitucional do meio ambiente sob a fórmula do “direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, contudo, assiste razão Cirlene Zimmermann, quando afirma que “não há como viver uma vida digna e com qualidade de vida se uma das atividades mais importantes da vida do homem não foi desenvolvida em um ambiente equilibrado”. Logo, não há como se pensar em cumprir o comando constitucional do artigo 225 ignorando o Meio Ambiente do Trabalho” [75].
Outrossim, o princípio fundamental da dignidade da pessoa humana encontra-se assegurado no artigo 1.º, inciso III, da Constituição Federal de 1988, constituindo, assim, em um dos fundamentos da República Federativa do Brasil e do Estado Democrático de Direito. Neste sentido, afirma Emmanuel Furtado “é de se concluir que dar fundamento ao Estado na dignidade da pessoa humana patenteia o reconhecimento do valor do homem enquanto ser livre, ao mesmo tempo em que o próprio Estado reconhece ter suas pilastras na observância do princípio em baila em favor do ser humano, abrangendo tal princípio não somente os direitos individuais, mas os direitos outros, de natureza econômica, social e cultural” [76].
Por conseguinte, o artigo 170, caput e inciso VI, da Constituição Federal de 1988, versam sobre a ordem econômica e asseguram a livre iniciativa, fundada na defesa do meio ambiente e na valorização do trabalho humano, de modo a assegurar a todos a existência digna, de acordo com os ditames da justiça social. Na mesma esteira, o artigo 193 também exige que a Ordem Social tenha como objetivos o bem-estar e a justiça social.
Desta feita, de acordo com os preceitos constitucionais citados, o modo de produção capitalista necessita conjugar os dividendos da economia de mercado às questões sociais e humanitárias, na busca do meio ambiente do trabalho equilibrado e do respeito irrestrito à pessoa humana [77]. Assim, o que se observa é que a Carta Política de 1988 apresenta novos paradigmas no que concerne ao direito fundamental ao trabalho digno, o que somente se consubstanciará quando o trabalho é exercido em um meio ambiente adequado e salubre. Portanto, o direito fundamental ao meio ambiente do trabalho, explicitado no art.225, c/c art.200, inciso VIII, da CF/88, concretiza-se sob o apanágio da dignidade da pessoa humana, tendo como espécie do gênero humano: a pessoa do trabalhador [78].
3.3. A interdependência, indivisibilidade e inter-relação dos direitos fundamentais sob a ótica do direito ambiental do trabalho.
A conceituação contemporânea de direitos fundamentais, principalmente após a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, passou a determiná-los como unidade indivisível, interdependente e inter-relacionada, na qual valores da igualdade e da liberdade conjugam-se e se completam. Neste contexto, liberdade e igualdade concretizam-se mutuamente. A igualdade-formal concretiza a liberdade jurídica, transformando-a em liberdade-real, ao passo que a liberdade-real concretiza a igualdade-formal, transformando-a em igualdade-proporcionalidade. Portanto, o direito fundamental ao meio ambiente do trabalho adequado e salubre necessita, umbilicalmente, da liberdade-real e da igualdade-proporcionalidade, para fins de concretização [79].
No mesmo sentido, a Declaração de Estocolmo de 1972 contemplou, expressamente, o direito ao meio ambiente de qualidade como um direito fundamental de toda a humanidade, conforme se depreende no seu primeiro princípio, senão vejamos: “O homem tem o direito fundamental à liberdade, à igualdade e ao desfrute de condições de vida adequadas em um meio ambiente de qualidade tal que lhe permita levar uma vida digna e gozar de bem-estar, tendo a solene obrigação de proteger e melhorar o meio ambiente para as gerações presentes e futuras”.
Por conseguinte, a Assembleia Geral da ONU editou Resolução n.º 32/130 de 16/12/1977, no item n.º 01, alínea “a”, disciplinando que: “[…] 01. Decide que el enfoque de la labor futura dentro del sistema de las Naciones Unidas respecto de las cuestiones de derechos humanos deberá tener en cuenta los conceptos siguientes: a) Todos los derechos humanos y libertades fundamentales son indivisibles e interdependientes; deberá prestarse la misma atención y urgente consideración a la aplicación, la promoción y la protección tanto de los derechos civiles y políticos como de los derechos económicos, sociales y culturales” [80].
Conforme se depreende, todos os direitos humanos e liberdades fundamentais são indivisíveis, interdependentes e se inter-relacionam entre si. Neste sentido, tal concepção também foi reiterada na Declaração de Direitos Humanos de Viena de junho de 1993, que afirma, em seu item n.º 05, textualmente: “[…] Todos os Direitos Humanos são universais, indivisíveis, interdependentes e inter-relacionados. A comunidade internacional deve considerar os Direitos Humanos, globalmente, de forma justa e equitativa, no mesmo pé e com igual ênfase. Embora se deva ter sempre presente o significado das especificidades nacionais e regionais e os diversos antecedentes históricos, culturais e religiosos, compete aos Estados, independentemente dos seus sistemas políticos econômicos e culturais, promover e proteger todos os Direitos Humanos e liberdades fundamentais […]” [81].
Neste diapasão, o princípio enunciado pela Conferência de Viena é denominado pela doutrina de “princípio da complementariedade solidária dos direitos humanos de qualquer espécie”, conforme afirma Fábio Konder Comparato, que “[…] a justificativa desse princípio encontra-se no postulado ontológico de que a essência do ser humano é uma só, não obstante a multiplicidade de diferenças, individuais e sociais, biológicas e culturais, que existem na humanidade. É exatamente por isso, […], que todos os seres humanos merecem igual respeito e proteção, a todo tempo e em todas as partes do mundo em que se encontrem […]” [82].
Por sua vez, o direito fundamental ao meio ambiente é direito de terceira geração[83], segundo a classificação clássica de Karel Vasak [84], já objeto de estudo desta pesquisa. No entanto, a doutrina vem questionando o conceito de “gerações” de direitos fundamentais, conforme destacam Tiago Fensterseifer e Ingo Wolfgang Sarlet, inclusive mencionando a posição de Cançado Trindade:
“[…] deve-se considerar também que a tese da indivisibilidade, unidade e interdependência dos direitos fundamentais refuta, de certa maneira, o conceito de “gerações” de direitos fundamentais, no sentido de que todos os direitos fundamentais, de diferentes dimensões, complementam-se na busca de uma tutela integral e efetiva da dignidade da pessoa humana, não havendo, portanto, como defendem alguns, primazia ou superioridade hierárquica entre tais direitos como decorrência de integrarem uma geração precedente. Nesse sentido, Cançado Trindade […] destaca a natureza complementar de todos os direitos humanos. […] pontua que, subjacente à perspectiva “fantasiosa” das gerações, está um visão fragmentária dos direitos humanos, a qual tem operado a postergação da realiação de alguns dos direitos humanos, como ocorre com os direitos econômicos, sociais e culturais” [85].
Em seguida, Fensterseifer e Sarlet concluem o raciocínio, notadamente quanto aos “direitos fundamentais socioambientais”, expressão designada para compreender uma tutela integrada dos direitos sociais e da proteção do ambiente, discorrendo que “contra tal mal, a tese da unidade e indivisibilidade dos direitos humanos (e o mesmo ocorre com os direitos fundamentais) é o melhor antídoto, rompendo com qualquer hierarquização ou priorização de direitos humanos em razão da sua precedência geracional, no sentido de afirmar que todos os direitos humanos (e fundamentais) expressam conteúdos conformadores da dignidade humana, o que é o caso dos direitos fundamentais socioambientais” [86].
No mesmo sentido, vislumbra-se o surgimento do Estado Sociambiental contemporâneo, isto é, a conjugação do Estado de Direito e do Estado Democrático, tendo como marco jurídico-constitucional o princípio da solidariedade, que renasce como fênix das cinzas jurídicas da Revolução Francesa. Neste sentido, o princípio da solidariedade aparece como mais uma tentativa histórica de realização integral do projeto da modernidade, concluindo o ciclo dos três princípios revolucionários: liberdade, igualdade e fraternidade mediante releitura constitucional ajustada à nova realidade social e no espaço histórico-temporal contemporâneo – a concretização do Estado Socioambiental de Direito [87].
Quanto ao aspecto do meio ambiente do trabalho, tem-se a ilação de que este possui intrínseca relação com o meio ambiente gênero, haja vista que eventuais efeitos nocivos do ambiente laboral transpassam as fronteiras do privado, invadindo derradeiramente o bairro, a cidade ou a região como um todo, como nos exemplos de contaminação de ar ou água, ruídos excessivos, e outros direitos metaindividuais que podem ser atingidos. Considerando essa situação, faz-se necessária uma ampla mobilização, no sentido de tentar buscar a efetividade do direito ao meio ambiente, inclusive no ambiente de trabalho, para que o conjunto de suas normas não perca credibilidade [88].
Em suma, todos os direitos humanos (e o mesmo ocorre com os direitos fundamentais) constituem um complexo integral, único e indivisível, no qual os diferentes direitos estão inter-relacionados e são interdependentes entre si, notadamente os direitos sociais trabalhistas e o direito ambiental, inclusive no aspecto do meio ambiente de trabalho.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
No decorrer da pesquisa, constata-se o caminho progressivo e virtuoso percorrido pelo direito ambiental no plano internacional, primordialmente sob a diretriz dogmática do direito internacional dos direitos humanos. Neste contexto, sobretudo em face de relevante trabalho jurídico-normativo da Organização das Nações Unidas (ONU) e da Organização Internacional do Trabalho (OIT), vislumbra-se o surgimento do denominado “Direito Internacional do Meio Ambiente do Trabalho”, configurando-se em elemento de coesão dos direitos fundamentais sociais e trabalhistas e do próprio direito ambiental. Assim, constata-se a possibilidade de irradiação de argamassa principiológica e normativa para o fortalecimento do direito interno protetivo dos Estados.
No Brasil, verifica-se, cristalinamente, a existência de um direito humano fundamental ao meio ambiente do trabalho sadio e equilibrado, consubstanciado, expressamente, no art. 225, da CF/88, possuindo ainda vários corolários no texto constitucional, dentre os quais se destacam: o art.200, inciso VIII (colaboração do sistema único de Saúde – SUS – na proteção do meio ambiente, nele compreendido o do trabalho); o art.170, inciso VI (defesa do meio ambiente como princípio geral norteador da atividade econômica); nos direitos sociais previstos no art.6º. (direito à saúde, ao trabalho, dentre outros); nos direitos trabalhistas esculpidos no art.7º. (incisos XXII, XXIII, XXVIII, dentre outros), sugerindo-se, inclusive, a interpretação de toda legislação infraconstitucional (principalmente a CLT) à luz do espírito ético, social e trabalhista da Constituição (interpretação conforme).
Desta forma, a qualificação jurídica imposta com força normativa potencializada pelos direitos humanos fundamentais – elencados pela Carta Política de 1988 – obriga aos poderes públicos constituídos, assim como à sociedade civil, tratamento prioritário ao meio ambiente do trabalho, notadamente pela ingerência dos empregadores e empregados, em prol da saúde, da vida, da dignidade humana laboral e do desenvolvimento econômico sustentável.
No entanto, não há que se falar em vida digna e respeitada se a atividade laboral do homem, matriz de seu sustento e de sua família, não for desenvolvida em meio ambiente do trabalho equilibrado e seguro. Portanto, faz-se necessária ampla mobilização da presente e das futuras gerações a favor dos pleitos protetivos em matéria ambiental, sob pena de se transformar a Constituição Federal, ápice do ordenamento jurídico, em mero documento solene – folha de papel – tão somente repleta de bons propósitos inofensivos.
Procurador Federal da Advocacia-Geral da União (AGU). Mestre em Direito pela Universidade Federal do Ceará (UFC). Especialista em Direito Público com habilitação em Direito Previdenciário pela Universidade de Brasília (UnB).
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