Da recepcionalidade ou não do artigo 200 do Código Tributário Nancional pela Constituição da República Federativa do Brasil de 1988

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Resumo: Os tributos são pagamentos pecuniários compulsórios, decorrentes da realização de atividades abstratamente previstas em lei que objetivam adquirir receitas para que o Estado realize o bem estar social. A obrigação tributária surge com a realização do fato gerador previsto em lei e apto a provocar a incidência do dever de pagar tributos. São sujeitos ativo e passivo da relação jurídico tributária respectivamente, o Estado e o contribuinte. O sujeito passivo tem como obrigação principal o dever de pagar tributo e como obrigação acessória uma serie de condutas de fazer e não fazer previstas em lei. Para melhor efetivar a atividade fiscal o Código Tributário Nacional prevê a possibilidade dos agentes fiscais de requisitarem força pública quando sofrerem embaraço no exercício de suas funções. Nesse escopo o presente artigo visa aferir a possibilidade de violação de domicílio por parte dos agentes fiscais, sem mandado judicial em face do direito fundamental á inviolabilidade de domicílio previsto no artigo 5º da Constituição Federal. Como metodologia o artigo utilizará a pesquisa bibliográfica em documentos sobre o tema bem como a pesquisa jurisprudencial.

Palavras chaves: tributos; atividade fiscal; violação; domicílio; direito fundamental.

Abstract: Taxes are compulsory, cash payments arising from the completion of activities abstractly provided by the law that aim to acquire revenue for the State to conduct social welfare. The tax obligation comes from the execution of the taxable event provided by the law, which is apt to trigger the incidence of the duty to pay taxes. Assets and liabilities are subjects to the tax legal relationship respectively, the State and the taxpayer. The taxpayer has the primary obligation to pay the duty and tax as ancillary obligation of a series of do's and don'ts prescribed by law behaviors. To better carry out the inspection activity the National Tax Code provides the tax agents with the possibility of ordering government forces whenever they suffer any kind of embarrassment in the exercise of their functions. In this scope the present article aims to assess the possibility of violation of domicile by the fiscal agents, without a warrant in the face of the fundamental right to inviolability of the home provided by the Article 5 of the Federal Constitution. The methodology will use this article in the bibliographical research papers on its subject as well as jurisprudence research.

Keywords: taxes; fiscal activity; violation; household; fundamental right.

Sumário: Introdução. 1. Recepcionalidade versus inconstitucionalidade. 1.1 Da relação tributária. 1.2 Conceito de tributo. 1.3 Obrigação tributária. 1.4 Sujeito da obrigação tributária. 2. Do domicílio na constituição. 2.1 Do domicílio. 2.2 Da inviolabilidade do domicílio. 3. Da violação de domicílio por autoridade fiscal. 3.1 Da atividade fiscal. 3.2 Da violação de domicílio por agente fiscal. Conclusão. Referências bibliográficas.

INTRODUÇÃO

O presente artigo tem como escopo avaliar a conformidade do artigo 200 do Código Tributário Nacional com a Constituição Federal de 1988 aferindo se o citado artigo viola o direito a inviolabilidade de domicílio previsto no artigo 5º, inciso XI, ou seja, sua recepcionalidade pela constituição de 1988.

O artigo 200 do CTN prevê a possibilidade das autoridades fiscais requisitarem força pública quando vítimas de embaraço no exercício de suas funções ou quando necessário à efetivação das medidas previstas na legislação tributária.

Nesse escopo questiona-se se as autoridades fiscais podem violar o domicílio do contribuinte sem autorização judicial quando estes se negarem a cumprir as obrigações tributárias acessórias e principais previstas em lei.

Como metodologia o artigo irá se utilizar da pesquisa bibliográfica através do estudo de livros, artigos e demais documentos, bem como a jurisprudência pátria sobre o tema em especial do Supremo Tribunal Federal.

O artigo se mostra relevante aos acadêmicos de direito e à sociedade em geral devido a importância do tema que envolve o estudo da atividade fiscal e do direito fundamental à inviolabilidade de domicílio.

Como objetivo geral o artigo visa aferir a possibilidade de violação de domicílio por autoridade fiscal sem mandado judicial face ao direito fundamental de inviolabilidade de domicílio previsto na Constituição Federal.

Em seus objetivos específicos o artigo irá abordar o conceito de tributos, sujeitos da relação jurídico-tributária e características da obrigação tributária. Irá avaliar ainda o conceito de domicílio e as características da inviolabilidade de domicílio previsto na Constituição Federal. Por fim o artigo irá aferir a possibilidade de violação de domicílio por autoridade fiscal sem autorização judiciária em face do direito fundamental a inviolabilidade de domicílio.

A atividade fiscal é imprescindível à consecução dos fins do Estado, não obstante sua relevância mostra-se necessário aferir se é possível mitigar direitos fundamentais em prol da efetivação do cumprimento da obrigação tributária diante dos preceitos constitucionais que regem o ordenamento jurídico brasileiro.

Nesse ínterim o artigo visa aferir a possibilidade de violação de domicílio sem mandado judicial, por parte das autoridades fiscais visando o cumprimento de obrigações tributárias.

1. RECEPCIONALIDADE VERSUS INCONSTITUCIONALIDADE

Importante clarearmos as definições de recepcionalidade e inconstitucionalidade no direito pátrio para um entendimento real e pleno do objeto do presente artigo.

Sendo assim, fala-se na inconstitucionalidade das normas quando estamos diante de normas posteriores, ou seja, ulteriores a uma constituição em determinado tempo.

Ainda, verifica-se a compatibilidade material ou formal de ato normativo com o texto constitucional sendo um critério de nulidade, desta forma declarando-se a nulidade do ato e a norma inconstitucional.

Já fala-se em não recepção, recepcionalidade, quando estamos diante de normas editadas anteriores a uma constituição, ou ainda quando as normas editadas antes das emendas constitucionais que alterem qualquer constituição, fazendo com que determinado ato normativo, que era constitucional, se torne “inconstitucional” nesse caso, como no Brasil não há inconstitucionalidade superveniente, fala-se em recepção ou não recepção, se a norma vai de encontro à constituição.

Também verifica-se a compatibilidade material de ato normativo com o texto constitucional, assim, havendo sua revogação ou não. Ex. o CTN, norma anterior a CF/88, não era lei complementar, contudo, com a recepção lhe foi dado o status de lei complementar, pois assim é a exigência da CF/88. Aqui houve uma verificação de compatibilidade material. A materialidade do CTN estava dentro dos parâmetros constitucionais, mas a forma não e, em razão disso, ele foi recepcionado com status de lei complementar. Mas não impede que algum artigo do CTN esteja carente de recepcionalidade pela constituição.

Desta forma pode o CTN ser recepcionado pela constituição federal, mas, um ou mais artigos não o serem.

1.1. DA RELAÇÃO TRIBUTÁRIA

Com o escopo de melhor compreender o tema proposto no presente artigo, qual seja, a inconstitucionalidade da violação de domicílio pela autoridade fiscal, mister se faz abordar o conceito de tributo, obrigação tributária e sujeitos da obrigação tributária.

1.2.  CONCEITO DE TRIBUTO

A cobrança de tributos é indispensável para que o estado possa atender aos seus fins. Através da repartição das receitas tributárias entre os entes federativos do Estado, busca-se efetivar os direitos sociais com a consecução de políticas públicas em prol da coletividade.

Acerca da relevância dos tributos para a consecução dos fins do Estado, Eduardo Sabbag preceitua:

“O Estado necessita, em sua atividade financeira, captar recursos materiais para manter sua estrutura, disponibilizando ao cidadão-contribuinte, o serviço que lhe compete, como autentica provedor das necessidades coletivas.

A cobrança de tributos se mostra como a principal fonte das receitas públicas, voltadas ao atingimento dos objetivos fundamentais, insertos no art. 3º da Constituição Federal, tais como a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, a garantia do desenvolvimento nacional, a erradicação da pobreza e da marginalização, tendente a redução das desigualdades sociais e regionais, bem como a promoção do bem-estar da coletividade”. (2011, p.38).

A cobrança dos tributos é ato de império do Estado utilizado para a realização do bem comum, interesses e políticas públicas em prol da coletividade.

Devido ao seu caráter coercitivo os tributos são regulados por lei e devem obedecer a uma serie de requisitos legais em sua criação e no procedimento para a sua cobrança por parte do Estado.

O sistema tributário possui suas normas principais na Constituição Federal e no Código Tributário Nacional. A Constituição apresenta regras e princípios que regem o sistema nacional tais como conceitos de limitações ao poder de tributar e repartições de receitas tributárias, já o CTN apresenta os conceitos de tributos e regula o procedimento que rege as obrigações tributárias entre outros.

O Código Tributário Nacional apresenta em seu artigo 3º o conceito de tributo como “é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada”.

O conceito de tributo traz em seu bojo os elementos necessários à existência de um tributo.

A primeira característica do tributo é o fato de o mesmo ser uma prestação pecuniária. Ou seja, trata-se de uma relação jurídica tributária obrigacional que se perfaz através do pagamento em dinheiro.

Acerca do elemento pecúnia preceitua Eduardo Sabbag:

“O tributo e prestação pecuniária, isto e, a obrigação de prestar dinheiro ao Estado. O art. 3º do CTN, em sua parte inicial, dispõe que “o tributo e prestação pecuniária, em moeda (…)”. Não obstante redundância no dispositivo, e possível asseverar que o dispositivo objetivou evitar o tributo in natura (em bens) ou o tributo in labore (em trabalho, em serviços).” (2012, p.377).

A regra geral é o pagamento do tributo em dinheiro, nesse sentido o artigo 3º é redundante ao afirmar que tributo é prestação pecuniária em moeda ou outro valor que nela possa se exprimir.

Ao discorrer sobre o caráter pecuniário do tributo preleciona Ricardo Cunha Chimenti:

“A lei só pode obrigar o contribuinte a pagar o tributo em moeda corrente do País (obrigação pecuniária), razão pela qual a doutrina costuma afirmar que em regra nosso direito desconhece o tributo in natura (parte da mercadoria comercializada é entregue ao Fisco a título de pagamento do tributo) ou tributo in labore (a cada Mês o sujeito passivo destinaria alguns dias de seu trabalho à entidade tributante)”. (2010, p.56)

Além do caráter pecuniário, o tributo é uma obrigação compulsória, imposta pelo poder de império do Estado. Não há, portanto uma faculdade por parte do contribuinte no pagamento do tributo basta realizar o fato gerador previsto em lei que passa a ser obrigatório o pagamento do tributo a ele relacionado.

Sobre o caráter compulsório dos tributos preleciona Sabbag:

“O tributo e prestação compulsória, logo, não contratual, não voluntária ou não facultativa. Com efeito, o Direito Tributário pertence a seara do Direito Publico, e a supremacia do interesse publico da guarida a imposição unilateral de obrigações, independentemente da anuência do obrigado”. (2011, p.378).

O tributo não constitui sanção a ato ilícito, pois este não é penalidade. Assim pode se afirmar, que este provém da incidência de situações lícitas, muita embora, às vezes, dentro de uma situação licitamente prevista em lei como fato gerador de tributo o agente possa realizar atividades ilícitas.

A obrigação tributária provém da ocorrência de uma situação lícita prevista em lei como fato gerador da relação jurídico-tributária. Tributo é uma obrigação imposta pelo Estado decorrente do seu poder de império que visa auferir receitas às consecuções dos fins almejados pelo Estado.

Sobre o tema preceitua Ricardo Chimenti:

“Quando o art. 3º do Código Tributário Nacional afirma que o tributo não constitui sanção a ato ilícito, quer dizer que a hipótese de incidência é sempre algo lícito. Observe-se, porém, que situações como a aquisição de disponibilidade econômica ou jurídica de rendimentos são suficientes para o nascimento de obrigação tributárias como o imposto de renda (art. 43 do CTN), ainda que tais rendimentos sejam provenientes de atividades ilícitas como o “jogo do bicho” (a hipótese de incidência é a aquisição de disponibilidade financeira e não o jogo do bicho).” (2010, p.56).

O fato gerador do tributo vem previsto em lei. Trata-se de uma garantia ao cidadão que se justifica pelo caráter coercitivo que recai sobre a relação jurídico-tributária.

A criação do tributo é matéria específica de lei, nesse sentido preceitua Eduardo Sabbag:

“O tributo e prestação instituída por meio de lei, sendo, portanto, obrigação ex lege. Seu nascimento se da pela simples realização do fato descrito na hipótese de incidência prevista em lei, sendo a vontade das partes de todo irrelevante (ver art. 123 do CTN)”. (2011, p.380).

O tributo é uma obrigação de caráter pecuniário, obrigação coercitivamente imposta pelo Estado em face dos cidadãos, decorrente de situações lícitas previamente disciplinadas em lei, que possuem como escopo auferir receitas para auxiliar o Estado na consecução de seus fins de interesse coletivo.

A Constituição Federal e o Código Tributário Nacional são os principais diplomas legais em matéria tributária e apresentam princípios e regras que regem a obrigação jurídico-tributária e dispõe acerca do fato gerador e sua incidência na relação entre o Estado e o contribuinte, aptas a gerar o dever de pagar tributos.

1.3. OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA

A obrigação tributária principal é o dever do contribuinte de pagar tributos ao Estado diante da ocorrência de um fato gerador prevista em lei como hipótese de incidência de um tributo.

A lei prevê uma serie de condutas que quando realizada pelo indivíduo gera o dever de pagar tributos, tais como auferir renda, hipótese de incidência do imposto de renda, quando o indivíduo passa a realizar uma atividade apta a auferir renda ocorre o fato gerador da conduta abstratamente prevista em lei.

A hipótese de incidência é a situação em abstrato prevista em lei como apta a gerar o dever de pagar o tributo, e o fato gerador é a ocorrência em concreta da situação prevista em lei.

Ao discorrer sobre o início da relação obrigacional tributária Ricardo Cunha Chimenti dispõe:

“A obrigação tributária surge da ocorrência de um fato previsto (hipótese de incidência, fato tributável, fato gerador in abstrato) em lei como capaz de produzir este efeito. Ocorrido o fato gerador (fato imponível, fato gerador in concreto) previsto em lei, nasce a obrigação tributária principal, a obrigação patrimonial do sujeito passivo que tem por objeto o pagamento do tributo e/ou da penalidade pecuniária”. (2010, p.92).

A obrigação tributária se perfaz com a ocorrência na realidade fática da situação prevista em lei como apta a gerar o dever de pagar o tributo. A lei prevê a hipótese em abstrato e a obrigação tributária surge com a ocorrência do fato gerador.

Sobre a hipótese de incidência Eduardo Sabbag preleciona:

“A hipótese de incidência tributaria representa o momento abstrato, previsto em lei, hábil a deflagrar a relação jurídico-tributária Caracteriza-se pela abstração, que se opõe a concretude fática, definindo-se pela escolha feita pelo legislador de fatos quaisquer do mundo fenomênico, propensos a ensejar o nascimento do episodio jurídico-tributário.” (2012, p.672).

A hipótese de incidência são as situações em concreto descritas na lei como aptas a gerar uma relação jurídico-tributária, como por exemplo, a hipótese de auferir renda, apta a gerar o imposto de renda, quando as pessoas passam a auferir renda, surge o fato gerador e nasce a obrigação tributária.

Sobre o tema Sabbag preleciona que:

“Como se notou “hipótese de incidência” é a situação descrita em lei, recortada pelo legislador entre inúmeros fatos do mundo fenomênico, a qual, uma vez concretizada no fato gerador, enseja o surgimento da obrigação principal. A substancial diferença reside em que, enquanto aquela é a “descrição legal de um fato (…) a descrição de hipótese em que o tributo é devido”, esta se materializa com a efetiva ocorrência do fato legalmente previsto”. (2011, p.674).

A relação tributária pode ser principal ou acessória a depender do conteúdo e da forma da prestação obrigacional.

Eduardo Sabbag preceitua obrigação tributária como:

“O objeto da obrigação tributaria equivale a prestação a que se submete o sujeito passivo diante do fato imponível deflagrador da obrigação tributaria. Pode se materializar em uma prestação dotada de patrimonialidade ou de instrumentalidade. A primeira, chamada “principal”, tem o objeto consubstanciado em uma “obrigação de dar”, estando definida no§1° do art. 113 do CTN. A segunda, intitulada “acessória”, revela o objeto como uma obrigação de fazer ou de não fazer, estando prevista no § 2° do art. 113 do CTN”. (2012, p.686).

A obrigação principal consiste no dever de prestação pecuniária que decorre da realização do fato gerador. Já a obrigação tributária acessória é um dever de fazer ou não fazer que visa auxiliar a arrecadação ou fiscalização da obrigação tributária principal.

Ao conceituar a obrigação tributária principal Edvaldo Nilo de Almeida dispõe:

“A obrigação tributária principal é a prestação representante do ato de pagar (tributo ou multa), sendo, portanto, uma obrigação de dar, com cunho pecuniário (dinheiro). Ou seja, o elemento fundamental da obrigação principal é a  sua natureza pecuniária, com a consequência de ser o pagamento de determinada quantia em dinheiro”. (2011, p.210).

A obrigação principal é o dever de realizar o pagamento pecuniário do tributo e surge em decorrência da realização do fato gerador previsto abstratamente em lei. A lei dispõe acerca das hipóteses de incidência aptas a gerar a obrigação tributária.

Ao conceituar a obrigação principal o CTN prevê no artigo 113 parágrafo primeiro:

“Art. 113…

§ 1º A obrigação principal surge com a ocorrência do fato gerador, tem por objeto o pagamento de tributo ou penalidade pecuniária e extingue-se juntamente com o crédito dela decorrente”.

Quando o contribuinte realiza a conduta prevista em lei como hipótese de incidência do tributo, surge o fato gerador iniciando a relação jurídico-tributária. A realização do fato gerador impõe ao contribuinte o dever de pagar um tributo, na forma previamente especificada em lei.

Para melhor efetivar a execução ou fiscalização da obrigação principal o Estado impõe algumas obrigações secundárias ao contribuinte são obrigações de fazer ou não fazer, tais como a emissão de notas fiscais ou declarações de rendimentos.

Ricardo Chimenti (2010, p.93) conceitua dispõe que “a obrigação acessória decorre da legislação tributária e tem por objeto uma obrigação de fazer ou não fazer prevista em favor da arrecadação ou da fiscalização dos tributos”.

Embora seja denominada de acessória, essa espécie de obrigação não depende da principal e pode ser realizada antes, durante, depois ou até mesmo sem que haja uma obrigação principal.

Sobre o tema Edivaldo Nilo de Almeida dispõe que:

“Por sua vez, a obrigação tributária acessória independe da obrigação tributária principal. Por isso a doutrina também chama as obrigações acessórias de instrumentais ou deveres formais, pois não poderia, em princípio, ser denominada de obrigação acessória se é independente da obrigação principal”. (2011, p.211).

A obrigação principal surge com a ocorrência do fato gerador e marca o inicio da relação jurídico-tributária através do dever imposto coercitivamente ao contribuinte de pagar determinado tributo previsto em lei.

A obrigação acessória por seu turno visa auxiliar o Estado na efetivação da obrigação principal e consiste em obrigação de fazer ou não fazer determinadas condutas que ajudam o Fisco na cobrança e fiscalização do cumprimento da obrigação jurídico-tributária.

1.4. SUJEITOS DA RELAÇÃO TRIBUTÁRIA

A relação jurídico-tributária é aquela que apresenta de um lado o ente legitimado a cobrança do tributo e de outro o sujeito compelido a pagar os tributos devidos. Tem como sujeito ativo e passivo respectivamente, o Fisco e o contribuinte.

Conforme preceitua Eduardo Sabbag:

“A sujeição ativa e matéria afeta ao polo ativo da relação jurídico-tributária. Refere-se, pois, ao lado credor da relação intersubjetiva tributaria, representado pelos entes que devem proceder a invasão patrimonial para a retirada compulsória de valores, a titulo de tributos”. (2012, p.679).

No polo ativo da obrigação tributária está o ente estatal competente para cobrar e fiscalizar o pagamento dos tributos.

Cumpre ressaltar que a legitimidade ativa do Estado de cobrar tributos advém do seu poder de império e, portanto é cercada de uma serie de prerrogativas que visam garantir a eficácia dessa atribuição.

Importante diferenciar o sujeito ativo competente para criar os tributos e o sujeito ativo da obrigação tributária. São competentes para instituir tributos a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, já no que tange ao polo ativo da obrigação tributária, este pode ser ocupado por pessoas jurídicas de direito público competentes para exigir o cumprimento do crédito tributário.

Nesse sentido preceitua Edvaldo Nilo de Almeida:

“O sujeito ativo não é necessariamente a pessoa jurídica de direito público titular da competência legislativa para instituir o tributo, mas sim a pessoa competente para cobrar e fiscalizar o respectivo tributo.

Nesse rumo, o sujeito ativo é o ente federativo competente para instituir tributo, ou outra pessoa jurídica, em razão de delegação da capacidade tributária ativa, de acordo com o art. 7º c/c 119 do CTN”. (2011, p.230).

O polo ativo da obrigação tributária pode ser ocupado por pessoas jurídicas de direito público que terão competência para a cobrança e fiscalização de determinados tributos.

Em relação ao polo passivo da obrigação tributária a lei diferencia o sujeito passivo da obrigação principal, que o dever de pagar o tributo, e o sujeito passivo da obrigação acessória que o dever de fazer ou deixar de fazer determinadas condutas que visam auxiliar a cobrança e fiscalização dessa obrigação.

A doutrina diferencia ainda na obrigação tributária principal o sujeito passivo direto que é aquele que realiza o fato gerador, do sujeito passivo indireto que é aquele obrigado a pagar o tributo.

O sujeito passivo da obrigação tributária principal é aquele que tem o dever de pagar o tributo, podendo ser dividido em sujeito passivo direto ou indireto.

Ao discorrer sobre o sujeito passivo da relação principal Ricardo Chimenti preleciona que:

“O sujeito passivo da obrigação tributária principal pode ser o contribuinte, normalmente denominado sujeito passivo direto, ou o responsável, também chamado de sujeito passivo indireto. As regras estão previstas nos arts. 121 e 128 do Código Tributário Nacional e a capacidade tributária passiva é de natureza objetiva, pois decorre da lei e não da vontade daquele que deve cumprir a obrigação.” (2010, p.127).

O sujeito passivo direto da obrigação tributária principal é aquele que realiza o fato gerador previsto em lei como apto a gerar a obrigação jurídico-tributária. Uma vez realizado o fato gerador a lei pode atribuir a outro sujeito, denominado sujeito passivo indireto a responsabilidade por efetivar o cumprimento da obrigação tributária.

Ao discorrer sobre o sujeito passivo indireto o CTN dispõe:

“Art. 121. Sujeito passivo da obrigação principal é a pessoa obrigada ao pagamento de tributo ou penalidade pecuniária.

Parágrafo único. O sujeito passivo da obrigação principal diz-se:

I – contribuinte, quando tenha relação pessoal e direta com a situação que constitua o respectivo fato gerador;

II – responsável, quando, sem revestir a condição de contribuinte, sua obrigação decorra de disposição expressa de lei.”

O sujeito passivo indireto ou sujeito passivo responsável é aquele que sem realizar o fato gerador, tem a obrigação de cumprir a obrigação tributária. A lei dispõe as formas de obrigação indireta.

Importante ressaltar ainda que a capacidade tributária passiva principal não se confunde com a capacidade para os atos da vida civil, possuindo cada uma delas características diversas. O capaz para figurar no polo passivo da obrigação tributária principal não precisa ter capacidade para os atos da vida civil.

Acerca da diferença entre capacidade civil e tributária preleciona Ricardo Chimenti:

“A capacidade tributária passiva independe da capacidade civil ou comercial das pessoas físicas ou jurídicas. Portanto, mesmo as pessoas naturais incapazes para os atos da vida civil (menores, alienados mentais etc.), aqueles que sofrem restrições quanto às suas atividades comerciais ou profissionais e aquelas sociedades que não estão regularmente constituídas podem ser sujeitos passivos de uma obrigação tributária (art. 126 do CTN)”. (2010, p.127).

Assim pode se inferir que a capacidade passiva tributária não se confunde com a capacidade civil, sendo possível que pessoas incapazes civilmente possuam capacidade tributária passiva direta.

O Código Tributário Nacional elenca as possibilidades de aplicação da capacidade tributária passiva às pessoas incapazes para os atos da vida civil ou pessoas não regularmente constituídas.

Nesse sentido dispõe o CTN em seu artigo 126:

“Art. 126. A capacidade tributária passiva independe:

I – da capacidade civil das pessoas naturais;

II – de achar-se a pessoa natural sujeita a medidas que importem privação ou limitação do exercício de atividades civis, comerciais ou profissionais, ou da administração direta de seus bens ou negócios;

III – de estar a pessoa jurídica regularmente constituída, bastando que configure uma unidade econômica ou profissional.”

No que se refere ao sujeito passivo da obrigação acessória, esse não se confunde com o sujeito passivo da obrigação principal. Sujeito passivo da obrigação tributária acessória é aquele obrigado por lei a realizar determinadas condutas que visam auxiliar o Estado no cumprimento da obrigação principal.

Sobre o sujeito passivo da obrigação principal preceitua Edvaldo Nilo de Almeida:

“O sujeito passivo da obrigação acessória é a pessoa obrigada às prestações que constituam o seu objeto. Isto é, as obrigações de fazer, não fazer ou tolerar em benefício da fiscalização e arrecadação tributária, independentemente da condição de contribuinte ou responsável tributário”. (2011, p.233).

Nesse escopo o sujeito passivo da obrigação principal nem sempre será o mesmo da obrigação acessória. A obrigação acessória de fazer ou não fazer determinada conduta pode ser imposta por lei a sujeito diverso do obrigado pela obrigação principal e pode incidir até mesmo em situações em que devedor principal seja isento ou imune ao pagamento de tributos.

Para melhor efetivar o cumprimento da obrigação jurídico-tributária, e em especial da obrigação acessória o Estado possui algumas prerrogativas previstas em lei.

Entre essas prerrogativas se encontra a possibilidade das autoridades fiscais requisitarem o auxílio da força pública, quando vítimas de embaraço ou desacato no exercício de suas funções, ou quando necessário à efetivação de medida prevista na lei tributária.

Nesse escopo faz-se mister aferir se é possível a violação de domicílio por autoridade fiscal no exercício de sua função, em face da inviolabilidade de domicílio prevista Constituição Federal de 1988.

Para melhor compreensão do tema é necessário abordar o conceito de domicílio e sua proteção constitucional.

2. DO DOMICÍLIO NA CONSTITUIÇÃO

A Constituição Federal de 1988 dispõe que a casa é asilo inviolável garantindo o caráter de direito fundamental à inviolabilidade de domicílio.

Nesse contexto é relevante abordar o conceito de domicílio segundo a doutrina e as recentes decisões jurisprudenciais.

2.1 DO DOMICÍLIO

Domicílio para a legislação civil é o lugar aonde o indivíduo tem sua residência principal, realiza seus negócios e principais obrigações.

Trata-se de um espaço que pertence á esfera intima da pessoa, pois é nele que guarda documentos, papéis e objetos de apreço e matem suas relações familiares e domésticas.

Ao discorrer sobre o conceito de domicílio Cristiano Chaves de Farias e outros dispõem que:

“Denomina-se domicílio o lugar que pode ser caracterizado como a sede jurídica dos negócios e interesses da pessoa. É onde ela se presume presente, pois é o espaço físico no qual habitualmente celebra atos jurídicos, encontra amigos e parentes, guarda seus pertences pessoais etc. Não é só o centro negocial, mas também familiar e social, para onde se dirigem convites, cartas, extratos bancários, revistas e contas de consumo”. (2012, p.112).

Como se pode inferir da citação acima o domicílio é um âmbito que pertence à esfera íntima do indivíduo eis que é nele que se manifestam as relações familiares. No que tange aos atos negociais o domicílio passa a ser um ponto de referência para se determinar o lugar no qual o individuo pode ser encontrado para responder por suas obrigações.

Ao conceituar domicílio Carlos Roberto Gonçalves dispõe:

“Pode-se simplesmente dizer que domicílio é o local onde o indivíduo responde por suas obrigações ou o local em que estabelece a sede principal de sua residência e de seus negócios. È, em última análise, a sede jurídica da pessoa, onde ela se presume presente para efeitos de direito e onde pratica habitualmente seus atos e negócios jurídicos”. (2011, p.143).

O domicílio é o local onde o indivíduo se estabelece e desenvolve suas relações familiares e negociais sendo considerado um lugar privado, relevante à proteção da vida privada e da esfera íntima do cidadão.

Sobre o conceito de casa Kildare Gonçalves Carvalho dispõe:

“O termo “casa” empregado no texto constitucional compreende qualquer compartimento habitado, aposento habitado, ou compartimento não aberto ao público, onde alguém exerce profissão ou atividade (Código Penal, art. 150, parágrafo 4°). É a projeção espacial da pessoa; o espaço isolado do ambiente externo utilizado para o desenvolvimento das atividades da vida e do qual a pessoa pretenda normalmente excluir a presença de terceiros. Da noção de casa fazem parte as ideias de âmbito espacial, direito de exclusividade em relação a todos, direito à privacidade e à não-intromissão. De se considerar, portanto, que nos teatros, restaurantes, mercados e lojas, desde que cerrem suas portas e neles haja domicílio, haverá a inviolabilidade por destinação, circunstância que não ocorre enquanto aberto”. (p.386, 2004).

A Constituição Federal protege a casa como ambiente íntimo do indivíduo, nesse contexto casa passa a ter uma acepção lata compreendendo qualquer compartimento habitado ou espaço não aberto ao público.

Sobre o conceito jurídico de casa dispõe Dirley da Cunha e Marcelo Novelino:

“O conceito jurídico de casa deve ser entendido de forma bastante ampla, abrangendo não apenas a moradia, mas também qualquer espaço habitado e locais nos quais é exercida uma atividade de índole profissional com exclusão de terceiros, tais como escritórios, consultórios, estabelecimentos industriais e comerciais”. (2012, p.45).

Está, portanto compreendido no conceito de casa os espaços habitados tais como quartos de hotéis e os ambientes nos quais o indivíduo realiza suas relações comerciais desde que fechados ao público.

Com o escopo de melhor proteger as liberdades individuais dos cidadãos a Constituição Federal de 1988 inseriu em texto como direito fundamental da pessoa humana a inviolabilidade de domicílio.

2.2 DA INVIOLABILIDADE DE DOMICÍLIO

A inviolabilidade de domicílio é um direito fundamental de primeira dimensão inserido no texto constitucional com o escopo de ampliar a proteção à esfera íntima da pessoa humana.

A inviolabilidade de domicílio é um direito fundamental de primeira dimensão caracterizado por um não fazer estatal. É um direito fundamental individual que se perfaz pela não intervenção do Estado.

Acerca dos direitos fundamentais de primeira dimensão Rafael Barreto (2012, p.37) dispõe que “A característica central desses direitos é o fato de serem direitos negativos, no sentido de que negam a intervenção estatal, de que são exercidos contra o Estado, limitando o poder de atuação dos governantes”.

Os direitos fundamentais apresentam ainda uma segunda dimensão formada pelos direitos sociais, econômicos e culturais e pela terceira dimensão de direitos constituída pelos direitos difusos.

Cumpre ressaltar, no entanto a primeira dimensão de direitos fundamentais que apresentam os direitos civis e políticos, direitos das liberdades que se configuram pela não intervenção do Estado em direitos essenciais individuais dos cidadãos.

Nesse escopo a Constituição elenca entre os direitos fundamentais o direito á inviolabilidade de domicílio.

Sobre o direito a inviolabilidade de domicílio dispõe a Constituição Federal no artigo 5º:

“Art. 5º…

XI – a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial;”

A Lei Maior garante ao indivíduo a proteção contra invasão indesejada ao seu ambiente domiciliar. Trata-se de uma extensão da tutela à intimidade da pessoa garantindo que ninguém entrará na casa de outrem sem o consentimento deste.

Ao discorrer sobre o histórico da inviolabilidade de domicílio Alexandre de Moraes dispõe:

“O preceito constitucional consagra a inviolabilidade do domicílio, direito fundamental enraizado mundialmente, a partir das tradições inglesas, conforme verificamos no discurso de Lord Chatham no Parlamento britânico: O homem mais pobre desafia em sua casa todas as forças da Coroa, sua cabana pode ser muito frágil, seu teto pode tremer, o vento soprar entre as portas mal ajustadas, a tormenta pode nela penetrar, mas o Rei da Inglaterra não pode nela entrar”. (2004, p.85).

A casa, entendendo esta em seu conceito lato apresentado pela doutrina e jurisprudência moderna, é um espaço da esfera íntima do indivíduo, no qual este estabelece suas relações privadas, portanto acobertado pelo manto da inviolabilidade.

A Constituição, no entanto, realizando uma ponderação de interesses entre direitos fundamentais elenca algumas exceções à inviolabilidade de domicílio que visam proteger um bem jurídico maior.

Nesse escopo são hipóteses constitucionais de exceção á inviolabilidade de domicílio o flagrante delito, desastre, a prestação de socorro e durante o dia o cumprimento de mandado judicial.

As hipóteses de flagrante delito, desastre e prestação de socorro se justificam devido á ponderação de interesses, pois nessas hipóteses ocorrem violações a outros bens jurídicos justificando a exceção taxativamente expressa no texto constitucional.

No que se refere a entrada de agentes públicos no cumprimento de seus deveres funcionais a Lei Maior adotou a reserva de jurisdição, pois a entrada em domicílio sem autorização do morador só pode ocorrer de dia e com mandado judicial.

Ao discorrer sobre as exceções à inviolabilidade de domicílio preceitua Dirley da Cunha e Marcelo Novelino:

“Com exceção das hipóteses de flagrante delito, desastre ou para prestar socorro, a invasão do domicílio somente poderá ocorrer durante o dia e por determinação judicial (reserva constitucional de jurisdição), o que impede a violação por autoridade administrativa, membros do Ministério Público ou mesmo Comissão Parlamentar de Inquérito”. (2012, p.46).

A Constituição elencou de forma expressa as exceções à inviolabilidade de domicílio, portanto a regra é que o domicílio da pessoa é um lugar inviolável e qualquer pessoa nele só pode entrar com o consentimento do morador.

Excepcionalmente, porém a Lei Maior dispõe taxativamente as exceções ao permitir a entrada independentemente de autorização do morador em caso de flagrante delito, desastre ou para prestar socorro, excepcionado o direito à inviolabilidade pela ponderação de direitos fundamentais.

No que refere a entrado de agentes públicos no cumprimento do dever legal, deve haver autorização judicial. Nessa hipótese o juízo de valor acerca da ponderação de direitos fundamentais envolvidos será realizado pelo Magistrado que irá aferir se existem motivos aptos a fundamentar a entrada do agente público sem a autorização do morador.

Para a concessão de autorização judicial aos agentes públicos, o Magistrado irá aferir se o interesse público representado no exercício do dever legal justifica a mitigação do direito fundamental á inviolabilidade de domicílio. Ou se a relevância no cumprimento de uma função de interesse público é motivação para se dispensar a autorização judicial no cumprimento da função, por parte de determinados agentes públicos e em especial as autoridades fiscais.

Nesse ínterim se mostra relevante compreender as características e preceitos legais que envolvem a realização da atividade fiscal.

3. DA VIOLAÇÃO DE DOMICÍLIO POR AGENTE FISCAL

A atividade fiscal decorre do desenvolvimento da relação jurídico-tributária realizada entre o Fisco, sujeito ativo da obrigação tributária e o contribuinte que é o sujeito passivo da relação.

Como abordado anteriormente, a obrigação tributária decorre da realização pelo indivíduo, de um fato gerador previsto em lei como apto à incidência do dever de pagar tributos.

Os tributos são fonte de receita do Estado para a consecução dos fins sociais da coletividade, motivo que justifica o caráter coercitivo do dever de pagar tributos. Trata-se de uma repartição pecuniária coercitiva realizada entre os cidadãos em prol dos interesses de ordem coletiva.

Nesse sentido a atividade fiscal mostra-se como um instrumento imprescindível à consecução dos objetivos e fins previstos na Lei Maior tais como a erradicação da pobreza a construção de uma sociedade livre justa e solidária.

3.1 DA ATIVIDADE FISCAL

A atividade fiscal compreende um conjunto de ações realizadas pelos agentes do Estado para efetivar a atividade da cobrança de tributos.

O Fisco tem o poder de exigir tributos àqueles que pratiquem o fato gerador previsto em lei como apto a efetivar a obrigação tributária, esse poder de império advém do poder político estatal necessário para realizar os fins e objetivos em prol da coletividade.

Ao conceituar fiscalização Eduardo Sabbag dispõe:

“A fiscalização se materializa em atos de verificação do cumprimento de obrigações tributarias, quer sejam principais, quer sejam acessórias. São atos decorrências da faculdade outorgada pela Constituição Federal as pessoas políticas, quanto a instituição de tributos. Assim, o procedimento fiscalizatório traduz-se em um poder-dever cometido as entidades impositoras.” (2011, p.909).

A atividade fiscal compreende entre suas atividades a fiscalização acerca do cumprimento das obrigações tributárias principais e acessórias. Essa tarefa de fiscalização é imprescindível para a efetividade da relação jurídico-tributária ao garantir e auxiliar desde a constituição até o cumprimento da obrigação tributária.

Acerca do âmbito de desenvolvimento da atividade fiscal Eduardo Sabbag preceitua ainda:

“A fiscalização deve permear seu trabalho mantendo-se fiel aos campos de interesse da Administração, sem promover a extrapolação da sua competência administrativa. Temos dito que a exigência estatal deve homenagear a parcimônia, a fim de que o cumprimento da medida pelo administrado venha a alimentar o interesse publico que a justifica. Toda exigência deve ser geral, dotada de razoabilidade e tendente a proteger os interesses públicos primários”. (2011, p.911).

Para realizar a fiscalização do cumprimento da obrigação jurídico-tributária a legislação dispõe uma serie de prerrogativas aos agentes do Estado.

Entre essas prerrogativas merece destaque a possibilidade das autoridades fiscais solicitarem auxílio das forças públicas, quando vítimas de embaraço ao exercício de suas funções ou quando necessário à realização das atividades tributárias.

Cumpre ressaltar que as prerrogativas do Estado têm por escopo auxiliar na efetivação das políticas públicas e nas ações de interesse da coletividade.

Acerca da relevância do interesse público na função Administrativa do Estado José dos Santos Carvalho dispõe:

“As atividades administrativas são desenvolvidas pelo Estado para benefício da coletividade. Mesmo quando age em vista de algum interesse estatal imediato, o fim último de sua atuação deve ser voltado para o interesse público. E se, como visto, não estiver presente esse objetivo, a atuação estará inquinada de desvio de finalidade. Desse modo, não é o indivíduo em si o destinatário da atividade administrativa, mas sim o grupo social num todo. Saindo da era do individualismo exacerbado, o Estado passou a caracterizar-se como Welfare State (Estado/ bem estar), dedicado a atender o interesse público. Logicamente, as relações sociais vão ensejar, em determinados momentos, um conflito entre o interesse público e o interesse privado, mas, ocorrendo esse conflito, há de prevalecer o interesse público”. (1999, p.16).

O interesse público justifica as prerrogativas concedidas ao Estado para realizar as atividades de cunho Administrativo, nesse sentido também a atividade fiscal compreende as funções administrativas do Estado em prol do interesse público, uma vez que os tributos são fonte para a entrada de receitas do Estado.

A função administrativa referente ao desenvolvimento e fiscalização da obrigação tributária compreende as tarefas da administração tributária.

Sobre a administração tributária dispõe Edvaldo Nilo de Almeida:

“A administração tributária é a parte da administração pública direta que cuida da orientação do sujeito passivo, fiscalização e arrecadação do tributo, bem como do treinamento dos servidores públicos que atuam nessas áreas, sobretudo os analistas tributários e auditores fiscais.” (2011, p.389).

A administração tributária tem a finalidade efetivar a relação obrigacional jurídico-tributária auxiliando na fiscalização do cumprimento da obrigação tributária acessória e principal.

3.2 DA VIOLAÇÃO DE DOMICÍLIO POR AUTORIDADE FISCAL

O Código Tributário Nacional ao dispor sobre a administração tributária prevê em seu artigo 200 acerca da possibilidade das autoridades fiscais requisitarem o auxílio de força pública para melhor desempenhar a fiscalização do cumprimento da obrigação tributária.

Acerca dos poderes das autoridades fiscais o CTN dispõe:

“Art. 200. As autoridades administrativas federais poderão requisitar o auxílio da força pública federal, estadual ou municipal, e reciprocamente, quando vítimas de embaraço ou desacato no exercício de suas funções, ou quando necessário à efetivação de medida prevista na legislação tributária, ainda que não se configure fato definido em lei como crime ou contravenção.”

Nesse mister para melhor desempenhar a fiscalização da obrigação principal e acessória da relação jurídico-tributária as autoridades fiscais possuem prerrogativas para auxiliar na efetivação do pagamento do tributo e para o desempenho das obrigações de fazer ou não fazer impostas em lei como obrigações acessórias.

Na atividade de fiscalização tributária algumas vezes é necessário que os fiscais tenham acesso a livros contábeis ou outros documentos aptos a comprovar o não cumprimento de determinadas obrigações tributárias.

Esses livros e documentos quando guardados no domicílio do contribuinte, devem ser por estes disponibilizados à fiscalização das autoridades fiscais.

Porém quando o contribuinte se recusa a receber as autoridades fiscais em seu domicílio surge o questionamento acerca da possibilidade de requisição de força pública para adentrar no domicílio e realizar a fiscalização da relação jurídico-tributária.

O CTN é anterior a Constituição Federal de 1988, portanto mostra-se imprescindível em sua aplicação avaliar se os seus dispositivos se coadunam com as normas previstas na Lei Maior.

Ao aplicar as regras que regulam o exercício da administração tributária e em especial a regra que dispõe acerca da atribuição da autoridade fiscal de requisitar força pública diante de condutas que embaracem e dificultem o exercício de sua função, mister se faz analisar se este procedimento está em consonância com os preceitos previstos na Constituição Federal.

Sobre a constitucionalidade da violação de domicílio pela autoridade fiscal preceitua Hugo de Brito Machado:

“A requisição, quando cabível, é feita diretamente pela autoridade administrativa. Não há necessidade de intervenção judicial. Mas é necessário distinguirmos entre as hipóteses nas quais é cabível a requisição da forca pública diretamente pela autoridade administrativa daquelas nas quais se faz necessária uma decisão judicial para autorizá-la. Sem essa distinção o art. 200 do Código Tributário Nacional será inconstitucional. Com efeito, em sua expressão literal, e admitindo-se que se aplica em qualquer hipótese, a norma do art. 200 do Código Tributário Nacional coloca-se em aberto conflito com as garantias constitucionais relativas à inviolabilidade do domicílio, conceito no qual é razoável incluir-se o estabelecimento comercial na parte em que não é acessível ao público (…) No caso em que o uso da força pública possa estar em conflito com as garantias constitucionais do contribuinte deve este ser objeto de prévia autorização judicial, sem o quê as provas eventualmente colhidas não poderão ser utilizadas pela Fazenda Pública. Além disto, a conduta dos agentes fiscais pode eventualmente configurar o crime de excesso de exação”. (2002).

Conforme citado acima pode se inferir que é plenamente possível a requisição por parte da autoridade fiscal de requisição de força pública para auxiliá-lo no cumprimento de sua atividade fiscal, importante ressaltar, porém que essa requisição encontra limite nas garantias constitucionais tais como a inviolabilidade de domicílio previsto no artigo 5º, inciso XI da Constituição Federal.

Sobre a inviolabilidade de domicílio segue posicionamento do STF:

“Para os fins da proteção jurídica a que se refere o art. 5.º, XI, da Constituição da República, o conceito normativo de ‘casa’ revela -se abrangente e, por estender -se a qualquer aposento de habitação coletiva, desde que ocupado (CP, art. 150, § 4.º, II), compreende, observada essa específica limitação espacial, os quartos de hotel. Doutrina. Precedentes. Sem que ocorra qualquer das situações excepcionais taxativamente previstas no texto constitucional (art. 5.º, XI), nenhum agente público poderá, contra a vontade de quem de direito (invito domino), ingressar, durante o dia, sem mandado judicial, em aposento ocupado de habitação coletiva, sob pena de a prova resultante dessa diligência de busca e apreensão reputar-se inadmissível, porque impregnada de ilicitude originária. Doutrina. Precedentes (STF)” (RHC 90.376, Rel. Min. Celso de Mello, j. 03.04.2007, DJ de 18.05.2007).

A inviolabilidade de domicílio é um direito fundamental individual previsto constitucionalmente e indispensável à tutela da dignidade da pessoa humana. Nesse viés o Supremo Tribunal Federal zela pela direito à inviolabilidade de domicílio sendo vedada a entrada no domicílio sem autorização do morador, salvo as exceções taxativamente previstas no Texto Constitucional.

Sobre a violação de domicílio por autoridade fiscal Dirley da Cunha e Marcelo Novelino preceituam:

“A autoexecutoriedade conferida à administração tributária para invadir estabelecimentos comerciais e industriais cedeu lugar diante da consagração da inviolabilidade do domicílio. Caso não haja consentimento do proprietário, o ingresso do agente fiscal no estabelecimento dependerá de prévia autorização judicial, sob pena de serem consideradas ilícitas as provas obtidas”. (2012, p.46).

A entrada sem autorização no domicílio de alguém, para não configurar crime, deve ocorrer nas hipóteses taxativamente previstas na constituição. Salvo as hipóteses de flagrante delito, desastre ou prestação socorro, a entrada forçado só é legitima se ocorrer durante o dia e com mandado judicial.

O exercício da atividade fiscal não é exceção constitucional à inviolabilidade de domicílio e nesse sentido a sua ocorrência está subordinada a existência de mandado judicial autorizando a entrada coercitiva.

Ao discorrer sobre a possibilidade de violação de domicílio por autoridade fiscal preceitua Eduardo Sabbag:

“Assim, entende-se que os agentes da administração tributaria, ainda que acompanhados de forca policial, não podem, sem autorização judicial, ingressar em escritório de contabilidade contra a vontade de seu titular, que nele desempenhe atividade profissional, com o objetivo de apreender documentos ali existentes, como livros, registros fiscais e contábeis e memória de computadores”. (2011, p.916).

Resta claro a relevância da atividade fiscal para efetivar o cumprimento das obrigações acessórias e da obrigação principal da obrigação tributária, essa atribuição, porém não pode justificar a realização de condutas de violem direitos fundamentais da pessoa humana.

Importante ressaltar que segundo precedentes dos tribunais superiores o termo “casa” previsto na Constituição Federal abrange os ambientes fechados aonde se realizam atividades profissionais.

Nesse sentido os escritórios e demais compartimentos fechados ao público de realização de atividades profissionais são considerados domicílio e, portanto estão acobertados pela inviolabilidade de domicílio previsto no artigo 5º, inciso XI da Constituição Federal.

Sobre a inviolabilidade de domicílio preceitua o Supremo Tribunal Federal:

“EMENTA: FISCALIZACAO TRIBUTARIA. Apreensão de livros contábeis e documentos fiscais realizada, em escritório de contabilidade, por agentes fazendários e policiais federais, sem mandado judicial. Inadmissibilidade. Espaço privado, não aberto ao publico, sujeito a proteção constitucional da inviolabilidade domiciliar (CF, art. 5o, XI). Subsunção ao conceito normativo de “casa”. Necessidade de ordem judicial. Administração publica e fiscalização tributaria. Dever de observância, por parte de seus órgãos e agentes, dos limites jurídicos impostos pela Constituição e pelas leis da Republica. Impossibilidade de utilização, pelo Ministério Publico, de prova obtida em transgressão a garantia da inviolabilidade domiciliar. Prova ilícita. Inidoneidade jurídica. Habeas corpus deferido. Administração tributaria. Fiscalização. Poderes. Necessário respeito aos direitos e garantias individuais dos contribuintes e de terceiros”. (HC 82.788/RJ, 2a T., rel. Min. Celso de Mello, j. 12-04-2005).

Não obstante a relevância da tarefa de administração tributária é necessário que as autoridades fiscais realizem suas funções em consonância com os preceitos da Lei Maior. Nesse sentido, a autoridade fiscal deve atuar em conformidade com os direitos fundamentais expressamente previstos na Constituição e entre eles a inviolabilidade de domicílio.

Ao discorrer sobre a atividade fiscal e os direitos fundamentais Edvaldo Nilo dispõe:

“Entretanto, ressaltamos que o CTN não pode e nem exclui os direitos e garantias fundamentais estabelecidos no texto constitucional, tais como o direito à intimidade e a vida privada (art. 5º, X), a inviolabilidade do domicílio (at. 5º, XI), o sigilo de correspondência e das comunicações telegráficas (art. 5º, XII), o livre exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão (art. 5º, XIII), dentre outros”. (2011, p.394).

As autoridades fiscais possuem uma serie de prerrogativas que visam auxiliar no desempenho da fiscalização das obrigações tributárias, essa tarefa de fiscalização, no entanto não pode suprimir direitos fundamentais da pessoa humana.

A inviolabilidade de domicílio só pode ser mitigada nas hipóteses expressamente previstas na Constituição Federal e entre elas não há previsão para a atuação da atividade fiscal.

Nesse sentido pode se inferir que para adentrar no domicílio do contribuinte sem a autorização deste para efetivar o cumprimento de atividade fiscal faz-se necessário mandado judicial.

A impossibilidade de violação de domicílio por parte da autoridade fiscal, no entanto não pode justificar ações de embaraço a atividade fiscal por parte do contribuinte, pois este tem o dever de cooperar com os agentes públicos no cumprimento das atividades de administração tributária.

Sobre a resistência contra a ação de autoridade fiscal preleciona Ricardo Cunha Chimenti:

“Havendo expressa resistência contra a ação fiscal, a administração tributária deve requerer ao Poder Judiciário um mandado de busca e apreensão, podendo o contribuinte ser enquadrado no art. 1º, I da Lei n. 8.137/90 (que trata dos crimes contra a ordem tributária).” (2010, p.152).

O contribuinte tem o dever de realizar a obrigação principal pagando seus tributos, porém tem ainda o dever de realizar as obrigações acessórias que consiste na realização de determinadas condutas aptas a auxiliar a atividade da administração tributária.

Devido à relevância da obrigação tributária para a consecução dos fins almejados pelo Estado o descumprimento ou obstrução da atividade fiscal pode até mesmo configurar crime contra a ordem tributária tipificados em sua maioria na lei 8.137/90.

Essa lei prevê uma serie de condutas por parte do contribuinte que configurar crime contra a ordem tributária.

O artigo 1º da lei 8.137/90 dispõe:

“Art. 1° Constitui crime contra a ordem tributária suprimir ou reduzir tributo, ou contribuição social e qualquer acessório, mediante as seguintes condutas:

I – omitir informação, ou prestar declaração falsa às autoridades fazendárias;

II – fraudar a fiscalização tributária, inserindo elementos inexatos, ou omitindo operação de qualquer natureza, em documento ou livro exigido pela lei fiscal;

III – falsificar ou alterar nota fiscal, fatura, duplicata, nota de venda, ou qualquer outro documento relativo à operação tributável;

IV – elaborar, distribuir, fornecer, emitir ou utilizar documento que saiba ou deva saber falso ou inexato;

V – negar ou deixar de fornecer, quando obrigatório, nota fiscal ou documento equivalente, relativa a venda de mercadoria ou prestação de serviço, efetivamente realizada, ou fornecê-la em desacordo com a legislação.

Pena – reclusão de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa.”

É dever do contribuinte, prestar informações, declarações e fornecer livros e documentos que compreendam obrigações acessórias da relação jurídico-tributária, esse dever, no entanto não permite que as autoridades fiscais desrespeitem a inviolabilidade de domicílio prevista na Constituição Federal como direito fundamental.

A entrada dos fiscais tributários em domicílios sem a permissão do morador se submete a exigência de mandado judicial, não sendo permitido a esses agentes adentrar em domicílios sem o consentimento dos moradores, mesmo que seja no exercício da atividade fiscal.

O artigo 200 do Código Tributário Nacional deve ser interpretado conforme a Constituição no sentido de limitar a atuação da autoridade fiscal aos preceitos previstos na Lei Maior.

A possibilidade das autoridades fiscais requisitarem auxílio de força policial para efetivar o exercício da atividade fiscal encontra limites nos direitos fundamentais da pessoa humana previstos na Constituição Federal sob pena de não recepção dos preceitos previstos no artigo 200 que sejam incompatíveis com a Carta Magna.

A Constituição Federal de 1988 é a norma suprema do ordenamento jurídico brasileiro e todas as demais normas e decisões políticas do Estado devem estar em conformidade com a Lei Maior, assim as normas do Código Tributário Nacional só serão legitimas e terão validade se estiverem em conformidade com a Constituição Federal de 1988.

CONCLUSÃO

O presente artigo teve como escopo abordar a conformidade do artigo 200 do Código Tributário Nacional com a Constituição Federal de 1988 e a consequente possibilidade de violação de domicílio por parte da autoridade fiscal no cumprimento das obrigações tributárias.

A atividade tributária surge do poder de império do Estado e tem por objetivo a obtenção de receitas que serão destinadas a consecução do bem estar social. A relação jurídico-tributária tem surge com a realização por parte do sujeito passivo, o contribuinte, de uma das condutas previstas em lei como hipótese de incidência apta a gerar o dever de pagar tributos.

Com a ocorrência na prática da hipótese abstratamente prevista em lei surge o direito do Estado de exigir do contribuinte o pagamento do tributo previsto em lei. O tributo é um pagamento compulsório e uma vez realizado o fato gerador tem início a obrigação tributária que tem como sujeito ativo o fisco, ente estatal, e como sujeito passivo o contribuinte.

Para melhor efetivar o cumprimento das obrigações tributárias acessórias e principal o Estado conta com um conjunto de prerrogativas legais que visam melhor aparelhar os agentes estatais. Algumas vezes a atividade das autoridades fiscais, no entanto entram em conflito com direitos fundamentais do contribuinte sendo necessário aferir qual interesse deve prevalecer no caso concreto.

Os direitos fundamentais são um núcleo de direitos intangíveis e essenciais à dignidade da pessoa humana positivados nas Constituições Federais dos Estados.

A Constituição Federal de 1988 apresenta um extenso rol de direitos fundamentais espalhados em todo seu texto legal. Entre os direitos fundamentais expressamente previstos na Lei Maior se encontra o direito fundamental á inviolabilidade de domicílio previsto no artigo 5º inciso XI que dispõe que a casa é asilo inviolável ninguém podendo nela entrar sem o consentimento do morador, salvo em flagrante delito, desastre, para prestar socorro ou durante do dia em cumprimento de mandado judicial.

A inviolabilidade de domicílio é um direito que visa assegurar a casa como um espaço reservado às relações intimas e pessoais dos cidadãos, que detém o direito de permitir o negar a entrada das pessoas em seu domicílio.

  Com o escopo de estender a tutela de proteção á pessoa humana a jurisprudência pátria e em especial o Supremo Tribunal Federal vem firmando entendimento no sentido de ampliar o conceito de casa que passa a compreender qualquer compartimento habitado ou espaço não aberto ao público no qual o indivíduo exerça as suas atividades profissionais.

  O artigo 200 do Código Tributário Nacional preceitua que as autoridades fiscais podem requisitar força pública quando vítimas de embaraço ao exercício de suas funções ou quando necessário à efetivação de medida prevista na legislação tributária.

Nesse escopo surge o questionamento acerca da possibilidade das autoridades fiscais se utilizarem de força pública para adentrar a casa ou estabelecimento comercial do contribuinte que se recuse a cumprir obrigações tributárias acessórias previstas em lei proibindo a entrada dos fiscais tributários e, portanto vedando o acesso desses agentes a documentos e livros contábeis entre outros.

Instado a se manifestar sobre o tema o Supremo Tribunal Federal como guardião da Constituição vem decidindo no sentido de que o exercício da atividade fiscal encontra limite nos direitos e garantias fundamentais expressamente previstas na Lei Maior.

No que tange a inviolabilidade de domicílio a Constituição Federal apresenta como exceções a ocorrência de flagrante delito, desastre, prestação de socorro ou durante dia em cumprimento de mandado judicial. Trata-se de um rol taxativo de exceções não sendo possível sua ampliação.

Diante do acima exposto pode se inferir que a atividade fiscal é relevante para a consecução dos fins do Estado, motivo pelo qual as autoridades fiscais possuem prerrogativas legais tais como a possibilidade de requisição de força pública quando se fizer necessário para o exercício de suas funções, essa prerrogativa, no entanto apresenta limitações.

Conforme entendimento do Supremo Tribunal Federal e de ampla corrente doutrinária, a atividade fiscal encontra limites nos direitos fundamentais previstos na Constituição Federal.

Nesse escopo os agentes fiscais do Estado não podem adentrar na casa ou qualquer compartimento fechado do contribuinte sem a autorização deste, para exercer a fiscalização de atividade tributária. A entrada em domicílio sem autorização do morador se limita as exceções expressamente previstas na Constituição Federal, quais sejam flagrante delito, desastre, prestação de socorro ou durante o dia em cumprimento de mandado judicial.

O artigo 200 do Código Tributário Nacional deve ser interpretado conforme a Constituição, com o efetivo exercício das atividades fiscais sempre em consonância com os direitos e garantias previstas na Lei Maior.

A violação de domicílio por autoridade fiscal sem mandado judicial fere o direito a inviolabilidade de domicílio expressamente previsto na Constituição Federal de 1988 no artigo 5º, inciso XI.

A Constituição é a norma suprema, fundamento de validade do ordenamento jurídico e todas as demais normas e decisões políticas do Estado devem apresentar conformidade com seus princípios e regras.

Os direitos e garantias fundamentais são uma importante conquista a efetivação da dignidade da pessoa humana e, portanto não podem ser suprimidos sobre o pretexto de consecução dos interesses sociais, pois a dignidade da pessoa humana é o fim maior, fundamento do Estado brasileiro.

Nesse ínterim pode se concluir que os agentes fiscais só podem adentrar no domicílio do contribuinte para efetivar o exercício da fiscalização tributária sem a autorização do morador se possuir mandado judicial.

A interpretação ampla do artigo 200 do CTN como permissivo para violação de domicílio por autoridade fiscal sem mandado judicial viola o artigo 5º, inciso XI da Constituição Federal e, portanto enseja a não recepção do citado artigo no ordenamento jurídico brasileiro.

 

Referências
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Informações Sobre o Autor

Delciomar Moro dos Santos

Bacharel em Direito pela Faculdade Anhanguera do Rio Grande Pós-Graduado em Direito Público Pós-Graduando em Direito Tributário professor do CAT concursos