Dano moral ambiental: desestimulando condutas danosas

Resumo: A responsabilidade civil aplicada em caso de dano ambiental deve ser objetiva, ou seja, independente da análise de culpa do poluidor – Trata-se do Princípio do Poluidor-pagador, no qual é imprescindível a reparação do dano, sendo necessário desestimular condutas danosas e, ao mesmo tempo, reparar o meio ambiente. Além disso, o juiz ao sentenciar deve considerar na aplicação da multa a sua função pedagógica, evitando a falsa ideia de que pagar é vantajoso diante de multas com valores irrisórios. No mais, a indenização pecuniária não deve ser vista pelos poluidores como o único meio de reparação do dano causado, devendo também o ambiente afetado ser reparado. Ainda, cabe ressaltar, que a responsabilidade civil no direito ambiental não visa satisfazer tão somente o interesse particular, mas detém o caráter coletivo. Sendo assim, o setor industrial deve aliar desenvolvimento com a preservação natureza, protegendo o patrimônio ambiental coletivo de toda ofensa. Sendo assim, o presente trabalho busca explorar a importância de um novo remédio jurídico no que tange questões ambientais: o dano moral ambiental. Irá, diante da temática proposta, demostrar recentes reflexos jurisprudenciais além de fazer a distinção entre o dano moral ambiental e dano ambiental. [1]

Palavras-chave: Dano moral ambiental. Responsabilidade civil ambiental. Princípio do Poluidor-Pagador.

Abstract: The civil liability applied in such cases of environmental damage must be objective, which means it should be independent of the polluter's fault analysis – this is the Polluter-Pays Principle, in which it is essential to repair the damage and it is necessary to discourage harmful actions and, at the same time, repair the environment. In addition, the judge in sentencing must consider the application of a fine its pedagogical function, avoiding the false idea that to pay is advantageous in front of fines with derisory values. In addition, the pecuniary compensation should not be seen by the polluters as the only mean of repairing the damage caused, being necessary that the affected environment should be repaired. Still, it should be emphasized that civil liability in environmental law is not only aimed at satisfying the private interest, but it also has a collective function. Thus, the industrial sector must ally development with the preservation of nature, protecting the collective environmental patrimony of all offense. Therefore, the present work seeks to explore the importance of a new legal remedy regarding environmental issues: environmental moral damage. It shall demonstrate recent jurisprudential reflexes, distinguishing between environmental moral damage and environmental damage.

Keywords: Environmental moral damage. Environmental civil liability. Principle of Polluter-Pays.

Sumário: Introdução. 1. Princípio do poluidor-pagador como meio subsidiário de responsabilização. 2. A consagração do Dano Moral Ambiental junto a Justiça Brasileira. 3. Sujeitos e distinções no Direito Ambiental: buscando a mais completa reparação. Conclusão. Referências.

Introdução

A responsabilidade civil por dano moral ambiental é tema pouco explorado ante a inovação que traz no mundo jurídico, portanto, são recentes as doutrinas e jurisprudências que tratam especificamente sobre o tema. A destruição do ecossistema, a poluição da biosfera e o desenfreado crescimento sem planejamento, refletem a pouca preocupação do setor industrial com o meio ambiente, considerando o fato econômico sobre o socioambiental.

Esse novo instituto jurídico representa um grande avanço para o Direito que não deve permanecer o mesmo. É exatamente por isso que, com os avanços em matéria Ambiental desde o advento da Carta Magna de 88 e a necessidade cada vez mais latente de se discutir a proteção da natureza no ambiente da Ciência Jurídica, esse tema torna-se de grande importância no cenário contemporâneo.

O dano ambiental subdivide-se em dano ao ecossistema e dano moral ambiental. Ao primeiro, cabe a recuperação do meio ambienta degradado, a multa não possui finalidade em si, uma vez que não tem destinação específica, o beneficiário da pecúnia é o poder estatal todo o tramite da multa se dá pela via administrativa. Por outro lado, o dano moral ambiental é a indenização com caráter pedagógico, objetivando que o poluidor-pagador não venha a repeti-lo, o meio cabível para pleiteá-la é o judicial através de Ação Civil Pública com Obrigação de Fazer e Não Fazer, a responsabilização civil neste caso é objetiva, independente de culpa, além disso, a indenização tem fim específico, o fundo de recuperação do meio ambiente e o beneficiário é a coletividade.

A teoria objetiva da responsabilidade civil preponderou no âmbito do Direito Ambiental, no entanto, pouco se faz para alcançar seu objetivo, qual seja: imputar ao causado do dano o ônus pela reparação de forma a coibir ações degradatórias. Entretanto, tais fatos acabam por ser mitigados por medidas meramente compensatórias. Isto, em grande parte, se dá pelo fato de a responsabilidade civil, nessa área, ser mal explorada e interpretada de forma equivocada.

1. Princípio do poluidor-pagador como meio subsidiário de responsabilização

Os princípios no Direito têm a função de representar os objetivos de uma determinada sociedade, dar norte às vastas interpretações que poderiam ser feitas no âmbito legal. É aí, então, que se encontra a crítica supramencionada, a responsabilidade civil, em matéria Ambiental, não se submete, na prática, aos princípios desta, fazendo-se, portanto, uma leitura que se equivoca ao constantemente permitir que os interesses econômicos subjuguem os interesses coletivos.

Objetiva-se, com a legislação Ambiental e a observação de seus princípios, desestimular a atividade lesiva e a punição do poluidor, de forma que se proteja o ambiente, ou, se este já fora lesado, a restituição de seu estado anterior ao dano.

É diante desta proposta de leitura principiológica se percebe que a indenização pecuniária, aplicada amplamente como forma de responsabilização, deveria ser meio subsidiário de responsabilização. Focando, então, na recuperação do meio-ambiente, fator que não depende unicamente da questão pecuniária, como nos propõe a análise principiológica do Direito Ambiental. A dívida do causador do dano com a sociedade apenas será sanada, portanto, quando o primeiro restituir o ambiente a seu prévio estado. Chama-se, a esta lógica de restituição do meio ambiente como primeira opção e, só então, a pecúnia de princípio poluidor-pagador.

Como expõem BEDRAN MARCOS e MAYER (2013, p. 51):

‘’Assim, a reparação por meio de uma indenização tem o intuito de fazer com que o meio ambiente lesado retorne ao status quo ante, ou seja, ao estado em que se encontrava antes da ocorrência do dano. Todavia, na maioria das vezes, é impossível a recuperação ou retorno ao estado anterior, o que torna imprescindível a necessidade de manutenção e conservação’’.

Cumpre apontar que a proteção de valores morais não se limita a valores morais individuais da pessoa física, a reparabilidade do dano moral deve ser admitida em face da coletividade que, não obstante o fato de ser ente despersonalizado, é possuidor de valores morais próprios e de um patrimônio que, em sua idealidade, deve ser protegido.

Aceitando-se, portanto, que a proteção dos valore morais não se restringe aos valores morais individuais da pessoa física, dá-se um primeiro passo para que se reconheça a reparabilidade do dano moral frente à um ente despersonalizado, no caso, o coletivo lesado pela conduta gravosa ao ambiente.

Segundo MARCHESAM (2006) apud DELGADO (2008, p.99):

“No caso do dano ecológico, a primeira premissa é perceber que este dano não consiste apenas e tão-somente na lesão ao equilíbrio ecológico, afetando igualmente outros valores precípuos da coletividade a ele ligados, a saber: a qualidade de vida e a saúde. Estes valores estão intimamente inter-relacionados, de modo que a agressão ao ambiente afeta diretamente a saúde e a qualidade de vida da comunidade. Portanto, as lesões a direitos difusos e coletivos também poderão produzir danos morais, pois qualquer abalo no patrimônio moral da coletividade também merece reparação.”

É a partir da observação de que o dano ambiental resulta em uma gama de danos à sociedade como um todo que se facilita o entendimento dos danos morais coletivos, visto que se trata de uma violação antijurídica a um patrimônio pertencente a uma comunidade e não pertencente a apenas um indivíduo.

Ressalta-se, ainda, que não há de se falar em “prova de culpa”, diante do fato de que, segundo o art. 14§1º, da Lei nº 6.938/81, a responsabilidade civil por dano ambiental é objetiva, não se fazendo necessária a prova da culpa do poluidor na situação que resultou em dano ambiental. Será discutida, então, apenas o evento danoso, a conduta lesiva e o nexo causal entre o dano e a conduta do poluidor.

Conclui-se a breve análise com a consciência de que o dano moral ambiental é um instrumento que tende a ser cada vez mais utilizado e ampliado, diante de seu potencial de atuar em grande sintonia com a legislação e o exigido pela sociedade quanto a preservação do ambiente.

2. A consagração do Dano Moral Ambiental junto a Justiça Brasileira

Demonstra-se, em concordância com o que já fora exposto, a aplicação dos danos morais em matéria ambiental em acórdão da Apelação Cível 2001.001.14586 (TJRJ, Rela Desemb. Maria Raimunda T. de Azevedo, 06.03.02), transcrevendo-se, por oportuno, a ementa:

‘'Poluição Ambiental. Ação civil Pública formulada pelo Município do Rio de Janeiro. Poluição consistente em supressão da vegetação do imóvel sem a devida autorização municipal. Cortes de árvores e início de construção não licenciada, ensejando multas e interdição do local. Dano à coletividade com a destruição do ecossistema, trazendo conseqüências nocivas ao meio ambiente, com infringência às leis ambientais, Lei Federal 4.771/65, Decreto Federal 750/93, artigo 2o, Decreto Federal 99.274/90, artigo 34 e inciso XI, e a Lei Orgânica do Município do Rio de Janeiro, artigo 477. Condenação à reparação de danos materiais consistentes no plantio de 2.800 árvores, e ao desfazimento das obras. Reforma da sentença para inclusão do dano moral perpetrado à coletividade. Quantificação do dano moral ambiental razoável e proporcional ao prejuízo coletivo. A impossibilidade de reposição do ambiente ao estado anterior justifica a condenação em dano moral pela degradação ambiental prejudicial à coletividade. Provimento do recurso'’.

A necessidade de se aderir a um novo formato de responsabilização, para aqueles que cometem danos ao meio ambiente – tanto pessoas físicas, quanto jurídicas –, se torna perceptível. O direito ao meio ambiente tem um papel fundamental na sociedade, refletindo na relação do ser humano com o meio em que se insere e a adequação do seu modo de vida, sem, contudo, coibir o desenvolvimento da indústria e do comércio e de outras necessidades básicas que a vida em sociedade pressupõe – moradia, saúde, etc. Nesta senda, a reparação do dano moral ambiental se estabelece taxativa, instigando a consciência de preservação pelos integrantes de certo meio, onde o poder legislativo atue concretamente no que tange à obrigação de reparar qualquer mal que afete o meio ambiente.

Como expõe DALANHOL, citado por DELGADO (2008, p. 97):

"O tema dano moral ambiental trafega muito lentamente em alguns países, notadamente aqueles voltados para a problemática dos aspectos causadores de impactos ambientais. Não se pode mais, num mundo globalizado, desconhecer a existência do fato provocador de tantas aflições, angústias e infinitas dores no íntimo do ser humano. A questão, como se disse, transcende as fronteiras brasileiras e percorre infinitas nações. Contudo, no presente trabalho, pretende-se fixar a abrangência no contexto nacional, para o fim de produzir um estudo que, trafegando pelas universidades, pelo mundo virtual, pela publicidade, ainda que incipiente, possa proporcionar o debate, a discussão e, se for o caso, servir como um dos pontos de partida para tornar o tema atraente, possibilitando uma ampla discussão, afloradora de idéias, independentemente de pontos fixos dentro da sociedade, independentemente de camadas sociais, de níveis de escolaridade, que atinja o corpo docente e discente, o empresariado, as associações e entidades afins. Será encarar a reparação do dano moral ambiental como um fato irreversível, provocador da consciência preservativa da coletividade e, por derradeiro, provocar o poder legislativo, para que analise o tema e proporcione uma legislação concreta acerca da obrigatoriedade da reparação do mal resultante de um ato doloso ou culposo em detrimento do meio ambiente que deve ser ecologicamente sustentável e, ferindo o sentimento mais nobre do ser humano, qual seja, a dor íntima e o sofrimento moral."

Diante da análise do julgado e das problematizações trazidas à baila, podemos concluir que a legislação há de acompanhar os tribunais quanto a efetividade das respostas às situações de flagrante desrespeito ao meio ambiente.

3. Sujeitos e distinções no Direito Ambiental: buscando a mais completa reparação

Os danos morais individuais e os danos morais ambientais se destacarão por sentimentos de vergonha, dor, tristeza, etc. O que importa salientar, no ponto, é de quem refletirá essa combinação de sentimentos, essa comoção negativa. Tem-se no dano moral individual um sujeito devidamente individualizado, enquanto no dano moral ambiental todos os membros de um grupo serão os "detentores" do mau sentimento devido a alguma prática prejudicial ao meio ambiente.

A dificuldade se dá, de certa forma, em como poderá se avaliar o dano moral ambiental sofrido por determinada população em determinada área. Nesse contexto, percebe- se a importância de um Poder Judiciário com efetiva tutela de um gerenciamento ambiental adequado, efetivando medidas que não sejam meramente paliativas, mas que coíbam consequências negativas ao meio, buscando-se uma prevenção à danos futuros.

Preceitua BACHARO JÚNIOR apud DELGADO (2008, p. 108):

‘’Diante do que foi exposto, o dano ambiental pode ser compreendido como sendo o prejuízo causado a todos os recursos ambientais indispensáveis para a garantia de um meio ecologicamente equilibrado, provocando a degradação e, conseqüentemente, o desequilíbrio ecológico. O dano ambiental, assim como o dano, tanto pode ser patrimonial como moral. É considerado dano ambiental patrimonial quando há a obrigação de uma reparação a um bem ambiental lesado que pertence a toda a sociedade. O dano moral ambiental, por sua vez, tem ligação com todo prejuízo que não seja econômico, causado à coletividade, em razão da lesão ao meio ambiente. Não se pode olvidar da questão social desencadeada pelo dano ambiental. O dano ao meio ambiente representa lesão a um direito difuso, um bem imaterial, incorpóreo, autônomo, de interesse da coletividade, garantido constitucionalmente para o uso comum do povo e para contribuir com a qualidade de vida das pessoas.’’

No Brasil os danos ambientais decorrem de fatores complexos, mas que – apesar dessa peculiar característica – não deixam de ser previsíveis. A exploração da natureza e de recursos naturais se dá de forma exponencial, havendo uma necessidade urgente de uma tutela desses bens jurídicos voltada à preservação e à conscientização – mesmo que forçadas. A necessidade de um olhar que observe a otimização e o combate ao desenvolvimento desenfreado que estimula o consumo irresponsável, buscando sempre práticas convergentes, sustentáveis.

Conclusão

A leitura da Responsabilidade Civil deve ser conjugada com os princípios do Direito Ambiental, preponderando o interesse coletivo sobre o individual e o econômico, de forma a buscar a mais completa reparação do ecossistema degradado. A indenização pecuniária do poluidor-pagador deve ser compreendida como meio subsidiário de responsabilização. A primeira forma deve, obrigatoriamente, ser a recuperação do meio ambiente.

O dano moral ambiental não é somente a lesão ao ecossistema, mas trata diretamente de valores precípuos da coletividade, da qualidade de vida e saúde dos envolvidos atingidos direta ou indiretamente. Portanto, abarca a agressão aos direitos difusos e coletivos, devendo ser compreendido com a injusta lesão da esfera moral da comunidade, trata-se, pois, da violação antijurídica de valores coletivos.

Conclui-se, portanto, que trata-se, de um modo de preservação. Existe uma agressão ao meio – em que se insere determinada comunidade –, onde, em última análise, a própria cultura dos seus componentes foi afetada. Em havendo violação – de qualquer ordem –, deve- se apontar os agentes e responsabilizá-los na dimensão do dano que, muitas vezes, são irreparáveis em sua totalidade.

 

Referências
ALVES DA SILVA, Leonio José e MORATO LEITE, José Rubens. Juridicidade do Dano Ambiental: gestão da zona costeira e aspectos da exploração do pré-sal pelo Brasil. Seqüência, n. 65, p. 305-328, dez. 2012.
BARACHO JÚNIOR, José Alfredo de Oliveira. Responsabilidade Civil por Dano Meio Ambiente. Belo Horizonte: Del Rey, 2000.
BEDRAN MARCOS, Karina e MAYER, Elizabeth. A responsabilidade civil por danos ambientais no direito brasileiro e comparado: Teoria do Risco Criado versus Teoria do Risco Integral. Veredas do Direito, Belo Horizonte, v.10, n.19, p.45-88, Janeiro/Junho de 2013.
DELGADO, José Augusto. Responsabilidade Civil por Dano Ambiental. Informativo Jurídico da Biblioteca Ministro Oscar Saraiva, v.19, n.1, p.81-153, jan./jun.2008.
RODRIGUES, Silvio. Responsabilidade Civil. 19 ed. Saraiva: São Paulo, 2002.
STEIGLEDER, Annelise Monteiro. Responsabilidade Civil Ambiental: as Dimensões do Dano Ambiental no Direito Brasileiro. 2. ed. Porto Alegre: Editora do Advogado, 2011.

Nota

[1] – Trabalho orientado ela Profa. Msc. Cláudia Mota Estabel Mestra em Direito e Justiça Social pela Universidade Federal do Rio Grande.

Informações Sobre os Autores

Bruno Bandeira Fonseca

Acadêmicos de Direito pela Universidade Federal do Rio Grande

Lucas Braunstein da Cunha

Acadêmico de Direito pela Universidade Federal do Rio Grande


Equipe Âmbito Jurídico

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