Das liminares concedidas contra a fazenda pública: admissibilidade ou inadmissibilidade

Resumo: No presente artigo, os esforços foram realizados sobre, precipuamente, a antecipação dos efeitos da tutela e sobre a decisão liminar. Desenvolvendo ao longo dos tópicos os fundamentos jurídicos e as jurisprudências para, ao seu final, concluir a respeito na inadmissibilidade, ou não, da antecipação dos efeitos da tutela pleiteada contra a Fazenda Pública.


Palavras-chave: Antecipação dos efeitos da tutela. Decisão liminar. Entes públicos.


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Abstract: In the present article, the efforts were accomplished on, mainly, the anticipation of the effects of the protection and about the preliminary decision. Developing along the topics the juridical foundations and the jurisprudences to in closing on the inadmissibility, or not, of the anticipation of the effects of the protection pled against Public Finance.


Keywords: Anticipation of the effects of the protection. Preliminary decision. Institutions publics.


Sumário: 1. Introdução, 1.1. Da  antecipação  dos  efeitos  da  tutela,  1.2.  Da medida cautelar;  2. Os entes públicos no polo passivo da demanda e concessão de liminar; 3. Fundamento jurídico-normativo para a concessão da antecipação dos efeitos da tutela e da medida cautelar; 4. Eficácia jurídica das normas infraconstitucionais impeditivas (ou restritivas) de liminares; 5. Normas infraconstitucionais e medidas provisórias impeditivas (ou restritivas) de liminares; 6. Requisitos para a concessão de medidas liminares; 7. Tutela antecipada contra o poder público; 8. Normas infraconstitucionais impeditivas  (ou restritivas) quanto à concessão da tutela antecipatória; 9. Conclusão. Referências  bibliográficas.


 1 Introdução


Ao longo dos anos o crescimento e o desenvolvimento das relações interpessoais, tornaram-se muito mais complexas, e, apesar do fortalecimento do Estado, que avocou para si a função jurisdicional, fez com que os conflitos entre as partes também aumentassem, o que resultou em manifesta morosidade da prestação jurisdicional, em razão do aumento significativo dos conflitos. Isso resultou na criação legislativa concernente a possibilitar que novos institutos visem a agilizar a justiça. No presente artigo, os esforços foram realizados sobre, precipuamente, a antecipação dos efeitos da tutela e sobre a decisão liminar.


1.1 Da Antecipação dos Efeitos da Tutela


O eminente doutrinador Alexandre Câmara Freitas entende, como a doutrina majoritária, que a tutela antecipada é uma forma de tutela jurisdicional satisfativa (e, portanto, não-cautelar), prestada com base em juízo de probabilidade (CÂMARA, 2004, p.87). 


Referida tutela é chamada de satisfativa pelo fato de que antecipa à parte seu pedido formulado na petição inicial, satisfazendo,  ao menos no momento, sua pretensão.


Antes da alteração legislativa de 1994, essa possibilidade somente seria possível através da ação mandamental, quando o direito da parte fosse líquido e certo, e, em algumas ações específicas, como a de despejo. Via de regra, excetuados esses raros casos, os pedidos somente seriam deferidos em caso de procedência da ação, através da sentença, por meio da cognição exauriente, onde se teria o juízo de certeza.


Para a concessão da tutela, é necessária a presença de dois requisitos: o fumus boni iuris (fumaça do bom direito) e o periculum in mora, que estão previstos no artigo 273 do Código de Processo Civil.


Preliminarmente, algumas considerações podem ser feitas sobre o dispositivo acima. Em seu caput, está previsto que, presentes os requisitos para a concessão da antecipação da tutela, o juiz “poderá” antecipar os efeitos da tutela. A jurisprudência dominante, nesse sentido, tem defendido que o que há, em verdade, é o dever de o juiz deferir a tutela de urgência, antecipando seus efeitos quando os requisitos para a concessão da tutela se fizerem presentes.


Nesse sentido, Carreira Alvim defende que “o julgador que indefere o pedido porque o art. 273 lhe faculta antecipar ou não a pretensão de mérito, é algo inadmissível e que não tem suporte legal” (CARREIRA ALVIM, 2008, p. 37). 


Deveras, antes de se verificar se estão presentes ou não os requisitos para a concessão da tutela antecipada, faz-se necessário o prévio requerimento da parte demandante, sendo vedado, conforme caput do artigo, bem como em razão do princípio do NE procedat iudex ex officio.


É sabido que a sentença de procedência pode produzir três tipos de efeitos principais: o declaratório, o constitutivo e o condenatório.


A doutrina tem caminhado no sentido de que apenas quando o pedido se referir à condenação que se poderá falar em antecipação dos efeitos da tutela. Segundo


Alexandre, “a tutela antecipada nada mais é do que uma condenação antecipada. (CÂMARA, 2007, pp. 471/472). 


Feitas as primeiras abordagens sobre o assunto, necessário se faz traçar algumas considerações acerca dos requisitos para se conceder a tutela antecipada, que conforme acima, trata-se do fumus boni iuris (fumaça do bom direito) e do periculum in mora (perigo da demora).


O primeiro requisito se faz presente na parte final do caput do Artigo 273 do CPC: “[…] existindo prova inequívoca, se convença da verossimilhança da alegação […]”.


Expresso está, pois, que para que o juiz conceda a  tutela antecipada requerida pela parte necessário que se tenha prova  inequívoca, a fim de que o mesmo se convença da verossimilhança da alegação.


Em um primeiro momento, se tem, então, a presença da “prova inequívoca”.


Pode-se falar com certeza, que a prova inequívoca é uma prova cabal, isenta de dúvidas, comum, em tese, quando se tem a cognição plena, exauriente. É fato, também, que através do pedido inicial, com as provas que o autor levar aos autos para o juiz, não se poderá falar, mesmo assim, que se tem um juízo de certeza sobre o direito da parte.


Ocorre, contudo, que ao falar em verossimilhança, que significa o que parece verdadeiro, que é, ao menos, plausível, obtida através da cognição rarefeita, o que tem defendido é em um juízo de provas intermediário, de cognição sumária, ou então, “a probabilidade de existência do direito afirmado pelo demandante” (CÂMARA, 2007, p. 473).


1.2 Da Medida Cautelar


Como visto acima, a antecipação dos efeitos da tutela tem provimentos satisfativos, visto que pode receber o pedido principal, respaldado em seu direito material. Luiz Guilherme Marinoni, por seu turno, afirma que  “a tutela cautelar se destina a assegurar a efetividade da tutela satisfativa do direito material”. Essa tutela, nas palavras de Marinoni, “é instrumento da tutela satisfativa, na medida em que objetiva garantir sua frutuosidade” (MARINONI, 2007, p. 61). 


Assim, caso a parte entenda, e se estiverem presentes os requisitos para a concessão da medida liminar, essa poderá ser deferida para assegurar a tutela final.


Para garantir a parte seu direito, poderá o juiz, então, observado o contido no artigo 798 do CPC, conceder a medida liminar quando houver fundado receio de que uma parte poderá causar ao direito da outra lesão grave e de difícil reparação. Como por exemplo, a parte que possui um título executivo judicial contra si, e que possui bens suficientes para a satisfação do crédito da outra parte, passe a dilapidar seu patrimônio, visando ao não pagamento da dívida. Através de uma medida cautelar, o devedor poderá se ver obrigado a não mais alienar seus bens, até final julgamento do processo principal.  


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 2. Os entes públicos no pólo passivo da demanda e concessão de liminar


 Está pacificada a possibilidade de se conceder liminares contra as pessoas de direito privado e contra as pessoas naturais. A questão que se coloca é que se contra os Órgãos Públicos é possível a concessão de liminar (antecipação da tutela ou medida cautelar).


E se há essa prerrogativa em favor dos Entes Públicos, uma diferenciação, qual o motivo da mesma.


Na baixa Idade Média, e precipuamente na Idade Moderna, com o fortalecimento do Poder Estatal, defendia-se a idéia do Poder Divino, concernente em ser Deus o possuidor de tal poder, que concedia o poder aos reis. Dessa forma, à época, era impossível sustentar a idéia do Estado Moderno como demandado em uma ação, haja vista que eles detinham o poder divino, absoluto e soberano.


Com o passar do tempo, contudo, essa concepção foi superada nas sociedades ocidentais, e na contemporaneidade, os Entes Públicos podem, sim, ser sujeitos passivos em processos judiciais.


Há, contudo, que se fazer um imediato parêntese, para transcrever um posicionamento de Carreira Alvim, que, segundo ele, “na formulação do ius positum processual, o Estado tem sido de tal modo privilegiado, que, demandar contra ele, no Brasil, é uma via dolorosa, antes e depois da sentença” (CARREIRA ALVIM, 2006, p. 26). 


Pode-se dizer, sobre a prerrogativa do Estado, que  essa é decorrente do modo como se sustentou a origem do Direito Administrativo brasileiro, que regula os atos da Administração Direta e Indireta, os atos do governo e os emanados de seu poder, visto que, embora falar-se hoje que o Brasil é um Estado Democrático de Direito, em que se deveria existir um igualdade formal e material entre todos, à luz da supremacia do interesse público sobre o privado – típico de Estados totalitários, o exercício dos direitos do particular contra o Estado é regulado.


Segundo a notória doutrinadora Maria Sylvia Zanella Di Pietro, verbis: 


“[…] o Direito Administrativo nasceu e desenvolveu-se baseado em duas idéias opostas: de um lado, a proteção aos direitos individuais frente ao Estado, que serve de fundamento ao princípio da legalidade, um dos esteios do Estado Democrático de Direito; de outro lado, a de necessidade de satisfação dos interesses coletivos, que conduz à outorga de prerrogativas e privilégios para a Administração Pública, quer para limitar o exercício dos direitos individuais em benefício do bem-estar coletivo (poder de polícia), quer para a prestação de serviços públicos.” (DI PIETRO, 2004, p. 65).


Verificável, então, que diante do fato de o Poder Público privar pelo interesse público, de garantir a execução dos serviços públicos, que a propósito, sendo Autor ou Réu nas demandas judiciais recebe o nome de Fazenda Pública (federal, estadual e municipal), “sob o enfoque dos ônus patrimoniais da ação” (MEDAUAR, 2004, p. 471), recebe a prerrogativa, seja, por exemplo, em razão do prazo mais amplo, ou então nas limitações de se deferir as liminares contra si.


Araken de Assis, doutrinando sobre a Execução contra a Fazenda Pública, contudo, defende que somente as dívidas pecuniárias são abrangidas pela execução. Não há, por esse motivo, a incidência do artigo 475-J, referente ao “cumprimento da sentença” (ASSIS, 2007, p. 951). 


Referindo-se aos créditos de outra natureza, contudo, continua o autor: que figure como obrigada pessoa jurídica de direito público, bem como as ordens emitidas pelo órgão judiciário, executam-se pelas vias executórias comuns a todos os devedores, ou seja, através dos meios porventura aplicados aos particulares (ASSIS, 2007, p. 951).


O ordenamento jurídico brasileiro, como ficará demonstrado, não veda, em regra, a concessão de liminares contra os entes públicos, por falta de vedação legal para tanto.


E esse é o posicionamento, também, da jurisprudência dos tribunais superiores do País.


Para a concessão, faz-se necessário, contudo, a presença dos requisitos previstos no Artigo 273 do CPC (fumus boni iuris e periculum in mora) além de o caso não estar previsto nas leis esparsas que regulam a matéria sobre a concessão das liminares contra os entes públicos.


3. Fundamento jurídico-normativo para a concessão da  antecipação dos efeitos da tutela e da medida cautelar


Os dispositivos mais comuns aplicáveis à espécie foram exarados acima, quais sejam o Art. 273 do CPC e o art. 798 e seguintes do mesmo diploma legal.O legislador traz, ainda, outros dispositivos que podem ser utilizados para a concessão da liminar.


As medidas liminares em mandado de segurança, habeas corpus, ação popular, ação civil pública, ação direta de inconstitucionalidade ou como “antecipações provisórias de medidas cautelares nominadas (típicas) e inominadas (atípicas – derivadas do denominado poder cautelar geral)”, têm expressa previsão em leis especiais: art. 7º, inc. II, da Lei 1.533/51 (no caso do mandado de segurança), “por integração analógica e construção jurisprudencial (no caso do habeas corpus); art. 5.º, § 4º, da Lei 4.717/65 (no caso da ação popular); art. 12 da Lei n. 7.347/85 (no caso da ação civil pública); no art. 102, inc. I, p, da CF/88 (no caso da ação direta de inconstitucionalidade); e no próprio Código de Processo Civil de 1973 (art. 804) no caso das cautelares – preparatórias ou incidentais (FRIEDE, 2007, pp. 163/164). 


Deveras, o legislador brasileiro inspirou-se, uma vez mais, na Carta  Constitucional para se permitir as liminares, visto que em seu artigo 5º, inciso XXXV, prevê que “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”.


Assim, ao contrário das Constituições pretéritas, a de 1988 prevê, expressamente, em seu texto, a possibilidade de o judiciário se manifestar acerca da ameaça ao direito da parte, tanto para proteção de direitos individuais, coletivos e difusos, não sendo necessário, portanto, aguardar a ocorrência do dano para que a parte se socorra ao Poder Judiciário.


4. Eficácia jurídica das normas infraconstitucionais impeditivas (ou restritivas) de liminares


Conforme informado acima, em regra, contra os entes públicos, e em especial contra a Fazenda Pública, é cabível as tutelas de urgência, sobretudo, a antecipação dos efeitos da tutela e as medidas cautelares, havendo, contudo, no ordenamento jurídico pátrio algumas leis infraconstitucionais que visam  a limitar ou mesmo impedir a concessão desse direito.


Por essa razão, Reis Freide manifesta-se totalmente contrário à essas leis, primeiramente, invocando o dispositivo citado acima da Constituição Federal[1].


O que ocorre no caso em tela, é sem dúvida uma limitação de um direito garantido à parte, direito esse, conforme demonstrado, tutelado em razão da urgência que o caso requer.


O doutrinador, para corroborar seu entendimento, leciona que a doutrina, a jurisprudências, o Poder Judiciário como um todo tem se manifestado o sentido da não-aceitação desses dispositivos em face da Carta Magna atual.


Segundo tal autor:


“[…] tais restrições afrontam diretamente princípios constitucionais expressos e implícitos, ferindo, por conseqüência, o Poder Cautelar Geral (poder do magistrado de outorgar medidas cautelares atípicas – não previstas expressamente pela lei), o Poder Cautelar Genérico (poder do magistrado de outorgar  ex officio as medidas cautelares necessárias à garantia da possibilidade de satisfação futura da pretensão das partes, com virtual exceção à regra do art. 2 do CPC, que apenas disciplina a jurisdição própria e não a imprópria (cautelar e executiva) e o Poder Cautelar de Forma Ampla, previsto, como principio constitucional implícito, na Carta Magna; insistindo, por efeito, que a ineficácia jurídica (intrínseca) destas normas jurídicas (rectius: inconstitucionalidade) é absolutamente manifesta  e, portanto, deve obrigatoriamente ser reconhecida pelo julgador, sob pena de omissão de dever de usar o poder que lhe foi legitimamente outorgado, pelo povo, através da promulgação da própria Constituição Federal.”


Em sua brilhante obra, Reis Freire ainda invoca Luiz Guilherme Marinoni[2] para sustentar seu posicionamento quanto às leis:


“Efetivamente é por demais evidente que determinadas pretensões somente se compatibilizam com tutelas de urgência. E as liminares e as ações urgentes, para estes casos, são os instrumentos que concretizam o direito à adequada tutela jurisdicional. A restrição do uso da liminar, portanto, significa lesão ao princípio da inafastabilidade”. (Apud MARINONI, 2007, p. 168).


Urge fazer menção, outrossim, que algumas normas que fazem essa restrição são, em verdade, medidas provisórias.


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Os argumentos que se têm para se impedir que medidas provisórias regulem o direito processual são os mais variados, como, por exemplo, ausência da relevância e urgência necessários para se criar uma medida provisória com força de lei, não podendo, ademais, regular matéria de direito de tutela jurisdicional. 


Essa questão, contudo, é de cunho doutrinário-jurisprudencial, não sendo, pois, objeto deste trabalho, que se limita a traçar considerações quanto à concessão ou não de liminares contra entes públicos, sem se deter em impropriedades doutrinárias substanciais.


5. Normas infraconstitucionais e medidas provisórias impeditivas (ou restritivas) de liminares


Na medida em que as medidas liminares de natureza jurídica instrumental cautelar passaram a ser concedidas em inobservância aos limites impostos pelos próprios pressupostos de sua admissibilidade, foram editadas leis expressamente restringindo, ou mesmo impedindo, a concessão de liminares, em razão da matéria ou de algum tipo de circunstância.


Uma dessas primeiras leis restritivas é a Lei n.º 2.770/56 que, em seu art. 1º, proíbe a concessão de medida liminar nas ações e procedimentos judiciais de qualquer natureza, que visem à liberação de mercadorias, bens o coisas de procedência estrangeira.


No tocante às restrições normativas de concessão de liminares contra atos do Poder Público, pode-se citar, por primeiro, a Lei n.º 4.348/64 que, em seu art. 5º, expressamente veda a liminar em mandados de segurança que visem à reclassificação ou equiparação de servidores públicos, ou à concessão de aumento ou extensão de vantagens e, destes feitos, só permite a execução da sentença depois de transitada em julgado (art. 5º e parágrafo único). 


De igual sorte, sublinhe-se a Lei n.º 4.862/65 que, embora em seu art. 51 tenha revogado o art. 39 da Lei n.º 4.348/64 que proibia liminar em matéria fiscal, limitou o prazo de eficácia da medida em 60 dias. Anote-se, a propósito, o citado dispositivo legal:


 “Fica revogado o art. 39 da Lei n.º 4.862, de 16.7.1964, cessando os efeitos da medida liminar concedida em mandado de segurança contra a Fazenda Nacional, após o decurso do prazo de 60 (sessenta) dias contados da data da petição inicial ou quando determinada a sua suspensão por tribunal imediatamente superior.”


Posteriormente, estendendo a proibição consignada anteriormente, foi editada a Lei n.º 5.021/66 que, através de seu art. 1º, § 4º, proibiu a concessão de medida liminar para pagamento de vencimentos ou vantagens pecuniárias a servidores da União, dos Estados ou dos Municípios e de suas autarquias. 


Sob a égide da Constituição Federal de 1998, foi editada a Lei nº 7.969/89 (antiga medida provisória n.º 118) que, em seu art. 1º, estendeu os efeitos do art. 5º da Lei n.º 4.348/64 às medidas cautelares, nos seguintes remos:


“Aplica-se às medidas cautelares previstas nos arts. 796 a 810 do Código de Processo Civil o disposto nos arts. 5º e seu parágrafo único e 7º da Lei nº 4.348 de 56 de junho de 1964.”


Mais tarde, foram editadas as Medidas Provisórias n. 173, 181, 186, 197 e 198/90, sendo que esta última foi convertida na Lei nº 8.076/90 que, em seu art. 1º, suspendia até 15 de setembro de 1992 a concessão de medidas liminares nos mandados de segurança e nos procedimentos cautelares que versassem sobre as matérias reguladas pelas leis que especificava, todas resultantes do Plano de Estabilização Econômica implantado pelo novo Governo, mais conhecido como “Plano Collor”.


Finalmente, a Lei n.º 8.437/90, modificada várias vezes por subseqüentes medidas provisórias, consignou, em seu art. 1º e § 1º, diversas vedações às medidas liminares, especialmente em processos cautelares, toda vez que providencia semelhante não puder ser concedida em ações de mandado de segurança, em decorrência de vedação legal, além de também impor uma série de outras limitações e vedações atinentes ao instituto da tutela provisória, de modo geral. Anote-se, por oportuno, a mencionada disposição legal:


“Art 1º Não será cabível medida liminar contra atos do Poder Público, no procedimento cautelar ou em quaisquer outras ações de natureza cautelar preventiva, toda vez que providencia semelhante não puder ser concedida em ações de andado de segurança, em virtude de vedação legal.


§ 1º Não será cabível, no juízo de primeiro grau, medida cautelar inominada ou a sua liminar, quando impugnado ato de autoridade sujeita, na via de mandado de segurança, à competência originária de tribunal (…).”


Após a análise genérica das Leis restritivas, ou mesmo impeditivas, da concessão de liminares contra entes públicos, passa-se ao exame individualizado de cada uma delas.


Com a edição da Lei n.º 4.348/64, restou estabelecido, dentre outras medidas, prazo de eficácia para a medida liminar eventualmente concedida (90 dias, prorrogáveis por mais 30 dias), dispôs sobre a possibilidade de decretação de perempção ou de caducidade da medida liminar deferida (quando o impetrante não se comportar de acordo com as imposições legais), regulamentou as providências para a eventual suspensão da medida liminar, estabeleceu expressamente a possibilidade de suspensão da execução da liminar pelo presidente do tribunal a que estiver adstrito o julgador (recurso administrativo), além de expressamente estabelecer restrições, ratione materiae, para a concessão de medidas liminares nas hipóteses de reclassificação ou equiparação de servidores públicos ou para a concessão de aumento ou para a extensão de vantagens (art. 5º), impedindo, ainda, nestes casos, a execução provisória da eventual sentença concessiva da segurança (art. 5º, parágrafo único), além de impor efeito suspensivo em todos os recursos que importem outorga ou adição de vencimento ou reclassificação funcional (art. 7º).


Dois anos mais tarde, a Lei nº 5.021/66 ampliou o alcance do art. 5º do lei em exame ao expressamente dispor, em seu art. 1º, § 4º, de forma genérica, que “não se concederá medida liminar para efeito de pagamento de vencimento e vantagens pecuniárias”.


Mais recentemente, a Medida Provisória nº 1.984-22, de 27 de setembro de 2000 acrescentou dois parágrafos ao art. 4º da Lei n.º 4.348/64, ampliando não só o grau de recorribilidade da suspensão de provimento liminar eventualmente deferido contra a Fazenda Pública, mas expressamente consignado a plena aplicação das disposições da Lei 8.4370/92 ao pedido de suspensão de segurança.


É necessário sublinhar que corrente majoritária do setor doutrinário entende que, sob à luz do princípio constitucional da inafastabilidade  do controle jurisdicional consagrado no art. 5º, inciso XXXV, da Carta Magna, a medida liminar eventualmente concedida não mais resta subordinada a um lapso temporal.


A Lei n.º 4.862/65, por meio do disposto em seu art. 51, revogou expressamente o art. 39 da Lei n.º 4.357/64 que simplesmente vedava, em todas as situações, medida liminar em mandado de segurança impetrado contra a Fazenda Nacional.


Desta feita, o art. 51 da Lei n.º 4.862/65 disciplina situação de validade para a concessão de medida liminar contra a Fazenda Nacional, estabelecendo, neste particular um prazo de 60 (sessenta) dias. Registre-se, de passagem, que tal regra tem sido, de forma majoritária, compreendida como inconstitucional, vale dizer, juridicamente ineficaz Relativamente à Lei n.º 5.021/66, o seu art. 1º buscou elidir a possibilidade de cobrança de “atrasados”, expressamente estabelecendo que o pagamento de vencimento e vantagens pecuniárias consignados em sentença concessivas de mandado de segurança, já transitada em julgado, nos termos do art. 5º, parágrafo único, da Lei n.º 4.348/64, a funcionários públicos, de modo geral, somente será efetuado relativamente as prestações que vencerem após o ajuizamento da ação.


Já quanto disposto no seu art. 1º, § 4º, o qual veda em virtual ampliação do previsto no art. 5º da Lei nº 4.348/64, a concessão de medidas liminares para efeitos de pagamento de vencimentos e vantagens pecuniárias, anote-se que a doutrina e a jurisprudência têm entendido que é plenamente eficaz vez que tal restrição se coaduna com a exigência do pressuposto do periculum in mora para a concessão de medida liminar, e que, no caso concreto, resta difícil comprovar o dano de impossível reparação.


A Medida Provisória n.º 118/89, a qual se converteu na Lei n.º 7.969/89, foi a primeira medida provisória restritiva em relação à concessão de medidas liminares que, para parte da doutrina, determinou, de maneira redundante, a aplicação dos art. 5º e seu parágrafo único e 7º da Lei nº 4.348/64 às medidas cautelares previstas nos arts. 796 a 810 do CPC (notadamente a antecipação in limine prevista no art. 804 do CPC), impedindo o deferimento de providências cautelares em ações com idêntica designação objetivando á reclassificação ou equiparação de servidores públicos ou à concessão de aumento ou extensão de vantagens, e determinado, de outro lado, a execução desses julgados somente após o seu trânsito em julgado, além de dotar de efeito suspensivo automático qualquer recurso relativo a essa matéria.


A Lei nº 8.076/90 derivou da edição de cinco diferentes medidas provisórias (n. 173, 181, 186, 197 e 198). Sua sistematização simplesmente inaugurou uma nova concepção normativa: a suspensão temporária da tutela cautelar (art. 1º), além de, redundantemente, dispor sobre o duplo grau de jurisdição como condição de eficácia das sentenças relativas ao sentes estatais (art. 1º, parágrafo único).


A Lei n.º 8.437/92, por seu turno, consiste na principal disciplina normativa impeditiva e/ou restritivo de medidas liminares contra atos do Poder Público. E nem poderia ser diferente, vez que foi alterada inúmeras vezes através de diversas medidas provisórias que buscaram incorporar à referida Lei várias restrições à concessão de medidas liminares.


Nessa esteira, consoante entendimento de diversos doutrinadores, tais restrições incorporadas à referida Lei tiveram como principal objetivo prover o governo de instrumentos jurídicos mais efetivos com o intuito  de sustar, com plena eficácia, liminares contra o processo de privatizações, consignando, dessa forma, novos elementos infraconstitucionais de restrição à concessão de medidas liminares, cautelares e antecipatórias, de acordo com os seguintes parâmetros:


Adequação das restrições à concessão de liminares em mandado de segurança para qualquer tipo de ação e/ou procedimento (art. 1º);


1 Vedação à usurpação, por via cautelar, de competência originária de tribunal, exceto nos casos de ação popular e ação civil pública (art. 1º, §§ 1º e 2º);


2 Vedação às liminares satisfativas (art. 1º, § 3º); 


3 Intimação obrigatória do representante judicial, independente da necessária comunicação ao dirigente do órgão ou entidade que sofrer os efeitos da concessão da tutela liminar (art. 1º, § 4º);


4 Vedação à compensação de créditos tributários e previdenciários por força de medida liminar (art. 1º,§ 5º);


5 Vedação a liminares “inaudita altera parte” em sede de mandado de segurança coletivo e de ação civil pública (art. 2º)


6 Imposição de efeito suspensivo ao recurso interposto contra sentença cautelar que importe em adição de vencimentos ou reclassificação funcional (art. 3º);


7 Caracterização de recurso administrativo (de suspensão de efeitos liminares) , já existente no mandado de segurança (art 4º da Lei n.º 4.348/64), para todos os tipos de ação providos de liminares (art. 4º), incluindo a ação cautelar, a ação popular e a ação civil pública (art. 4º, § 1º), com ou sem audiência da parte contrária e do Ministério  Público (art. 4º, §§ 2º e 7º), e passível, em todos os casos, de recurso de agravo (art. 4º, § 3º), e, caso necessário, de novo recurso administrativo de suspensão dos efeitos da liminar originalmente concedida e mantida pelo tribunal intermediário (Tribunal de Justiça dos Estados ou Tribunal Regional Federal) ao presidente do STJ ou do STF (art. 4º, §§ 4º e 5º);


8 Possibilidade de suspensão coletiva de liminares equivalentes já concedidas e que vierem a ser concedidas (art. 4º, § 8º).


6. Requisitos para a concessão de medidas liminares


Sendo a concessão de liminar, tanto em mando de segurança como na qualidade de antecipação da tutela cautelar, medida de absoluta excepcionalidade, é imperiosa sua vinculação à efetiva presença de todos os pressupostos inarredáveis, a saber, os requisitos tradicionais do periculum in mora e do fumus boni juris, a existência efetiva da relevância dos motivos alegados pelo impetrante o requerente, a não-produção do denominado periculum in mora inverso, além do requisito específico para a concessão de antecipações cautelares em forma de liminar prevista no art. 804 do CPC.


O requisito do periculum in mora consiste no fundado receio da existência de um dano jurídico, de difícil ou impossível reparação, durante o curso da ação cautelar e, por extensão, da ação principal (no caso de ações cautelares típicas ou atípicas) ou durante o curso do mandado de segurança, e outras ações que o provimento liminar, aferido através do juízo próprio de provabilidade, com comprovada plausibilidade de existência de dano, justificado receio de lesão de direito e/ou existência de direito ameaçado.


Já o requisito do fumus boni juris consiste na probabilidade plausível, e não mera e genérica possibilidade, de exercício presente ou futuro do direito de ação com provimento de mérito favorável, considerando que pequenas incertezas e eventuais imprecisões, a respeito do direito material do autor, não devem assumir a força de impedir-lhe o acesso à tutela cautelar.


O denominado periculum in mora inverso, por seu turno, traduz-se na concretização de grave risco de ocorrência de dano irreparável, ou de difícil reparação, contra o impetrado ou o requerido, como conseqüência direta da própria concessão da medida liminar deferida ao impetrante ou requerente. Inclui-se neste requisito o que se denomina por grave lesão à ordem pública, compreendendo nesse conceito a chamada ordem administrativa em geral, vale dizer, o normal andamento da execução do serviço público, o regular prosseguimento das obras públicas e o devido exercício das funções da administração pelas autoridades constituídas.


Por fim, anote-se que em se tratando especificamente de medidas cautelares, de procedimento comum sumário, operacionalizadas através de ação autônoma e de processo próprio, a concessão de medida liminar, na qualidade de antecipação da medida cautelar, além de necessitar da comprovação da presença dos requisitos supracitados, condiciona-se à observância da restrição imposta pelo art. 804 c/c art. 797, ambos do CPC, que só permitem o deferimento da antecipação cautelar em forma de liminar nas situações em que a citação do requerido possa vir a tornar a medida ineficaz, caso em que poderá o magistrado determinar que o requerente preste caução real ou fidejussória, para garantir o ressarcimento dos eventuais danos que o requerido possa vir a sofrer  com o futuro julgamento pela improcedência da pretensão cautelar.


Cabe mencionar que, nos casos de o requerido ser parte integrante da Fazenda Pública, o magistrado deve obrigatoriamente determinar que o requerente preste a referida caução, como condição  para a concessão da medida liminar cautelar.


7. Tutela antecipada contra o poder público


Sobre os aspectos do alcance e da própria aplicabilidade do instituto antecipatório sub examen, resta afirmar que a edição da Medida Provisória nº 1.570, de 26 de março de 1997 (atual Lei nº 9.494/1997), acabou por disciplinar, ainda que posteriormente, o espectro aplicativo da  tutela antecipada  contra os entes integrantes da  Fazenda Pública (União, Estados-membros – Distrito Federal, Municípios e autarquias), restringindo, sobremaneira, o alcance do instituto, que teve sua vigência originária inaugurada em 1995, a partir da previsão legal consignada na Lei nº 8.952, de 13 de dezembro de 1994 –, através da edição de uma série de normas infraconstitucionais  impeditivas (ou restritivas) quanto à concessão da tutela antecipatória. 


Para João Batista Lopes (LOPES, 2008, p. 108) a questão da admissibilidade da tutela antecipada em face da Fazenda Pública comporta exame em dois planos bem distintos: o doutrinário e o legislativo. Sob o aspecto doutrinário importa ressaltar que a tutela jurisdicional tem assento constitucional, como se vê do art. 5ª, XXXV, da Constituição Federal. Evidente que a tutela jurisdicional, em todas as suas manifestações (cognição, execução, cautelaridade), tem fundamento constitucional, razão por que não pode a lei ordinária eliminá-la ou esvaziá-la. 


Ao legislador ordinário incumbe, porém, a tarefa de disciplinar as liminares, o que deve ser feito sem ofensa aos direitos e garantias constitucionais. (LOPES, 2008 p. 109) afirma que: “não é lícito, porém, ao legislador abolir a tutela de urgência, o que implicaria eliminação da própria tutela jurisdicional nas hipóteses em que a demora traduzisse sacrifício do próprio direito. Deve-se, em suma, reconhecer ao legislador competência para disciplinar o uso das liminares, mas não para aboli-las do ordenamento sic et simpliciter.”


Vislumbrar-se-ia inconstitucionalidade em proposta que tivesse escopo proibir liminares contra a Fazenda Pública (LOPES, 2008, pp. 109-110).


Porém cabe analisar, também, o art. 4º da Lei n. 8.437/92, que repete, com modificação, o preceito do art. 4º da Lei n. 4.348/64 e está assim redigido:


“Compete ao presidente do tribunal, ao qual couber o conhecimento do respectivo recurso, suspender, em despacho fundamentado, a execução da liminar nas ações movidas contra o Poder Público ou seus agentes, a requerimento do Ministério Público ou da pessoa jurídica de direito público interessada, em caso de manifesto interesse público ou de flagrante ilegitimidade, e para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas.


§ 1º Aplica-se o disposto neste artigo à sentença proferida em processo de ação cautelar inominada, no processo de ação popular e na ação civil pública, enquanto não transitada em julgado.


§ 2º O presidente do tribunal poderá ouvir o autor  e o Ministério Público, em 5 (cinco) dias.


§ 3º Do despacho que conceder ou negar a suspensão, caberá agravo, no prazo de 5 (cinco) dias”.


A suspensão de liminares, nas hipóteses mencionadas, não traduz, em princípio, ofensa à Constituição, mas é necessário  que a decisão seja devidamente fundamentada, tornando explícitos os fatos e o interesse público que se quer salvaguardar.


A generalização da suspensão de liminares com fundamentação vaga e genérica constitui prática freqüente que em nada contribui para o aprimoramento da prestação jurisdicional e, por isso, deve ser combatida (LOPES, 2008, p. 112). Em contrapartida, o autor critica o § 3º do art. 1º da Lei n. 8.437/92 (“não será cabível medida liminar que esgote, no todo ou em parte, o objeto da ação”). Por conseguinte, seja no processo cautelar, seja na tutela antecipada, a liminar, não pode antecipar a eficácia da sentença final, sob pena de indevido julgamento do mérito. 


A tutela antecipada não tem caráter cautelar, mas satisfativo, e, por isso, em relação a ela não se justificam as restrições opostas pelo legislador. Com efeito, a tutela antecipada implica adiantamento provisório de feitos práticos do provimento de mérito e não 16 da própria eficácia da sentença, razão por que não há falar em concessão de providencias que esgotem o objeto da ação.


Em ação de indenização contra a Fazenda Pública, por exemplo, não pode o juiz, a título de tutela antecipada, conceder ao autor o valor pleiteado na inicial, mas será viável antecipar-lhe, por exemplo, o ressarcimento de despesas hospitalares e o percebimento de pensão para garantir sua sobrevivência. 


Já para José Eduardo Carreira Alvim (CARREIRA ALVIM, 2008, p. 201), no caso do Poder Público, a tutela antecipada condenatória se faz pelos princípios que regem as tutelas declaratória e constitutiva, sob o prisma da mandamentalidade (mandado de cumprimento do preceito), cabendo ao agente público a providência que considerar mais adequada ao atendimento da ordem judicial, podendo, inclusive, determinar a inclusão provisória do titular da tutela na folha de pensionistas do Estado, enquanto durar a eficácia da tutela liminar.


O que não pode a autoridade pública, sob pena de responsabilidade solidária e prática criminosa (CP, art. 330) é deixar de cumprir a ordem sob o argumento de que inexiste verba e que a efetivação da medida depende deprecatório.


Para tal fim, a vítima deve receber modus in rebus tratamento análogo ao de um servidor público, ao qual o Estado deve garantir a sobrevivência. Se sobreviver a incapacidade da vítima, continuará o Estado obrigado a pensioná-la, como parcela da indenização, bastando para tanto proceder à alteração do valor da pensão, se for o caso.


A jurisprudência, no particular, segue os passos da doutrina, admitindo a antecipação da tutela em face da Fazenda Pública:


“Processo civil e tributário. Tutela antecipatória.  Direitos patrimoniais. Concessão: possibilidade. Inteligência do art. 273  do CPC. Recurso não conhecido.


I – A tutela antecipatória prevista no art. 273 do CPC pode ser conceda em casas envolvendo direitos patrimoniais ou não-patrimoniais, pois o aludido dispositivo não restringiu o alcance do novel instituto, pelo que é vedado ao interprete fazê-lo. Nada obsta, por outro lado, que a tutela antecipatória seja concedida nas ações movidas contra as pessoas jurídicas de direito público interno.


II – A exigência da irreversibilidade inserta no §2º do art. 273 do CPC não pode ser levada ao extremo, sob pena de o novel instituto da tutela antecipatória não cumprir a excelsa missão a que se destina.


III – Recurso especial não conhecido[3].”


Noutro julgado, entendeu o Superior Tribunal de Justiça que a tutela antecipada contra a Fazenda Pública tem lugar quando se tratar de dívida alimentícia necessária à sobrevivência do necessitado e com base em precedentes jurisprudências; ou quando, no campo tributário, há entendimento largamente uniformizado na jurisprudência sobre a relação jurídica em debate. Nesse mesmo julgado, afirma que não cabe a transferência definitiva de domínio, sem a garantia legal, no que, a contrario sensu, a admite se houver a garantia noticiada[4].


CARREIRA ALVIN (2008, p. 203) diz que “nem mesmo as disposições da Lei 9.494/97, que limita a outorga de tutela antecipada contra a Fazenda Nacional, têm constituído obstáculo a que o Superior Tribunal de Justiça caminhe pari passu com a doutrina, como se vê do seguinte acórdão”:


“Processual civil. Concessão de tutela antecipada contra autarquia federal. Reajuste de 28,86%. MP 1.570/97, convertida na Lei 9.494/97. Inaplicabilidade. 1.  A MP 1.570/97, convertida na Lei 9.494/97, por ser uma norma de exceção quanto à concessão de tutela antecipada contra a Fazenda Nacional, deve ser interpretada de forma restritiva. 2.  Conforme a interpretação dada pelo STF, bem como pelos precedentes desta Corte, o reajuste de 28,86%, relativo às Leis 8.622/93 e 8.627/93, refere-se a revisão geral da remuneração dos servidores públicos. Pelo  que, não se enquadrando a hipótese dos autos dentre aquelas estipuladas pela  Lei 9.494/97, há que se reconhecer a sua inaplicabilidade.  3.  Recurso improvido[5].”


 Para Luiz Guilherme Marinoni (MARINONI, 2007, p. 314) se é possível a tutela antecipatória contra o particular, nada deve impedir a tutela antecipatória contra a Fazenda Pública. Entretanto, há quem diga que em virtude do art. 1º da Lei 8.437, de 30.06.1992, que é impossível a concessão de tutela  antecipatória contra a Fazenda Pública.


Outras tentam contornar o veto argumentando que o referido artigo não proíbe a tutela antecipatória contra a Fazenda Pública. Outros tentam contornar o veto argumentando que o referido artigo não proíbe a tutela antecipatória em face do Poder Público, mas apenas veda a concessão de liminares, em ações cautelares ou preventivas, que esgotem, no todo ou em parte, o objeto do respectivo processo. Como a tutela antecipatória não se confunde com a tutela cautelar ou com a tutela preventiva, o artigo em discussão não proibiria a tutela antecipatória. 


Porém, foi editada posteriormente a Medida Provisória 1.570, de 26.03.1997, que assim estabeleceu, no seu art. 1º: “Aplica-se à tutela antecipada prevista nos arts. 273 e 461 do Código de Processo Civil o disposto nos arts. 5º e seu parágrafo único e 7º da Lei n. 4.348, de 26 de junho de 1964, no art. 1º e seu § 4º da Lei n. 5.021, de 9 de junho de 1966, e nos arts. 1º, 3º e 4º da Lei 8.437, de 30 de junho de 1992.” Tal medida provisória também objetivou impedir – ao menos em algumas hipóteses – a concessão da tutela antecipatória contra a Fazenda Pública.


O texto da medida provisória 1.570/1997 voltou a figurar na Lei 9.494/97, que foi objeto de ação direta de constitucionalidade, proposta pelos Presidentes da República, do Senado e da Câmara. Nessa ação, o STF, por meio de sua Sessão Plenária e por maioria de votos, decidiu, em sede de liminar, e com efeito vinculante, pela constitucionalidade da referida norma.


Contudo, de lado a questão da vinculação à posição assumida pelo STF, qualquer tentativa de vedar a concessão de tutela antecipatória contra a Fazenda Pública, mesmo através de lei, é inconstitucional.


8. Normas infraconstitucionais impeditivas (ou restritivas)  quanto à concessão da tutela antecipatória


No que tange ao instituto da tutela antecipada genérica (art. 273 do CPC) e específica  (art. 461 do CPC), de forma diversa da  tutela cautelar  (e de seus respectivos provimentos liminares), basicamente existe apenas um único ato normativo, editado pelo Poder Legislativo, objetivando impor limites à concessão da  tutela antecipatória  contra o Poder Público.


Em termos mais precisos, trata-se, da já falada nesse trabalho, da Lei nº 9.494, de 10 de setembro de 1997, que, pó sua vez, originou-se do texto da Medida Provisória nº 1.570, inicialmente editada em 26 de março de 1997. Essa medida impôs uma série de restrições a diversos  instrumentos jurídicos, alterando expressamente o texto da Lei nº 8.437/92 e da Lei nº 7.347/85, relativo à disciplina legal da ação civil pública. 


As restrições objetivas previstas, FRIEDE (2002, pag. 651) diz que é lícito afirmar que as principais restrições à concessão da tutela antecipada se encontram previstas no art. 1º da Lei nº 9.494/97. Sob o aspecto recursal, o art. 7º da Lei n. 4.348/64 (que aduz: “o recurso voluntário ou ex-ofício, interposto de decisão concessiva de mandado de segurança, que importe outorga ou adição de vencimento ou ainda reclassificação funcional, terá efeito suspensivo.”), assim como os arts. 3º e 4º da Lei nº 8.437/92:


“Art. 3° O recurso voluntário ou ex officio, interposto contra sentença em processo cautelar, proferida contra pessoa jurídica de direito público ou seus agentes, que importe em outorga ou adição de vencimentos ou de reclassificação funcional, terá efeito suspensivo.


Art. 4° Compete ao presidente do tribunal, ao qual couber o conhecimento do respectivo recurso, suspender, em despacho fundamentado, a execução da liminar nas ações movidas contra o Poder Público ou seus agentes, a requerimento do Ministério Público ou da pessoa jurídica de direito público interessada, em caso de manifesto interesse público ou de flagrante ilegitimidade, e para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas.


Que ao incluir obrigatório efeito suspensivo nos recursos interpostos contra o deferimento da tutela antecipada, adiciona importante restrição ao exercício da faculdade anterior de se prover (ou não) efeito suspensivo quando da apreciação do recurso de agravo, na modalidade por instrumento.


Desta feita, diz Reis Friede (2002, pag. 654), a anterior opção do julgador, quando da apreciação do recurso e de seu eventual provimento, simplesmente desaparece, ensejando lugar à inafastável imposição do efeito suspensivo no eventual recurso interposto contra a antecipação porventura concedida no juízo originário.


Também, o recurso próprio e específico de agravo contra a concessão da antecipação de tutela enseja lugar a outras possíveis modalidades recursais (até então inadmissíveis in casu), como o recurso administrativo de suspensão de efeitos da antecipação, apreciado pelo presidente do tribunal a que se encontra vinculado o julgador originário.


Por conseguinte, mais uma vez a respeito da constitucionalidade da Lei nº 9.494/97 em que pesem algumas vozes discordantes, FRIEDE (2002, pag. 655) entende que inexiste, na atual configuração vigente, qualquer vício de ineficácia jurídica, ou seja, inconstitucionalidade, a macular a Lei nº 9.494/97 em sua disciplina restritiva quanto à concessão da tutela antecipada (art. 273 do CPC) ou da tutela específica (art. 461 do CPC), na própria medida em que os institutos em questão não possuem natureza cautelar e, portanto, não encontram abrigo no princípio da inafastabilidade ampliada do controle jurisdicional (art. 5º, inc. XXXV, da CF/88).


9. Conclusão


Por fim, como dito antes, alguns tribunais do país já inadmitiam a antecipação dos efeitos da tutela pleiteada contra a Fazenda Pública ao argumento de que a execução provisória contra a mesma far-se-ia nos moldes do art. 730 do CPC:


“Em homenagem ao art. 100 da Constituição Federal e a regra ínsita do art. 475, II, do CPC, nas ações de procedimento ordinário, contra a Fazenda Pública, que buscam a cobrança de créditos, torna-se inviável o  deferimento liminar da antecipação da tutela.”(Ac. un. da 1ª Câm. do TJMT de 10.03.1997, no Ag 7.035, rel. Des. Barros Filho)


Entretanto, tal ocorria somente no que concerne às  tutelas condenatórias típicas, haja vista o dispositivo processual citado. Sem embargo, a Lei nº 9.494/97, na qual foi convertida a medida provisória nº 1.570, dispõe que aplicar-se-ão as leis nº 4.348, de 26 de junho de 1964, arts. 5º e seu parágrafo único e 7º, 5.021, de 9 de junho de 1966, art. 1º e seu §4º, e 8.437, de 30 de junho de 1992, arts. 1º, 3º e 4º, o que, sob a ótica prática, inviabilizou o deferimento do pedido de antecipação dos efeitos da tutela pleiteada contra a Fazenda Pública.


 


Referências bibliográficas:

ASSIS, Araken de . Manual da execução. 11. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007.

CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de direito processual civil, volume I. 16. ed. Rio de Janeiro: Editora Lúmen Júris, 2007. 

CARREIRA ALVIM, José Eduardo. Tutela antecipada. 5. ed. (ano 2006), 3ª tir. Curitiba: Juruá, 2008.

LOPES, João Batista. Tutela Antecipada no Processo  Civil Brasileiro. 3 ed. São Paulo:

Editora Revista dos Tribunais, 2008.

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 17. ed. São Paulo: Atlas, 2004.

FRIEDE, Reis. Aspectos Fundamentais das Medidas Liminares. 5ª ed. rev., atual. E ampl. São Paulo: Forense Universitária, 2002.

MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Curso de processo civil, volume 4: processo cautelar. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008.

_______. A antecipação de tutela. São Paulo: Malheiros, 2007. 

 

Notas:

[1] Art. 5º. , XXXV. A Lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito

[2] Luiz Guilherme Marinoni,  in  Tutela Cautelar e Tutela Antecipatória, São Paulo,  Ed. Ver. dos Trib., 1992, p.96).

[3] REsp. 144.656-ES, Rel. Min. Adhemar Maciel, STJ, 2ª T., un, DJ 27.10.1997, p. 54.778.  

[4] REsp. 148.072-RJ, Rel. Min. José Delgado, STJ, 1ª T., un, DJ 23.03.1998, p. 34.

[5] AgRg na Medida Cautelar 1.030-PE, Rel. Min. Edson Vidigal, STJ, 5ª T., un., CJ 15.12.1997, p. 66.459.


Informações Sobre o Autor

Daniel Marinho Corrêa

Professor servidor do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná mediador judicial e advogado licenciado. Bacharel em Direito pela Universidade Estadual de Londrina – UEL 2009 pós-graduado em Direito Aplicado pela Escola da Magistratura do Paraná 2011 e em Direito Civil e Empresarial pela Faculdade de Direito Professor Damásio de Jesus 2015. Aluno especial do Mestrado em Direito Negocial pela Universidade Estadual de Londrina – UEL 2012/2014 e 2016. Colaborador em projetos de pesquisa da UEL


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