Resumo: Trata-se de artigo sobre a polêmica estabelecida pela instituição do regime de desoneração da folha de salários, no qual o efeito pretendido pela norma jurídico-tributária vem cumprindo o efeito contrário a razão de sua instituição, ou seja, onerar. Assim, o que se pretende mostrar são as reais consequências econômicas e sociais trazidas por este novo regime de recolhimento previdenciário, bem como os argumentos jurídicos que podem combater esta exação.
Palavras-chave: desoneração, folha de pagamento, oneração, contribuição previdenciária, inconstitucionalidade.
Abstract: This is article about the controversy institution established by the regime of exemption from payroll, in which the effect intended by legal and tax regulation has been fulfilling the opposite effect because of its institution, or encumber. So, what you want to show are the real economic and social consequences brought by this new regime of social security contribution, as well as the legal arguments that can combat this exaction.
Keywords: exemption, payroll, encumbrance, social security contribution, unconstitutional
Sumário: Introdução. 1. Prólogo legislativo. 2. Síntese da controvérsia – Desonerar para onerar. 3. Síntese conclusiva.
Introdução
O regime da desoneração da folha de pagamento, um dos pilares defendido abertamente pelo Ministro da Fazenda, Guido Mantega, para o aumento dos investimentos e, consequentemente, dos estímulos econômicos, tem realmente cumprido com os seus objetivos?
Esbarrando nas diferentes realidades e características das atividades empresariais, o novo regime de apuração da contribuição previdenciária tem trazido resultados díspares.
1. Prólogo legislativo.
O regime da desoneração da folha de salários foi introduzido inicialmente no ordenamento jurídico pela Medida Provisória n. 540, de 3 de agosto de 2011, e convertida na Lei 12.546, de 14 de dezembro de 2011.
Esse novo diploma legal trouxe a substituição da contribuição previdenciária patronal de 20% incidente sobre a remuneração paga aos segurados empregados, avulsos e contribuintes individuais (artigo 22, I e II, da Lei 8.212, de 24 de julho de 1991), pela contribuição incidente sobre receita bruta auferida pelas empresas de determinados ramos de atividade, identificadas simplesmente pelo código CNAE.
Dessa forma, muito se vem debatendo a respeito da legalidade e constitucionalidade da nova base de cálculo e alíquotas instituídas para a contribuição previdenciária a cargo das empresas, atualmente, denominada contribuição previdenciária sobre a receita bruta ou CPRB.
2. Síntese da controvérsia – Desonerar para onerar.
Trocar a famigerada alíquota de 20% por uma alíquota média de 2%, a princípio, revelou-se uma boa postura por parte do Governo Federal em termos de incentivo fiscal. Mas, como sempre, o barato está saindo caro.
Muitas empresas, especialmente, àquelas do setor da construção civil e mercado varejista estão sentindo na pele o aumento da carga tributária em relação a esta contribuição.
A alteração da simbólica base de calculo – folha de salários, por uma infinitamente maior – faturamento bruto, tem onerado demasiadamente esses setores, chegando ao dobro que vinham recolhendo sobre o mesmo tributo. Na construção civil, os cálculos chegam até o quíntuplo do valor que anteriormente se recolhia[1].
Fato é que este novo regime veio expressamente vinculado ao fomento da economia e à formalização das relações de trabalho, revelando seu caráter extrafiscal.
Todavia, no campo prático, o resultado é totalmente contrário. E não poderia ser diferente, pois o Governo Federal insiste na fórmula paradoxal de estimular a economia e o aumento das contratações com o aumento da carga tributária.
Assim, o que se vê é a utilização maquiada de uma contribuição com função extrafiscal para uma exclusiva função fiscal (arrecadatória), a qual não lhe é própria.
Em sequência, sobreveio a Medida Provisória n. 610/2013, convertida na Lei 12.844/2013, e, conforme prometido pelo Ministro Guido Mantega, fez restabelecer seis ramos da construção civil, bem como introduzir outros ramos de atividade.
Assim, fora esses aspectos extrínsecos ao tributo, de cunho social e econômico, existem muitos outros argumentos jurídicos que afastam a validade deste regime de tributação, tais como a violação à isonomia tributária, à capacidade contributiva, à proporcionalidade, à equidade no custeio da seguridade social, à livre concorrência, ao desvio de finalidade da lei, à ocorrência de bis in idem (identidade de base de cálculo e destinação constitucional da receita em relação à COFINS).
No entanto, o Poder Judiciário Paulista vem se manifestando de modo conservador a respeito da matéria, afastando esses argumentos acima elencados, todos de cunho constitucional, sendo a maioria prevista de forma expressa na Constituição Federal.
Mas por outro lado, também existe decisão exemplar por parte do Judiciário Mineiro, concedida em sede liminar e confirmada pelo TRF da 1ª Região, a qual envolve empresa da construção civil e obras de infraestrutura, que na apreciação dos mesmos argumentos refutados pela Justiça Federal de São Paulo, entendeu-se pelo afastamento dessa nova contribuição[2]. Vejamos este trecho:
“Afiguram-se-se plausíveis, portanto, as alegações da impetrante voltadas para a ocorrência de ofensa à igualdade tributária e à livre concorrência, na medida em que, após as alterações introduzidas pela Lei 12.844/2013, tornou-se possível que duas pessoas jurídicas que atuem em um mesmo ramo de atividade empresarial/comercial, com faturamento absolutamente idêntico e folhas de pagamento igualmente idênticas, sejam tributadas de forma diferenciada, isso porque uma delas tem como atividade principal alguma daquelas enquadradas nos grupos de CNAE elencados no artigo 7º, enquanto a outra exerça essa mesma atividade em caráter secundário, não como atividade principal.”
(grifo nosso).
3. Síntese conclusiva.
Portanto, verifica-se que a questão atinente à constitucionalidade desta exação encontra-se indefinida no Poder Judiciário, mas com viés de ser reconhecida a sua inconstitucionalidade, ainda, que diante da aplicação da regra hermenêutica da interpretação conforme à Constituição (art. 28 da Lei 9.868/1999).
Sendo assim, até que sobrevenha pronunciamento definitivo no STF, as empresas prejudicadas por este novo regime de tributação, e que se encontram obrigadas ao seu recolhimento, terão fortes e consistentes argumentos jurídicos para buscar o direito de permanecerem recolhendo sobre a folha de salários, assim como muitas outras empresas continuam fazendo.
Notas
[1] Dados contidos nos processos n.(s) 0000473-16.2014.4.03.6130 e 0002862-71.2014.4.03.6130, da JFSP.
2 Processo n. 0015644-73.2014.4.01.3800, da JFMG.
Advogado e professor universitário. Especialista em Direito Tributário pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC/SP e em Direito Processual Civil pela Escola Paulista da Magistratura – EPM. Ex-Conselheiro Julgador no Conselho Municipal de Tributos de São Paulo – CMT
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