Direito Civil

Desvirtuamento de Projetos de Lei de Iniciativa Popular: Consequências Para o Estado Democrático de Direito

Jucelia De Paula Pereira Armando[1]

Johanes Lopes De Moura[2]

 

Resumo

A Iniciativa Popular, que permite aos cidadãos participar de forma direta nas escolhas legislativas que regularão a vida em sociedade, tem sido pouco valorizada nesses 30 anos de regime democrático. Posto que, nas poucas vezes que a sociedade organizada conseguiu cumprir os requisitos formais exigidos para a propositura de projeto de lei, não se dispensou ao instituto tratamento diferenciado em sua tramitação no Congresso. Tampouco, preocupou-se em resguardar a essencialidade do texto do anteprojeto de lei, já que muitos deles foram totalmente desconfigurados ao se permitir a inclusão, alteração e exclusão de parte de seu texto. É o que se verificou do projeto de lei denominado “as 10 medidas contra a corrupção”, que foi totalmente desvirtuardo de seu propósito original, que era a criação de instrumentos que permitiriam um maior combate à corrupção institucionalizada nos vários setores das instituições públicas, principalmente nas instituições do poder legislativo brasileiro. Assim, tornou-se necessária a análise do instituto da Iniciativa Popular e das consequências advindas da desvirtuação de projetos de leis alçados ao legislativo por meio desse instrumento. Para tanto, com base em uma pesquisa bibliográfica analisou-se o tratamento dispensado à Iniciativa Popular no Brasil e no mundo, as consequências advindas de sua desvirtuação pelo Congresso Nacional Brasileiro. Por fim, foi possível concluir que a desvirtuação de projetos de lei de Iniciativa Popular é responsável por afrontar princípios constitucionais responsáveis por validar o Estado Democrático De Direito, desacreditar as instituições do Estado e causar insegurança e enfraquecimento do regime de governo e das suas instituições.

Palavras-Chave: Desvirtuamento. Iniciativa. Popular. Democrático. Direito.

 

Sumário: Introdução. 1. Da Democracia. 1.1. Conceito. 1.2. Aspectos históricos. 1.3. Democracia Direta, Indireta e Semidireta. 1.4. Dos princípios basilares do Estado Democrático de Direito. 2. Da Iniciativa Popular. 2.1. Conceito. 2.2. Relevância da Iniciativa Popular. 3.Iniciativa popular no Brasil. 3.1. Implementação da Iniciativa Popular no Brasil. 3.1.1 Tramitação Dos Projetos De Leis De Iniciativa Popular No Legislativo Brasileiro. 4. Comparativo entre Iniciativa Popular no Brasil no mundo: sistema semi vinculante e não vinculante. 4.1. Vinculação da Iniciativa Popular pelos princípios constitucionais do Estado Democrático de Direito. 4.1.2. Tramitação da Lei da Ficha Limpa e das 10 Medidas Contra a Corrupção. 5. Consequências da desvirtuação da Iniciativa Popular para o Estado Democrático de Direito. Considerações finais. Referências.

 

Introdução

Até o final de 2016, o entendimento sobre a importância do instituto da Iniciativa Popular e a forma de tramitação que eram dispensadas a ele pelos congressistas (quando da sua tramitação) era assunto unânime e assentado, tanto pela doutrina, quanto pelas casas legislativas do Brasil.

Mas, um projeto de lei de Iniciativa Popular, denominado “10 medidas contra a corrupção”, que angariou mais de 2 milhões de assinaturas para sua propositura, trouxe à discussão algo muito maior que o próprio instituto: discute-se as normas fundantes que o consubstanciam na sua existência, importância e efetivação.

Ao conceder uma liminar em mandado de segurança de n. 34530 MC/DF, que pedia a suspensão dos efeitos da votação na Câmara Federal que aprovara o projeto de lei das “10 medidas” com inúmeras modificações em seu texto e inclusão de emendas contrárias ao que se buscava com o projeto original, o ministro relator, Luiz Fux, levantou uma discussão sobre a real implementação do instituto da Iniciativa Popular no Brasil.

Segundo ele, por ser a Iniciativa Popular um instrumento de participação direta do povo na elaboração das leis, não poderia o congresso tratar o projeto de lei como se fosse um originário da própria câmara, amoldando-o conforme os interesses dos congressistas. Pelo contrário, deveria haver um procedimento diferenciado em sua tramitação, em que o mesmo deveria ser discutido em sua essência, não se permitindo substitutivos, nem nenhuma outra atuação que desvirtuasse o mesmo, lhes tirando a essência da finalidade a que foi proposto.

A partir desse novo olhar sobre o instituto, houve a necessidade de uma análise mais aprofundada sobre mesmo, pela qual busca-se responder algumas questões, como: houve, de fato, no Brasil, algum projeto de lei que fora aprovado como realmente sendo uma lei de Iniciativa Popular?

Outra dúvida suscitada é: exige-se um tratamento diferenciado a projetos de lei originários do âmago da sociedade, ou estes podem ser tratados como qualquer outro de autoria dos deputados? A partir dessas respostas, far-se-á uma análise mais aprofundada do preceito em questão, verificando quais consequências advém da subvalorizarão do instituto. Precisamente, quais princípios fundamentais ao Estado Democrático de Direito são afrontados ao se desvirtuar projetos de lei de Iniciativa Popular.

A busca por respostas sobre essa temática, levantada pelo ministro Fux, surge do momento de grande transformação de valores que o país está vivendo. Pois, nunca se falou tanto em moralidade, nunca se buscou tanto os fins sociais de qualquer objeto em discussão, e com esse não tem sido diferente.

A discussão se faz necessária, porque é preciso objetivar a Iniciativa Popular como cerne do Estado Democrático de Direito, como ferramenta dada aos detentores do poder do Estado, é preciso alçá-la ao patamar de sobre direito, de ferramenta essencial ao povo. E isso só será possível após profundas discussões sobre a mesma.

Por isso, objetiva-se com a pesquisa compreender, a partir do projeto de lei de Iniciativa Popular denominado “10 medidas contra a corrupção”, as consequências jurídicas advindas dessa desvirtuação.

Para a realização do estudo proposto serão utilizadas as mais diversas fontes de pesquisas bibliográficas, como doutrinas, leis, jurisprudências, artigos científicos e quaisquer outros materiais de fonte fidedigna que verse sobre o tema, no escopo de enriquecer o estudo com as análises e possibilidades do ordenamento jurídico. Será desenvolvida com uma abordagem qualitativa.

 

1. Da Democracia

O instituto da Iniciativa Popular só subsiste em Estados que adotam o regime democrático de governo. Posto ser a Iniciativa Popular, um instrumento que efetiva o real significado da palavra Democracia: de origem grega, demo = povo e Kracia = governo, ou seja, governo do povo. (BONAVIDES, 2001)

 

1.1. Conceito

Não há uma definição única para o que seja Democracia. A conceituação mais apropriada vai depender do contexto em que se busca essa definição, e de qual teoria está sendo adotada para tal. Pois, até os governos mais absolutistas se autodenominavam democráticos.

Segundo leciona Bobbio (1997), por mais que haja uma diversidade de conceitos atribuídos à Democracia, ela tem características únicas, que demonstram que um Estado é efetivamente um “governo do povo”.

Ao definir Democracia, José Afonso da Silva assevera que:

Democracia é conceito histórico. Não sendo por si um valor-fim, mas meio e instrumento de realização de valores essenciais de convivência humana, que se traduzem basicamente nos direitos fundamentais do homem, compreende-se que a historicidade destes a envolva na mesma medida, enriquecendo-lhe o conteúdo a cada etapa do envolver social, mantido sempre o princípio básico de que ela revela um regime político em que o poder repousa na vontade do povo. (2001. p. 129-130).

Nesse viés, ela é considerada o sistema pelo qual o povo pode participar, direta ou indiretamente, da vida política de seu país. Sendo assim “[…] entendida como contraposta a todas as formas de governo autocrático […]” sendo um “[…] conjunto de regras (primárias ou fundamentais) que estabelecem quem está autorizado a tomar as decisões coletivas e com quais procedimentos. ” (1997, p.17).

Já, Paulo Bonavides define Democracia como sendo o “[…] governo do povo, para o povo […]”. (2001, p. 344). Ainda, esse mesmo doutrinador, fazendo referência a Emílio Bouthoux, a conceitua como sendo “[…] a forma de governo na qual o povo impõe sua vontade de todas as questões importantes. ” (2001, p. 345).

Hans Kelsen, indignado pelas várias concepções distintas acerca do conceito de democracia, fez um manifesto, no qual se chegava à conclusão que por mais que houvesse várias nomenclaturas e definições para a Democracia, o certo é que Democracia se resumia a ser o caminho mais viável e certo para a progressão da liberdade. (BONAVIDES apud KELSEN, 2001).

 

1.2. Aspectos históricos

A história remete à Grécia como sendo o berço da Democracia. Nascida na antiguidade clássica, da necessidade de um povo de autogovernar-se, de decidir sobre suas questões políticas.

Os homens livres se reuniam nas praças (chamadas de Àgora) das cidades-estados para discutirem sobre as questões de Estado. Na Democracia de Atenas, os homens deliberavam sobre os problemas locais. Não havia representantes, eram os cidadãos comuns que decidiam o assunto posto em discussão, sem intermediários. Por isso, fala-se que a Grécia é a mãe da Democracia direta.

José de Alencar define bem esse momento nas pólis gregas: “A praça representava o grande recinto da nação: diariamente o povo concorria ao comício; cada cidadão era orador, quando preciso. Ali discutiam-se todas as questões do Estado, nomeavam-se generais, julgavam-se crimes. ” (1968, p. 36).

Segundo Alencar (1968, p. 39) “A civilização moderna não comporta esse governo da praça. Por um lado, alargaram-se consideravelmente os limites do estado, o que impossibilita o ajuntamento da população em um só comício: também a política tomou largas proporções[…]”. Ele ainda nos ensina que devido à modernização, a consciência de uma vida civil (particular) tomou conta de quase todo o tempo do homem moderno, com isso foi necessário a implementação da Democracia representativa, para que alguns decidissem em nome da maioria.

No século XX, houve uma expansão da Democracia como regime de governo, principalmente nos meados das décadas de 70 e 80. Isso significa dizer, que houve uma grande ampliação em relação aos países que deram direito ao voto a seus indivíduos. Pois Democracia está intrinsecamente ligada a poder de decisão, de escolha, mesmo que na forma representativa.

Como dito, o homem contemporâneo não pode se ocupar totalmente da vida pública, pois deixou de ser aquele homem político da Grécia antiga para ser o homem econômico dos tempos modernos. Houve aí, uma necessidade de adequar a Democracia a essas novas situações. Nasce, então, outras formas de Democracia: a indireta (ou representativa) e a semidireta.

 

1.3 Democracia Direta, Indireta e Semidireta

Na Democracia direta, a Iniciativa Popular surge “[…] como uma forma de valorizar a soberania popular, legitimando a atuação normativa do Estado e, por conseguinte, reforçando a validade social do próprio sistema jurídico. ” Filho (2017, p. 11). É por meio da Democracia direta que o povo pode interferir nas decisões políticas de seu país, sem intermediários, apresentando projetos de leis, aprovando ou rechaçando decisões de relevância social para a sociedade; antes ou depois de já postas em votação pelos seus governantes.

Na Democracia indireta ou representativa, o cidadão, titular do poder, elege -entre os seus – representantes que ficarão responsáveis por tomar as decisões políticas em seu nome.  Conforme Dutra:

[…] o povo, impossibilitado de participar diretamente na formação da vontade estatal, em função, por exemplo, da extensão territorial, da densidade demográfica e da complexidade dos problemas sociais, escolhem representantes que, em nome dos eleitores, exercem as funções do Estado. (2017, p. 164).

Já na Democracia semidireta, as decisões são tomadas por aqueles exercem o poder das duas formas: indireta (pelos representantes eleitos) e direta (referendo, plebiscito e Iniciativa Popular). O Brasil adota esse regime político, conforme se extrai dos artigos 1° e 14 da constituição pátria.

Art. 1º […] Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.

E Art. 14: A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante: plebiscito; referendo e Iniciativa Popular.

Neste tipo de Democracia o exercício do poder é desempenhado tanto por meio da Democracia representativa, quanto por meio da Democracia participativa, o que se dá pelo Referendo, Plesbicito e Iniciativa Popular.

 

1.4. Dos princípios basilares do Estado Democrático de Direito

A partir da criação do pacto social entre o homem e o Estado, o homem aceitou ser regido por normas que definiriam até onde iriam seus direitos e, também, quais seriam seus deveres. Nesse ínterim, o ordenamento que passou a reger a vida das pessoas em sociedade se mostra como uma norma posta, coercitiva, que se impõe e obriga a todos a cumpri-la. Com o passar do tempo, novas necessidades foram surgindo, as normas que antes tinham o intuito de garantir a liberdade do cidadão e o direito de manter seus bens já não eram mais suficientes para atender às novas demandas sociais.

Verificou-se com isso a necessidade de normas que assegurassem uma maior proteção ao povo, que garantissem direitos à uma vida com um mínimo de dignidade. Como reflexo dessa nova consciência social, surgiram inúmeras revoluções ao redor do mundo, em cada momento se reivindicavam novos direitos, que atendessem aos reclames de uma vida digna. Surge aí a ideia do princípio da dignidade da pessoa humana, juntamente com um novo regime de governo, no qual o povo pudesse participar das decisões políticas que os regeriam pelo pacto social então existente.

Através da ideia de princípios como normas garantidoras de direitos, pôde-se limitar a atuação do Estado. Com isso, princípios passaram a ser vistos como protetores do homem perante o Estado, já que, a partir deles, o homem passou a ser o centro de todas as manifestações normativas, que deveriam ser criadas para regular a convivência em sociedade e garantir direitos inerentes à raça humana e não mais com o intuito único de coerção. Pois, conforme Luiz Augusto Crispim,

Toda a questão subsume-se, portanto, à valorização dos termos POLÍTICA E DIREITO. Depende todo o processo da relação de equilíbrio entre a capacidade interativa da sociedade e o poder que ela própria outorga ao Estado para disciplinar toda essa trama de ações e reações movida pelo pensamento e pela dinâmica social. (2003, p. 22).

A partir da valoração dos direitos sob um viés principiológico, houve uma sujeição de todos aos limites de atuação trazidos pelos princípios, inclusive com a sujeição do próprio direito e do Estado. Já que, apesar de o direito positivado ser indispensável à regulação das relações jurídicas, este deve ter como componente de sua formação o objetivo de atender os anseios da sociedade organizada.

Os princípios desempenham o papel de unir e equilibrar os dois polos para que não haja, por parte de grupos da sociedade, uma busca desenfreada por direitos que atendam a seus interesses em detrimento dos direitos das minorias, e para que não sejam criadas pelo Estado normas formais, que não refletem as necessidades sociais que precisam ser regulamentadas. Com isso, os princípios foram elaborados com o intuito de alçar o ser humano como maior bem a ser tutelado, pautado no princípio da dignidade da pessoa humana.

A dignidade da pessoa humana é o valor supremo de um Estado Democrático de Direito, posto que tal princípio não é apenas um direito fundamental, mas sim, um elemento diretamente ligado a cada ser humano, configurando um fundamento basilar de todos os direitos fundamentais assegurados na constituição. Por meio da dignidade da pessoa humana se busca uma revalorização da Democracia. Posto que esta tem como corolário valores como:

[…] a garantia do exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias. (HELEN HWANG, 2016, p. 17).

A observância desses valores surge como obrigação para o Estado, para que todos possam viver em sociedade de forma não marginalizada. Pois como ensina José Afonso da Silva (2007, p. 178) “[..] a dignidade da pessoa humana é um valor supremo que atrai o conteúdo de todos os direitos fundamentais do homem, desde o direito à vida. ”

Nasce daí o entendimento de que não basta assegurar que todos tenham vida, mas que tenham uma vida digna, que todos tenham liberdade para escolher, que se autodeterminem e sejam respeitados por tais escolhas, tanto na seara religiosa, politica, filosófica, intelectual, social e moral.

A Dignidade da Pessoa Humana é tida como norteadora de toda atuação estatal e, também, limitadora e direcionadora do agir na seara particular. Significa dizer, o Estado democrático existe porque objetivou-se garantir a todos o direito a uma vida digna. O que só será possível por meios de garantias mínimas ao ser humano, garantias estas que saem do plano jus-natural e passam ao plano jus-positivo ao serem colocadas em um documento que deverá servir de guia a toda atuação do Estado para com os cidadãos e dos cidadãos para com outros cidadãos.

Por isso, ao dar início a uma nova ordem constitucional, escolheu-se para o Brasil em 1988 um novo regime, o Estado Democrático de Direito, que significa ser um Estado que tem como objetivo principal o respeito aos direitos inerentes à qualidade de pessoa humana e a seus instrumentos garantistas. Já o fato de ser o Estado DE DIREITO significa que este será regido por normas positivadas em um arcabouço jurídico, normas estas que serão fundamentadas nos direitos e garantias fundamentais de alcances principiológicos desse Estado.

Ao se estudar os princípios fundamentais do Estado Democrático de Direito, não há como negar que o basilar de todos, tido como norteador dos demais, é o próprio princípio democrático. Pois sob sua égide encontra-se os princípios mais elementares de uma constituição.

José Joaquim Gomes Canotilho (2002) ensina que o princípio democrático vai muito além de meras técnicas ou método utilizados pelos governados ao escolherem seus governantes. Pois, segundo ele, como princípio normativo, o princípio democrático deverá ser considerado nos seus vários aspectos políticos, econômicos, sociais e culturais, ele aspira a tornar-se impulso dirigente de uma sociedade.  Significa dizer que o princípio democrático é a norma matriz a que todos devem observar, seja na seara pública ou privada. Leonardo Drigo sintetiza essa posição elementar do princípio democrático nas seguintes palavras:

[…] norma jurídica de posição superior na hierarquia constitucional brasileira, desafiando uma interpretação e aplicação que prime pela realização do regime político participativo, de Democracia semidireta, privilegiando-se, ademais, os instrumentos de atuação do povo diretamente no exercício do poder, ou seja, a faceta direta da Democracia. (2014, p.97).

No Estado Democrático de Direito, os princípios deixam de ser meros vetores de interpretação e passam a ser considerados, também, normas cogentes, impositivas, que guiam e limitam a atuação pública ou privada. Assegura ainda, a participação dos cidadãos em todas as escolhas que sejam relevantes para a sociedade. Escolhas essas que são feitas por meio de seus representantes ou por meio de sua participação direta nas decisões políticas, através dos instrumentos de referendo, plebiscito e iniciativa popular. Como bem assevera Leonardo Godoy Drigo:

[…] a Democracia como princípio promove imediatamente valores como (a) soberania e autodeterminação do povo, enquanto permite que sejam criadas normas jurídicas e políticas públicas pelo próprio detentor do poder, (b) afirmação e resguardo dos direitos fundamentais, já que pressupõe, para sua efetividade, não apenas direitos políticos, mas também direitos como educação, saúde, habitação, liberdade de opinião, de reunião, de associação, dentre outros, (c) limitação do exercício do poder político, pelas possibilidades/exigências de fiscalização dos mandatários políticos pelos representados, (d) participação popular, pela previsão de meios de intervenção direta do soberano nos assuntos públicos mais relevantes. (2014, p.96).

O princípio Democrático tem sob seu manto alguns outros princípios, que estão diretamente relacionados à forma de participação do povo nas decisões políticas do país, quais sejam:

1.            Princípio Republicano

Conforme explicita Cauana Perim Franco Reche (2017, p. 04) “O princípio republicano tornou-se aspecto essencial dentro da nossa Constituição Federal, já que pontua não só a forma de governo, bem como, também pontua a própria organização estatal e o relacionamento deste com os cidadãos. ”

Esse princípio é tido como a espinha dorsal do Estado Democrático de Direito, pois por meio dele permite-se uma divisão do poder estatal em legislativo, executivo e judiciário. Através dessa divisão, possibilita-se que não haja uma concentração de poder nas mãos de um só, como ocorre em governos autoritários.

O Princípio Republicano também é o responsável por garantir que um exercente do poder não permaneça para sempre como detentor único daquela função, também como ocorre nos governos autoritários. Pelo contrário, ao se afirmar o processo de escolha pelo povo dos ocupantes do legislativo e executivo de quatro em quatro anos, evidencia-se sua característica de o regime democrático ter como finalidade trabalhar para garantir os interesses do povo. Porque se o eleito não estiver atendendo aos primados democráticos de garantia de direitos basilares ao povo, este poderá tirá-lo do poder por meio do voto e colocar outro em seu lugar.

2.            Supremacia da vontade popular

O Princípio da Soberania Popular está expresso no artigo 1° da constituição pátria, mais precisamente em seu parágrafo único, que diz:

Art. 1º […] Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição. (CF/1988) (grifos nosso).

É evidente que a vontade popular é ligada substancialmente ao regime democrático, pois só um povo que se autogoverna e toma suas próprias decisões pode ser chamado de efetivamente um país democrático.

Não há Democracia sem povo. Mas não basta o sentido abstrato e superficial de povo, aquele que se acaba na frase abúlica e fria da letra havida na norma. Para que se possa cogitar da efetividade democrática, há de se pensar na substância que nesta palavra se contém, em sua significação mais própria, direta e revolucionária, do elemento humano que potencializa a ação permanente e diretiva do comportamento do Estado na qual ele se organiza. (CARMEM LÚCIA A. ROCHA, 1998, p. 02)

Se há a possibilidade de participação do povo nas tomadas de decisões, mas essa só existe no papel, não há que se falar em estado democrático, e sim em demagogia. Como se extrai da própria palavra “arte de conduzir o povo a uma falsa situação. Dizer ou propor algo que não pode ser posto em prática, apenas com o intuito de obter um benefício ou compensação. ” Dicionário informal (2018, p. 01).

Logo, é por meio do Princípio da Vontade Popular que será garantido ao povo o direito de escolher quem exercerá as funções estatais, e também, é por meio desse princípio que se permite que haja a troca dos ocupantes dos cargos de poder do Estado. Pode-se dizer que o princípio da vontade popular efetiva o que promete o Princípio Republicano, sem a efetivação do primeiro não haverá o último e, consequentemente, não há que se falar em Democracia.

3.            Princípio da cidadania

A definição dicionarizada para o termo “cidadão” é “pessoa que habita uma cidade”. Já numa acepção jurídica, é “indivíduo que, como membro de um Estado, usufrui de direitos civis e políticos por este garantidos e desempenha os deveres que, nesta condição, lhe são atribuídos. ” Dicionário online (2018, p. 01)

No viés da Constituição Federal, o termo cidadão é corolário do princípio de mesmo nome: Princípio da Cidadania. Tal princípio veio como um dos fundamentos do Estado Democrático Brasileiro:

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: […] II –  a cidadania.

Ao discorrer sobre a definição do que seria povo, Paulo Bonavides (2001, p. 93) ensina que “O status civitatis ou estado de cidadania define basicamente a capacidade pública do indivíduo, a soma dos direitos políticos e deveres que ele tem perante o Estado. ” Um povo sem vínculos com o Estado é só um povo, mas um povo que tem relações de direitos e deveres com seu país, deixa de ser apenas povo e tornam-se cidadãos.

A temática da cidadania é tão relevante que Benevides (1994, p. 01), em uma de suas obras, já afirmou que “O debate sobre a ‘questão da cidadania’ permanece associado, na teoria e na prática, e para o bem ou para o mal, à discussão sobre as virtualidades e perspectivas da consolidação democrática no Brasil. ”

Isto significa que, não há que se falar em cidadania sem falar em Democracia e não há que se falar em Democracia sem analisá-la sob a ótica da efetivação da cidadania. Pois uma está intrinsecamente ligada à outra de tal modo que aquela não subsiste sem esta. Não adianta de nada um documento que constitui um regime democrático para um Estado, se o povo, que concordou em se sujeitar às normas criadas pelo Estado para regulamentar a convivência em sociedade, não tiver assegurado por esse mesmo Estado garantias intrínsecas à dignidade humana.

Portanto, Cidadania é para o povo uma via de mão dupla, que objetiva a busca da paz social. Pois, de um lado, há a sujeição aos deveres impostos pelo Estado e, do outro, há a garantia de que seus direitos de sobrevivência, liberdade, propriedade e vida com dignidade lhes serão assegurados por esse mesmo Estado. Se algum desses não for observado, não há que se falar em cidadania, somente em povo.

4.            Princípio da Igualdade

Ao passar a viver em sociedade, o homem precisa aceitar e se sujeitar às normas impostas para que haja tal convivência. Nesse viés, ele passa a ser sujeito de direitos e também passa a entender que o outro também o é, com isso há um reconhecimento da igualdade entre eles e da necessidade que se respeite ao outro como a si mesmo. Pois, como bem lembra Willis Santiago Guerra Filho ao ser citado por Fernanda Holanda de Vasconcelos Brandão

O princípio mereceu formulação clássica na ética kantiana, precisamente na máxima que determina aos homens, em suas relações interpessoais, não agirem jamais de molde a que o outro seja tratado como objeto, e sim como igualmente um sujeito de direitos. (2010, p. 02)

Sob o viés da Democracia, igualdade significa a possibilidade de se participar das decisões políticas do Estado de forma igual para todos, independentemente de raça, cor, credo, condição social ou ideologias políticas ou filosóficas.

Essa participação se dá de várias maneiras, dentre elas por meio do sufrágio. Mas o que vem a ser sufrágio? Sufrágio é toda forma de participação do povo nas decisões políticas do seu país. No Brasil, ela se dá de duas formas, a direta e a indireta.

5.            Princípio da Sufrágio Universal

Como mencionado, o sufrágio é o instituto constitucional responsável por assegurar aos cidadãos o direito de participar da vida política e das decisões tomadas por seus governantes. Apesar de a Constituição Federal trazer uma definição para o instituto, que se dá em uma pequena frase: “o direito de votar e de ser votado”, o princípio em análise desempenha função primordial no corpo do Estado Democrático de Direito. Thauana Barroso Nascimento compartilha desse entendimento, ao declarar que

[…] o sufrágio para a Democracia deve revelar-se como a vontade do povo, a verdadeira participação da sociedade na vida política e nas decisões tomadas pelo governo, não existindo limitações fundadas em discriminações sociais, raciais, intelectuais, de sexo, cor e/ou idade. (2013, p. 01)

Resta esclarecer que apesar de o sufrágio se chamar universal, essa amplitude só tem alcance àqueles que são considerados cidadãos pela carta constitucional, ou seja, os detentores de direitos políticos. Pois, somente os cidadãos detém o direito político, aqueles que não o têm são considerados apenas povo. Não podendo estes influir na condução política do Estado, seja por não ter sua capacidade civil plena, seja porque está com seus direitos políticos suspensos em decorrência de descumprimento ao pacto social (cumprindo alguma penalidade imposta pelo poder-juiz do Estado).

É o que assevera Pedro Lenza (2013, p. 78) ao conceituar os direitos políticos como sendo “[…] o instrumento por meio do qual a Constituição Federal garante o exercício da soberania popular, atribuindo poderes aos cidadãos para interferirem na condução da coisa pública seja direta, seja indiretamente”.

Ao dizer que o sufrágio é o instituto que garante a participação dos cidadãos nas escolhas políticas do Estado, estar-se-á falando sobre a participação que se dá de forma direta e de forma indireta nas decisões políticas do governo. O sufrágio garante a participação direta do cidadão por meio de instrumentos como o plebiscito, o referendo e a Iniciativa Popular. Já, a participação indireta se dá por meio do voto secreto e direto, ao permitir que o cidadão escolha algumas pessoas entre os seus para falar e decidir em nome da coletividade.

6.            Princípio da Liberdade e Legitimidade

O princípio da liberdade democrática se verifica quando o cidadão tem direito de escolher quem vai representá-lo, quem vai tomar decisões políticas em seu nome. E, também, quando ele mesmo, de forma direta, pode tomar essas decisões, por meio de instrumentos como o plebiscito, referendo e Iniciativa Popular. Também a legitimidade se relaciona às duas situações anteriores, só que nesse caso, dando validade às escolhas feitas, como se pode ver da seguinte definição de legitimidade:

[…] a aquiescência que os cidadãos outorgam a seus representantes e ao sistema político, o que contribui para a harmonia social e evita conflitos com segmentos da população que não compartilham em igualdade na distribuição dos bens produzidos. (VELLOSO e AGRA, 2016, p. 22)

Resta comprovado que tais princípios são elementares para a efetivação de um verdadeiro Estado Democrático de Direito. Que não há que se falar em Democracia se houver afronta ou aviltamento aos mesmos. Além disso, foi possível inferir da análise dos princípios que alicerçam o Estado Democrático de Direito que, apesar de cada princípio citado desempenhar uma função específica à efetivação do regime democrático, todos eles estão intrinsecamente ligados um ao outro de tal forma que se houver ofensa a algum deles, atingir-se-á a todos em algum grau. E ao se permitir que tal ofensa aconteça, ferir-se-á de morte o Estado que tem como primado ser democrático e ser de direito.

 

2. Da Iniciativa Popular

Como se pôde observar até aqui, a Constituição Federal objetivou assegurar diversos instrumentos de efetivação à participação dos cidadãos nas escolhas políticas do governo. Ao trabalhar os princípios, também se concluiu que, através dos princípios da soberania popular e do sufrágio, outros instrumentos eram garantidos para tal implementação, dentre os instrumentos que efetivam de forma direta a participação dos cidadãos encontra-se a Iniciativa Popular.

 

2.1. Conceito

De acordo com Maria Victória de M. Benevides (1991, p. 33), a Iniciativa Popular “[…] trata-se do direito assegurado a um conjunto de cidadãos de iniciar o processo legislativo, o qual desenrola-se num órgão estatal, que é o Parlamento”.

Costa de Oliveira diz que a Iniciativa Popular “[…] se trata de uma forma de provocação do Estado-legislador realizada diretamente por uma parcela da sociedade civil […]”. E ainda justifica a sua implementação ao dizer que “[…] o litígio legislativo terá sido impulsionado pelos próprios cidadãos que forçarão a instituição responsável pela feitura da lei a discutir, avaliar e, eventualmente, aprovar a norma ofertada seguindo esta via. ” (2010, p. 156).

Já Vicente Paulo e Marcelo Alexandrino definem o instituto como sendo “um dos meios de participação direta do cidadão na vida do Estado, nos atos de governo. ” (2017).

Infere-se que a Iniciativa Popular é o meio mais adequado, para que o cidadão consiga imprimir, nas decisões legislativas, seus anseios e suas necessidades. Ela possibilita que haja um alinhamento direto e mais efetivo entre aquilo que aquiesce a sociedade e as leis que a rege.

 

2.2. Relevância da Iniciativa Popular

A soberania popular é requisito mínimo para a efetivação de um Estado Democrático de Direito. Nesse contexto, o povo precisa ser respeitado, e consultado, quando da tomada de decisão de assuntos de relevo para a sociedade. Pois o interesse maior é que seus anseios sejam alcançados.

Nele, tem-se por corolário a participação representativa e a participação direta. É necessário que se respeite essas modalidades de participação e que haja um equilíbrio entre as mesmas, que atuem em complementariedade, e não com a primeira em situação de superioridade em relação à segunda, anulando-a.

O sociólogo Américo Sampaio define bem as características de cada uma, veja-se:

A Democracia representativa […] articula todo o campo jurídico-institucional da representação: eleição de dois em dois anos, com propaganda política, partidos políticos, candidatos, mandatos e assim por diante. Por outro lado, a Democracia participativa e direta não se realiza mediante a participação de partidos políticos, nem de representantes eleitos, mas sim, sem as intermediações de pessoas ou instituições, ou seja, pela participação direta do povo, que é consultado sobre algum tema, lei ou política pública. A “disputa” nessa modalidade de Democracia não se dá entre partidos políticos ou candidatos, mas entre opiniões contra e a favor a uma determinada matéria […]. (2016, p. 01)

Já Maria Victória de M. Benevides (1991), vem confirmando a importância e implementação do instituto da Iniciativa Popular numa Democracia participativa, defendendo que a implementação dos mecanismos de Democracia direta, além de ser uma forma de participação política que complementa os mecanismos de Democracia representativa, também são muito importantes no processo de educação política dos cidadãos.

Fala-se que o Brasil vive uma “crise de representatividade”, por isso a importância de mecanismos que permitam a participação do povo nas decisões políticas, “[…] consubstanciado na capacidade jurídica de propor formalmente a legislação que no seu parecer melhor consulte o interesse público”. (BONAVIDES, 2001, p. 374). Pois, em tempos em que o poder legislativo anda tão desacreditado, instrumentos que possibilitem uma maior participação dos titulares do poder nunca se fizeram tão necessários nas escolhas das normas que os regularão.

 

3. Iniciativa Popular no Brasil

Nos idos da década de 80, houve um grande apelo popular pela redemocratização do Brasil e milhares de pessoas foram às ruas pedir eleições diretas, movimento que ficou conhecido por “diretas já”. Esse movimento refletia a insatisfação da população em relação ao regime autoritário implantado nos 20 anos de governo militar. Era um grito pela redemocratização do país. (CÂMARA FEDERAL, 2018)

Com o movimento das “diretas já”, criou-se a emenda constitucional “Dante de Oliveira”, que buscava a instituição das eleições diretas para presidente da república. Mas, apesar de grande apoio popular ao movimento, a emenda não foi aprovada, permanecendo o modelo, então, vigente, de eleição indireta para presidente. (CÂMARA FEDERAL, 2018)

Apesar da derrota, a campanha “diretas já” promoveu uma intensa reflexão sobre o processo legislativo e as formas de participação da sociedade, fortalecendo os movimentos populares e trazendo à discussão a necessidade de meios alternativos de participação da sociedade nas discussões sobre questões políticas.

Como afirma Nelson Shih yehn Lin (2010, p. 27), “[…] indicou a necessidade da sociedade civil de buscar alternativas para a participação política para além da esfera da representação política. ” Bem como, também, cita José Álvaro Moisés, que diz:

“[…] as massas que se reuniam na praça pública não desejavam apenas a mudança do governo do dia, mas queriam influir na mudança das políticas que, doravante, seriam adotadas pelo Estado. ” (2010, p. 27).

Surgiu daí a necessidade de instrumentos que assegurassem uma maior participação da sociedade nas decisões políticas do Estado. Que possibilitassem uma maior aproximação entre a sociedade civil (cidadãos) e a sociedade política (Estado), historicamente distanciadas.

Nascia ali um projeto de Democracia e, com ele nascia também o desejo por uma maior aproximação e interferência da população nas escolhas das leis e das políticas públicas que as fossem gerir. Para isso, houve uma ampla organização dos grupos sociais de base, a fim de que fossem ouvidos e tivessem suas reivindicações colocadas na nova lei maior.

A primeira reivindicação desses grupos foi a criação de uma constituinte exclusiva para elaborar o anteprojeto da constituição. Conforme demonstra Cardoso (2016, p.33), em sua tese de doutorado ao citar notícia do jornal da época “FOLHA DE SÃO PAULO” conforme Benevides: “[…] com o apoio de oitocentas Comunidades Eclesiais de Base, o Cardeal-Arcebispo de São Paulo D. Paulo Evaristo Arns lançou, em setembro de 1985, uma campanha de mobilização popular em favor de uma Constituinte exclusiva. ”

Mas, apesar de tanta organização, não obtiveram êxito, já que, depois de muitos debates e discussões, decidiu-se por uma constituinte congressista. Todavia, a derrota não foi por completo, posto que os grupos mobilizados conseguiram colocar no regimento interno da assembleia constituinte que a sociedade civil poderia apresentar “emendas populares” ao texto em elaboração.

Ademais, nascia ali, também, uma consciência política muito importante que, além de levar a uma grande participação da sociedade nesse momento histórico, permitiu que novos instrumentos de participação fossem criados.

Tudo isso era tão novo que a forma como a sociedade se organizou em grupos de mobilizações, exigindo estar presentes nos debates sobre a elaboração e criação da nova constituinte, “[…] surpreendeu até mesmo o governo militar, que sustentava o discurso da transição lenta e gradual, fechada à participação social e sem rupturas. ” (NASCIMENTO, 2013, p. 02).

Por essa razão, verifica-se que, apesar de sofrer bastante resistência por parte daqueles a quem foi dado o poder de elaborar a nova constituinte, os grupos sociais conseguiram reproduzir muitos de seus anseios no texto constitucional.

Alexandrino, em sua obra, resume bem o que aconteceu ali, pois nas palavras dele

[…] é possível a participação direta do povo no processo de elaboração ou de aprovação da Constituição (Democracia participativa), por meio de plebiscito ou referendo, ou mediante apresentação, ao órgão constituinte, de propostas populares de dispositivos constitucionais para serem apreciadas e, se aprovadas (com ou sem modificações), incorporadas ao texto da Constituição (uma espécie de “Iniciativa Popular constitucional”). (2017, p. 77)

Só que a implementação dessa conquista não foi fácil. Pois, apesar de conquistado o direito de participar da elaboração e aprovação da nova constituinte, para conseguir apresentar “emendas populares” eram exigidos alguns requisitos, como: “[…] participação de, no mínimo, três entidades da sociedade civil e a existência de, no mínimo, 30.000 assinaturas, sendo que cada cidadão poderia assinar três emendas populares. ” (LIN, 2010, p. 54).

Mas, a despeito de toda a dificuldade em preencher os requisitos mínimos exigidos, as entidades civis conseguiram apresentar 03 emendas ao texto em elaboração, as de número 21, 22 e 56. Essas emendas objetivavam ampliar a participação direta do povo no processo legislativo. (BRASIL, 2018)

Após um longo debate político, onde uns defendiam a inserção dos mecanismos de participação popular e outros diziam que elas conflitariam com o instituto da Democracia representativa, foi aprovada, no artigo 62, parágrafo 2° da Constituição Federal de 1988, a participação direta da sociedade civil nas deliberações legislativas, por meio dos institutos da Iniciativa Popular, referendo e plebiscito. (BRASIL, 2018)

 

3.1. Implementação da Iniciativa Popular no Brasil

Apesar de o Brasil ter adotado a Democracia semidireta, esta é preponderantemente exercida na forma indireta, já que a direta encontra várias barreiras que dificultam a sua efetivação. Esses empecilhos são tantos sociais, quanto culturais, reflexos das desigualdades e, também, da falta de conscientização política do povo.

Há também, não menos grave, outros dificultadores (técnicos e legais), como exemplo, os requisitos formais exigidos pela Constituição Federal vigente para o exercício da participação direta no processo de elaboração de leis (assinatura de 1% do eleitorado brasileiro, no mínimo 5 estados participantes com 0,3% de assinatura de seus respectivos eleitores). (BRASIL, 2018). A dificuldade na sua execução é tão grande que Manoel Gonçalves Ferreira Filho (2002) a apelidou de “instituto decorativo”.

Para corroborar com essa análise, João Morgado (2016, p. 05), citando Fleury (2007), “[…] assevera que as condições exigidas pela CFRB/88 e pela Lei nº 9.709/98 são altamente restritivas, uma vez que a sociedade brasileira careceria, em muitos lugares, de informações, educação e cultura cívica […]”.

Não bastassem as dificuldades já mencionadas, 30 anos após a promulgação da constituição brasileira de 1988, o instrumento, ora analisado, ainda não foi implantado de forma a concretizar o direito de participação dos cidadãos nas decisões de interesse público.

3.1.1 Tramitação Dos Projetos De Leis De Iniciativa Popular No Legislativo Brasileiro
 
Ao se fazer uma análise do processo de tramitação dos projetos de lei de Iniciativa Popular no site da Câmara Federal, chega-se à conclusão de que, no decorrer desses anos, projetos de lei que nasceram dos anseios da sociedade têm sido autuados nos mesmos moldes de um projeto de iniciativa parlamentar. Isso acontece porque os projetos que conseguem cumprir os rigorosos requisitos e chegar à casa legislativa encontram outros obstáculos: não há condições técnicas de serem autuados formalmente como de Iniciativa Popular.

Para não se perder todo o trabalho e, também, pela esperança de ver seus anseios alcançados, os cidadãos que o ratificaram sujeitam o projeto de lei a algum deputado, que faz o “favor” de subscrevê-lo como se de sua autoria, para que prospere sua tramitação. Desconfigura-se, com isso, o instituto. Deixando, ele, de dar voz às ruas e passando a servir conforme o interesse daqueles que deliberam sobre o mesmo.

Pois, ao seguir o mesmo rito de projetos comuns, autuados pelos deputados, possibilita-se que o projeto de Iniciativa Popular seja emendado, substituído, ou ainda que parte do texto da proposta original seja subtraída, perdendo com isso toda sua essência, não tendo mais a razão de ser daquilo que a sociedade almejava. (CÂMARA FEDERAL, 2018).

Como resultado, deixando de existir o projeto original, dá-se lugar a um pseudoprojeto, que atenderá interesses particulares dos mais variados. Para tornar mais grave a situação, após ser desfigurado e aprovado, tal projeto é noticiado como se de Iniciativa Popular, com a finalidade de dar à sociedade uma falsa ilusão de ingerência na criação de normas para o país, além de passar a mensagem de que o mesmo é validado pela vontade popular.

É o que se verificou, quando da aprovação da lei das “10 medidas contra a corrupção”, que tinha como finalidade criar mecanismos que inibissem e punissem de forma mais severa agentes políticos que praticassem corrupção, e como resultado teve-se uma lei que punia membros do Ministério Público e do Judiciário por atos realizados na sua atuação institucional. Atuação esta, que tem como função combater a corrupção.

4. Comparativo entre Iniciativa Popular no Brasil no mundo: sistema semi vinculante e não vinculante

Ao se comparar o instituto de participação popular do Brasil com o de outros países, verifica-se que um dos problemas principais a ser enfrentado é a questão da falta de prestígio que o Brasil vem dispensando a tal instituto.

Sobre esse desprestígio, veja-se o que diz o ministro Luiz Fux:

É relevante destacar que desde 1988 não houve nenhum projeto sequer autuado formalmente como de Iniciativa Popular na Câmara Federal dos Deputados, atestando não apenas o completo desprestígio com que este instrumento democrático é tratado, mas também a eliminação de qualquer efetividade das normas constitucionais que regem o tema. (STF, MS nº 34530 MC / DF).

Para entender sobre o tratamento dispensado ao instituto nas constituições alienígenas e o dispensado a ele aqui no Brasil, é preciso saber que existem duas formas de tratamento dispensado à Iniciativa Popular, a semi vinculante e a não vinculante.

Nos países que tratam a Iniciativa Popular como um sistema semivinculante, a atuação do legislativo na condução do projeto de lei de Iniciativa Popular é limitada. Há uma superproteção ao princípio da soberania popular e devido a isso, eles ficam limitados ao teor da proposta original do projeto de lei, podendo, apenas, aprová-lo. E nos casos de rejeição ou apresentação de substitutivos, deverá, obrigatoriamente, levá-los a referendo popular. É o que leciona João Trindade Cavalcante Filho:

Há alguns ordenamentos jurídicos em que a soberania popular é mais valorizada, chegando-se mesmo a estabelecer que, uma vez apresentado o projeto por proposta do eleitorado, não poderá o Legislativo rejeitá-lo, sem consultar a população, mediante referendo. (2017, p. 09).

O Uruguai é um dos países que adotam o sistema semivinculante na tramitação de projetos originários da Iniciativa Popular. Devido ao seu sistema semivinculante, ele é considerado o país da América Latina que mais aprovou leis advindas da Iniciativa Popular. Ainda, segundo Érika Bazilio, (2017, p.03) “[…] 81% de todos os processos de Democracia direta de Iniciativa Popular na América Latina, nos últimos 40 anos, aconteceram no Uruguai. ”

Já quando o instituto é tido como não vinculante, não há limitação aos detentores do poder legislativo, podendo, estes, modificar o texto original, apresentando substitutivos; aprovar; ou mesmo rejeitar o projeto de Iniciativa Popular. Pois como bem ensina Filho (2017, p. 10), “[…] a Iniciativa Popular é encarada como mero poder de impulsionar o processo legislativo, deixando o Parlamento livre, entretanto, para dar ao projeto o destino que julgar adequado. ”

No Brasil, apesar de se adotar a Democracia participativa, a atuação nas decisões políticas se dá, quase que totalmente, pelo meio representativo. Além disso, quando algum projeto de lei é autuado como de Iniciativa Popular, este não vincula o legislativo. Podendo, eles, aprová-lo, fazer substitutivos ou mesmo rejeitá-lo totalmente. Américo Sampaio afirma que ocorre uma sobreposição da Democracia representativa sobre a participativa, e esta sobreposição se dá de tal maneira que a Democracia direta acaba por ser anulada, não passando de mero instituto decorativo.

[…] trata-se da Democracia representativa se sobrepondo e anulando a Democracia direta, o que podemos chamar de verticalidade institucional da Democracia, o que deturpa a ideia inicial […] da coexistência de duas modalidades de Democracia, a representativa e a participativa e direta. (2017, p. 206).

Como dito, não há expresso, na constituição pátria, nenhuma norma que vincule a atuação dos legisladores à tramitação dos projetos de lei de Iniciativa Popular, proibindo que se faça modificações que desconfigurem o texto originário, tirando toda sua essência inicial. E por não haver nenhum proibitivo, o poder legislativo se sente na liberdade de fazer as modificações que achar pertinentes.

 

4.1. Vinculação da Iniciativa Popular pelos princípios constitucionais do Estado Democrático de Direito

Apesar de não haver norma constitucional ou infraconstitucional que delimite a tramitação das iniciativas populares, os legisladores não podem tratá-las como se fossem projetos de sua autoria, visto representar não só um instituto em si, mas um instrumento que de efetivação do Estado Democrático, pois permite ao povo poder interferir nas escolhas políticas do pais definindo as normas de direito que melhor atendam às suas necessidades.

Crispim (2003, p. 23), assevera esse entendimento ao confirmar que o direito é “fruto de pressões exercidas por uma certa massa crítica, que aflora a trama social exigindo instrumentos de controle social que só o ordenamento pode trazer. ”

Pois, segundo ele, na criação do Estado, o direito se reconhece sob dois aspectos. De um lado, encontra-se o elemento natural, que se realizam das necessidades de fato ou dos princípios gerais que tutelam os direitos básicos do homem. E do outro, encontra-se uma norma positivada, construída, considerada um conjunto de elementos artificiais que variam conforme as necessidades da sociedade a qual pertençam e que tiram seu valor normativo e sua aplicação eficaz da vontade humana.

[…] de um lado, o elemento “dado”, oriundo “das realidades de fato ou dos princípios essenciais à ordem geral do mundo que comporta certa permanência e se nos impõe, do outro, “o construído”, conjunto de elementos artificiais, variáveis e contingentes, que tiram seu valor e eficácia da vontade humana e constituem os meios necessários para dar efeito às direções gerais fornecidas pelos fundamentos da sociedade. (CRISPIM, 2003, p. 23)

Infere-se com isso que o direito tem que nascer da vontade popular e não o contrário, pois existindo a vontade popular e esta for ignorada na criação do direito, estará se ignorando o fato de que o direito nasceu para regular a interdependência humana, advinda da necessidade de se viver em coletividade.

Em última análise, são fatores de natureza social, econômica, étnico e cultural que atuam na configuração dessas condições, criando o meio no interior do qual se defrontam interesses concorrentes ou antagônicos. Por mais que se pretenda atribuir à norma uma autonomia impermeável às manifestações da causalidade histórico-social, não se pode confiar, nem muito menos concentrar o processo de formação do ordenamento jurídico exclusivamente nas mãos do legislador, como se fora este o único artífice do fenômeno jurídico e não o intérprete ou, se quiserem, o porta-voz do grupo social para o qual está legislando em dado momento. (CRISPIM, 2003, p. 24)

Além do mais, ao desconfigurar os projetos de lei de Iniciativa Popular, afronta-se diretamente vários princípios intrinsecamente conectados à Democracia participativa. Pois, quando da análise dos princípios que direcionam o regime democrático, restou evidenciado a amplitude e a força que se busca ao elevar algum direito ao nível principiológico. E que, a partir dessa elevação, toda atuação em nome do Estado deve tê-los como norma superior de direcionamento e limitação, dentre elas a atuação legislativa.

Numa síntese da análise principiológica, nota-se que os princípios são inerentes um ao outro, de maneira tal que a afronta a um princípio, cerne do regime de governo democrático, atinge a todos os demais com maior ou menor proporção, mas o que não se pode negar, é que ao se permitir condutas que não observem os limites estabelecidos pela lei ou os caminhos orientadores trazidos pelos princípios, não se pode dizer que se vive, efetivamente, uma Democracia.

Como exemplo da inter-relação entre os princípios, é possível citar o art. 14 da Constituição Federal de 1988, no qual se verifica como um princípio está intrinsecamente ligado a outro. Pois, em um único comando normativo constitucional demonstra-se que, por meio do princípio da soberania popular, os cidadãos que compõem um Estado poderão tomar as decisões que melhor atendam a necessidade de todos. Para isso, outro princípio assegura instrumentos de efetivação dessa participação popular, qual seja: o princípio do sufrágio universal.

Além disso, o mesmo artigo enumera importantes instrumentos pelos quais o povo poderá fazer valer seu direito de tomar as decisões que a maioria entender pertinentes, os quais se desdobram em voto direto e secreto, plebiscito referendo e, Iniciativa Popular. Neste comando ainda resta evidenciado um princípio indispensável a um Estado Democrático, o princípio da igualdade, que garante a participação igualitária a todos.

Art. 14. A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante:  I – plebiscito; II – referendo; III – Iniciativa Popular. (Grifou-se)

Por isso que, ao afrontá-los, fere-se de morte o Estado Democrático de Direito. Posto que os princípios são normas de sobredireito, norteadoras de toda e qualquer atuação pública ou privada, na seara administrativa, legislativa ou judicial. Deixando, a muito, de ser meros vetores interpretativos e passando a ser normas cogentes, vinculativas, suficientes para fundamentar qualquer decisão judicial.

Para demonstrar como a falta de vinculação do legislativo ao instituto da Iniciativa Popular permite que sejam feitas modificações substanciais capazes de tirar-lhe toda a essência e seu objetivo inicial, far-se-á uma análise da tramitação de dois projetos de lei, um que foi aprovado com poucas modificações e outro que foi totalmente desconfigurado, perdendo sua substancialidade, desvirtuando o instituto da Iniciativa Popular.

 

4.1.2. Tramitação da Lei da Ficha Limpa e das 10 Medidas Contra a Corrupção

O Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE) em conjunto com a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) conseguiram angariar mais de um milhão e meio de assinaturas para propor o projeto de lei de Iniciativa Popular que originou na que ficou conhecida como “lei da ficha limpa”.

O projeto de lei complementar foi proposto com o objetivo de incluir, na lei complementar de n. 64/90, a condenação criminal em primeira instância como critério de inelegibilidade para aqueles que pretendessem alçar voo na carreira política ou que já estivessem nela e quisessem permanecer.

Este projeto de lei teve algumas peculiaridades em sua tramitação. Primeiro, que ele foi autuado na Câmara Federal em 29 setembro de 2009 e em nove meses de tramitação a lei já havia sido sancionada pelo presidente da república. Essa rapidez em sua tramitação deveu-se a grande pressão popular, apoiada pela igreja católica e alicerçada pelo MCCE.

Outra característica da tramitação da lei da ficha limpa foi a não aprovação de substitutivos à mesma. O único substitutivo que teve foi o que alterava a parte do artigo que dizia que bastava a condenação em primeira instância ou em instância única para o enquadramento na lei da ficha limpa.

De autoria do relator da comissão criada para tratar da tramitação da lei antes de ser levada em plenário, deputado Índio da Costa, grande defensor da referida lei, o substitutivo, segundo ele, foi necessário visto que sem a alteração seria muito difícil alcançar o apoio necessário para sua aprovação. (CÂMARA FEDERAL, 2018)

Ao analisar a referida lei, nota-se que o objetivo ao qual foi criado o projeto de lei foi preservado, feito apenas algumas adequações técnicas, que não tinham o condão de desvirtuá-la, pelo contrário, os ajustes feitos possibilitou que novas condutas fossem enquadradas como condição de inelegibilidade. Conforme se lê:

Assim, a Subemenda Substitutiva Global apresentada trouxe como principais alterações a ampliação e melhor adequação técnica das hipóteses de inelegibilidade, garantindo-se sua adequação ao espírito do projeto original […]. (MELCHIORI; 2011, p. 93)

Isso não significa dizer que não houve uma mobilização por parte dos deputados para incluir diversas emendas com o intuito de esvaziar a finalidade da nova lei. Houve pedidos de vistas com efeitos protelatórios, nomeação de relator que se encontrava fora do país, pedido de adiamento da votação em plenário, inclusive o próprio esvaziamento do plenário a fim de que não se alcançasse o quórum necessário para que o projeto de lei fosse votado. (MELCHIORI, 2011)

Mas, devido a participação ativa dos membros do MCCE que acompanharam de perto toda a tramitação do projeto de lei e a divulgação pelas grandes mídias do que estava se passando durante a tramitação, a Câmara Federal aprovou o projeto de lei somente com o substitutivo da comissão técnica e rechaçou todas as 28 emendas apresentadas ao projeto de lei. Dentre elas, inclusive, tinham algumas com o único propósito de tirar a finalidade a que se pretendia com a lei. (CÂMARA FEDERAL, 2018)

Já em relação à tramitação do projeto de lei n. 4.850/16, chamado de “as 10 medidas contra a corrupção”, a sociedade organizada, com o apoio do Ministério Público Federal, conseguiu reunir mais de duas milhões e duzentas mil assinaturas para propor a criação de uma lei que instituía vários instrumentos que permitiriam maior efetividade no combate à corrupção.

Entre os instrumentos de combate à corrupção, o PL 4.850/16 trazia mecanismos pelos quais buscava-se acelerar a tramitação dos processos judiciais; criminalizar o enriquecimento ilícito de agentes públicos; aumentar a pena de crimes de corrupção; qualificar como crime hediondo os crimes de corrupção quando envolvessem altos valores; responsabilização dos partidos e criminalização do caixa dois, dentre outras medidas, totalizando dez.

Por fim, buscou-se, com a proposição legislativa, combater arduamente a corrupção sistemática que assola as instituições públicas brasileiras, além de obter mais transparência e o fortalecimento do princípio da lisura na condução da coisa pública.

Em contrapartida, na madrugada do dia 30/11/2016 o que se viu foi uma total desconfiguração do projeto originário de Iniciativa Popular. Quando foi declarada aprovada “a lei das 10 medidas”, o que menos se via em seu corpo eram instrumentos que remetessem àquelas medidas propostas originariamente. As alterações feitas no projeto de lei o desvirtuaram totalmente da ideia pretendida na inicial, foram introduzidos no corpo do texto diversos temas desconhecidos daqueles que subscreveram o projeto de lei.

Os deputados federais que o votaram se aproveitaram de um momento de grande comoção nacional pela queda de um avião que ceifara a vida de toda uma equipe de futebol, a chapecoense, para na calada da noite descaracterizar aquele que seria um marco para o combate à corrupção. Rodrigues e Magalhães trazem uma síntese dos objetos suprimidos do projeto original. Nas palavras deles,

Os deputados rejeitaram o ponto que: tornava crime o enriquecimento ilícito de funcionários públicos previa o confisco dos bens relacionados ao crime; a proposta que previa acordos de leniência entre empresas envolvidas em crimes espécie de delação premiada em que empresas reconhecem crimes em troca de redução de punição) fossem celebrados pelo Ministério Público; foram derrubadas as mudanças para dificultar a ocorrência da prescrição de penas, que é quando o processo não pode seguir adiante porque a Justiça não conseguiu conclui-lo em tempo hábil; e a criação do confisco alargado, que permitiria o recolhimento de patrimônio da pessoa condenada pela prática de crimes graves. Também foram suprimidas as medidas que previam estímulo à denúncia de crimes de corrupção que era conhecida como “reportante do bem” para incentivar o cidadão a denunciar crimes de corrupção em qualquer órgão, público ou não. Como estímulo, o texto dele previa o pagamento de recompensa em dinheiro para quem fizesse isso; e a proposta de acordos entre defesa e acusação para simplificar processos e o ponto que previa a responsabilização dos partidos e a suspensão do registro da legenda em caso de crimes graves. (2017, p. 10)

Das 10 medidas iniciais que haviam no projeto de lei, restaram apenas 04, que ainda sofreram alterações. O resultado da votação refletia os interesses daqueles que ocupavam as cadeiras no parlamento e que tinham pendências judiciais a respeito do tema. Pois, muitos dos que ali votaram estavam respondendo processos judiciais, exatamente, por corrupção.

Entre as diversas emendas apresentados ao PL das 10 medidas contra a corrupção, foi aprovada uma que tinha como objeto a punição de magistrados e membros do ministério público, quando de sua atuação institucional. Percebia-se ali, claramente, o intento vingativo e o enfraquecimento do judiciário e do Ministério Público na atuação de combate aos crimes de corrupção. (CÂMARA FEDERAL, 2018)

Devido à ampla gama de substitutivos inseridos no projeto de lei das medidas contra a corrupção, o deputado federal Eduardo Bolsonaro impetrou o mandado de segurança de n. 34530 MC/DF no Supremo Tribunal Federal (STF), com efeitos acautelatórios para suspender os efeitos da aprovação de tal projeto de lei e que o mesmo fosse devolvido à Câmara Federal para que fossem corrigidas irregularidades do mesmo.

Ao deferir a liminar suspendendo os efeitos da tramitação do PL 4.850/16, o ministro relator Luiz Fux afirmou que o congresso não pode desfigurar projeto de lei de autoria popular, acrescentando emendas ou retirando partes de seu texto original de forma que haja uma perda de sua essência. Pois, segundo ele, é preciso que

[…] o projeto de lei de Iniciativa Popular seja debatido na sua essência, interditando-se emendas e substitutivos que desfigurem a proposta original para simular apoio público a um texto essencialmente distinto do subscrito por milhões de eleitores. (MS 34530 MC/D)

Pois, se ao instituto da Iniciativa Popular não for dispensado um tratamento diferenciado em sua tramitação, corre-se o risco de se esvaziar importante instrumento de participação popular no processo legislativo brasileiro.

À míngua desses elementos, ocorre evidente sobreposição do anseio popular pelos interesses parlamentares ordinários, frustrando a ratio essendi da figura constitucional, destinada a abrir à sociedade uma porta de entrada eficaz, no Congresso Nacional, para que seus interesses sejam apreciados e discutidos nos termos apresentados. (MS 34530 MC/D)

Ainda, segundo ele, quando o texto gestado no consciente popular é emendado com matéria estranha ou fulminado antes mesmo de ser debatido, atropelado pelas propostas mais interessantes à classe política detentora das cadeiras no Parlamento nacional, ter-se-á “apenas simulacro de participação popular” (MS 34530 MC/D).

Diante dessa nova abordagem dada à Iniciativa Popular, surge a necessidade de se analisar como o desvirtuamento aos projetos de lei de autoria popular atinge o Estado Democrático de Direito, se de alguma forma há afronta aos princípios constitucionais que servem de base de sustentação ao regime democrático brasileiro e quais são as consequências desse desvirtuamento.

 

5. Consequências da desvirtuação da Iniciativa Popular para o Estado Democrático de Direito

As consequências da desvirtuação da Iniciativa Popular para o Estado Democrático de Direito restam demonstradas a partir das análises feitas no decorrer de todo trabalho. Primeiro, porque para que o instituto da Iniciativa Popular fosse implantado no Brasil foi necessária árdua luta da sociedade organizada, quando da criação da constituinte de 88.

O instituto foi conquista da participação popular, poder-se-ia dizer que foi preciso uma atuação popular para se conquistar o instrumento que assegura a participação popular. Por isso, não faz o menor sentido, depois de tamanha conquista, o povo não ter o direito de fazer uso de um instrumento que assegure sua participação ativa nas decisões do Estado.

Além disso, foi demonstrado que, desde antes de sua criação, a Iniciativa Popular sofreu resistência por partes dos detentores do poder político. Foi vista como um entrave por aqueles que entendiam que o máximo de participação que o povo deveria ter nas decisões políticas era sua representação por seus candidatos eleitos.

Maria V. Benevides, ao fazer uma análise sobre a cidadania ativa, externa bem o posicionamento dos políticos da constituinte de 1988, ao dizer que

Configuram a política do reformismo gato pardista que, no Brasil, distinguiu-se pela frase célebre de Antonio Carlos — “façamos a revolução antes que o povo a faça” — ou pelo desalento de Hipólito da Costa: “mudanças sim; mas como nos aborrecem serem feitas pelo povo!”. (1991, p. 03) (Grifou-Se)

Para não aprovarem o instituto da Iniciativa Popular, falou-se inclusive em enfraquecimento do sistema representativo se fosse permitido a propositura de projetos de leis pela população. Mas, devido a força e a grande mobilização havida na época, conseguiram que o instituto constasse na nova Constituição que ali nascia.

Mas, apesar da conquista, durante os 30 anos de vigência da nova Constituição, o que se viu foram alguns poucos projetos de lei alçados ao congresso como de Iniciativa Popular, tamanha dificuldade em implementar os requisitos exigidos para sua concretização.

Até 2016, entendia-se que havia quatro leis originárias da Iniciativa Popular, mas após o total desvirtuamento ocorrido com o projeto de lei (PL) 4.850/16, o instituto veio à discussão sob uma nova vertente, questionava-se o modo de tramitação do PL 4.850/16 na Câmara Federal, as diversas supressões, alterações e inclusões feitas em seu texto. Questionou-se, inclusive, se houvera, no Brasil, algum projeto de lei que pudesse ser definido como realmente de Iniciativa Popular.

Conforme a decisão monocrática do Ministro Luiz Fux no mandado de segurança 34.530, deve haver uma tramitação própria para projetos de leis sob o manto da Iniciativa Popular, que deverá observar os seguintes requisitos:

 

·         Deverão ser conferidas todas as assinaturas para validação dos requisitos formais do art. 61, § 2 da CF/88.

·         Nenhum deputado poderá “adotar” o projeto de lei como de sua autoria.

·         A sessão plenária deverá ser transformada em uma comissão geral, na qual será discutido o projeto de lei.

·         Deverá ter um orador para defender a aprovação do projeto de lei.

·         O projeto de lei deve ser debatido em sua essência, interditando-se emendas e substitutivos que desfigurem a proposta original.

·         As proposições de Iniciativa Popular não são arquivadas ao final da legislatura, como ocorrem nos projetos de leis comuns.

 

Chega-se à conclusão de que nenhuma das quatro leis aprovadas como sendo de Iniciativa Popular, assim devem ser consideradas. Pois, nenhuma delas observou os requisitos supramencionados. Tanto é assim, que o projeto de lei (10 medidas contra a corrupção) teve que ser devolvido à Câmara Federal para que recomeçasse do zero, conforme os requisitos acima.

Além dos motivos citados para a invalidação de toda tramitação do PL 4.850/16, o ministro asseverou que, ao não se observar uma tramitação própria, com limitações à atuação dos deputados ao propor emendas, alterações e exclusões de parte do texto de projeto de lei de Iniciativa Popular, feria-se vários princípios. Dentre eles, o do Devido Processo Legislativo, o da Soberania Popular e o princípio da Participação Direta.

Verifica-se, então, que pelo fato dos princípios do Estado Democrático Brasileiro estarem ligados uns aos outros, em maior ou menor grau, ao não dar um tratamento diferenciado a um projeto de lei de Iniciativa Popular, ferem-se inúmeros princípios fundamentais para a efetivação e fortalecimento do regime democrático e das instituições.

Pois, independentemente de haver lei expressa vedando a descaracterização de texto de Iniciativa Popular, ao desvirtuá-lo estar-se-á desmoralizando aqueles milhões de eleitores que o subscreveram. É como se dissessem “a constituição lhes assegurou o direito, mas ele não sairá do papel. ”

Com isso, cria-se uma descrença da população nas instituições do Estado, causando insegurança jurídica e enfraquecimento ao regime democrático. Já que não há que se falar em Democracia em um Estado que mitiga ou anula os instrumentos que permitem a participação do povo. Esse é o entendimento da Ministra Carmem Lucia, também do STF, ao dizer que

O Poder, no Brasil, continua sendo exercido por grupos menores, preocupados em não permitir que o povo, em seu conceito substancial, aceda à titularidade plena do seu direito à participação. Sem povo participe e ativo no exercício do Poder não há que se falar em Democracia, nem em soberania popular. A participação popular é princípio ativo da Democracia; seu imperativo fático; seu pressuposto constitucional. Democracia sem povo igualmente livre, educadamente crítico em sua liberdade e solidariamente atuante em sua condição política é falácia, simulacro demagógico de um ideal mais justo e mais humano. (1998, p. 03)

Ainda, segundo a ministra, a Democracia efetiva-se na concretização dos valores sociais e políticos, que jurisdicionalizados, se transformam em princípios jurídicos. A partir de sua sistematização no regime democrático, esses princípios passam a informar as instituições, que devem basilar suas atuações fundamentadas por eles. Assevera, ainda, a excelentíssima ministra, que, não é um texto constitucional pendurado em prateleiras de bibliotecas bem organizadas que concretizará a Democracia, e, sim, a participação popular que deu ensejo à criação do texto constitucional, porque o direito nasce dos fatos sociais e não o contrário. (CARMEM LÚCIA, 1998)

A respeito dos princípios informadores da atuação institucional dos poderes do Estado, a ministra Carmem Lúcia (1998, p. 04) assevera que “A indicação dos valores formatadores do sistema fundamental de um Estado põe em destaque o animus constituinte e os objetivos tidos como legítimos pela sociedade […]. ”

Isso significa que a Constituição Federal de 1988 elegeu valores sociais e políticos que serviriam de norte a sua concretização, dentre eles a soberania, dignidade da pessoa humana, a cidadania, a igualdade, o sufrágio universal e a participação popular.

Somente se respeitando e aplicando os princípios e preceitos constitucionais é que se terá uma Democracia efetiva. Pois, ao não se observar as normas princípios e o direito legítimo do povo à participação nas decisões políticas do Estado, não há que se falar em Estado Democrático, muito menos que ele é fundamentado pelo Estado de Direito, pois o que se terá é insegurança jurídica pela incerteza política, jurídica, social e econômica quanto ao cumprimento do pacto social entre Estado e povo. Pois, nos ensinamentos da ministra Carmem Lúcia,

A Constituição assegura os direitos do cidadão e faz da cidadania a manifestação mais nobre da Democracia. Pelo que, no processo eleitoral, é ele que tem o papel central de titular insubstituível do poder. Somente com a sua participação efetiva, sensível, engajada e responsável é que se tem a Democracia operante. Não se há frustrá-lo, seja como for. Qualquer tentativa ou consumação de tal aniquilamento importa em violação do princípio da cidadania e não pode ser considerado lícito, legítimo e fundado no sistema constitucional democrático. (1998, p. 08) (Grifou-Se)

Nota-se, que na análise em comento, a insegurança jurídica nas instituições responsáveis por preservar e manter os institutos da Democracia funcionando e sendo respeitados é causada pelos próprios membros do legislativo, que foram escolhidos, a princípio, para fazer valer os anseios da sociedade.

Fazendo uma analogia, é como se fosse uma pessoa que passa uma procuração à outra, outorgando-lhes poderes para agir em seu nome. Mas, que o procurador, após se instituir dos poderes concedidos em procuração e sentindo-se titular do direito, já não mais acolhe os desejos do outorgante. Pelo contrário, procura de todas as formas reduzir os instrumentos pelos quais o verdadeiro titular do direito poderia reavê-lo, e atuar em nome próprio. Nota-se uma má-fé, e pior, uma verdadeira usurpação de poder por parte daqueles que de início só deveriam atuar objetivando única e exclusivamente defender os interesses daqueles que lhes confiou o exercício do poder.

Por fim, o desrespeito os ditames constitucionais e aos instrumentos de efetivação da Cidadania Participativa gera descrença no regime atual de governo, oportunizando que ideologias extremistas tomem força, abrindo brechas para governos autoritários e radicais que crescem por meio de discursos de tomada de poder e fechamento das instituições representantes do Estado. Prometendo que após uma “renovação”, o povo terá vez e voz, e que uma nova Democracia será criada, o que é sabido não ser verdade. Basta verificar tantos casos semelhantes ocorridos mundo afora, nos quais governos ditatoriais tomaram o poder sob aplausos e apoio do povo, que acreditaram numa promessa de renovação das instituições do Estado.

 

Considerações finais

Um exame do instituto da Iniciativa Popular nos quase 30 anos de vigência da Constituição Federal Brasileira mostrou que o mesmo era assunto assentado, tanto na doutrina, quanto na jurisprudência, e que o máximo que se discutia era a dificuldade formal de sua implementação, devido aos exigentes requisitos para sua propositura. Mas, a partir da decisão do ministro Luiz Fux do STF, ao conceder uma liminar em mandado de segurança que objetivava suspender os efeitos de votação do plenário da Câmara Federal, a qual aprovara, com diversos substitutivos, projeto de lei de iniciativa popular, houve uma nova perspectiva sobre o instituto, suficientemente poderosa para provocar um novo olhar sobre o mesmo.

Pois, ao se fazer uma breve análise das leis criadas por meio da iniciativa popular, de acordo com os requisitos elencados pelo ministro em sua decisão, verificou-se que, formalmente, nenhuma dessas leis pode ser considerada como de iniciativa popular, posto que não houve uma tramitação diferenciada para as mesmas.

Além disso, ao se votar alguns desses, sempre que houve interesses diversos àqueles objetivados pela proposta de lei de iniciativa popular, aqueles interesses foram colocados em preponderância em relação a estes, permitindo modificações, inclusões e, até mesmo, exclusões de trechos do projeto inicial de autoria popular. Desvirtuando a proposta de lei trazida pelo povo. Pôde-se perceber que esse dervirtuamento ocorre porque os legisladores não se sentem vinculados ao teor do projeto de lei inicial, já que não há, segundo eles, no ordenamento jurídico brasileiro, norma expressa que vede tal prática.

Mas, apesar de tal alegação, foi possível demonstrar que os princípios constitucionais não são meros vetores interpretativos, que os mesmos possuem força vinculante suficiente para impor alguma vedação ou limitação na atuação dos congressistas brasileiros. Que, sendo assim, os princípios inerentes ao Estado Democrático Brasileiro são suficientes para vincular os legisladores à essência do que se objetiva com o projeto de lei de autoria popular. Não podendo estes, incluir, excluir ou apresentar outro tipo de modificação que desconfigure o PL original, que tire a sua substancialidade originária, como ocorreu com o projeto de lei das “10 medidas contra a corrupção”.

Nota-se, então, que o desvirtuamento de projetos de leis que inicialmente foram propostos como de autoria popular é causado pela afronta aos princípios fundamentais, inerentes ao regime político democrático, todos elencados na Constituição Federal Brasileira de 1988. Posto que os princípios têm força vinculante suficiente para limitar a atuação do legislador, quando da votação de projeto de lei proposto por meio de iniciativa popular.

Ademais, ao se examinar quais as possíveis consequências desse desvirtuamento, tem-se como resultado o descrédito do povo nas instituições, além de um sentimento de frustração diante do descaso como é tratado o instituto da Iniciativa Popular. Outra consequência do desprestígio dispensado ao instituto, é a insegurança jurídica e, consequentemente, o enfraquecimento do regime democrático brasileiro.

Além de, ao não dispensar um tratamento especial à iniciativa popular, frustra-se a participação direta nas decisões do Estado, perdendo-se a razão de ser do instituto, existindo, tão somente, uma simulação de participação dos cidadãos na elaboração de leis.

Assevera-se, com isso, que apesar de o mundo ter amadurecido em termos de Democracia, a brasileira ainda engatinha. Há muito o que ser feito, por isso se torna indispensável que, haja reflexões sobre o tema. Verifica-se uma necessidade de remodelação, de valorização da Iniciativa Popular. É preciso que haja mudanças significativas na sua tramitação. Mas, mais ainda, que haja um novo olhar sobre instituto de tal importância para a efetivação da Democracia brasileira.

 

DESVIACIÓN DE PROYECTOS DE LEY DE INICIATIVA POPULAR: CONSECUENCIAS PARA EL ESTADO DEMOCRÁTICO DE DERECHO

Resumen

La Iniciativa Popular, que permite a los ciudadanos participar de forma directa en las elecciones legislativas que regular la vida en sociedad, ha sido poco valorada en esos 30 años de régimen democrático. En las pocas veces que la sociedad organizada logró cumplir los requisitos formales exigidos para la proposición de proyecto de ley, no se dispensó al instituto trato diferenciado en su tramitación en el Congreso. Tampoco, se preocupó en resguardar la esencialidad del texto del anteproyecto de ley, ya que muchos de ellos fueron totalmente desconfigurados al permitir la inclusión, alteración y exclusión de parte de su texto. Es lo que se verificó del proyecto de ley denominado “las 10 medidas contra la corrupción”, que fue totalmente desvirtuado de su propósito original, que era la creación de instrumentos que permitiría un mayor combate a la corrupción institucionalizada en los diversos sectores de las instituciones públicas, principalmente en las instituciones del poder legislativo brasileño. Así, se hizo necesario el análisis del instituto de la Iniciativa Popular y de las consecuencias derivadas de la desnaturalización de proyectos de leyes alzados al legislativo por medio de ese instrumento. Para ello, con base en una investigación bibliográfica se analizó el tratamiento dispensado a la Iniciativa Popular en Brasil y en el mundo, las consecuencias derivadas de su desnaturalización por el Congreso Nacional Brasileño. Por último, fue posible concluir que la desnaturalización de proyectos de ley de Iniciativa Popular es responsable de afrontar principios constitucionales responsables de validar el Estado Democrático De Derecho, desacreditar a las instituciones del Estado y causar inseguridad y debilidad del régimen de gobierno y de sus instituciones.

Palabras clave: Desvirtuamiento. Iniciativa. Popular. Democrática. Derecho.

 

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[1] Bacharela em direito pelo Centro Universitário Luterano de Ji-Paraná – CEULJI. E-mail: jdepaulaarmando@hotmail.com
[2]Possui graduação em Pedagogia pela Universidade Federal de Rondônia (2003), especialização em Psicopedagogia e Linguística pelas Faculdades Integradas Mato-Grossense de Ciências Sociais e Humanas – Instituto Cuiabano de Educação (2004) e graduação em Direito pelo Centro Universitário Luterano de Ji-Paraná (2008). Professor-orientador no curso de Direito do Centro Universitário Luterano de Ji-Paraná – CEULJI. E-mail: johanesmoura.adv@gmail.com

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