Autor: Victor Willian Brito Silva – Acadêmico do Curso de Direito da Universidade Federal de Mato Grosso, Email: victorwill336@gmail.com;
Orientadora: Silvia Regina Siqueira Loureiro Oliveira: Doutorado em Direito “cum laude”, com menção “Doutora Internacional”, pela Universidade Pública de León – UNILEON (Espanha/2017). Professora e Orientadora da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Mato Grosso, Email: sirelou@gmail.com
Resumo: Este presente artigo percorrerá as peculiaridades do sistema punitivista vigente no direito penal brasileiro. Realizando comparações entre a realidade e a ficção, frente a inversão do processo-crime e suas semelhanças com distopias da literatura. O objetivo central é analisar as razões de se punir antes da materialização da culpa, tanto no aspecto jurídico como social. Ilustrando assim, a importância da desconstituição do direito penal autopoiético e a necessidade do diálogo entre as áreas do conhecimento. A realização desta abordagem tem objetivo de proporcionar uma crítica ao sistema criminal brasileiro, que opera uma transgressão as leis e seus princípios norteadores. Para tal, fora adequado utilizar a metodologia qualitativa e o método de pesquisa bibliográfica, permitido uma pesquisa mais aprofundada. Ademais, fora implementado o método dedutivo, utilizando-se de referências jurisprudenciais para observação das ideias, com a finalidade de proporcionar um estudo factual e específico acerca das questões pragmáticas na seara penal. Baseando-se na investigação de documentação indireta por meio de pesquisa bibliográfica com exame de fontes literárias, normativas e doutrinárias. Concluindo que a inversão da ordem processo-crime como meio de punição anteriormente ao trâmite processual, não é novidade na seara distópica da ficção.
Palavras-chave: Ficção; Inversão; Processo-Crime; Perpetuidade; Autopoiese.
Abstract: This article will cover the peculiarities of the punitive system in force in Brazilian criminal law. Making comparisons between reality and fiction, facing the inversion of the criminal process and its similarities with literature dystopias. The central objective is to analyze the reasons for punishing itself before the materialization of guilt, both in the legal and social aspects. Thus illustrating the importance of deconstructing autopoietic criminal law and the need for dialogue between areas of knowledge. The implementation of this approach aims to provide a critique of the Brazilian criminal system, which operates in violation of the laws and their guiding principles. To this end, it was appropriate to use the qualitative methodology and the bibliographic research method, allowing for a more in-depth research. In addition, the deductive method had been implemented, using jurisprudential references to observe ideas, in order to provide a factual and specific study about pragmatic issues in the criminal field. Based on the investigation of indirect documentation through bibliographic research with examination of literary, normative and doctrinal sources. Concluding that the inversion of the criminal process order as a means of punishment prior to the procedural procedure, is not new in the dystopian field of fiction.
Keywords: Fiction; Inversion; Criminal Proceedings; perpetuity; Autopoietic.
Sumário: Introdução, 1. A vida imita a arte no sistema punitivista contemporâneo. 1. 1 A inversão do sistema punitivista da ficção: Pena como mero procedimento. 1.2-A justiça contada pelos que detém a palavra: Transgressão ao princípio do contraditório. 2. O direito justificado em si mesmo. A necessidade da interdisciplinaridade para o respeito ao estado democrático de direito: Liberdade em um “sim” ou “não”. 3. A necessidade da interdisciplinaridade para o respeito ao estado democrático de direito. Conclusão. Referência.
Introdução
O presente artigo tem como finalidade debater a inversão do modelo legal punitivista vigente, que consiste na ordem Processo-Crime, tendo seu procedimento subvertido na medida em que se pune antes de haver o devido processo regular que caracteriza a existência do delito.
Para tal objetivo, o trabalho de forma análoga abordará sistemas punitivistas da ficção, os quais retratam a proximidade da realidade com a fantasia, haja vista que ambos obedecem a uma ordem inversa em que há: punição, julgamento e posteriormente a tipicidade do ato.
Analogamente ao debate teórico, necessário se faz a concretude do tema na sociedade. Assim sendo, será demonstrado como na atualidade se desconstitui o processo penal, ao fato que os intérpretes do sistema judicial, como sendo detentores da última palavra, costumam atribuir sentido diverso do que o texto da lei.
Tal subjetivismo provoca instabilidade e excessos marcantes, acarretando em injustiças e presunções de culpa formadas por estereótipo que demonstram um dos aspecto mais marcantes da punição do sistema atual, a sua ad perpetuam rei memoriam.
Destaca-se que o método de abordagem que servirá de base para análise das críticas, informações e resultados deste trabalho é o método dedutivo que parte de observações gerais para chegar a um objetivo de pesquisa específico. No presente caso, será destacado como a literatura e a realidade reflete a inversão no sistema sancionador brasileiro, acarretando em sentenças sem processo que se baseiam em conceitos abstratos de uma justiça subjetiva amparada por uma suposta busca pela verdade real.
Quanto ao método de procedimento, este será o monográfico, de forma que serão usados textos literários que demonstraram a multidisciplinaridade do tema, bem como doutrinadores para que haja fundamentos jurídicos na presente proposta. Outrossim, será realizada análise jurisprudencial que evidencia a plenitude da inobservância ao respeito constitucional, que de forma expressa proíbe a punição com caráter perpétuo. Contudo, necessário se fez destacar que a pena não se observa apenas em caráter judicial, mas em diversas vezes em seu aspecto social, ao modo que o sistema cria formas de punir, evidenciando assim, a sua intrínseca ligação com o poder vigente.
Sendo assim, a técnica de pesquisa consistirá na investigação de documentação indireta através de pesquisa bibliográfica com exame de fontes literárias, normativas, jurisprudenciais e doutrinárias, proporcionando o diálogo entre as áreas do saber, ilustrando a dimensão que abrange o presente tema na sociedade contemporânea.
É nessa conjuntura, que será realizada uma análise da continuidade do pensamento clássico do direito como sistema (autopoiese), consignatários da concepção da ciência jurídica que se justifica em si mesmo.
Por fim, seremos capazes de tentar realizar uma crítica ao modelo punitivista vigente, ao compreendermos como o direito penal e seus autores estão se utilizando da vontade do ser humano de punir como legitimidade para dar, às palavras, significados diversos do que elas falam.
1. A Vida Imita A Arte No Sistema Punitivista Contemporâneo.
1.1 A Inversão Do Sistema Punitivista Da Ficção. A Pena Como Mero Procedimento.
De acordo com Aristóteles (2009), “a arte imita a natureza”, sendo a arte um mecanismo para que possamos entender e atribuir sentido a situações que outros setores do conhecimento são insuficientes. Dessa forma, superando a concepção de que a arte é uma mera representação.
A contemporaneidade, contudo, trouxe consigo a inversão da concepção aristotélica, haja vista que a vida passou a refletir a arte. Tal fenômeno acarreta sentimentos diversos, ao fato que visualizar uma injustiça no mundo ficcional nos causam antipatia, raiva, sentimentos de inconformidade.
Como poderia alguém ser preso injustamente? Como poderia se acusar sem provas? Como os personagens que ali estão não percebem o óbvio? Será que não está claro que a mocinha não é a culpada de ter furtado as joias da vilã?!
Assim são as reações dos leitores de um dos livros de filosofia mais vistos no mundo, do escritor, não tão reconhecido pelo nome, Charles Lutwidge Dodgson, porém, muito conhecido pelo seu pseudônimo, Lewis Carroll, autor de “Alice no país das Maravilhas”. Obra que conta a experiência de uma pequena heroína enfrentando desafios de se ver em um mundo novo (2003).
A personagem inicia a trama ficcional como uma criança em sua rotina normal de reclamações e descobertas, aborrecendo-se com um livro que sua irmã lia, e que de nada lhe serviria, haja vista que não havia desenhos ou diálogos. Contudo, após avistar um coelho branco com olhos cor-de-rosa, Alice corre atrás do animal curioso, vindo a cair em um buraco e descobrindo um mundo caótico, sem sentido e desproporcional. Isto é, bem semelhante ao nosso, como verá ao decorrer do presente trabalho.
O mundo de Alice é sem racionalidade, onde as palavras têm diversos sentidos e nenhum aparenta falar aquilo que é óbvio (aquilo o que é óbvio para você, pode não ser para outrem). Assim, exemplificamos:
“O mundo imaginário de Alice é um espaço no qual reina certa falta de sentido. A corrida-caucus é disto um exemplo. Corria-se num círculo, ainda que a forma exata da pista não tivesse importância. Podia até não ser um círculo. Embora fosse um círculo. Não se falava um, dois, três e já; a corrida começava quando cada um dos corredores bem o desejasse e terminava quando qualquer um dos corredores também o quisesse. Por isso, não era fácil saber se a corrida havia se encerrado. E também não havia como se saber (com segurança) quem fora o vencedor da corrida. Assim, todos ganhavam; e todos recebiam prêmios. (GODOY, M. S. Arnaldo, 2019)”
Diante da complexidade de sua própria imaginação, a história ganha mais enredamento quando a Alice passa a conhecer os personagens que marcam aquele mundo, o chapeleiro, o coelho, a lebre, o rei, dentre outros. Contudo, necessário para o presente trabalho destacar uma personagem chave, a rainha vermelha, que inicialmente detém o poder da justiça em sua mão, ou melhor, em sua fala. Marcada pelos dizeres “Cortem-lhe a cabeça” (CARROL, 2003, p. 113), a majestade da realidade em análise, detém uma personalidade punitivista, sem preocupar-se com razões e motivos, a mesma sai distribuindo sentenças a quem lhe incomodar.
Em umas dessas condenações, Alice demonstrando mais uma de suas características, a curiosidade, ao ser informada sobre a execução da Duquesa, indaga uma pergunta simples, porém, com resultados inimagináveis, “Qual foi a pena?” (CORTELLA, 2019 Apud. CARROL, 2003, p.110). Um questionamento que tem como finalidade o conhecimento das razões da punição.
Entretanto, a resposta da rainha vermelha não fora a esperada, ao fato que a mesma disse: “Não sei, porque hoje é a execução, amanhã é o julgamento e depois de amanhã é o crime” (CORTELLA, 2019 apud. CARROLL, 2003, p. 110). E a reação de Alice, talvez seja como a de todos os presentes leitores, “Isso não faz sentido”. Contudo, lá faz! Lá onde? Em todos os lugares em que a punição é meio de controle pelos que detêm o poder. (BRÍGIDO, 2013, apud. FOUCAULT, 1997).
A situação exposta é uma clara inversão da ordem contemporânea natural da punição estatal, que é resumidamente explicada pelos 10 (dez) axiomas do garantismo penal, lecionadas pelo professor Luigi Ferrajoli, sendo dois desses postulados, a impossibilidade de pena sem crime e do crime sem lei (2002, p. 91).
O castigo (pena), de forma quase disseminada, se compreende como meio de restaurar o desequilíbrio causado por uma conduta transgressora de regras. Assim, o pressuposto que baseia todo o sistema restaurador da homeostase social está fundado na certeza da ação humana em punição.
Como castigar se o causador do resultado, merecedor de sanção, é desconhecido ou incerto? Aliás, como saber se a conduta ou resultado merecem a punição? A pena até mesmo em seu primórdio, utilizada como vingança coletiva, tinha como finalidade punir ao executor da conduta. (BECCARIA, 1764)
Tal subversão é tema não tão raro de ser invocado nas manifestações da arte. Principalmente aquelas que visam a representatividade de um modelo social falido, cuja segregação é regra e a punição é primeira e única resposta.
Essa é a realidade enfrentada na música “O homem na estrada” (RACIONAIS, 1993). A canção narra a trajetória de um ex-detento, que busca um recomeço em sua vida, dado que ao já ter praticado crimes que acarretaram na perda de sua liberdade, visa provar a si mesmo que pode alterar o rumo de sua trajetória.
Contudo, enfrenta adversidades no meio social que vive, haja vista que se depara inserido em uma sociedade caótica, sem regras, onde as mínimas condições de sobrevivência dignas parecem inexistir. Esse “é o palco da história” (1993) que o personagem conta seu trajeto.
A obra musical invocada contém diversos trechos que poderiam ser relatadas como demonstração da realidade distópica que o presente artigo se propõe a debater, haja vista que como é descrito na supracitada manifestação, tal meio é “Um pedaço do inferno” (1993). Entretanto, a subversão da pena é expressa de forma mais clara quando se relata a prática de um crime no espaço em que o personagem vive:
“Assaltos na redondeza levantaram suspeitas;
Logo acusaram a favela para variar
E o boato que corre é que esse homem
Está com o seu nome lá na lista dos suspeitos Pregada na parede do bar (RACIONAIS, 1993)”
O protagonista tem antecedentes na prática acima relatada, acarretando assim na suspeita da polícia contra o mesmo. Como destacado na música e que será melhor debatido por este trabalho, a pena detém em nosso sistema um caráter perpétuo, não sobre o corpo físico, mas na própria identidade. Nesse sentido, o personagem é acusado pelos seus antecedentes, haja vista que para o sistema será para sempre chamado de ex-presidiário.
Ulteriormente às suspeitas pelas autoridades contra o agente, seria esperado as ações inquisitoriais pela lei estabelecida (arts. 4 e 5º CPP). Mas como esperar que a lei penal seja cumprida em um local onde sequer aprendem a ler e escrever, onde os animais e homens são diferenciados apenas pela natureza de sua origem.
Uma punição sem provas, sem investigações, sem processo, sem garantias, sem ampla defesa e sem contraditório, essa é a pena executada. Como relatado no final da obra musical, as autoridades ao chegarem ao domicílio do personagem e “já deram a sentença e os mesmo a executaram (1993) “.
Como fora exposto, a arte invoca em seus enredos uma distopia em que a
culpa é presumida, o crime é atribuído sem critérios objetivos. É arbitrário mesmo! O acusador pretende cumprir sua imaginária função de sempre acusar sem provas, basta que o “réu” não lhe pareça inocente.
Mas, não deveria o órgão institucional acusador ser defensor da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis? (MAZZUOLI, 2019, p. 508). Não em uma sociedade em que o negacionismo epistêmico (STRECK, 2020) transcende a barreira pragmática, interpretando fatos e aplicações jurídicas claras.
Nessa realidade inicia-se a corrida com o título de culpado, cabe ao acusado conseguir provas para inocentar-se. Mas e quando não há tempo? Aí se cumpri a sentença, o mal irremediável, aquilo que marca a estranha passagem de todos no mundo distópico, porque tudo que é vivo nessa terra pode ser um possível novo criminoso. (SUASSUNA, 1995)
As presentes tramas podem ser ficcionais, mas suas ideias são bem próximas da realidade cotidiana do judiciário brasileiro. É uma infeliz prática costumeira do Órgão acusador no sistema penal, formar a materialidade do crime por meras subjetividades, nas quais, por diversas vezes, são justificadas por uma insuficiência física das entidades investigativas de produzir provas que deem concretude as palavras das vítimas.
Uma demonstração de que nosso sistema inquisitorial ainda falha em sua investigação probatória (materiais, testemunhais e documentais), se destaca na fraqueza em admitir o desconhecido, o erro, ou o equívoco. Assim é relatado por Paulo Rangel (2013) no famoso caso ocorrido no brasil colonial, sobre o abuso das autoridades policiais relatado no livro “Fera de Macabu” de Carlos Marchi (1999), no qual narra a morte de um inocente que fora motivada pela perseguição de um policial e um juiz.
“Quer-se dizer: as autoridades policiais, no Brasil, já possuíram funções judicantes de formação de culpa e, neste caso, os abusos foram imensos. Para tanto, confira-se o caso famoso ocorrido no Império da chamada “FERA DE MACABU” onde um fazendeiro, Manuel da Mota Coqueiro, foi investigado, acusado, processado e condenado à forca pela prática da chacina de uma família de oito pessoas. Depois do seu enforcamento, descobriu-se que ele era inocente. O delegado que investigou o fato e o juiz que presidiu o processo fizeram de tudo para condenar Coqueiro à morte. Foi o último homem branco, se não o único, a ser condenado à morte no Brasil. Tudo por interesses políticos e financeiros e por vinganç a. (MARCHI apud RANGEL, 2013, p.71).(Grifo nosso)”
Um erro que custou a vida; detentores do poder que realizam uma verdadeira perseguição; um homem que não teve tempo, iniciou e finalizou esse jogo de cartas marcas com o indesejado título de culpado. Essa é uma demonstração que a realidade e a ficção andam muito próximos, quase se confundem em tempos em que a verdade parece apenas sair da boca daqueles que falam por último.
1.2 A Justiça Contada Pelos Que Detém A Palavra, A Transgressão Ao Princípio Do Contraditório
A supressão ao direito de defesa é um tema constantemente tratado na ficção, por meio de histórias contadas na perspectiva do narrador, quase sempre se tem a visão unívoca dos fatos, acarretando a um julgamento baseado apenas na acusação.
A ausência do espaço a palavra ao acusado proporciona um interessante fenômeno, as mais absurdas teorias e acusações ganham razão, onde os sentidos das palavras são dados pelo que único as dizem. Uma transgressão ao devido processo legal, que nas palavras do atual ministro do supremo “Tem como corolários a ampla defesa e o contraditório, que deverão ser assegurados aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral”. (MORAIS, 2003, p.96).
Um processo que visualiza o réu apenas como ser imputável de acusações retorna ao estado do direito antigo denominado de cognitio, “antigo processo penal romano, processo sem ação e sem defesa, que visualizava o réu como simples objeto da investigação” (KRUEGER, 2020, p. 85)
Tal sistema caracterizava-se pela ausência de forma legal, ao modo que não
havia precisão nem para a abertura nem para o encerramento do processo. O magistrado podia abandoná-lo ou retomá-lo a qualquer tempo (KRUEGER, 2020, apud. MOMSEN, 1907).
Uma acusação que não necessita de fundamento, apenas tendo como requisito ser originada pelos que detém a voz da palavra interpretando os fatos, e o aparente privilegio de dizer sua versão da forma que bem lhe agrade. Assim é o enredo contado pelo genial escritor brasileiro Machado de Assis, na obra Dom Casmurro (1994).
Obra que conta um obsessivo ciúme do personagem Bentinho a sua esposa Capitú. O narrador é o próprio Bentinho, já transformado pelo tempo, na figura de Dom Casmurro, período temporal que o fez um homem amargo, triste e abatido.
Bentinho deixou a vida massacrada pela incógnita que cercou sua estranha passagem na terra, perseguido pela ilusão da possível traição da esposa. Cuja descoberta, imaginária talvez, lhe tirou a vontade de viver. É um drama de realismo ferino. (GODOY, 2018)
Nessa obra o narrador conta a sua forma os fatos, subverte a verdade a seu modo de ver a vida. Um conto essencial e que demonstra a identidade cultura desse povo. A narrativa centraliza a realidade de Bentinho, ao fato que Capitu não tem espaço para sua defesa no livro.
Uma acusada que nunca teve a chance de partilhar da sua palavra própria. Dom Casmurro poderia ser destacado como uma demonstração da criminologia machista, que apresenta uma tentativa de redução da mulher a inferioridade biológica e intelectual. (GODOY, 2018) Mas, não será esse o presente enfoque, ao modo que se está a pretender demontrar como se forma a culpa, mesmo sem as palavras do suposto acusado. Um retrocesso aos inquéritos na Europa medieval quando se construía verdade com uma razão a si mesma.
Ora, como poderia haver justiça sem contraditório? Ainda que culpada pela
voz do povo, o processo seria nulo, como prevê o Código de Processo penal (1941)
“Art. 564”. A nulidade ocorrerá nos seguintes casos: (…) III – por falta das fórmulas ou dos termos seguintes:
(…) e) a citação do réu para ver-se processar, o seu interrogatório, quando presente, e os prazos concedidos à acusação e à defesa”.
Analogamente a isso, diante da omissão ao direito a defesa, se destaca a ausência de caráter jurisdicional. Assim, explicamos:
“É bem de ver que processo assim estruturado, sem direito de defesa, não tem caráter jurisdicional. Trata-se, aí, de repressão administrativa de crimes e delinquentes, que se apresenta como necessidade, em determinados momentos da vida dos povos. A jurisdição supõe a afirmação do indivíduo como titular de direitos. No campo do processo civil, sempre se observou o princípio do contraditório, porquanto foi relativamente fácil conceberem-se os dois litigantes, autor e réu, como igualmente sujeitos de direitos de caráter privado. No processo penal isso custou a acontecer, porque foi necessário que se concebesse, antes, a ideia de direitos subjetivos públicos, direitos em face do Estado. (KRUEGER, 2020, P. 86)”
Outrossim, a Constituição Federal é clara ao consagrar o princípio do contraditório no art. 5º, LV: “Aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes. (1998)
Dessa forma, tal nulidade é insanável, haja vista que o ofendido é ao mesmo tempo juiz, narrador, promotor, ator e revisor. Bentinho faz tudo, acusa com a ferocidade de quem não tem adversário; faz gols contra um time sem goleiro. A Materialidade da culpa em Capitu se baseia em uma simples premissa: Capitu traiu, porque Capitu poderia ter traído, é a mais indigna prova, ter como certo o que poderia ter ocorrido. (GODOY, 2018)
Contudo, é claro que todos se questionam! Se fosse uma denúncia realizada na realidade, passaria pelo crivo das jurisprudências atuais? A resposta parece óbvia de início, punir por uma materialidade tão subjetiva, parcial e recheado de sentimentos controversos, é um verdadeiro absurdo.
Mas a história demonstra que o óbvio pode não ser condizente com a realidade. Decisões do judiciário que se baseia em abstratividades e “achismos” são marcas de vários erros dos tribunais nacionais. Assim é uma das maiores injustiça do judiciário brasileiro, o famoso processo dos irmãos Naves Rosa:
“(…) Sebastião e Joaquim Naves Rosa acusados de homicídios na cidade de Araguaia, em Minas Gerais. Houve confissão arrancada com violência e tortura. O júri absolveu os réus duas vezes. Da segunda vez, ja no Estado Novo, com a soberania do júri suprimida, o Tribunal de Justiça reformou a decisão dos jurados para condenar os irmãos à pena de 26 anos e 6 meses de reclusão, pena que veio depois a ser reduzida para 16 anos, pela “morte” de Benedito Pareira Caetano. A “vítima”, quinze anos depois, reapareceu na cidade de Araguaia. O juiz que pronunciou os réus, num crime de morte sem cadáver. (SILVA,2009, p .72)”
A vida e a arte se misturam, acusações em que os réus não são escutados, condenações sem provas e provas obtidas com violência. Parece que existe muito mais proximidade entre as barbaridades, seja da ficção ou realidade, que possamos imaginar.
Tais casos chocam, causam aos leitores angústia, ao fato que, seja na vida real ou na ficçã,o o ser humano identifica injustiças. O medo é um sentimento comum a todos, a possibilidade de perda da liberdade está em total conflito com a própria razão que cerca o contrato social, haja vista que “Ninguém fez gratuitamente o sacrifício de uma porção de sua liberdade visando unicamente ao bem público. Tais quimeras só se encontram nos romances”. (BECCARIA, 1764, p. 9)
Essa necessidade da vivência vem da própria garantia da liberdade, mesmo que seja em seu mínimo suficiente. Assim leciona Cesare Beccaria:
“Cansados de só viver no meio de temores e de encontrar inimigos por toda parte, fatigados de uma liberdade que a incerteza de conservá-la tornava inútil, sacrificaram uma parte dela para gozar do resto com mais segurança. A soma de todas essas porções de liberdade, sacrificadas assim ao bem geral, formou a soberania da nação; e aquele que foi encarregado pelas leis do depósito das liberdades e dos cuidados da administração foi proclamado o soberano do povo (BECCARIA, 1764, p.10).”
Analogamente a isso, qualquer sistema que não alicerce sobre os sentimentos indestrutíveis do coração do homem tende ao fracasso, pois sempre encontrará resistência (BECCARIA, 1764, p. 13). Isto posto, debatido sobre ameaça à liberdade sem razões, cabe dissertarmos quanto as especificidades da ciência juridíca criminal que viabiliza essas contradições.
2. O Direito Justificado Em Si Mesmo. A Necessidade Da Interdisciplinaridade Para O Respeito Ao Estado Democrático De Direito. A Liberdade Em Um “Sim” Ou “Não”
Diante do que fora posto pelos tópicos anteriores, nos quais se elencou diversas situações em que se assemelhavam a ficção e a realidade nos aspectos de punição ao homem, destacando como se pune antes de se formar a materialidade do crime, conclui-se que o sistema penal nesses exemplos são utilizados com finalidade em si mesmo, punir pelo simples fato de poder punir.
Nesse sentido, um sistema penal que se auto justifica é semelhante ao modelo social e jurídico sistêmico, no qual uma determinada área do saber só pode ser compreendido e justificado em si mesmo. Assim é explicado (PEREIRA, 2011, 87 apud. LOSANO, 2010).
“Deveras, o sistema intrínseco, segundo Losano, é o ponto de partida do estudioso do direito, situando-se na estrutura ínsita do objeto a ser estudado. Sua lógica decorre do próprio sistema enquanto objeto. (. )
sistema é um sistema interno ao objeto estudado, isto é, a lógica está ínsita no próprio Direito, à espera da revelação.”
Analogamente a isso, o que se entende é uma ciência que busca a legitimação de suas ações independentemente das consequências no plano fático. Nessa concepção, é impossível compreender o direito fora de sua própria ciência. Contudo, a teoria do direito como autopoiese passou por reformas diante do seu declínio social, ao fato passou a não acompanhar a complexidade das relações contemporâneas.
Surge assim, Luhman, defendendo que a sociedade é composta por vários sistemas sociais comunicativos, sendo que a comunicação na teoria luhmanniana é o operador central dos sistemas sociais, de modo que a não comunicação entre eles é impossível. (PEREIRA, 2011, p.89, Apud. Luhman, 2005). Sendo o direito parte dos sistemas sociais.
Luhman defende a necessidade da comunicação entre as esferas e conjuntos. Sendo ilógico um sistema totalmente fechado, haja vista que como defende (BERTALANFFY, 1977, p. 262), a ciência social trata com seres humanos no universo da cultura criado por eles, sendo que o homem tem valores que são mais do que biológicos e transcendem a esfera do mundo físico.
Nesse sentido, um sistema social que não leve em consideração a complexidade do meio em que se encontra, não cumpri com sua finalidade, é ilegítimo e ineficaz. A subjetividade das ações do homem não permite a existência de um conjunto impermeável pelo meio, o diálogo com outras manifestações do conhecimento assim se torna essencial.
3. A Necessidade Da Interdisciplinaridade Para O Respeito Ao Estado Democrático De Direito
Pelo que fora posto, é de uma clareza solar que a contemporaneidade trouxe consigo uma complexidade interacional entre os grupos sociais que não mais permite explicações a todo e qualquer assunto que se baseie em si mesmo.
Fundamento possiveis para esses se encontram na clássica doutrina positivista, que dissemina a validade de uma norma jurídica independentemente de sua legitimidade, enquanto norma justa, assim explica Kelsen (2003, p. 68),
“Um direito positivo não vale pelo fato de ser justo, isto é, pelo fato de a sua prescrição corresponder à norma da justiça – e vale mesmo que seja injusto. A sua validade é independente da validade de uma norma de justiça. É esta a concepção do positivismo jurídico, e tal é a consequência de uma teoria jurídica positivista ou realista, enquanto contraposta à doutrina idealista.”
Tal concepção não mais condiz com as necessidades sociais, principalmente com a estreita ligação histórica entre o direito em sua face positivista e a força como único garantidor da aplicabilidade das leis, mesmo as mais arbitrárias. Sendo assim, é clara a exigência de decisões que dialoguem com o meio em que se encontra regulando.
Não se pode haver uma fixação absoluta nas formalidades legais, tendo em vista que as leis são palavras e mesmo que digam por si próprio seus significados, quando utilizadas para fundamentar sentenças que proporcione injustiças, não há de prevalecer.
Tais leis positivadas, seja em qual grau de hierarquia que se encontre no sistema escalonado do direito, devem respeito aos fundamentos originadores do dispositivo normativo.
É o caso do princípio internacional pro homine, que segundo o Internacionalista Valério Mazzuoli, engloba dois valores jurídicos: a dignidade da pessoa humana e a prevalência dos direitos humanos. Tal princípio tem abrangência tanto na esfera internacional como interna, e se baseia em um diálogo das fontes, ao fato que sua premissa é clara, se deve aplicar as normas justa ao caso sub judice, ou seja, aquela que mais garante os direitos humanos. Tendo em vista que “o princípio internacional pro homine tem autorização constitucional para ser aplicado entre nós como resultado do diálogo entre fontes internacionais (tratados de direitos humanos) e de direito interno” (MAZZUOLI, In: MARINONI, 2013, p.31)
Nesse sentido, necessário destacar que na seara do direito penal, deter premissas absolutas na própria fonte formal e principal do direito (a lei) é um risco, haja vista que tais dispositivos dependem de uma legitimidade social que transcende o próprio direito. Tal legitimidade é movida por paixões, assim explica:
“Quando as paixões são vivamente abaladas pelos objetos presentes, os mais sábios discursos, a eloqüência mais arrebatadora, as verdades mais sublimes, não passam, para elas, de um freio impotente que logo despedaçam (BECCARIA, 1764, P. 10)”.
Analogamente a tal instabilidade, verifica as limitações de se fundar a essência da razão de punir e de como punir apenas na lei, ao fato que a norma carece de preenchimento, o que justifica a existência dos atores do direito. A figura do juiz por exemplo. Entretanto:
“Cada homem tem sua maneira própria de ver; e o mesmo homem, em diferentes épocas, vê diversamente os mesmos objetos. O espírito de uma lei seria, pois, o resultado da boa ou má lógica de um juiz, de uma digestão fácil ou penosa, da fraqueza do acusado, da violência das paixões do magistrado, de suas relações com o ofendido, enfim, de todas as pequenas causas que mudam as aparências e desnaturam os objetos no espírito inconstante do homem (BECCARIA, 1764, P. 11).”
A mesma conduta, o mesmo agente, nos mesmos meio, dois juízes diferentes uma mesma razão de punir, a lei. Poderia se compreender que a mesma sentença seria dada, contudo, não é o que acontece.
Decisões diferentes fundadas no mesmo texto legal. Sentenças são datas de formas aleatórias, prisões são decretadas sem a materialidade do crime formada, audiências de custódias em que se pune antes mesmo do fim das investigações policiais em prol de uma celeridade processual e ordem pública fundada na própria lei.
Ora, questiona-se, um procedimento em que retira a liberdade de um indivíduo antes da materialidade da culpa (transito em julgado), do fim da instrução ou até mesmo do final das investigações policiais não é um atentado a mínima liberdade que fora pelos indivíduos protegidas? Proteção essa que nos custou grande parte da própria liberdade, para Beccaria, tal procedimento é injusto: (1769, p. 10:11)
“Só a necessidade constrange os homens a ceder uma parte de sua liberdade; daí resulta que cada um só consente em pôr no depósito comum a menor porção possível dela, isto é, precisamente o que era preciso para empenhar os outros em mantê-lo na posse do resto.
O conjunto de todas essas pequenas porções de liberdade é o fundamento do direito de punir. Todo exercício do poder que se afastar dessa base é abuso e não justiça; é um poder de fato e não de direito (8); é uma usurpação e não mais um poder legítimo.(p. 10) (…)
As penas que ultrapassam a necessidade de conservar o depósito da salvação pública são injustas por sua natureza; (p.11)”
Nesse sentido, toda e qualquer ação que decrete sem razão (não apenas legal) a punição, é por natureza injusta. Indaga-se: um juiz ao presidir uma audiência de custódia tentando converter o flagrante em prisão preventiva (punindo antes do recebimento do processo) por meio de incidir a conduta do custodiado em alguma das condições dos artigos 314 e 315 do CPP (1941), não é a mesma façanha de uma criança em um jogo lúdico na qual a mesma tenta inserir uma figura geométrica no seu espaço correspondente, como um quebra cabeça.
Ora, definir a liberdade de um homem por meio de um sistema binário de incidência aos requisitos dos artigos dos supracitados, é uma transgressão ao Estado democrático de direito, sendo que ninguém pode perder a liberdade por um detalhe de um “sim” ou um “não”, dado às escuras, sem o dever de dizer o porquê (STRECK,2020).
Tais porquês são ditos por palavras! Essas, que dependem dos contextos interacionais em que são atribuídos. As decisões devem levar tudo em conta, necessário diálogo com o meio e as manifestações do saber. Um homem não pode ser julgado por um amontoado de palavras que ao formar esse jogo tedioso do processo penal, lhes falte o lugar e local da emoção (ROSA, 2016).
Enquanto, não se visualizar a liberdade como um bem intrínseco ao homem e que não pode ser retirado, sequer restringido, sem uma razão fundada na justiça, na certeza das provas, ao respeito para com as peculiaridades dos meios culturais. Teremos o processo penal como um jogo, em que a regra é clara: a sorte da fixação da competência do juiz impera. Isso é democrático? Absolutamente não! (ROSA, 2016).
Conclusão
Por tudo que fora posto, a arte e a realidade demonstram diversos aspectos que se assemelham no que tange a aplicabilidade da justiça, ou a falta dela. Verifica-se que o tema das transgressões ao Estado democrático de direito é comum, há uma clara preocupação dos grandes escritores no Brasil e no mundo, como fora visto, de relatar e formular contos em que o caos e a subversão à ordem processo-crime no sistema de punição, impera.
Foram analisadas, diversas obras que revelavam a fragilidade da proteção ao bem natural humano que alicerça a sociedade, a liberdade. Fragilidade essa que está a todo o momento em prova, lembrança de um passado ficcional ou histórico nos fazem refletir que há poucas décadas atrás os métodos de punição mais bárbaros eram costumeiramente praticados de forma legitimada pelos que detinham o Jus puniendi. Uma demonstração do abuso do poder de guarda do armazenamento das liberdades por todos dos indivíduos.
Nesse contexto, fora por esse trabalho destacado a proximidade existente entre as transgressões mais visíveis e injustas aos direitos amplamente universais (vida, liberdade, voz, devido processo legal) e a contemporaneidade. Engana-se quem acha que as injustiças demonstradas nos contos distópicos da literatura não se subsume a realidade do processo penal atual. Ora, talvez não seja tão visível, haja vista que nos acostumamos a ser, viver e sentir aquilo e nos dizem que devemos. Mas a injustiça está presente mesmo que seja legitimada por outras fontes normativas não tão claras.
Vimos que formas ilegais de punição impera, até mesmo pelo poder instituído, cujo a regra de conduta é clara, faça o que falo e não o que com faço, esse deveria ser o lema de alguns atuais detentores da punição.
É de uma clareza solar, por tudo que fora posto, que a prática de punir de forma antecipada, sem os trâmites processuais corretos é comum no atual modelo punitivista. A celeridade na justiça se sobrepõe aos outros valores igualmente importantes, ou até mais (a liberdade), vindo a incorrer em mitos reformistas como a relatada por “quanto mais depressa, melhor”.
Nessa conjuntura correlacionada fora a falta de razões de punir, com os “achismos” de alguns autores do direito, que compreendem a ciência jurídica como produto pronto e acabado, que basta a mera subsunção como requisito para punir. Ora, a subsunção é um reducionismo a justiça que deveria ser tratado como uma ofensiva aos manejadores do conhecimento.
Diante, da inexistência de uma ciência jurídica como sistema fechado é que não se pode aceitar decisões que privam a liberdade de forma antecipada sem a materialidade da culpa, definidos por meio de razões que não dialogam com o meio e suas consequências fáticas. Como converter o flagrante em prisão preventiva de um morador de rua, dependente químico, acusado de furto de alimentos em uma rede de supermercado, por ter o custodiado acusações por outras práticas de furto, cujo a res furtiva detém a mesma natureza, direcionando-o a uma Penitenciária que, como quase todas no Brasil, estão superlotadas?
É irracional, sequer podemos chamar de uma solução paliativa, deveria, sim, ser batizado como o nome popular atribuído ao furto de energia elétrica, é apenas um “gato”. Uma forma momentânea de aplicar uma justiça que se racionaliza em si mesmo, essa não é uma justiça eficaz!
Necessário que as decisões de natureza sancionadoras da liberdade tenham materialidade legitime pelas necessidades e limitações do meio, as razões da punição devem sair do papel, não há que se falar em justiça que não se fundamente sobre sentimentos indeléveis do coração do homem.
Por fim, para que se haja uma possivel solução as indagações que foram postas no início do presente artigo, questionamos: como poderia na justiça da ficção acontecer as mais óbvias transgressões aos direitos? Como poderia se acusar sem provas ou colocar a culpa na mocinha por furtar a vilã? Responde-se, da mesma forma que foi possível o direito permitir que milhares de pessoas fossem mortas e torturadas pela sua crença (holocausto), cor (escravidão), opção sexual (Orlando 2016), gênero (Incêndio na fábrica Triangle Shirtwaist)! Pela Indiferença.
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