Resumo: Aborda-se no presente estudo a temática referente a idade limite de 21 anos para o pensionamento de filhos previsto na Lei 8.112/90, com a exposição de entendimento legal e jurisprudencial acerca da inconstitucionalidade desse dispositivo legal.
Palavras-chave: Idade. Pensionamento. Filho. Servidor Público, Lei 8.112/90. Inconstitucionalidade.
Abstract: Addresses in the present study, the thematic age limit of 21 years for pensionamento children under Law 8.112/90, with exposure of understanding about the legal and jurisprudential this legal provision unconstitutional
Keywords: Age. Pensionamento. Son. Civil Servants, Law 8.112/90. Unconstitutional.
Atualmente, a Lei nº 8.112/90[i], considera a idade de 21 anos como limite à qualidade de beneficiário da pensão temporária (art. 217, inciso II, alíneas a e b).
Muito embora desde os 18 anos o indivíduo esteja apto a exercer os atos da vida civil, para fins previdenciários a relação de dependência merece tratamento diferenciado em relação ao filho e à pessoa a ele equiparada, universitário ou que estiver cursando a escola técnica de 2º grau até 24 anos.
Nesse sentido, o jovem no período dos 18 aos 24 anos, deve dar prioridade à sua formação intelectual para poder melhor enfrentar o mercado de trabalho. Se por infelicidade, nesta fase da vida, vier a perder a pessoa responsável pela sua manutenção, certamente terá que abandonar os estudos e procurar meios para o próprio sustento.
Por sua vez, a Constituição Federal em seu art. 201, inciso V[ii], ao estabelecer que a pensão por morte será paga aos dependentes do segurado falecido evidencia o nítido caráter alimentar do benefício, haja vista que ao determinar que este será pago àqueles que dependiam economicamente do segurado morto está a estabelecer que sua finalidade é suprir a contribuição econômica que o finado prestava à família, possibilitando que esta, em razão da contribuição econômica recebida da previdência social, permaneça estruturada.
Assim, a Lei nº 8.112/90[iii] ao fixar o rol de dependentes para tal efeito deverá obrigatoriamente observar o parâmetro traçado pela Carta Magna, contemplando todos aqueles que sejam substancialmente dependentes do segurado falecido, sendo que as disposições legais que fixam como termo final do benefício de pensão por morte o alcance da idade de 21 (vinte um) anos, independentemente da aferição de outros fatores relevantes que possam evidenciar a continuidade do estado de dependência, padecem de flagrante inconstitucionalidade, uma vez que desvirtuam a natureza e finalidade do instituto constitucional, violando o disposto no art. 201, V, da Constituição Federal[iv].
Não bastasse a ofensa ao comando do art. 201, inciso V, da Constituição Federal[v], vemos que a aplicação literal de tais dispositivos legais, como ventilado, viola materialmente ainda o disposto no art. 205, da Constituição Federal[vi], que prevê que a educação é direito de todos e deverá ser promovida e incentivada pelo Estado, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, uma vez que ao excluir o maior de 21 (vinte e um) e menor de 24 (vinte e quatro) anos de idade, que se encontre cursando universidade, do rol de dependentes a receber a pensão por morte, o Estado estaria a promover justamente o oposto do determinado pelo comando Constitucional, inibindo, dificultando e mesmo impedindo o pleno desenvolvimento da pessoa e sua qualificação para o trabalho através da educação, quando, a teor do que disciplina a Carta Magna, deveria promover e incentivar a formação educacional dos cidadãos.
Por estes motivos, é que nossos Tribunais vêm abandonando a letra fria do disposto no art. 217, inciso II, alíneas a e b da Lei 8.112/90[vii], e proferindo decisões assentando que os filhos ou enteados, bem como o menor sob guarda ou tutela, até 24 (vinte e quatro) anos, não perdem a condição de dependente, e assim, o direito à percepção do benefício de pensão por morte, desde que se encontre cursando universidade, tudo conforme se vê dos seguintes arestos adiante reproduzidos:
“ADMINISTRATIVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL. PENSÃO POR MORTE. MENOR. ESTUDANTE UNIVERSITÁRIO. EXTENSÃO ATÉ 24 (VINTE E QUATRO) ANOS. POSSIBILIDADE.
Hipótese onde se busca provimento judicial que garanta ao agravante, filho de servidor público federal, ora falecido, do qual era dependente, a manutenção de benefício até os 24 (vinte e quatro) anos;
Sendo o agravante estudante universitário e presumindo-se que até a conclusão de sua formação profissional encontrar-se-ia sob a dependência do de cujus, é de garantir-lhe a percepção do benefício até a idade de 24 (vinte e quatro) anos; Agravo de instrumento provido.”[viii]
“I – Filho de segurado da previdência social faz jus à pensão por morte até os vinte e quatro anos de idade, desde que comprovado o seu ingresso em universidade à época em que completou a maioridade e a dependência econômica, a fim de assegurar a verdadeira finalidade alimentar do benefício, a qual engloba a garantia à educação.
II – Devido à natureza alimentar, não há argumento que justifique conferir à pensão por morte uma aplicação diversa da que é atribuída aos alimentos advindos da relação de parentesco, regulada pelo Direito Civil, sendo certo que nesta seara vigora o entendimento segundo o qual o alimentando faz jus a permanecer nesta condição até os 24 (vinte e quatro) anos de idade se estiver cursando faculdade.
III – É preciso considerar o caráter assecuratório do beneficio, para o qual o segurado contribuiu durante toda a sua vida com vistas a garantir, no caso de seu falecimento, o sustento e o pleno desenvolvimento profissional de seus descendentes que, se vivo fosse, manteria com o resultado de seu trabalho, por meio do salário ou da correspondente pensão.”[ix]
“PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. PENSÃO POR MORTE. DEPENDENTE MAIOR DE 21 ANOS. ESTUDANTE UNIVERSITÁRIO. PRORROGAÇÃO DO BENEFÍCIO ATÉ OS 24 ANOS DE IDADE. 1. É cabível a prorrogação do benefício previdenciário de pensão por morte até que o dependente complete 24 anos de idade, na hipótese de ser estudante de curso universitário. Precedente. 2. Estando regularmente instruído o agravo de instrumento, é possível o seu julgamento imediato, restando prejudicado o agravo regimental. 3. Agravo de instrumento improvido”[x]“PENSÃO POR MORTE – FILHO MAIOR DE 21 ANOS – UNIVERSITÁRIO. O § 4º do artigo 16 da Lei n. 8.213/91 versa sobre uma presunção relativa, estabelecendo, assim, a dependência econômica como requisito para que alguém receba um beneficio da Previdência Social na qualidade de dependente, ou seja, o fator preponderante não é a idade ou o grau de parentesco e sim a dependência econômica, razão pela qual a apreciação deste fato é imprescindível para a adequada interpretação do aludido dispositivo legal. No direito de família a jurisprudência é pacifica no sentido de que a pensão alimentícia é devida ao alimentando universitário até que ele complete 24 anos de idade ou conclua seu curso superior, não se justificando, assim, que o filho universitário de um segurado do INSS seja considerado dependente no âmbito cível e até tributário (depende do imposto de renda), mas não seja considerado dependente para fins previdenciários.[xi]
No mesmo sentido foi o posicionamento do Egrégio Superior Tribunal de Justiça ao decidir que a letra fria da lei dever ser mitigada, de forma a se evitar injustiças, uma vez que a relação de dependência entre o falecido segurado e seu filho, em tese, perduraria até a conclusão da graduação deste, senão vejamos:
“RESPONSABILIDADE CIVIL. PENSÃO MENSAL. LIMITE DO PENSIONAMENTO. ABATIMENTO DE VALORES PAGOS A TÍTULO DE SEGURO DE VIDA. – Termo final do pensionamento devido às filhas menores da vítima. Fixação em 24 anos, considerado que, nessa idade, as beneficiárias já terão concluído a sua formação, inclusive em nível universitário. – Abatimento dos valores pagos a título de seguro de vida: dissenso interpretativo não suscetível de configuração. Recurso especial conhecido, em parte, e provido.”[xii]
Por outro lado, há um evidente tratamento distinto e desigual entre os filhos de servidores civis e militares, eis que a Lei n° 3.765/60[xiii], que disciplina as pensões militares, estabelece em seu art. 7°, inciso I, alínea d:
"Art. 7º A pensão militar é deferida em processo de habilitação, tomando-se por base a declaração de beneficiários preenchida em vida pelo contribuinte, na ordem de prioridade e condições a seguir:
I – primeira ordem de prioridade:..
d) filhos ou enteados até vinte e um anos de idade ou até vinte e quatro anos de idade, se estudantes universitários ou, se inválidos, enquanto durar a invalidez; e"
Desta forma, o legislador passou a voltar sua atenção para os dependentes dos militares na condição de filhos em curso de estudos universitários, permitindo o prolongamento da pensão temporária até 24 anos. A pergunta que surge é a seguinte: tal disposição é aplicável também aos dependentes dos servidores civis? A primeira resposta que se antevê é negativa, principalmente se considerado que os servidores civis são regidos por estatuto próprio.
Contudo, tal solução não é aceitável, pois não se pode deixar de considerar que o princípio da legalidade, inscrito no art. 37, caput, da Constituição Federal[xiv], não mais se circunscreve à cega obediência à letra da lei.
E, na espécie, há dois valores constitucionais que impõem a extensão aos filhos dos servidores civis do disposto no art. 7°, I, alínea d, da Lei n° 3.765/60[xv]. O primeiro deles é o direito à educação, consagrado no art. 205 da Constituição Federal[xvi], como dever do Estado e da família, o qual impõe que a pensão temporária se prolongue até 24 anos, época provável da conclusão de curso superior ao filho universitário.
Já em segundo lugar, há o primado da isonomia, previsto no art. 5, inciso I, da Constituição Federal[xvii], para o qual deve ser afastado do sistema jurídico, por ser irrazoável e desproporcional, a previsão de referido benefício unicamente para os filhos dos servidores militares.
Assim, não há como se negar que os filhos dos servidores civis também tem o direito a perceber a pensão decorrente do falecimento de seu genitor, servidor público, até os 24 anos de idade, se estudantes universitários, podendo o magistrado na apreciação do caso concreto fazer uso das denominadas sentenças aditivas, oriundas das cortes constitucionais européias, como por exemplo a Corte Constitucional Italiana (sentenze aggiuntive ou additive), utilizadas quando uma disposição porta uma norma de menor abrangência daquela que, constitucionalmente, deveria possuir, de modo que a declaração de inconstitucionalidade tem o efeito de inserir no texto normativo aquilo que lhe falta, sanando-lhe a omissão parcial.
Informações Sobre o Autor
Claudio Ribeiro Santana
Procurador de Assistência Judiciária do Distrito Federal em atuação no Núcleo de Atendimento Inicial – CEAJUR, do Fórum de Sobradinho-DF