Resumo: Com base nas normas de direito eleitoral brasileiro, analisa-se o direito das emissoras de rádio e televisão à compensação fiscal equivalente ao valor comercial integral do espaço cedido para a veiculação da propaganda partidária e eleitoral gratuita.
Palavras-chave: Propaganda partidária e eleitoral gratuita. Emissoras de rádio e televisão. Direito à compensação fiscal.
É fato conhecido que, no Brasil, os partidos políticos têm direito ao acesso gratuito a horários no rádio e na televisão para a divulgação de suas propostas políticas.
Todos que vivem no Brasil sabem dessa realidade, dado que as denominadas ‘propaganda partidária gratuita’ e ‘propaganda eleitoral gratuita’ são regularmente veiculadas através das emissoras de rádio e televisão.
Esse direito dos partidos políticos de divulgar gratuitamente suas propostas através do rádio e da televisão é estabelecido pela própria Constituição da República, que, no parágrafo terceiro do seu artigo 17, dispõe que:
“Art. 17. (…)
§ 3º – Os partidos políticos têm direito a recursos do fundo partidário e acesso gratuito ao rádio e à televisão, na forma da lei”.
Dessa forma, os partidos políticos podem expor suas idéias e propostas através do rádio e da televisão, sem que tenham que efetuar qualquer tipo de pagamento pelo tempo de exposição cedido pelas emissoras.
As emissoras são obrigadas pela lei a ceder o espaço de sua programação em prol do horário partidário e eleitoral.
Neste ponto, contudo, impõe-se uma indagação: se os partidos políticos não precisam pagar pelo tempo cedido pelas emissoras para a propaganda partidária e eleitoral, quem então deve arcar com os custos da veiculação dessas propagandas? As próprias emissoras? Ou o governo?
Ocorre que existe um preço pelo tempo de exposição utilizado pelos partidos políticos, dado que esse tempo seria normalmente utilizado pelas emissoras em programação destinada à publicidade comercial.
Como os partidos políticos não precisam pagar pela utilização desse tempo, então ou as emissoras assumem esse ônus, ou o governo o faz.
Dentre essas duas opções, entende-se que, em princípio, seria coerente imaginar que o ônus deveria recair sobre as próprias emissoras, uma vez que o direito de transmissão de sons e imagens através de radiodifusão tem caráter de serviço público, explorado pela União diretamente ou mediante concessão (conforme artigo 21, parágrafo XII, da Constituição da República), e, portanto, o poder público, quando promove a licitação para a concessão de linhas de radiodifusão, poderia fazê-lo impondo como condição que os licitantes aceitassem transmitir gratuitamente a propaganda partidária e eleitoral.
Assim, as emissoras concessionárias de serviços de radiodifusão, no momento da aquisição da concessão, já estariam comprometidas com o ônus da transmissão da propaganda partidária e eleitoral, na forma que a lei eleitoral determinar.
Não haveria, então, que se falar em direito à remuneração pelo espaço cedido pelas emissoras para a propaganda partidária e eleitoral.
Não obstante esse entendimento, cumpre observar que foi outra a resposta encontrada pelo legislador pátrio para a indagação acima formulada, tendo ele optado por repassar à União os ônus da propaganda partidária e eleitoral.
De fato, nota-se que a União, ainda que não efetue um ‘pagamento’ direto às emissoras pelo espaço destinado à propaganda partidária e eleitoral, promove, na forma da Lei nº 9.096/1995, uma ‘compensação fiscal’ pelo tempo despendido com a propaganda gratuita.
A esse respeito, verifica-se que a Lei nº 9.096/1995, após reafirmar o direito constitucional dos partidos políticos à propaganda partidária e eleitoral gratuita, estabelece que:
“Art. 52. (vetado)
Parágrafo único. As emissoras de rádio e televisão terão direito a compensação fiscal pela cedência do horário gratuito previsto nesta Lei”.
Essa mesma disposição, em idêntica redação, foi posteriormente reiterada pelo artigo 99 da Lei nº 9.504/1997 (Lei Eleitoral).
Com base nessas leis, portanto, conclui-se que as emissoras passam a ter direito à compensação fiscal no valor equivalente ao tempo de exposição cedido para a propaganda partidária e eleitoral gratuita.
Não obstante essa solução legal, certa controvérsia persiste em razão da regulamentação das Leis nºs 9.096/1995 e 9.504/1997 pelos Decretos nºs 3.786/2001 e 5.331/2005, uma vez que estes estipularam que a compensação fiscal referida seria feita na apuração do Imposto sobre a Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ), e, além disso, que as emissoras poderiam “(…) excluir do lucro líquido, para efeito de determinação do lucro real, valor correspondente a oito décimos do resultado da multiplicação do preço do espaço comercializável pelo tempo que seria efetivamente utilizado pela emissora em programação destinada à publicidade comercial, no período de duração da propaganda eleitoral ou partidária gratuita” (artigo 1º do Decreto nº 3.786/2001 e artigo 1º do Decreto 5.331/2005, ambos com redação idêntica na parte ora transcrita).
Ou seja, na forma da regulamentação acima referida (Decretos nºs 3.786/2001 e 5.331/2005), a compensação fiscal foi limitada a apenas uma parcela do valor do espaço ocupado pela propaganda partidária e eleitoral gratuita, não contemplando a integralidade do valor de comercialização do tempo cedido pelas emissoras.
Assim, entende-se que é possível questionar a legalidade e validade dessa regulamentação, uma vez que a compensação fiscal, apesar de prevista em lei, acabou por ter seu efeito minimizado pelos decretos regulamentares.
Cabe assim questionar se poderia um decreto restringir ou limitar a aplicação de um direito reconhecido em lei? Ora, a resposta é, evidentemente, não. O decreto, como é cediço, tendo apenas a função de regulamentar a disposição legal, não pode contrariá-la ou limitar arbitrariamente os seus efeitos, sob pena de ilegalidade.
Logo, se as Leis nºs 9.096/1995 e 9.504/1997 estabeleceram o direito das emissoras à compensação fiscal pela cessão do espaço destinado à propaganda partidária e eleitoral gratuita, e se, em tais previsões legais, não constou nenhuma restrição ou limite ao exercício desse direito, entende-se que a compensação deve ser feita em relação à integralidade do espaço cedido, sendo ilegal a limitação infralegal posteriormente estabelecida pelos Decretos nºs 3.786/2001 e 5.331/2005[1] (1).
Bacharel em direito. Especialista em Direito Empresarial pela Universidade Estadual de Londrina.
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