Direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente saudável e equilibrado

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Resumo: Em função da complexidade das relações internacionais e da necessidade de conservação do meio ambiente o homem estabelece uma série de direitos considerados fundamentais para o convívio entre os povos. Esses direitos que se encontram formalizados por meio de tratados e convenções internacionais tomam a forma de uma verdadeira Constituição Planetária. Tal Constituição tem como escopo salvaguardar os direitos mínimos dos cidadãos e o respeito ao meio ambiente para que se torne possível a preservação do planeta. Em função disso, constata-se cada vez mais que o direito ao meio ambiente saudável se concretiza internacionalmente como um direito fundamental, razão pela qual tal direito já se encontra preservado dentro da Constituição de diversos países, inclusive o Brasil.


Palavras-chaves: Meio Ambiente – Constiuição Planetária – Direitos Fundamentais – Princípios Fundamentais – Desenvolvimento Sustentável


Abstract: Depending on the complexity of international relations and the need of environmental conservation man establishes a series of rights considered fundamental for coexistence among peoples. These rights are formalized through international treaties and Conventions take the form of a true Planetary Constitution. This Constitution is scoped to safeguard the basic rights of citizens and respect for the environment to make it possible to preserve the planet. As a result it appears increasingly that the right to health environment is realized internationally as a fundamental right, why such a right is already preserved in the Constitution of several Countries, including Brazil.


Keywords: Environment – Planetary Constitution – Fundamental Rights –Fundamental Principles – Sustainable Development


Sumário: 1. Introdução; 2. A constituição planetária; 3. Os princípios constitucionais e o meio ambiente; 4. O princípio do desenvolvimento sustentável; 5. O princípio do desenvolvimento sustentável como direito fundamental; 6. O princípio do direito ao desenvolvimento sustentável frente ao antropocentrismo e ao ecocêntrismo; 7. A importância dos tratados internacionais e sua influência nas constituições de vários países; 8.o direito fundamental ambiental na cr/88; 9. O efetivação do meio ambiente sustentável; 10. O princípio do desenvolvimento sustentável em conflito com outros direitos fundamentais; 11. Conclusão.


1.INTRODUÇÃO


No início do século XX criou-se a necessidade de uma consciência universal, voltada para o futuro. Para que isso se concretizasse era necessário uma “conversa” com as gerações futuras, tendo em vista o encolhimento entre os tempos. Essa prática criou um sentimento de cooperação e co-responsabilidade entre os povos, marcando o início de uma Constituição Universal.


Essa cooperação entre os povos pode ser sentida nos inúmeros tratados e acordos internacionais assinados por diversos países. A lógica inerente a essa construção jurídica está baseada no fato de que diversos problemas, dentre os quais destacamos os ambientais, não conhecem limites territoriais. Um claro exemplo é a chuva ácida que decorre de uma zona urbana industrializada e que atinge propriedades de pequenos agricultores do Estado vizinho. Fatores como o exemplo citado demonstram que as legislações nacionais não bastam para salvaguardar direitos fundamentais como o de viver em um ambiente saudável. Somente por meio de uma legislação internacional que obrigue tanto os países quanto as empresas e os indivíduos pode resultar em um modo eficaz de construção efetiva de um meio ambiente saudável para a humanidade. Daí a construção por meio desses tratados de uma Constituição da Humanidade.


José Adércio Leite Sampaio corrobora a ideia de uma Constituição da Humanidade, veja-se:


“A existência de um “Direito Constitucional da Humanidade” ou da “Amizade entre os Povos” se contém tanto na cultura condominial da Constituição, quanto nos textos que expressamente enaltecem os valores da paz, da cooperação entre os povos e dos direitos humanos”. (SAMPAIO; WOLD; NARDY, 2003, p. 39).


Esse Direito Constitucional funciona como uma ponte entre passado, presente e futuro, em que os indivíduos do passado e do presente devem conservar o planeta, por meio de ações que viabilizem a aplicação dos direitos fundamentais, para que os indivíduos do futuro possam ter uma vida digna. É sobre essa nova consciência que deverá ocorrer uma profunda reflexão sobre a relação entre o homem e o meio-ambiente.


2.A CONSTITUIÇÃO PLANETÁRIA


Tudo que vem ocorrendo no mundo, toda essa corrida pelo desenvolvimento em detrimento dos recursos naturais, influencia e afeta no gozo da vida, da saúde e da propriedade, direitos fundamentais já consagrados no cenário internacional.


A Constituição Planetária é a Constituição da co-responsabilidade dos povos, em que todos são responsáveis pelas ações e bem estar de todos, pautados pela conservação e consumo sustentável dos recursos naturais. SAMPAIO (2003, p. 42) diz em sua obra que “o Direito Constitucional da Humanidade é, por conseguinte, também a Constituição do Meio Ambiente e o Direito Constitucional Ambiental seu grande e talvez principal alicerce”.


Quase todos os problemas ambientais estão relacionados ao uso e apropriação de bens e produtos pela sociedade moderna de forma imoderada e irresponsável.


Lembrando, também, conforme afirma Édis Milaré (2007), que em uma sociedade capitalista, voltada para a aquisição de bens, há uma estreita relação entre consumo, sustentabilidade e direito a um meio ambiente ecologicamente equilibrado.


José Adércio Leite Sampaio, mais uma vez, discorre acerca da introdução do direito a um meio ambiente ecologicamente equilibrado nas Constituições:


“Não será por excesso constituinte que os novos textos constitucionais, originários ou reformados, se tingiram de verde e passaram a incorporar, tanto os princípios de direito ambiental, quanto deram corpo a um direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. Algumas até elevaram o meio ambiente a “valor fundamental da ordem econômica” (SAMPAIO; WOLD; NARDY, 2003, p. 42).


Só a título de exemplificação, conforme lembra MILARÉ (2007), a proteção do meio ambiente, na Constituição da República de 1988, faz parte dos princípios da ordem econômica, funcionando como limite à livre iniciativa. No art. 170 da Constituição de 1988, o constituinte dá como pressuposto de defesa do meio ambiente a dignidade da pessoa humana.


3.OS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS E O MEIO AMBIENTE


Os princípios são enunciados deônticos que concretizam valores em um ordenamento jurídico e/ou orientam operações estruturais sistêmicas, que podem vir expressos ou implícitos. Os princípios são dinâmicos, tendo em vista a especialização funcional e a abertura do sistema. Isso faz com que estes princípios se adaptem às necessidades, anseios e perspectivas do contexto atual. 


Dentro do contexto principiológico há uma hierarquia entre os mesmos, em que os princípios mais concretos e específicos estão contidos dentro dos princípios mais gerais, que são os caracterizadores e definidores das ideias básicas da Constituição. SAMPAIO caracteriza de forma pontual os princípios de Direito Ambiental:


“Os princípios de Direito Ambiental têm a ossatura dos demais princípios, como eles, gozam das peculiaridades de sua dinâmica e de relativa abertura semântica. E, quando alçados ao patamar constitucional, ganham maior vitalidade de fonte (fonte de primeiro grau) e configuram a “Constituição da Cooperação e da Amizade”, a “Constituição do Ambiente”. (SAMPAIO;WOLD; NARDY, 2003, p. 47).


4.O PRINCÍPIO DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL


Há um princípio que pauta todas as lições e aplicações de Direito Ambiental, o princípio do desenvolvimento sustentável, que significa um desenvolvimento econômico e social pautado na conservação do meio ambiente para as presentes e futuras gerações, de tal forma que estas possam usufruir de um meio ambiente sadio.


Nos anos 80, o mundo se deparou com uma crise ambiental extremamente agravada e globalizada, em que o desenvolvimento econômico passava por cima de todos os valores e princípios ambientais. Surge, então, a necessidade e a meta de um ecodesenvolvimento, o referido desenvolvimento sustentável, em que se deve conciliar desenvolvimento econômico e preservação do meio ambiente.


O surgimento dessa consciência se deu, primeiramente, nos países industrializados, que produziam grandes quantidades de poluentes do solo, do ar e da água, não só em seus territórios, mas também nos países limítrofes com estes, caracterizando, conforme a expressão de Maria Rodrigues Bertoldi (2007, p. 3), “a contaminação além fronteiras”.


O problema da degradação desenfreada do meio ambiente passou a figurar como tema central em muitos encontros entre as maiores cúpulas do planeta, como ocorreu em 1992, na Conferência da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento[1], realizada no Rio de Janeiro, em que ficou bem especificado e definido, nos princípios 1 e 4, respectivamente, a imensa preocupação com o desenvolvimento sustentável do planeta Terra:


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“Os seres humanos estão nos centros das preocupações com o desenvolvimento sustentável. Têm direito a uma vida saudável e produtiva, em harmonia com a natureza.


Para alcançar o desenvolvimento sustentável, a proteção ambiental deve constituir parte integrante do processo de desenvolvimento, e não pode ser considerada isoladamente deste.” (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 1992, p.1).[2]


Sendo assim, o princípio do direito a um meio ambiente ecologicamente equilibrado é desdobramento do primaprincipium do desenvolvimento sustentável.


5.O PRINCÍPIO DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL COMO DIREITO FUNDAMENTAL


Agora, o debate seria se este direito a um meio ambiente ecologicamente equilibrado seria um direito fundamental e se as suas características o definiriam como um direito que possa ser enquadrado no rol dos direitos salvaguardadores das garantias coletivas da sociedade.


Os direitos fundamentais surgiram com o escopo de conter a arbitrariedade do Poder Público, além de garantir o exercício da cidadania pelo povo diante do Estado, evitando-se, assim, o abuso deste frente àquele.


Os direitos fundamentais, conforme a ideia de SAMPAIO (2003), são mandamentos e vinculações referentes às aspirações e interesses humanos que se apresentam ora como normas subjetivas, ora como enunciados de tarefas estatais que visam a garantir o bem estar da sociedade. Essa dimensão objetiva visa a garantir uma aspiração coletiva, criando um dever coletivo de garantir e preservar a indisponibilidade desses direitos.


Com o intuito de ordenar e sistematizar a ideia de direitos fundamentais, a Doutrina elaborou, segundo critérios de evolução histórica, uma classificação a que se faz referência: direitos de primeira geração (direitos civis e políticos), que compreendem as liberdades individuais e coletivas; os direitos de segunda geração (direitos econômicos, sociais e culturais) que reforçam o direito de igualdade e; finalmente, os direitos de terceira geração (direitos de solidariedade), em que o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado é a maior expressão atual, materializando os direitos de titularidade coletiva que participam no processo de desenvolvimento e reconhecimento dos direitos humanos. Segundo Celso D. Albuquerque Mello (2004), os direitos humanos de 3ª geração começaram a tomar forma na década de 90 com a característica ímpar de serem direitos “individuais e coletivos”.


Segundo Maria Rodrigues Bertoldi (2007), a doutrina majoritária entende como direitos de terceira geração o direito ao desenvolvimento, o direito ao patrimônio comum da humanidade, o direito à paz e ao meio ambiente, os quais estão orientados pelos princípios da indivisibilidade, interdependência e da solidariedade.


Os direitos humanos não são concebidos arbitrariamente e aleatoriamente. Tampouco são enunciados estáticos e inalienáveis, tendo em vista que eles procuram proteger os anseios e as necessidades prementes da sociedade, sendo considerados direitos supranacionais.


Quanto mais um direito tende a promover a dignidade humana, mais essencial e fundamental ele é. A fundamentalidade dos direitos do homem parte do epicentro, que é a dignidade humana. Essa dignidade tem a ver com o ser pessoal do homem, é a base de qualquer direito.


A relação entre os direitos humanos e os direitos do ambiente pode ser feita pela necessidade da preservação do meio ambiente para a concretização dos direitos fundamentais à vida e à saúde. Então, considerando-se o direito à vida como o mais importante de todos os direitos, tendo em vista que sem vida não há relação e interações interpessoais, pode-se constatar que esse direito fundamental tem como pré-requisito o direito a um meio ambiente ecologicamente equilibrado. BERTOLDI (2007) diz que o direito humano e o direito a um meio ambiente equilibrado tem, no mínimo, uma íntima relação, já que a violação de um, implica na invasão do outro, causando um duplo desequilíbrio, ambiental e humano.


O direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado tem como tarefa tutelar o princípio da dignidade da pessoa humana e é uma consequência da co-responsabilidadeintergeracional.


Porém, SAMPAIO (2003) adverte que essa adoção da dignidade da pessoa humana como substrato dos direitos fundamentais é perigosa, tendo em vista que isso importa na absolutização da dignidade humana e na combatida visão antropocêntrica do mundo. No entanto, essa é uma visão consensual no mundo ocidental na busca pela fundamentação de um direito.


6.O PRINCÍPIO DO DIREITO AO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL FRENTE AO ANTROPOCENTRISMO E AO ECOCÊNTRISMO


Consequência disso, é a dificuldade em reconhecer um direito humano a um meio ambiente ecologicamente equilibrado, tendo em vista essa visão antropocêntrica do mundo, voltando os direitos humanos diretamente para o homem.


Qual visão, juridicamente, deve prevalecer no mundo diante do antagonismo entre a satisfação de desejos infinitos com recursos finitos e o desenvolvimento sustentável? A visão antropocêntrica ou a visão ecocêntrica?


Paulo Affonso Leme Machado (2009) é da opinião que assegura que o caput do art. 225 da Constituição Federal é antropocêntrico, tendo em vista que este é um direito da pessoa humana na medida em que tal direito assegura o bem estar e a qualidade de vida homem, cerne dos direitos fundamentais e que a destruição da natureza compromete a própria existência do ser humano na Terra. Já nos parágrafos e incisos do mesmo art. 225, há a compatibilização entre antropocentrismo e ecocentrismo, equilibrando a vida humana com os demais seres e ecossistemas que nos cercam.


O mesmo MACHADO (2009, p.59) diz que “o Direito contemporâneo sente a necessidade de estabelecer normas que assegurem o equilíbrio ecológico.”


Procurando caracterizar o direito a um meio ambiente ecologicamente equilibrado, MILARÉ o fez da seguinte maneira:


“Trata-se, realmente, de valor que, como os da pessoa humana e da democracia, universalizou-se como expressão da própria experiência social e com tamanha força, que já atua como se fosse inato, estável e definitivo, não sujeito à erosão do tempo”. (MILARÉ, 2007, p. 761).


O objeto deste direito fundamental é um meio ambiente sadio, favorável à boa qualidade de vida. O equilíbrio ecológico é apenas uma das condições para que o meio ambiente se torne sadio.


Novamente, Paulo Affonso Leme Machado (2009) assevera que o Direito Ambiental tem como escopo a identificação do motivo que leva as comunidades naturais a um maior ou menor desequilíbrio, formulando, ainda, as medidas para que o equilíbrio seja restaurado, continuando:


“A especial característica do princípio é a de que o desequilíbrio ecológico não é indiferente ao Direito, pois o Direito Ambiental realiza-se somente em uma sociedade equilibrada ecologicamente. Cada ser humano só fruirá plenamente de um estado de bem-estar e de equidade se lhe for assegurado o direito fundamental de viver num meio ambiente ecologicamente equilibrado.” (MACHADO, 2009, p.59).


7.A IMPORTÂNCIA DOS TRATADOS INTERNACIONAIS E SUA INFLUÊNCIA NAS CONSTITUIÇÕES DE VÁRIOS PAÍSES


Em 1972, a Organização das Nações Unidas se reuniu em Estocolmo para a realização da Conferência de Estocolmo, em que se fixaram as bases fundamentais do Direito Ambiental. Nesta conferência, instituiu-se os princípios que hoje balizam todo o ambientalismo das Constituições atuais.


Nesta Declaração de Estocolmo, há, pela primeira vez na história, a menção, em seu Princípio 1, de maneira expressa, ao princípio do direito fundamental a um meio ambiente ecologicamente equilibrado, o que significou grande evolução em matéria ambiental, in verbis:


“O homem tem o direito fundamental à liberdade, à igualdade e a desfrutar de condições de vida adequadas em um meio ambiente de qualidade tal que lhe permita ter uma vida digna e gozar de bem estar, e tem a solene obrigação de proteger e melhorar o meio para as presentes e futuras gerações (…)”. (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 1992, p. 2)


Daí seguiram vários tratados que reconheceram, de forma expressa, o direito fundamental a um meio ambiente ecologicamente equilibrado, como, por exemplo, a Declaração Universal dos Povos de Argel de 1976, a Carta Africana dos Direitos dos Homens e dos Povos de 1981, o Protocolo Adicional de 1988 à Conferência Americana de Direitos Humanos e, por fim, a Declaração de Viscaia, celebrada em Bilbao, sobre a vigilância da UNESCO e da ONU, proclamando em seu art. 13, o reconhecimento do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado como um legítimo direito humano, tendo em vista o seu alcance universal.[3]


Diversas constituições já absorveram, ainda que não reconheçam o direito a um meio ambiente ecologicamente equilibrado como direito fundamental, tais como a Constituição Italiana de 1948, a Constituição de Angola de 2010, a Constituição de Kosovo de 2008, a Constituição da França (que apesar de ser de 1958 foi alterada em 2004), a Constituição Espanhola de 1978 e o Tratado que estabelece uma Constituição para a Europa de 2004.


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Dessas constituições destacam-se a curiosa presença da Constituição Francesa, por se tratar de uma constituição antiga mas que exigiu sua adequação em razão da importância que o meio ambiente exige nos dias de hoje, e do Tratado que pretendeu estabelecer uma constituição supranacional europeia.


Em 2005 foi promulgada a Carta do Meio Ambiente na França. Em seu preâmbulo já se deixou claro que a Carta estava sendo incorporada de forma expressa à Constituição Francesa de 1958. A Carta não se furtou em indicar o Meio Ambiente como direito fundamental no mesmo patamar que os demais já defendidos pela Nação.


Já o Tratado que buscou, sem sucesso, estabelecer uma constituição supranacional na Comunidade Europeia também indicou de forma expressa sua preocupação com o meio ambiente. A norma foi inserida inclusive na Parte II do Tratado cujo título “Carta dos Direitos Fundamentais da União” deixa evidente o interesse em colocar o direito ao meio ambiente saudável como um direito fundamental de todo cidadão da comunidade europeia. Em seu artigo I – 3º, intitulado “Objetivos da União” se destaca no item 3:


“3. A União empenha-se no desenvolvimento sustentável da Europa, assente num crescimento econômico equilibrado e na estabilidade dos preços, numa economia social de mercado altamente competitiva que tenha como meta o pleno emprego e o progresso social, e num elevado nível de proteção e de melhoramento da qualidade do ambiente. A União fomenta o progresso científico e tecnológico.” (Tratado que estabelece uma Constituição para a Europa)


Exemplos como esses demonstram que apesar do surgimento tardio nas Constituições da preocupação com o meio ambiente saudável sendo um direito fundamental ser recente, tal aspecto começou a surgir nas últimas décadas principalmente do esforço internacional na busca de que esse direito seja reconhecido como um direito fundamental que deve ser assegurado a todo cidadão.


8.O DIREITO FUNDAMENTAL AMBIENTAL NA CR/88


José Adércio Leite Sampaio discorre sobre este direito fundamental ambiental em nossa Constituição da seguinte maneira:


“No caso brasileiro, a seguir o modelo formal, poderíamos nos ater à literalidade do Título II (“Dos Direitos e Garantias Fundamentais”) ou bem isoladamente (hipótese em que o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado não seria fundamental) ou bem vinculada a elementos de concretização das enunciações desse Título. Por exemplo, o direito a um ambiente ecologicamente equilibrado como desenvolvimento necessário do direito à vida, à saúde e mesmo à intimidade. Ou ainda um direito decorrente do regime e dos princípios constitucionalmente adotados ou dos tratados internacionais em que o Brasil seja parte (art. 5º., §2º.).” (SAMPAIO; WOLD; NARDY, 2007, p. 95).


A norma do meio ambiente ecologicamente equilibrado, como direito fundamental, é de aplicação imediata, porém, depende de alguns mecanismos para a sua eficácia.


A Constituição da República de 1988 que, no Brasil, elevou o direito a um meio ambiente ecologicamente equilibrado ao nível de direito fundamental, incumbe a tarefa de proteção do meio ambiente ao Poder Público e a toda coletivamente (caráter objetivo), dizendo que é bem de uso comum do povo. Para a efetivação desse direito fundamental, é mister a sua designação como patrimônio de uso comum da humanidade, tendo em vista que o Direito Ambiental trata-se de fenômeno transfronteiriço, em que toda a humanidade é detentora do direito a desfrutar de um meio ambiente ecologicamente equilibrado e é responsável pela manutenção deste no estado que permita o desenvolvimento de uma sadia qualidade de vida (caráter subjetivo)[4].


Antônio Herman de Benjamin e Vasconcellos (2010) considera o caput do art. 225 da Constituição Federal o núcleo da proteção ambiental, sendo, também, ao mesmo tempo, apenas o ponto de partida e chegada da tutela do meio ambiente. Já José Afonso da Silva ressalta que o capítulo do meio ambiente é “um dos mais importantes e avançados da Constituição de 1988”. Colocando a Constituição da República de 1988 com destaque frente à forma como um tema tão relevante é tratado em Constituições recentes como a da Bulgária (art. 31), a da ex-URSS (art.18), a de Portugal (art. 16) e a da Espanha (art. 45). Em razão de todo esse quadro, Kildare Gonçalves Carvalho tenta explica-lo dizendo que trata não somente do direito à vida, mas sim de forma mais ampla, ou seja, ao direito à sadia qualidade de vida em todas as suas formas.


9.A EFETIVAÇÃO DO MEIO AMBIENTE SUSTENTÁVEL


Para a implementação e efetivação do direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado é necessário o maior e irrestrito acesso à informação e aos processos decisórios, visando a democratização do, segundo palavras de BENJAMIN (2010, p.13), “dueprocess ambiental” ou devido processo ambiental. O Direito Ambiental, assim como, também, a sua norma fundamental, só tem efetivação plena em um regime democrático, com amplo acesso dos cidadãos interessados à informação. Tal direito pode vir a assumir, porém, uma feição retórica, caso não haja a verdadeira efetivação do mesmo pelo Poder Público e pela coletividade.


Alexandre de Moraes (2007) diz que para a efetivação do princípio fundamental contido no caput do art. 225 da Constituição da República de 1988, este deve ser interpretado em consonância com outros dispositivos da mesma Carta. Confira-se:


“Dentro desse contexto, o art. 225 deve ser interpretado em consonância com o art. 1º., III, que consagra como fundamento da República o princípio da dignidade da pessoa humana; o art. 3º., II, que prevê como objetivo fundamental da República o desenvolvimento nacional; e o art. 4º., IX, que estipula que o Brasil deve reger-se em suas relações internacionais pelos princípios da cooperação entre os povos para o progresso da humanidade, de maneira a permitir maior efetividade na proteção  do meio ambiente.” (MORAES, 2007, p. 816).


Para proteção do meio ambiente e efetivação do direito fundamental contido no caput do art. 225, a Constituição estabelece, difusamente, regras diversas relacionadas à proteção do meio ambiente, tais como os arts. 170, VI; 173, §5º.; 174, §3º.; 186, II; 200, VIII; 216, V; 231, §1º.; além das regras específicas contidas nos parágrafos e incisos do próprio art. 225. Tais regras dão efetividade ao direito fundamental a um meio ambiente ecologicamente equilibrado, constituindo sua proteção, conforme reconheceu o Supremo Tribunal Federal (STF), prerrogativa jurídica de titularidade coletiva, reconhecido, no processo de desenvolvimento dos direitos humanos, como poder atribuído não a um indivíduo considerado em sua singularidade, mas a toda uma coletividade social titular de direitos fundamentais individuais e coletivos. Veja ementa que enunciou o v. Acórdão, tratando da amplitude coletiva da proteção do meio ambiente:


“EMENTA: REFORMA AGRARIA – IMÓVEL RURAL SITUADO NO PANTANAL MATO-GROSSENSE – DESAPROPRIAÇÃO-SANÇÃO (CF, ART. 184) – POSSIBILIDADE – FALTA DE NOTIFICAÇÃO PESSOAL E PREVIA DO PROPRIETARIO RURAL QUANTO A REALIZAÇÃO DA VISTORIA (LEI N. 8.629/93, ART. 2., PAR. 2.) – OFENSA AO POSTULADO DO DUE PROCESS OF LAW (CF, ART. 5., LIV) – NULIDADE RADICAL DA DECLARAÇÃO EXPROPRIATORIA – MANDADO DE SEGURANÇA DEFERIDO. PANTANAL MATO-GROSSENSE (CF, ART. 225, PAR. 4. ) – POSSIBILIDADE JURÍDICA DE EXPROPRIAÇÃO DE IMÓVEIS RURAIS NELE SITUADOS, PARA FINS DE REFORMA AGRARIA.


A NORMA INSCRITA NO ART. 225, PARAGRAFO 4., DA CONSTITUIÇÃO NÃO ATUA, EM TESE, COMO IMPEDIMENTO JURÍDICO A EFETIVAÇÃO, PELA UNIÃO FEDERAL, DE ATIVIDADE EXPROPRIATORIA DESTINADA A PROMOVER E A EXECUTAR PROJETOS DE REFORMA AGRARIA NAS AREAS REFERIDAS NESSE PRECEITO CONSTITUCIONAL, NOTADAMENTE NOS IMÓVEIS RURAIS SITUADOS NO PANTANAL MATO-GROSSENSE. A PROPRIA CONSTITUIÇÃO DA REPUBLICA, AO IMPOR AO PODER PUBLICO O DEVER DE FAZER RESPEITAR A INTEGRIDADE DO PATRIMÔNIO AMBIENTAL, NÃO O INIBE, QUANDO NECESSÁRIA A INTERVENÇÃO ESTATAL NA ESFERAL DOMINIAL PRIVADA, DE PROMOVER A DESAPROPRIAÇÃO DE IMÓVEIS RURAIS PARA FINS DE REFORMA AGRARIA, ESPECIALMENTE PORQUE UM DOS INSTRUMENTOS DE REALIZAÇÃO DA FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE CONSISTE, PRECISAMENTE, NA SUBMISSAO DO DOMÍNIO A NECESSIDADE DE O SEU TITULAR UTILIZAR ADEQUADAMENTE OS RECURSOS NATURAIS DISPONIVEIS E DE FAZER PRESERVAR O EQUILIBRIO DO MEIO AMBIENTE (CF, ART. 186, II), SOB PENA DE, EM DESCUMPRINDO ESSES ENCARGOS, EXPOR-SE A DESAPROPRIAÇÃO-SANÇÃO A QUE SE REFERE O ART. 184 DA LEI FUNDAMENTAL.


A QUESTÃO DO DIREITO AO MEIO AMBIENTE ECOLOGICAMENTE EQUILIBRADO – DIREITO DE TERCEIRA GERAÇÃO – PRINCÍPIO DA SOLIDARIEDADE.


O DIREITO A INTEGRIDADE DO MEIO AMBIENTE – TIPICO DIREITO DE TERCEIRA GERAÇÃO – CONSTITUI PRERROGATIVA JURÍDICA DE TITULARIDADE COLETIVA, REFLETINDO, DENTRO DO PROCESSO DE AFIRMAÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS, A EXPRESSÃO SIGNIFICATIVA DE UM PODER ATRIBUIDO, NÃO AO INDIVIDUO IDENTIFICADO EM SUA SINGULARIDADE, MAS, NUM SENTIDO VERDADEIRAMENTE MAIS ABRANGENTE, A PROPRIA COLETIVIDADE SOCIAL. ENQUANTO OS DIREITOS DE PRIMEIRA GERAÇÃO (DIREITOS CIVIS E POLITICOS) – QUE COMPREENDEM AS LIBERDADES CLASSICAS, NEGATIVAS OU FORMAIS – REALCAM O PRINCÍPIO DA LIBERDADE E OS DIREITOS DE SEGUNDA GERAÇÃO (DIREITOS ECONOMICOS, SOCIAIS E CULTURAIS) – QUE SE IDENTIFICA COM AS LIBERDADES POSITIVAS, REAIS OU CONCRETAS – ACENTUAM O PRINCÍPIO DA IGUALDADE, OS DIREITOS DE TERCEIRA GERAÇÃO, QUE MATERIALIZAM PODERES DE TITULARIDADE COLETIVA ATRIBUIDOS GENERICAMENTE A TODAS AS FORMAÇÕES SOCIAIS, CONSAGRAM O PRINCÍPIO DA SOLIDARIEDADE E CONSTITUEM UM MOMENTO IMPORTANTE NO PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO, EXPANSAO E RECONHECIMENTO DOS DIREITOS HUMANOS, CARACTERIZADOS, ENQUANTO VALORES FUNDAMENTAIS INDISPONIVEIS, PELA NOTA DE UMA ESSENCIAL INEXAURIBILIDADE. CONSIDERAÇÕES DOUTRINARIAS.” (Brasília, STF. MS 22164/SP, Rel. Ministro Celso de Mello, 1995).


Seguindo o entendimento de que o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado é um princípio fundamental da qual todo o cidadão deve ter direito o STF produziu diversas outras decisões onde demonstra de forma explicita essa posição. A possibilidade ou não de importação e utilização de pneus usados (ADPF 101-3/DF), a proibição de atos cruéis contra animais (RE 153.531/SC e ADI 1.856/RJ), a desnecessidade de lei para autorizar obras ou atividades em espaços territoriais que sejam especialmente protegidos (ADI 3.540-1/DF), e por fim a irrazoabilidade da proibição estadual de plantação de eucalipto para a produção de celulose (ADI 2.623-2/ES), constituem exemplos da formação de uma verdadeira jurisprudência constitucional ambiental pelo Supremo Tribunal Federal que reconhece o meio ambiente saudável um direito fundamental garantido a todo o cidadão brasileiro.


Segundo MILARÉ (2007), o direito fundamental em epígrafe, pela importância e abrangência que possui hoje, deve ser elevado ao status de cláusula pétrea, conjuntamente às contidas no art. 60, §4º., IV, da Constituição da República de 1988.


Os sujeitos ativos desse direito são todas as pessoas nacionais e estrangeiras. Quanto às pessoas jurídicas, adota-se a posição de SAMPAIO (2003), dizendo que as pessoas jurídicas podem ser sujeitos ativos do direito fundamental a um meio ambiente ecologicamente equilibrado, desde que sejam compatíveis com as suas peculiaridades. Em contrapartida, os sujeitos passivos dessa relação são o Poder Público e os particulares. O Estado, conforme já referido acima, tem o dever de preservar a integridade física e o uso adequado do meio ambiente. Já os particulares têm o dever de não atrapalhar o exercício do direito pelos outros e de fazer uso racional dos recursos naturais.


O legislador desempenha função de extrema importância no que tange à matéria do meio ambiente ecologicamente equilibrado, tendo em vista que aquele define os aspectos materiais desse direito e os seus meios de tutela.


10.O PRINCÍPIO DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL EM CONFLITO COM OUTROS DIREITOS FUNDAMENTAIS


O direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, como direito coletivo, tem caráter conflituoso, tendo em vista que pode servir de restrição a outros direitos fundamentais, como o direito de propriedade e o desenvolvimento econômico, pela simples imposição do uso racional, desenvolvimento sustentável e contenção à livre iniciativa. SAMPAIO, acerca da conflituosidade do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, diz o seguinte:


“É importante registrar que essa natureza conflituosa do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado não precisaria de dispositivos constitucionais expressos de reconhecimento. O seu caráter de tutela expansiva, dado pela titularidade difusa e pelo objeto elevado à condição de bens de todos ou como diz a Constituição brasileira, “bem de uso comum do povo”, torna-o latente adversário de outros interesses, além de pôr em relevo a sua dimensão “utisocius”. Por essa relevância, tende-se a afastar todo uso ou gozo que ponha em risco o próprio objeto de tutela. A sua relação tensa com os demais direitos fundamentais e com os interesses coletivos, exige uma intervenção legislativa conciliadora. E, diante de casos concretos, a mediação judicial equilibrada.” (SAMPAIO; WOLD; NARDY, 2003, p. 105).


Apesar de existirem conflitos entre direitos fundamentais, como ocorre com o direito a um meio ambiente ecologicamente equilibrado e o direito à informação, ou em relação ao direto de propriedade, é de se ressaltar que nem sempre o direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado entra em conflito com outros direitos. Há, também, zonas de convergência, tais como as que ocorrem entre o direito ao meio ambiente equilibrado e o direto fundamental à vida ou à saúde – um meio ambiente equilibrado é essencial à uma sadia qualidade de vida e à saúde física e mental dos indivíduos; o direito à igualdade – o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado revela que nesta matéria não há cisão e uma exclusividade aristocrática no que tange à contemplação e uso das belezas naturais; o direito ao desenvolvimento – é parte do projeto ambiental o uso equitativo e racional dos recursos naturais; o próprio direto de propriedade – é protegido com as condições de uso regular e racional dos recursos naturais, fazendo com que a propriedade cumpra sua função eco-social; direitos democráticos – o direito ao ambiente equilibrado reforça os direitos democráticos, tais como a liberdade de associação, direito a informação e a participação, dando ênfase a uma cidadania ecológica.


Em julgado da 1ª. Turma do STF, foi reconhecido o direito à indenização ao proprietário de propriedade rural pela imposição de restrição à exploração das potencialidades econômicas de sua propriedade, incluindo-se sua vegetação de cobertura, encontrando, assim, a ponderação entre o direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e o direito fundamental à propriedade. Confira-se:


“EMENTA: RECURSO EXTRAORDINÁRIO – ESTAÇÃO ECOLOGICA – RESERVA FLORESTAL NA SERRA DO MAR – PATRIMÔNIO NACIONAL (CF, ART. 225, PAR. 4.) – LIMITAÇÃO ADMINISTRATIVA QUE AFETA O CONTEUDO ECONOMICO DO DIREITO DE PROPRIEDADE – DIREITO DO PROPRIETARIO A INDENIZAÇÃO – DEVER ESTATAL DE RESSARCIR OS PREJUIZOS DE ORDEM PATRIMONIAL SOFRIDOS PELO PARTICULAR – RE NÃO CONHECIDO.


Incumbe ao Poder Público o dever constitucional de proteger a flora e de adotar as necessárias medidas que visem a coibir praticas lesivas ao equilíbrio ambiental. Esse encargo, contudo, não exonera o Estado da obrigação de indenizar os proprietários cujos imóveis venham a ser afetados, em sua potencialidade econômica, pelas limitações impostas pela Administração Pública.


A proteção jurídica dispensada às coberturas vegetais que revestem as propriedades imobiliárias não impede que o dominus venha a promover, dentro dos limites autorizados pelo Código Florestal, o adequado e racional aproveitamento econômico das arvores nelas existentes. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e dos Tribunais em geral, tendo presente a garantia constitucional que protege o direito de propriedade, firmou-se no sentido de proclamar a plena indenizabilidade das matas e revestimentos florestais que recobrem áreas dominiais privadas objeto de apossamento estatal ou sujeitas a restrições administrativas impostas pelo Poder Público. Precedentes. – A circunstancia de o Estado dispor de competência para criar reservas florestais não lhe confere, só por si – considerando-se os princípios que tutelam, em nosso sistema normativo, o direito de propriedade -, a prerrogativa de subtrair-se ao pagamento de indenização compensatória ao particular, quando a atividade pública, decorrente do exercício de atribuições em tema de direito florestal, impedir ou afetar a válida exploração econômica do imóvel por seu proprietário.


A norma inscrita no Art. 225, par. 4º., da Constituição, deve ser interpretada de modo harmonioso com o sistema jurídico consagrado pelo ordenamento fundamental, notadamente com a cláusula que, proclamada pelo art. 5º., XXII, da Carta Política, garante e assegura o direito de propriedade em todas as suas projeções, inclusive aquela concernente à compensação financeira devida pelo Poder Público ao proprietário atingido por atos imputáveis à atividade estatal. O preceito consubstanciado no art. 225, par. 4º., da Carta da República, além de não haver convertido em bens públicos os imóveis particulares abrangidos pelas florestas e pelas matas nele referidas (Mata Atlântica, Serra do Mar, Floresta Amazônica brasileira), também não impede a utilização, pelos próprios particulares, dos recursos naturais existentes naquelas áreas que estejam sujeitas ao domínio privado, desde que observadas as prescrições legais e respeitadas as condições necessárias à preservação ambiental.


A ordem constitucional dispensa tutela efetiva ao direito de propriedade (CF/88, art. 5º., XXII). Essa proteção outorgada pela Lei Fundamental da República estende-se, na abrangência normativa de sua incidência tutelar, ao reconhecimento, em favor do dominus, da garantia de compensação financeira, sempre que o Estado, mediante atividade que lhe seja juridicamente imputável, atingir o direito de propriedade em seu conteúdo econômico, ainda que o imóvel particular afetado pela ação do Poder Público esteja localizado em qualquer das áreas referidas no art. 225, par. 4º., da Constituição.


Direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado: a consagração constitucional de um tipico direito de terceira geração (CF,art. 225, caput). (BRASIL, 1995).” (Brasília, STF. RE 134297/SP, Rel.: Ministro Celso de Mello, 1995).


11.CONCLUSÃO


José Adércio Leite Sampaio conclui como o Direito Ambiental pode ser visto na ordem constitucional brasileira:


“Somados, assim, requisitos formais e materiais, pode-se falar no Brasil de um direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, assim como se pode referir a uma “ordem ambiental” que completa e condiciona a “ordem econômica” e que, por topologia, integra-se na “ordem social”.” (SAMPAIO; WOLD; NARDY, 2003, p. 98).


O meio ambiente é protegido como elemento determinante à essencial qualidade de vida. Esse direito não persegue concepções abstratas, mas exprime um desejo de um habitat saudável para que o homem, individual e coletivamente, possa desenvolver suas atividades de forma, também, a preservar o meio ambiente para as futuras gerações. O direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado é a expressão maior, no campo ambiental, do direito fundamental à vida.


Márcia Rodrigues Bertoldi (2007, p. 16) diz o seguinte: “Um meio ambiente sadio e ecologicamente equilibrado é um ávido valor social a ser reclamado porque determina um desejo unânime e prioritário da humanidade e demais espécies: a vida.”


O direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado é de cada um, por isso a aplicação do pronome indefinido “todos”, não excluindo qualquer pessoa que seja. Esse direito é, ao mesmo tempo, tanto de cada pessoa, em sua subjetividade, quanto da coletividade, não se esgotando em apenas um indivíduo, o que o caracteriza como direito difuso, transindividual.


O certo é que o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado é um legítimo direito fundamental, tendo em vista que está inserido no Título “Da Ordem Social”, ao lado da saúde, família, educação, seguridade social, cultura, criança, idoso etc., e, também, pela própria letra do art. 225, caput, da Constituição da República (“Todos têm direito…”). Essa afirmação, também, pode ser corroborada pela ideia de que o §22 do art. 5º. da mesma Carta Constitucional admite a existência de outros direitos fundamentais fora do rol deste artigo e, por fim, o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado é uma extensão do direito à vida.


 


Referências

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Notas:

[1] 2A Conferência das Nações Unidass sobre meio ambiente e desenvolvimento ocorreu em junho de 1992 na cidade do Rio de Janeiro. Rezek (2008) ressalta a importância do evento devido ao esforço internacional que ficou demonstrado por meio da presença de cento e setenta e oito delegações nacionais, sendo que destas cerca de cento e dezessete estavam sendo encabeçadas pelo próprio chefe de estado ou de governo. Como resultado do evento surgiram duas convenções (uma sobre mudanças climáticas e outra sobre diversidade biológica), duas declarações (uma de cunho geral e outra sobre florestas) e a Agenda 21, que constituía um amplo plano de ação para os países.

[2] A Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento de 1992 não se trata tecnicamente de um tratado já que não ocorreu o recolhimento das assinaturas dos Estados-partes e nem ficou aberta a ratificação ou adesão. Tal fato não desconstitui sua notável posição como uma importante declaração de princípios a serem observados pelos Estados participantes da ECO-92 para a proteção do meio ambiente. A expectativa é de que ocorra um balanço da execução desses princípios durante totó o período transcorrido até o evento da RIO+20 em junho de 2012.

[3] Justamente para incentivar a absorção pelos Estados que celebraram tais tratados a ONU por meio do PNUMA – Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente – busca agir em conjunto com diversos parceiros, dentre eles entidades que integram a própria Nações Unidas, organizações internacionais e sub-regionais, governos nacionais, estaduais e municipais, organizações não-governamentais, setor privado e acadêmico trabalha de forma ativa para alcançar o intento de promover a implementação das diretrizes ambientais e a utilização eficiente de recursos dentro de uma concepção de desenvolvimento sustentável. Disponível em http://www.onu.org.br/onu-no-brasil/pnuma/.

[4] A degradação ambiental não conhece fronteiras. Hoje, um dano ambiental não é mais sentido somente no Estado que o provocou. Este dano é internacionalizado para os países vizinhos ou até exportados para outros continentes. Já não se pode tratar regionalmente, ou nacionalmente, fenômenos que são internacionais e supranacionais. A solução de conflitos no plano internacional pode ser estabelecida de duas maneiras, a primeira através de acordos e tratados de cooperação ambiental entre os países, e a segunda, por meio da criação do Tribunal Internacional Ambiental, responsável pela tutela do meio ambiente e que terá jurisdição ilimitada. Tem-se, hoje, a consciência de que os espaços naturais estão sob a jurisdição de mais de um Estado, o que, consequentemente, ultrapassa as fronteiras de soberania destes. Assim, a proteção do ecossistema planetário demanda a formação de uma comunidade planetária ambiental. Nos dias atuais, as tensões ambientais estão à tona, vez que há espaços naturais protegidos que não estão sob a jurisdição de nenhum Estado ou regiões que estejam sob o território de mais de um Estado. Não obstante, a poluição, também, é um fenômenoglobalizado. Esses espaços naturais protegidos são considerados patrimônio da humanidade e, por isso, demandam uma singularização do tratamento, o que seria possível através da criação do Tribunal Internacional Ambiental. Essa internacionalização da tutela do Direito Ambiental, tornando-o um fenômeno supranacional possui três fases que vale a pena destacar: a primeira diz respeito ao próprio reconhecimento de que o meio ambiente trata-se de uma unidade global; a segunda é a edição de normas e tratados que efetivem a proteção do meio ambiente, colocando-o como direito fundamental a ser protegido pelos seus titulares; e a terceira fase, na qual se encontra a humanidade, é a tentativa de criação de um órgão supranacional, munido de competência jurisdicional e consultiva, para regular as relações entre os Estados e o meio ambiente, considerado como um todo planetário, no cenário global, capaz de impor sanções e adequar condutas, nos moldes do já existente Tribunal Penal Internacional.


Informações Sobre os Autores

Davi Niemann Ottoni

Advogado; Especialista em Direito Público (Aprobatum/Anamages); Mestrando em Direito Público (PUC Minas); Professor de Graduação da PUC Minas e Facsal. Membro da Comissão de Assuntos Penitênciários da OAB/MG

Daniel Fernandes Nogueira Costa

Advogado na empresa Tracbel S/A; Graduado em Direito pela PUC Minas; Pós-Graduando em Direito Público pela PUCMINAS


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