Sumário: 1. Direitos metaindividuaIs – breves apontamentos 2. A necessidade da proteção coletiva. 3. A conquista do desenvolvimento pela efetividade do processo coletivo 4. Considerações finais
1. Direitos metaindividuaIs – breves apontamentos
Com efeito, é notória a existência de planos diversos de titularização, escala crescente de coletivização no que tange à segurança pública; assistência à saúde; qualidade de vida, dentre outros fatores.[1]
Em derradeiro, não padece dúvida que sempre existiram interesses difusos. Os interesses sempre emergiram, naturalmente, do plano de mera existência-utilidade; de modo que interesses de todos os tipos e matizes puderam surgir de cada ponto onde se voltaram a atenção ou a vontade humanas.[2]
Em síntese, uma dicotomia está estabelecida, separando de um lado, os interesses privados, individuais, de cunho egoístico, e, de outro, os interesses metaindividuais, interesses difusos, que se projetam na ordem coletiva, legitimando a própria comunidade na invocação da tutela jurisdicional.
A existência de interesses coletivos impulsiona a formação de grupos sociais, justificando também tal entendimento a idéia sobre a qual os sobre a qual os homens se unem por grupo ou satisfação plena de suas necessidades não pode ser alcançada de forma eminentemente isolada, sendo a família, a sociedade civil e comercial, o sindicato exemplos específicos para tal entendimento[3]
A análise crítica da Tutela Jurisdicional de Massa é o escopo desta pesquisa, uma vez que o Direito Individual posto não mais consegue tutelar efetivamente os interesses oriundos dos conflitos de massa da sociedade e, com evolução e coletivação dos direitos é patente a necessidade de implantação de novo sistema processual pátrio[4].
São Princípios da Tutela Jurisdicional Coletiva[5]:
1. acesso à justiça e à ordem jurídica justa;
2. efetividade da tutela jurisdicional;
3. incremento dos meios alternativos de solução de conflitos;
4. participação pelo processo e no processo;
5. boa-fé e cooperação das partes e de seus procuradores
6. cooperação dos órgãos públicos na produção de provas;
7. economia processual;
8. instrumentalidade das formas;
9. ativismo judicial;
10. flexibilização da técnica processual, observando o contraditório;
11. repartição dinâmica do ônus da prova;
12. não taxatividade da ação;
13. proporcionalidade e razoabilidade.
Segundo NERY JÚNIOR[6]:
“O CDC não regula especificamente o procedimento da Ação Coletiva desta ação, de sorte que a ela deverá ser dado o rito da LACP, aplicando-se, onde couber, o Tít. III do CDC bem como a LACP. V. CDC 90 e LACP 21.(…) O procedimento desta ação está regulado no art. 91 a 100, aplicando-se, onde couber, o Tít. III do CDC bem como LACP. V. CDC 90 e LACP 21.”
Como se nota, as relações interpessoais na sociedade contemporânea foram se intensificando e tornando o tecido social, originariamente individualista, em uma sociedade de massa, os grupos organizados começaram a ganhar voz e força. Hodiernamente, os movimentos sociais instigam as massas e o vigor de sua coesão, incentivando sua atuação e fortalecimento.
Nesta perspectiva surge a necessidade de aperfeiçoamento da tutela coletiva, que consiste em instrumentos de defesa de interesses da coletividade, vinculada aos efeitos do provimento jurisdicional, de sorte a garantir a segurança e efetividade das relações jurídicas.
Consoante a lição cediça de ALMEIDA, “o controle da coletividade por meio deste instrumento é necessário para que o sistema processual molecular seja realmente eficaz”.[7]
“No sistema jurídico brasileiro existem regras de direito material com previsões que refletem a necessidade de controlar as classes, tais como as hipóteses de aquisições de direitos e obrigações de forma coletiva, através de convenções e acordos coletivos trabalhistas (art. 661 da CLT), da convenção coletiva de consumo (art. 107 do CDC) e do usucapião coletivo (artigo 10 da Lei 10.257/01), entre outros.[8]
Como visto, não é privilégio do ordenamento jurídico norte-americano a necessidade de uma tutela jurisdicional que proteja as pessoas contra grupos organizados. Com toda essa movimentação em torno da ação coletiva passiva, a necessidade de reconhecimento expresso de uma ação que permita a vinculação de uma coletividade no pólo passivo assoma-se cada vez mais evidente no mundo atual.[9]
Não olvidando as fundamentais transformações conceituais e pragmáticas pelas quais vem a Ciência Processual experimentando, a partir, sobretudo, de novos contornos em institutos formadores de sua própria “Trilogia Estrutural” – Ação, Jurisdição e Processo – impende notar que o próprio alcance desta “nova” perspectiva metodológica do processo e o movimento pela sua instrumentalidade (cf. DINAMARCO, Cândido Rangel. A Instrumentalidade do Processo. 4 ed. São Paulo: Malheiros Editores, 1994, p.17-24) rumo a um processo civil de resultados, marca a urgência na modificação de posturas não somente dos operadores do direito, como também de todo aparato estatal, seja por meio de inovadoras performances na estrutura física e administrativa dos foros em geral e ainda na produção legiferante qualitativa, apta a mirar, indubitavelmente, como centro das atenções, a afetividade, entendida aqui como instrumentalização racional e razoável de entrega do bem da vida a quem, exatamente, dele necessita. Afinal, o Direito (aqui, o Processo) deve ser instrumento a tornar as pessoas mais felizes ou menos infelizes!”[10]
Por tais razões, a análise crítica e compreensão para aplicação das regras do microssistema de defesa dos direitos metaindividuais é temática relevante e urgente, já que para a presente empreitada é imprescindível a desmistificação de determinados dogmas estigmatizados pelo processo civil de índole individual para que seja possível a efetiva prestação jurisdicional da tutela transindividual.
“Enfim, o contributo da processualística pátria para com a massa crédula em dias melhores é possível e real, sobretudo se a visão turva da formalidade irracional e estéril, que tem no processo um fim em si mesmo e ainda praticada de forma larga nos pretórios nacionais, se curve perante o exercício prático da norma processual que, desejosa por seu alcance efetivo na satisfação dos direitos, possa ir mais além, isto é, ser igualmente protagonista de parcela contributiva aos desígnios desenvolvimentistas de nosso amado país.”[11]
De outro lado, a ação coletiva passiva[12] vem sendo acolhida pelo Poder Judiciário pátrio. Sua utilização é ampla e não há qualquer restrição legal para seu emprego em todos os campos do direito.
“Contudo, a sua utilização é mais frequente em ações envolvendo direitos civis, demandas questionando a constitucionalidade de leis locais e estaduais e práticas desenvolvidas por funcionários públicos, ou, ações contra entidades, não personalizadas. Não obstante, classes de réus têm sido certificados em outros contextos, como violações de patentes, antitruste, valores mobiliários e meio ambiente”.[13]
Observada a particularidade do instituto processual da Coisa Julgada[14] nas demandas coletivas, visando a corroboração da segurança jurídica, neste caso, nas relações consumeristas, verifica-se a plena necessidade de regulação para efetiva satisfação dos direitos coletivos.
2. A necessidade da proteção coletiva
A princípio, a prerrogativa do Poder Judiciário quanto a legitimidade para impor ao administrador público a obrigação de implantar políticas públicas mediante a tutela específica, visando o aperfeiçoamento do Estado Democrático de Direito, guarda intrínseca relação com a necessidade da proteção coletiva através da tutela jurisdicional de massa.
“O processualista não poderá perder de vista seu principal escopo, que consiste no estudo e no aperfeiçoamento de mecanismos destinados à pacificação social, com a resolução de controvérsias que exijam a proteção do Estado. Os institutos processuais – jurisdição, ação, defesa e processo – existem para garantir ao jurisdicionado o acesso à ordem jurídica justa, outorgando-lhe o bem a que tem direito”.[15]
“O conceito de “interesse” é fundamental não só para o estudo do processo, mas para o estudo do direito, de uma maneira geral”.[16]
“Objetivamente, entende-se por “interesse” como conceito geral para o campo jurídico ocorre no instante em que o ordenamento jurídico lhe oferece proteção. Assegurada a proteção ao titular do interesse, nasce o direito. Tratando-se de direito individual, surge o direito subjetivo.
Da tradicional distinção entre o interesse público e o interesse privado, percebe-se a existência de situações que não se incluíam em nenhuma das duas categorias. Eram interesses que transbordavam a esfera individual, sem se confundir, todavia, com a esfera pública.
A percepção dessa nova categoria de interesses despontou com a sociedade contemporânea, produtora de conflitos envolvendo grandes massas. Os fenômenos de massa, como a cultura de massa, levaram a existência de um processo também de massa. (MOREIRA, José Carlos Barbosa. Ações Coletivas na Constituição Federal de 1988, Revista de Processo, São Paulo, v. 16, nº 61, pp.187-200, jan./mar. 1991.) Sobretudo nos danos aos consumidores e ao meio ambiente, não raro, de uma única conduta ilícita, inúmeras pessoas são atingidas, culminando no que se denominou litigiosidade das massas.” (SOUZA, Miguel Teixeira de. A legitimidade popular na tutela dos interesses difusos. Lisboa: Lex, 2003, p. 9) [17]
Tenha-se presente que, em comparação aos sistemas estrangeiros, aponta-se a proteção de direitos supraindividuais, como meio ambiente e o consumidor, através das vias administrativa, penal e civil. Não se pode perder de vista a influência do grau de cultura da nação e a aquiescência das decisões e normas administrativas na proteção de direitos supraindividuais.
É óbvio a necessidade de disponibilização modelos processuais coletivos, como forma de acesso à ordem jurídica justa, já que, comprovadamente, as técnicas do processo civil em sede individual, mesmo com adaptações, são, em sua maioria, insatisfatórias para garantir a efetiva proteção dos direitos supraindividuais.
“A comparação entre a ação popular, a ação civil pública e o mandado de segurança coletivo poderia sugerir a utilidade de se elaborar um procedimento único para tutela jurisdicional coletiva brasileira, principalmente após a interpretação dos artigos 83 e 110 do CDC, do artigo 21 da LACP e artigos 210e 212 do ECA, uma vez que citados dispositivos ligam os instrumentos, os quais passariam a compor um sistema único.”[18]
Em rápidas pinceladas, a harmonização entre os mecanismos de tutela coletiva – dispostos em legislações esparsas – sempre se mostraram conturbados na prática forense. Tudo, pois, poderia apontar para criação de um procedimento coletivo único, o qual valorizaria o sistema brasileiro, ampliando o acesso à justiça dos direitos e interesses supraindividuais.[19]
As bases científicas para um novo direito processual civil demandam mudanças estruturais. E, para tanto, o processo civil coletivo – compendiado em um Anteprojeto de Código Brasileiro, cuja proposta foi apresentada pelo IBDP ao Ministério da Justiça – pode servir de inspiração para modernização do ordenamento processual pátrio. Ao lado disso outras mudanças estruturais seriam bem-vindas.[20]
Segundo BOBBIO[21], “na linguagem jurídica corrente o uso do termo “ sistema” para indicar ordenamento jurídico é comum.
Lemos no ensaio de DEL VECCHIO[22], Sobre a estatalidade do direito este trecho:
“Cada proposição jurídica em particular, mesmo podendo ser considerada também em si mesma, sua abstratividade, tende naturalmente em se constituir em sistema. A necessidade da coerência lógica leva a aproximar aquelas que são compatíveis ou respectivamente complementares entre si, e a eliminar as contraditórias e incompatíveis. A vontade, que é uma lógica viva, não pode desenvolver-se também no campo do Direito, a não ser que ligue as suas afirmações, á guisa de reduzi-las a um todo harmônico.”(O ensaio, que é de 1928, se encontra nos Studi sul diritto, 1958, v.1, pp. 89-115. trecho citado está na página 97)
PERASSI[23], em sua Introdução às Ciências Jurídicas:
“As normas, que entram para constituir um ordenamento, não ficam isoladas, mas tornam parte de um sistema, uma vez que certos princípios agem como ligações, pelas quais as normas são mantidas juntas de maneira a constituir um bloco sistemático.”
É preciso insistir no fato de que o atual Código de Processo Civil não possui mecanismos suficientes para solucionar diversas espécies de demandas da sociedade brasileira, uma vez que o contexto em que foi elaborado revelou concepção individualista, própria do início da década de 70, sem qualquer disciplina necessária para complexidade e especialização exigidas para disciplinar a tutela jurisdicional de massa.
Mister se faz ressaltar que o PLS 1662010 que trata do Novo Código de Processo Civil preferiu não incorporar o Anteprojeto de Código Brasileiro de Processos Coletivos, tratando apenas do Incidente de Coletivização de Demandas Repetitivas nos arts. 883,I e arts. 930 e ss.[24]
“Assim, deve ser reconhecida a existência de um Sistema Único Coletivo, ou seja, os diversos textos legais formam todo o sistema interligado. Havendo a lacuna ou a ausência de disciplina normativa em texto legal, aplica-se a lei pertencente ao Sistema Único Coletivo, somente podendo ser invocado o Código de Processo Civil na ausência de qualquer disciplina específica ou caso haja expressa previsão legal. ( STJ, Resp 610.438 – SP, rel. p/ o ac. Min. Castro Meira, j. 15.12.05, DJU 30.03.06 – Fonte: DVD Magister, versão 25, ementa 11304813, Editora Magister, Porto Alegre, RS.[25]
Neste ponto, o Projeto de Lei (5.139/2009) propõe, de forma clara, a evidente autonomia do Direito Processual coletivo, com adoção de diversos princípios próprios em seu art. 3º: “ O processo civil coletivo rege-se pelos seguintes princípios: I – amplo acesso à justiça e participação social; II- duração razoável do processo; III – isonomia, economia processual, flexibilidade procedimental e máxima eficácia; IV- tutela coletiva adequada, com efetiva precaução, prevenção e reparação dos danos materiais e morais, individuais e coletivos, bem como punição pelo enriquecimento ilícito.; V- motivação específica de todas as decisões judiciais, notadamente quanto aos conceitos indeterminados; VI- publicidade e divulgação ampla dos atos processuais que interessam à comunidade; VII- dever de colaboração de todos, inclusive pessoas jurídicas públicas e privadas, na produção de provas, no cumprimento das decisões judiciais e na efetividade da tutela coletiva; VIII – exigência permanente de boa-fé, lealdade e responsabilidade das partes, dos procuradores e de todos aqueles que de qualquer forma participem do processo; IX – preferência da execução coletiva” .[26]
Cai a lanço notar que, a adoção de novos paradigmas de regulação, visando adaptação do Direito ao tecido social, revela completa alteração do Sistema Processual pátrio, com futuros reflexos inclusive no Direito Processual Civil individual.
“Não se pode olvidar que o atual Sistema Único Coletivo, mostra-se insuficiente para atuais demandas coletivas no Brasil. Apesar de benefícios inegáveis na defesa dos direitos coletivos que foram obtidos nestes vários anos, desde a Lei da Ação Popular (1965) até a atual Lei da Ação Civil Pública (1985) e o Código do Consumidor (1990), é hora de avançar, e esta é a proposta básica do Projeto de Lei n. 5139/09 em tramitação na Câmara dos Deputados”.[27]
No dizer expressivo de GOMES JÚNIOR e FAVRETO[28], “claro que sempre poderá haver o risco de involuções – efeito colateral decorrente do próprio debate democrático –, mas o certo é que não podemos deixar de tentar evoluir ou aperfeiçoar com receio do novo, da alteração da situação atual.”
3. A conquista do desenvolvimento pela efetividade do processo coletivo
Cai a lanço notar que inevitável torna-se a introdução de instrumento de tutela coletiva nos países de direito escrito. A tutela, tradicionalmente, tem como base a titularidade e não o interesse – fato e uma relevância social.[29]
”Sob a ótica Processual, a espécie de interesse defendido na ação (difuso, coletivo ou individual homogêneo) irá depender diretamente do conteúdo e extensão do(s) pedido(s) e da cauda de pedir formulados pelo autor, permitindo delinear os benefícios atuais e potenciais da tutela requerida.” (BESSA, 2007: p. 390).
Em virtude das mencionadas considerações, a transformação ocorrida na legitimidade monopolística do Estado e no papel esperado das profissões jurídicas, pelo fenômeno da globalização das trocas associada ao desenvolvimento de alternativas à regulação jurídica estatal e de modos informais de resolução de conflitos com visível multiplicação dos vínculos de produção do Direito, paralelamente ao tema da complexidade (largamente relacionado com o sistemismo – que tem mais influência no velho continente do que no novo – começa a apresentar consequências significativas.) são algumas das grandes tendências do fenômeno aqui abordado.
A internacionalização refere-se à uma rede de ideias, cujo centro é o radical “nação”. “Inter-nacio-nal” supõe que haja relações entre os Estados-Nações. Falar de “globalização” permite, por conseguinte, compreender algo diferente do que quando se fala simplesmente da internacionalização. Caso se queira referir-se à realidade da nação, nesse processo de trocas, seria mais conveniente falar de “transnacionalização”, no sentido que certos fluxos passam de uma nação a outra, sem que se suspendam as trocas – ou que se suspendam, justamente – o direito nacional ou o direito internacional.[30]
Não é clara a linha de demarcação. Existem imbricações, inter-relações, interpenetrações, que tornam tudo confuso, muito complexo, até paralisar a aplicação das regras de alguma ordem jurídica. Isso não quer dizer que o processo de transformação das trocas que as “globaliza” não venha, mais cedo ou mais tarde, a transformar o próprio direito internacional.
Neste sentido, deve-se dizer que o termo “mundialização” é, às vezes, preferido ao termo “globalização”. Ele apresenta, aos olhos de uns, a vantagem de não ser uma “réplica” perfeita de um termo americano: global. Sua verdadeira vantagem reside noutra esfera: na utilização de “mundial”, para não se evocar o fenômeno específico da “globalização”. A utilização sistemática de “mundialização” apenas dá uma certa ambiguidade ao conceito, cujo significado todo mundo sabe que tem, ao chamá-lo “global” apresenta, além disso, a vantagem de fazer referência a seu antônimo, “local”, que , como se verá, desempenha um papel na dinâmica de globalização das trocas.[31]
Tal relação com a regulação coletiva se dá uma vez que não se pode ignorar a mudança nos modelos de produção e surgimento de uma nova divisão internacional do trabalho através do deslocamento da atividade econômica e das transferências de uma parte das operações de trabalho de um país a outro, como também o desenvolvimento de mercado de capitais ligados para além das nações, em que é patente o livre fluxo de investimentos produzido sem levar as fronteiras em consideração, e ainda uma crescente expansão das multinacionais para tratamento dos negócios e negociação em confluência com uma economia planetária.
Em consonância com o acatado, a codificação efetiva dos direitos das coletividades não deve censurar a importância crescente dos acordos comerciais entre nações que formam blocos econômicos regionais de primeira importância, bem como a inevitável hegemonia dos conceitos neoliberais em matéria de relações econômicas. Cumpre ressaltar que mercado privatizado, livre mercado internacional, desregulação e desengajamento do estado foram as palavras de ordem do “reaganismo” e “thatcherismo” que ditaram o comportamento do Fundo Monetário Internacional, do Banco Internacional para Pesquisa e Desenvolvimento, bancos regionais e o General Agrement Tarifis and Trade (GATT). Num momento em que se fala do fim das ideologias, a ideologia liberal jorra de todos os lados e coloniza os espaços que a ela resistem, com base na fé nas ordens econômicas e jurídicas nacionais.
Sobremais, em uma economia sem fronteiras, os fluxos internacionais de bens, de serviços, de capitais e de pessoas abrem perspectivas aos trabalhadores. O emprego e os salários beneficiam, de fato, um desenvolvimento das exportações. Inversamente, trabalhadores sofrerão por causa deste processo. (v.g. – deslocamento dos empregos menos especializados em direção a zonas do planeta onde os custos salariais são menos elevados.)
Buscando, outrossim, a aplicação de políticas públicas no tocante à garantia dos interesses das coletividades é mais do que nunca necessária, pois estes são os únicos capazes de poderem apoiar-se localmente nos diversos movimentos sociais – participação da sociedade civil.
“A efetividade da prestação jurisdicional, portanto, está intrinsecamente ligada ao incremento das vendas com respectivo aumento destas gerando multiplicação dos produtos; contratação de empregados para dar cabo à produção em larga escala e, por último, mais acesso aos bens de consumo, justificando isso a partir do interesse e amplitude favorável das empresas, somado à uma frente de trabalho que consegue produzir em larga quantidade”. [32]
Embora as fronteiras mostram-se impotentes, a partir dessa nova ordem, para reter fluxos transnacionais de informação tanto quanto aos riscos como às medidas de controle da regulação, inclusive a regulação jurídica, Cabe ao Estado melhorar o funcionamento do mercado, promover a equidade e proteger os trabalhadores vulneráveis.
“(…) há que se debruçar sobre a perspectiva do direito como instrumento estatal potencializador de reais e efetivas políticas afirmativas no sentido de propiciar melhoria na qualidade de vida do cidadão comum, aptidão hoje inevitável, inclusive do próprio desenvolvimento do Estado.
Despiciendo é dizer que o conceito de desenvolvimento, hodiernamente, se relaciona não somente com a tradicional ótica do crescimento econômico, sobretudo na perspectiva de uma avanço significativo no quadro da políticas sociais voltadas à edificação da cultura na melhoria nas condições daquela sociedade destinatária de tais políticas”.[33]
O Judiciário, por sua vez, representando o retorno do direito deve estar equipado para atender necessidade de uma proteção específica à coletividade no Brasil com aplicação de instrumentos processuais clássicos e atuais no sistema processual civil brasileiro se adequando a uma proteção do Direito de Massa ou da Coletividade para que, analogicamente à matéria laboral, a proteção ao consumidor em nível coletivo, e de forma específica, gere incremento no consumo através da efetiva prestação jurisdicional, em nível coletivo, sob a ótica da segurança jurídica e seu impacto relevante no cotidiano do tecido social pátrio.
O Estado, que a princípio sempre detém o monopólio do direito, aparece como uma estrutura cada vez mais ausente, quando se trata das relações jurídicas de fato, que ocorrem cada vez mais à margem do direito estatal. Por conseguinte, os grandes problemas do momento estão se tornando, prioritariamente, o da transformação do direito e dos litígios, e o da opressão de grupos sociais, ligados ao processo de transnacionalização econômica social e política.
Neste novo contexto o escritório de advocacia vai se tornar um lugar onde os operadores do direito virão preparar suas ações, antes mesmo de aceitá-las. O dito ambiente organizacional também representará uma etapa, em que se regularão os contenciosos entre as partes cada vez mais prontas para um acordo, e cada vez menos se passará pelas vias “normais” judiciárias ou administrativas de regulamento de conflitos.
Tudo seria muito simples, na verdade, se o desenvolvimento do local não levasse, na sua luta com o nacional, a um desenvolvimento contrapontístico do local, que pode ser entendido de diversas maneiras. A sofisticação das relações Jurídicas permitem aos empresários deslocar sua produção, sem muitas desvantagens, pois há leis nacionais protetoras.
Os profissionais de direito devem – e deverão ainda mais, no futuro –, levar em isso em consideração, sem negligenciar as diferenças entre as culturas jurídicas dos países com os quais mantém contato.
Em uma perspectiva de gestão planetária unificada, a extrema divisão das nações, cuja existência se nota como sendo uma ameaça à expansão de uma sociedade globalizada. Enquanto poderia descontar uma redução desse fracionamento, sobretudo com o surgimento de blocos regionais (no sentido de regiões do globo – União Européia, Mercosul, Nafta etc), uma fotografia da geopolítica contemporânea revela justamente o processo contrário.
Convém acrescentar a isso o fracionamento das soberanias provenientes da descentralização dos lugares de tomada de decisão jurídica no próprio seio de uma nação. Cada vez mais mesmo num Estado de forte tradição jacobina, como é a França, vê-se desaparecer elementos de soberania nacional em favor de autoridades inferiores: o que a comunidade se chama o “local”.
Em contrapartida, vê-se surgir em virtude dessa crescente descentralização um direito local, cada vez menos marginal, e que torna cada vez mais complicado o conhecimento das situações jurídicas, mesmo se as decisões tomadas nessas esferas não podem ser contrárias à Lei, sempre tendo de emanar do Estado central.
Por conseguinte, no panorama hodierno, se faz necessária a reestruturação das profissões jurídicas – mudança na própria lógica das relações jurídicas – bem como remodelação do direito segundo as novas necessidades correspondentes às velhas formas de relações jurídicas.
Em última análise, essas ações afetarão o poder e a própria legitimidade tanto dos Estados nacionais quanto de suas áreas jurídicas. Cabe ao analista sociológico dos sistemas jurídicos sociológicos estudar esses fenômenos com precaução e com ponderação. Legisladores nacionais, magistrados e profissionais do direito terão, cada vez mais, de contar com os pesquisadores envolvidos nesse tipo de investigação.
É de amplo conhecimento a insuficiência do número de juízes e de funcionários não lhe permite fazer andar a contento os milhões de processos que chegam todos os anos às secretarias de justiça. Tal déficit acaba comprometendo a efetividade da tutela dos direitos e aumenta os custos para as partes, pressionando-as, muitas vezes, ao abandono das causas e a concordância com acordos que não traduzem a satisfação efetiva das pretensões resistidas.
A atividade científica e seus operadores, pois, têm diante de si, permanentemente, a escolha entre colaborar com a opressão ou com a libertação.[34]
“Assim, os operadores da ciência jurídica, comprometidos com uma renovada e ampliada atitude filosófica democrática, desligados das aparências de juridicidade que possam ter tais práticas, têm de se contrapor aos desígnios e intentos das elites e declarar o seu caráter autocrático, portanto injusto e inconstitucional, mesmo que os riscados formais tenham sido seguidos”.[35]
Importante observar que a dissonância entre práticas sociais e princípios jurídicos não foi inventada e nem mesmo patenteada pelas elites nacionais brasileiras. Mas certamente o corpo docente teve nelas os melhores aprendizes.[36]
Assim que as democracias devem se preocupar mais com a verdadeira e complexa realidade social e econômica, não somente se concentrando no reconhecimento das liberdades políticas, mas também observando que as sociedades crescem em tamanho e complexidade.
“Afinado dito conjunto de ideias com a perspectiva do que afirmamos em linhas atrás, já é tempo de ter em mente a dimensão social, política, econômica e jurídica que traz a carga do processo, este como instrumento do Estado apto a contribuir para o desenvolvimento do país, influenciando, mediante a prolação de uma simples decisão judicial, no emprego e no desemprego, no reconhecimento de débeis condições contratuais a gerar riqueza ou não, no amparo do hipossuficiente assolapado em precárias condições de higiene e saúde, na restauração judicial da dignidade da pessoa diante de aviltante tratamento concedido por parte dos serviços públicos ínfimos ofertados pelo próprio Estado” (Previdência, Transporte, Habitação, Lazer, etc), dentre outras questões e situações.[37]
4. Considerações finais
Em suma, a efetiva prestação jurisdicional, em nível coletivo, sob a ótica da segurança jurídica, tem impacto relevante no cotidiano do tecido social pátrio, já que está relacionada ao desenvolvimento da nação.
Nesta toada, o bom funcionamento da estrutura do Poder Judiciário, associado à efetividade da prestação jurisdicional está intrinsecamente ligado à evolução social, política e econômica do país. Observando os olhares do mercado – hoje “mundializado” – tal assertiva se mostra relevante como requisito na tomada de decisões inerentes à investimentos, desenvolvimento mercantil; instalação de grandes empresas, geração de novos postos de trabalho etc.
“O surgimento e desenvolvimento dos mercados, relacionados a mecanismos de troca de bens e serviços realizados por agentes com capacidade autônoma – indivíduos, empresas – dentro de um espaço normativo comum, são oriundos de larga história e também de processos sociais e políticos complexos , sendo a proteção do consumidor consequências direta de tais processos, ante as novas situações decorrentes do desenvolvimento”. [38]
Conforme defendido em toda edificação desta pesquisa, o princípio do acesso à justiça está fortemente ligado à noção de justiça social, onde o direito à igualdade deve significar direito à igualdade de oportunidades e, justamente, partindo da idéia de que os desiguais têm que ser tratados de forma desigual, a igualdade obrigatoriamente tem que atingir a mesma oportunidade de acesso à justiça a todos para que a tal harmonia das relações sociais e jurídicas possa tornar inabalável o desenvolvimento da nação.
Mestrando em hermenêutica e direitos fundamentais (UNIPAC-JF) especialista em direito processual contemporâneo e as novas tendências do direito (UNESA-MG), advogado.
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