Maria Beatriz Torquato Rego – Advogada. Graduada em Direito pelo Centro Universitário do Rio Grande do Norte. Pós-graduanda em Direito Constitucional pela ABDConst. E-mail: mariabeatriztorquato@hotmail.com.
Marcelo Maurício da Silva – Professor Doutor Orientador do Curso de Direito do Centro Universitário do Rio Grande do Norte. E-mail: marcelomauricio@unirn.edu.br.
Resumo: Esta pesquisa tem como foco a análise do estabelecido no guia de aparência dos trabalhadores da Disney, intitulado de Disney look, à luz do ordenamento jurídico brasileiro. Apesar da inexistência do referido fenômeno no Brasil, centra-se a problemática em hipoteticamente examinar o impacto que ele produziria nas relações de trabalho, tendo como objetivo geral estabelecer qual seria o posicionamento dos tribunais trabalhistas a respeito da temática. No que concerne a metodologia, cabe destacar que ela ocupa uma posição de destaque nesta pesquisa, tendo em vista tratar-se de um exercício teórico, não sendo, portanto, uma proposta factual. Cuida-se de uma analogia de um fenômeno estadunidense ao direito brasileiro, através do método de abordagem hipotético dedutivo e de uma de pesquisa qualitativa. Conforme análise da legislação pátria e de jurisprudências, o limite da liberdade contratual é ultrapassado quando viola os direitos e garantias fundamentais previstos na Constituição. Ademais, constata-se que a abrangência de normas relativas ao enfrentamento da discriminação é maior no ordenamento pátrio do que no estadunidense. Desse modo, para que o Disney look possa ser aceito no ordenamento brasileiro, é necessário que ocorram mudanças de modo as regras nele preceituadas se tornem compatíveis com o estabelecido na Carta Magna.
Palavras-chave: Disney look. Discriminação. Liberdade contratual. Analogia.
Abstract: This research focuses on the analysis of the Disney employees appearance guidelines, entitled Disney look, which are interpreted in terms of the Brazilian legal system. Despite the inexistence of the mentioned phenomenon in Brazil, the core of the problem consists in hypothetically examine the impact that it would have on work relations, with the general aim of determining the position of the Brazilian labour courts on this issue. Regarding the methodology, it is important to highlight that it occupies a fundamental position in this research, since it is a theoretical exercise and not a factual proposal. It is an analogy of an U.S phenomenon applied to the Brazilian Law, through the hypothetical-deductive approach method and a qualitative research. Based on the analysis of the Brazilian legislation and case law, the limit of contractual freedom is exceeded when it infringes rights and guarantees laid down in the Constitution. In addition, it is verified that there are more norms related to the confrontation of discrimination in the Brazilian law system than in the U.S legislation. Therefore, in order to be acceptable under Brazilian legislation, the Disney look guidelines have to make changes in a way that they become compatible with those laid down in the Constitution.
Keywords: Disney look. Discrimination. Contractual freedom. Analogy.
Sumário: Introdução. 1. The Disney look: o guia de aparência da maior empresa de entretenimento do mundo. 2. This is America. 3. This is Brazil. 4. A vedação as práticas discriminatórias como uma forma de garantir a igualdade. 5. A importância do uso da analogia na projeção do hipotético julgamento do Disney look pela legislação brasileira. Conclusão. Referências.
INTRODUÇÃO
A discriminação nas relações de trabalho é um tema polêmico e que fomenta bastante discussão nos diversos ordenamentos jurídicos. O debate acerca da questão não se restringe ao Direito do Trabalho, engloba também princípios constitucionais como o da igualdade, o da dignidade da pessoa humana e o da não discriminação.
Na presente pesquisa o foco é a análise do estabelecido no guia de aparência dos trabalhadores da Disney, intitulado de Disney look, à luz do ordenamento jurídico brasileiro. Apesar da inexistência do referido fenômeno no Brasil, a problemática centrou-se em examinar hipoteticamente o impacto que ele produziria nas relações de trabalho brasileiras, tendo como objetivo geral estabelecer qual seria o posicionamento dos tribunais trabalhistas a respeito da temática.
No que concerne a metodologia, cabe destacar que ela ocupa uma posição de destaque nesta pesquisa, tendo em vista tratar-se de um exercício teórico, não sendo, portanto, uma proposta factual. Cuida-se de uma analogia de um fenômeno estadunidense ao direito brasileiro.
Nessa senda, trata-se de uma pesquisa qualitativa em que o método de abordagem utilizado foi o hipotético dedutivo. Além disso, o método de investigação aplicado consistiu em revisão bibliográfica, legal e análise documental e jurisprudencial. Saliente-se ainda que a jurisprudência tem um papel essencial na metodologia, tendo em vista que o Disney look não existe no Brasil e que a elucidação do objetivo geral está condicionada a análise jurisprudencial.
Com o intuito de atingir os objetivos propostos, o presente estudo foi dividido em cinco capítulos no seu desenvolvimento, versando o primeiro capítulo sobre o que é o Disney look e os seus respectivos desenvolvimentos, sendo esse baseado no conteúdo disposto no referido manual, ora responsável por determinar aspectos da aparência dos trabalhadores da empresa.
Respectivamente, nos dois capítulos seguintes, houve uma contraposição entre os Estados Unidos e o Brasil no que concerne a questões políticas, econômicas e sociais. Nesse âmbito, foi discutido o grau da interferência estatal nas relações de trabalho em ambas as nações, bem como a suposta aplicação do Disney look no Brasil.
Em ato contínuo, no quarto capítulo ocorreu o debate acerca da principal celeuma relativa a hipotética inserção do Disney look no cenário brasileiro: a questão da não discriminação. Para tanto, foi analisado o disposto na legislação pátria a respeito de práticas discriminatórias e da forma de combate. De mais a mais, também foi visto como, na área jurídica, a discriminação é evitada nas relações de trabalho nos Estados Unidos, tendo sido feito um paralelo sobre qual das duas nações trata o assunto de forma mais abrangente.
Por fim, no último capítulo do desenvolvimento, foi demonstrado através de casos concretos como os tribunais trabalhistas brasileiros vem se posicionando em situações análogas ao Disney look no Brasil. Além disso, foram abordadas as consequências jurídicas da hipotética aplicação do manual estadunidense em território brasileiro.
Em 1955, foi fundado o primeiro parque temático da The Walt Disney Company: a Disneyland. Destacam-se, desde o surgimento da empresa, a dedicação e empenho em fazer com que sonhos se tornem realidade. Para tornar a imersão em um mundo mágico possível, a multinacional ateve, desde o princípio, uma enorme atenção aos detalhes.
Dentre as particularidades que tornam a empresa um caso de sucesso e completamente diferente das demais, ressalta-se a criação de um vocabulário específico: o funcionário é chamado de cast member, ou seja, de membro do elenco. O uniforme usado por eles é considerado costume, em outras palavras, eles usam uma fantasia. Os visitantes do parque são tratados como guests, isso é, convidados do show. O “glossário Disney” simboliza apenas um dos inúmeros aspectos que torna a empresa única. Segundo Nader (2014, p. 384):
“O tratamento ao público exige quase uma veneração ao visitante. Com um largo e franco sorriso – o big smile – e palavras gentis que não soem falsas, o funcionário precisa saber orientar e dosar a sensação de espanto e fascínio que domina o público em um dia de visita aos parques da Disney. Seria um crime roubar essa fascinação, pôr fim a seus sonhos, quebrar o encanto de suas fantasias. Por isso, os artistas precisam agir como se fossem literalmente membros de um elenco, dando-lhes a sensação de que todos, indiscriminadamente, são personagens de um grande espetáculo e fazem parte desse sonho.”
Nessa perspectiva, cabe destacar que o guest é tratado como VIP (Very Individual Person)[i], sendo colocado sempre como prioridade. Todos os detalhes são pensados para que eles tenham a melhor experiência possível durante o período em que estiverem no parque ou enquanto hóspedes de algum dos hotéis da Disney.
Diante desse propósito, a primeira lição que os funcionários aprendem quando entram na empresa, é a respeito da missão deles: “a de criar felicidade”. O desejo de atingir essa meta justifica hábitos comumente vistos no parque como o de dar indicações apontando com dois dedos, visto que em algumas culturas apontar utilizando apenas um dedo é considerado grosseiro.
Em meio essas minucias, surge também o Disney look, o código de aparência dos cast members. O guia possui 28 páginas e foi desenvolvido para tentar estabelecer um padrão e manter a qualidade e integridade da marca.
Saliente-se que todas as informações detalhadas na presente seção foram baseadas e retiradas do referido manual. O documento, ora listado nas referências bibliográficas deste estudo, encontra-se disponível no formato PDF na internet, sendo, portanto, acessível publicamente (THE WALT…, 2020).
A aparência ocupa uma posição de destaque nesse manual, sendo inclusive associada a ideia de excelência da empresa. Nesse sentido, impende mencionar trecho extraído da compilação (THE WALT…, 2020, p. 01), o qual aduz, em tradução livre do inglês para o português, que “independentemente da sua função, quando você se orgulha de sua aparência, você se torna um modelo para aqueles ao seu redor, e você transmite a atitude de excelência que se tornou sinônimo do nome da Disney”[ii]
Desse modo, resta evidente que a associação entre as regras estabelecidas no guia e a imagem da empresa é muito forte. Conforme o fragmento de texto supracitado, seguir as normas convencionadas e ter orgulho da aparência é considerado uma forma de servir de exemplo para os demais funcionários.
De um modo geral, o Disney look classifica como proibido tudo aquilo que possa ser considerado como “distração” para os visitantes do parque, assim como o que não se enquadre no melhor interesse da empresa (THE WALT…, 2020, p. 03). De forma mais específica, há uma série de restrições listadas no manual e que serão abordadas ao longo deste trabalho.
Há algumas dessas proibições que são genéricas e se aplicam a todos os funcionários, como é o caso do uso de óculos: não são permitidos óculos de sol que impossibilitem que os olhos sejam vistos, como por exemplo, os espelhados e os muito escuros. Tal regra fundamenta-se no fator de que isso pode bloquear a comunicação com os convidados. Já em relação aos óculos de grau, a restrição consiste no modelo da armação, que tem de ser de cor e estilo discretos e com a mínima aparição da marca (THE WALT…, 2020, p. 05).
Ainda nesse âmbito, outro ponto que merece ênfase é o das modificações ou alterações corporais. Todas as modificações intencionais que gerarem efeitos visíveis são proibidas, alguns dos exemplos que se encaixam nessa situação são as tatuagens, piercings e alargadores de orelha (THE WALT…, 2020, p. 06).
Uma outra observação expressa no manual diz respeito a higiene pessoal, na qual é exigido o uso de desodorantes e proibido o uso de fragrâncias fortes. Tais exigências são justificadas pelo contato próximo que há entre os funcionários e visitantes do parque (THE WALT…, 2020, p. 07).
Mister se faz realçar que há ainda uma parte do guia dedicada a restrições especificas para as mulheres e em seguida uma seção destinada aos homens. Em relação as mulheres, merece relevância as exigências em relação as unhas, cabelo, acessórios e joias.
Quanto as unhas, elas devem ser mantidas limpas. Caso sejam pintadas, a cor tem de ser “apropriada”, qual seja, neutra. Entre as cores elencadas como proibidas, estão: preto, dourado, cinza, colorido e neon. Outro ponto que chama a atenção é em relação a dimensão das unhas, que não podem exceder 6 milímetros (THE WALT…, 2020, p. 09).
Já em relação ao cabelo, os principais detalhes expressos no guia são os seguintes: tem que estarem limpos, naturais e bem cuidados; cabelos “artificiais”, o que inclui os coloridos artificialmente, são permitidos desde que pareçam naturais (THE WALT…, 2020, p. 09). Insta salientar o guia atual demonstra um “avanço” em relação ao anterior, que estabelecia que era necessário manter um estilo de cabelo clássico porque estilos extremos não eram permitidos; e que era proibido raspar a cabeça ou parte dela, bem como as sobrancelhas (THE WALT…, 2014, p. 09).
Os acessórios também englobam uma série de restrições: devem ser neutros ou combinando com a cor do uniforme; não podem ser usados mais do que 03 (três) acessórios por vez; e quanto as dimensões não podem ser maiores do que 5 cm de largura e 10 cm de comprimento (THE WALT…, 2020, p. 11).
Do mesmo modo, há limitações em relação ao uso de joias, sendo permitido o uso de colar, desde que modesto e em boas condições, e caso tenha um pingente anexado, não deve exceder uma polegada de tamanho. Quanto as pulseiras, só podem ser usadas no pulso e não devem exceder uma polegada de largura, sendo proibido o uso de tornozeleiras. Ademais, é permitido o uso de até 02 (dois) anéis, um em cada mão; e o de brincos, 01 (um) em cada orelha, desde que simples e devendo ser posicionados na parte inferior da orelha sem poder exceder o tamanho de 2,5 cm (THE WALT…, 2020, p. 12).
Na parte referente ao guia masculino, destacam-se os ditames sobre o estilo do cabelo, unhas e pelos faciais. Quanto a este último item, há algumas especificidades, tais como: mantê-los bem cuidados e arrumados para não exceder uma polegada de comprimento; a necessidade de que, caso se tenha barba, que esta seja bem arrumada e delineada, devendo inclusive os pelos do pescoço serem raspados (THE WALT…, 2020, p. 16-17). Além de tudo o que foi mencionado está escrito, há também figuras para ilustrar o preceituado. Conforme observe-se em gravuras extraídas do próprio manual ilustrando as restrições:
De mais a mais, é vedado modelar a barba ou bigode em um estilo particular, tendo em vista que foge do padrão profissional que a Disney apregoa. Ainda nesse âmbito, vale salientar que a permissão do uso do bigode é algo recente. No entanto, mudanças dessa magnitude não são comuns (DISNEY…, 2011, p.70):
“[…] mudanças na política não são implementadas levianamente. Quando Walt Disney World ajustou recentemente suas diretrizes para permitir bigodes, por exemplo, o que pareceu à primeira vista ser uma decisão simples na verdade demandou muita reflexão de discussões. Nem os funcionários nem o sistema jurídico gostarão de um retorno a uma política mais rigorosa uma vez que ela foi afrouxada.”
A rigidez também é observada quanto ao cabelo, que segue a mesma lógica do feminino na medida em que o estilo deve ser natural e que o cabelo artificial só é consentido desde que pareça natural. Outrossim, é imperioso ressaltar que o cabelo deve ser bem cortado e penteado para que não se estenda além ou cubra qualquer parte das orelhas ou do colarinho da camisa. Ademais, as costeletas devem ser bem aparadas, retas e uniformes em largura (THE WALT…, 2020, p. 18).
Já em relação as unhas, a curiosidade é em relação a dimensão, visto que não pode se estender além da ponta do dedo. Outrossim, exige-se que elas estejam limpas e consequentemente apresentáveis (THE WALT…, 2020, p. 18).
Interessante apontar que o uso de celular também entra na questão da aparência abordada pelo Disney look. O uso de aparelhos eletrônicos durante o trabalho é absolutamente proibido, devendo os equipamentos serem guardados no modo silencioso e de maneira que fique fora do campo de visão dos visitantes do parque (THE WALT…, 2020, p. 07). Percebe-se, através dessa restrição, outro elemento que contribui diretamente para o sucesso da maior empresa de entretenimento do mundo: a disciplina.
Pormenorizados os pontos relevantes no tocante ao guia de aparência da Disney, é fundamental ressaltar que ele é uma questão prevista contratualmente. Assim sendo, ao aceitar o emprego na empresa, ou até mesmo antes, desde o processo de entrevistas, quem está aplicando-se ao cargo sabe da existência desse manual e da necessidade de obedecê-lo. Ao ser contratado, para não restar dúvidas (NADER, 2014, p. 383-384):
“O candidato recebe um livreto que lhe explica detalhadamente o que se espera dele em termos de aparência, penteado, comprimento dos cabelos, etc. Tal procedimento faz com que não exista a possibilidade de uma informação incorreta ou de má interpretação. Isso se chama “atenção ao detalhe”. Todas essas instruções são escritas, e não verbais.”
Há inclusive na parte final do manual uma seção dedicada à política de disciplina da empresa (THE WALT…, 2020, p. 23), a qual é incisiva ao afirmar as consequências do descumprimento do Disney look. Os funcionários que falharem ao seguir o preceituado no guia podem sofrer uma punição disciplinar, uma espécie de advertência, ou até mesmo serem demitidos. Mister se faz evidenciar que mesmo os “protegidos” por Acordo Coletivo de Trabalho podem ser penalizados.
A importância dada à filosofia e à história da empresa é a principal justificativa para a necessidade de cumprimento do guia. A Disney é reconhecida mundialmente como sinônimo de excelência e de qualidade na prestação de serviços e isso se deve, em grande parte, aos cast members que fazem com que a mágica aconteça. Como bem disse Walt Disney em uma de suas céleres frases: “você pode sonhar, criar, projetar e construir o lugar mais maravilhoso do mundo […] mas são necessárias pessoas para fazer do sonho um realidade” (DISNEY…, 2011, p. 63).
As pessoas a quem o fundador da Disney se refere são aos membros do elenco, peças-chave para o sucesso da empresa. Nesse sentido, cabe destacar que o processo de seleção a que os funcionários são submetidos é rigoroso (NADER, 2014, p. 383):
“A entrevista a que se submetem os candidatos não é conduzida por um especialista em recursos humanos, mas por um funcionário que fez carreira na empresa. Nessa fase, são selecionadas pessoas amistosas, de personalidade envolvente, que transmitem uma atitude positiva diante da vida. São procurados estudantes ou profissionais discretos, com boa apresentação, que se expressem com clareza e determinação. Durante a entrevista, caso seja verificado que o candidato é do “tipo Disney” e se enquadra no Disney look, e, caso haja vaga para o cargo solicitado, fica acertado de imediato que ele passará a fazer parte do elenco. Após a seleção, o futuro “artista” é despachado para a Universidade Disney, na qual será “doutrinado”.”
Para fazer com que os cast members incorporem o legado deixado por Walt, todos passam por uma espécie de treinamento chamado Traditions. É nesse momento em que são discutidos os principais pilares da empresa e a importância de seguir o Disney look.
“Trata-se de um curso introdutório à produção de espetáculos da Disney. Por exemplo, o Traditions explica por que a aparência do elenco deve refletir o cenário e a história quando eles se apresentam para os convidados. Os parques temáticos da Disney foram muitas vezes elogiados, e criticados, pelas suas rigorosas diretrizes relativas à aparência pessoal do elenco. Apesar de alguns observadores terem tentado politizar a questão, normas referentes a corte de cabelo, joias, cosméticos, etc. foram criadas por razões lógicas de negócios. Elas são relacionadas direta e claramente ao padrão de atendimento do Espetáculo. Para que uma política como essa seja justa com os funcionários além de legal, ela deve ser sistematicamente interpretada e aplicada. Os membros do elenco da Disney são informados das diretrizes de aparência ao longo de todo o processo de recrutamento e, sem exceção, não podem participar do treinamento Traditions e começar a trabalhar enquanto sua aparência pessoal não estiver de acordo (DISNEY…, 2011, p. 69-70).”
Portanto, é nítido que o conjunto de regras que compõem o Disney Look tem impacto direto no modo como a empresa é vista e reconhecida. A aparência tem total correlação com a filosofia empresarial e com o que ela almeja refletir. Desse modo, merece relevância o fato de que por ser expressamente previsto contratualmente, o guia encontra amparo na legislação estadunidense. Reforçando assim a liberdade e autonomia que há para se pactuar nos Estados Unidos de maneira juridicamente lícita e sem a recorrente presença e interferência do Estado, como acontece no Brasil, através do dirigismo estatal.
Faz-se mister salientar que o Disney look não é um fenômeno brasileiro. Conforme já foi mencionado no capítulo anterior, trata-se de um guia de aparência de uma empresa que encontra amparo na legislação estadunidense. Desse modo, merece relevância o motivo de o manual transcorrer de forma natural, sem muitas críticas, no território americano. Para tanto, há algumas características que precisam ser analisadas, dentre elas: o estado liberal e a autonomia dos indivíduos.
Os Estados Unidos é reconhecidamente um país economicamente liberal, situação essa que gera impacto não somente na economia, mas em todas as outras áreas. Assim sendo, uma das principais consequências desse tipo de política e economia é a ampla autonomia dos indivíduos.
Nesse sentido, para que essa pregada independência aconteça, a interferência estatal deve ser mínima, de modo que se limite a estipular normas cabíveis a situações gerais. Assim, os indivíduos poderão ser livres para se posicionar dependendo das circunstâncias de tempo e lugar, tendo em vista que somente eles têm conhecimento pleno sobre a conjuntura em que estão inseridos (HAYEK, 2010, p. 91).
Isto posto, impende mencionar que o Disney look é então fruto da autonomia da vontade das partes em uma relação contratual, não havendo, portanto, o intervencionismo do Estado, bem como o dirigismo estatal que há no Brasil. Sobre o aspecto da intervenção e o liberalismo econômico, Smith (1996, p. 438) preceitua que:
“Portanto, já que cada indivíduo procura, na medida do possível, empregar seu capital em fomentar a atividade nacional e dirigir de tal maneira essa atividade que seu produto tenha o máximo valor possível, cada indivíduo necessariamente se esforça por aumentar ao máximo possível a renda anual da sociedade. Geralmente, na realidade, ele não tenciona promover o interesse público nem sabe até que ponto o está promovendo. Ao preferir fomentar a atividade do país e não de outros países ele tem em vista apenas sua própria segurança; e orientando sua atividade de tal maneira que sua produção possa ser de maior valor, visa apenas a seu próprio ganho e, neste, como em muitos outros casos, é levado como que por mão invisível a promover um objetivo que não fazia parte de suas intenções. Aliás, nem sempre é pior para a sociedade que esse objetivo não faça parte das intenções do indivíduo. Ao perseguir seus próprios interesses, o indivíduo muitas vezes promove o interesse da sociedade muito mais eficazmente do que quando tenciona realmente promovê-lo. Nunca ouvi dizer que tenham realizado grandes coisas para o país aqueles que simulam exercer o comércio visando ao bem público. Efetivamente, é um artifício não muito comum entre os comerciantes, e não são necessárias muitas palavras para dissuadi-los disso.
É evidente que cada indivíduo, na situação local em que se encontra, tem muito melhores condições do que qualquer estadista ou legislador de julgar por si mesmo qual o tipo de atividade nacional no qual pode empregar seu capital, e cujo produto tenha probabilidade de alcançar o valor máximo. O estadista que tentasse orientar pessoas particulares sobre como devem empregar seu capital não somente se sobrecarregaria com uma preocupação altamente desnecessária, mas também assumiria uma autoridade que seguramente não pode ser confiada nem a uma pessoa individual nem mesmo a alguma assembléia ou conselho, e que em lugar algum seria tão perigosa como nas mãos de uma pessoa com insensatez e presunção suficientes para imaginar-se capaz de exercer tal autoridade.”
Um dos conceitos extraídos do trecho supracitado é o da “mão invisível”. Ao se referir a esse termo na obra, Adam Smith buscou mostrar que o mercado poderia se “autorregular”, como se de certa forma houvesse uma mão invisível o ajudando. Fortalecendo, portanto, a ideia da intervenção mínima do Estado e da necessária autonomia dos indivíduos para negociar.
Outro filósofo que também defende a liberdade dos indivíduos é Nozick (1991). O autor norte-americano enxerga o Estado Mínimo sob uma ótica inovadora, critica o utilitarismo e de certa forma legitima a desigualdade econômica ao criticar a padronização e a intervenção além do necessário do Estado. Conforme Nozick (1991, p. 48-183):
“Não há uma compensação moral a cargo de outros em nossa vida que leve a um bem social maior. Nada justifica o sacrifício de um pelos demais. Esta idéia fundamental, isto é, a ideia de que há diferentes indivíduos, com vidas separadas, de modo que ninguém pode ser sacrificado pelos demais, fornece base à existência das restrições morais indiretas […] O Estado Mínimo é o mais extenso que se pode justificar. Qualquer outro mais amplo viola direitos da pessoa […] o Estado mais amplo se justifica, porque é necessário (ou é o melhor instrumento) para se conseguir justiça distributiva […] nenhum princípio de estado final ou distributivo padronizado de justiça pode ser continuamente implementado sem interferência continua na vida das pessoas. Qualquer padrão preferido seria transformado pelo princípio em outro não favorecido, ou por pessoas que resolvessem agir de maneiras diferentes, como por exemplo trocando bens e serviços com outras pessoas ou dando a estas pessoas coisas a que elas tinham direito de acordo com o padrão distributivo preferido.”
Complementando o acima mencionado, o também filósofo Michael J. Sandel (2016) faz um contraponto interessante ao confrontar o utilitarismo e a ideologia libertária. Para defender a primeira premissa, ele demonstra de forma quantitativa a desigualdade astronômica presente nos Estados Unidos, tendo em vista que mais de um terço da riqueza do país pertence a cerca de 1% dos americanos mais ricos. Por outro lado, para sustentar a segunda teoria, ele afirma que para alguns a desigualdade econômica não é considerada injusta desde que não seja fruto do uso da força ou de fraude (SANDEL, 2016, p. 77).
Ademais, o filósofo estadunidense justifica que os libertários tutelam a existência de mercados livres e são contrários a regulamentação do governo em prol da liberdade humana. Tal argumento se baseia no fato de que a liberdade é um direito fundamental deve ser respeitado, tendo como limite o direito do outro de fazer o mesmo (SANDEL, 2016, p. 78).
Ainda na seara do liberalismo, cumpre evidenciar a íntima relação entre política e economia:
“Afirma-se muitas vezes que a liberdade política nada significa sem a liberdade econômica. Isto em parte é verdade, porém num sentido quase oposto ao usado pelos defensores da planificação. A liberdade econômica que constitui o requisito prévio de qualquer outra liberdade não pode ser aquela que nos libera dos cuidados econômicos, segundo nos prometem os socialistas, e que só se pode obter eximindo o indivíduo ao mesmo tempo da necessidade e do poder de escolha: deve ser a liberdade de ação econômica que, junto com o direito de escolher, também acarreta inevitavelmente os riscos e a responsabilidade inerentes a esse direito. (HAYEK, 2010, p. 110-111).”
Destarte, resta evidente que a permissão e aceitação do Disney look nos Estados Unidos resulta de uma combinação de diversos fatores, quais sejam: o liberalismo econômico, a política capitalista, a autonomia dos indivíduos e a quase ausência do dirigismo estatal.
Outrossim, pode-se dizer também que é uma questão cultural a medida em que os indivíduos pactuam com o sistema ao concordarem com o que é imposto contratualmente sem “reclamar”. A ausência de contestação ocorre justamente porque os estadunidenses enxergam o contrato como algo que eles têm a liberdade de aceitar ou não. Desse modo, ao aceitá-lo, há o conhecimento prévio do regime de trabalho a que serão submetidos, bem como das condições para necessárias a serem cumpridas para permanecer no emprego. Portanto, queixar-se das exigências estipuladas previamente no contrato, seria ir de encontro a algo que ele, o empregado, tinha aceitado anteriormente ao assinar o contrato.
Em virtude dos pontos acima tratados que verifica-se a baixa demanda de ações trabalhistas contra a The Walt Disney Company. Pelo menos não no que se refere as questões dispostas no manual relativas a aparência dos funcionários, quais sejam: a cor do cabelo, a necessidade de esconder as tatuagens, a proibição de determinados acessórios e todas as outras exigências já mencionadas no capítulo anterior.
A falta de repercussão judicial e legislativa acerca do preceituado no Disney look comprova a importância dada a autonomia dos indivíduos. No entanto, é imperioso destacar que mesmo diante da ausência de processos referentes aos quesitos relacionados a aparência, a The Walt Disney Company já foi e continua sendo ré em inúmeras ações judiciais com diversas problemáticas. Todavia, a empresa de entretenimento costuma ganhar a esmagadora maioria dos processos.
Corroborando com o já aludido, merece destaque a análise de forma quantitativa de dados levantados acerca das demandas judiciais envolvendo a companhia em estudo. De uma amostra de 1.300 casos analisados, apenas 265 foram para julgamento, o que estatisticamente representa apenas 20%. Não obstante a pequena fração de ações que chegaram a julgamento, dentre elas a Disney venceu 231, ou seja, a quase totalidade (KOENIG, 2015, p. 208).
Ademais, outro dado curioso é o fato de que a quase totalidade dos processos contra a Disney foi movida pelos visitantes do parque. Essa situação é interessante porque em lugares como o Brasil, por exemplo, é comum e vasto o número de ações judiciais dos empregados contra grandes empresas. Em relação aos funcionários da Disney, a conjuntura foi diferente, e as causas possíveis causas para isso são as leis de compensação dos trabalhadores ou o amor a empresa (KOENIG, 2015, p. 187).
Dessa maneira, consta-se que além dos aspectos relativos ao Estado liberal e a autonomia dos indivíduos, a filosofia da Disney e os valores que a empresa representa contribuem para que os funcionários não promovam ações judicias contra a companhia. Fato notório que se revela nos casos que se tornam emblemáticos e ganham grande repercussão, a exemplo do da funcionária muçulmana que processou a Disney após ter sido proibida de usar o véu, qual seja hijab, no ambiente de trabalho. Para solucionar a situação, a empresa ofereceu que a cast member passasse a ocupar uma posição em que não pudesse ser vista pelos visitantes do parque. Todavia, ela não aceitou e decidiu entrar com a ação judicial (HOLPUCH, 2012). Mas como já foi dito anteriormente, a via judicial é uma opção minoritária entre os funcionários para a resolução dos conflitos.
Diante de todos os argumentos e dados elencados, torna-se compreensível o por quê de o Disney look ser amplamente aceito nos Estados Unidos.
Superada a explicação do por quê do Disney look ser aceito nos Estados Unidos, merece destaque a análise de como – hipoteticamente – visto que se trata de um exercício de projeção, esse fenômeno seria analisado pelo ordenamento jurídico brasileiro. Para tanto, antes de adentrar no âmbito efetivamente jurídico, é preciso analisar os principais aspectos que permeiam a política e a economia brasileira.
Primariamente, é imperioso mencionar que o Brasil, diferentemente dos EUA, não é um Estado Liberal. Muito pelo contrário, é tido como um Estado Social[v], visto que a Constituição Federal de 1988 é considerada uma Carta Social Democrática que tem como princípio norteador o da dignidade da pessoa humana. Desse modo, para garanti-lo, a intervenção estatal se faz necessária. Acerca do Estado Social, Bonavides (2017, p. 186) o caracteriza e o exemplifica como:
“Quando o Estado, coagido pela pressão das massas, pelas reivindicações que a impaciência do quarto estado faz ao poder político, confere, no Estado constitucional ou fora deste, os direitos do trabalho, da previdência, da educação, intervém na economia como distribuidor, dita o salário, manipula a moeda, regula os preços, combate o desemprego, protege os enfermos, dá ao trabalhador e ao burocrata casa própria, controla as profissões, compra a produção, financia as exportações, concede o crédito, institui comissões de abastecimento, provê necessidades individuais, enfrenta crises econômicas, coloca na sociedade todas as classes na mais estreita dependência de seu poderio econômico, politico e social, em suma, estende sua importância a quase todos os domínios que dantes pertenciam, em grande parte, à área de iniciativa individual, nesse instante o Estado pode, com justiça, receber a denominação de Estado Social.”
Isto posto, impende destacar que Bonavides (2007) considera o Estado Social uma espécie de evolução do Estado Liberal, ponderando ser o atual melhor e mais justo do que o anterior. Nessa seara, faz-se mister salientar que no âmbito do Direito do Trabalho, o dirigismo estatal intervém nas relações particulares de trabalho como uma forma de assegurar os direitos e garantias mínimas dos trabalhadores, criando de certa forma uma relação de dependência Estado – indivíduo.
Contrapondo-se a todas as características expostas no capítulo anterior a respeito do liberalismo, o dirigismo estatal mostra-se como uma forma de interferência do Estado nas relações privadas. Nos contratos, por exemplo, a ingerência estatal ampara-se na tentativa de tornar a relação contratual menos desigual, visando, portanto, a igualdade jurídica ao limitar a autonomia das partes e a liberdade de contratar. Todavia, isso fez com que o interesse privado não fosse colocado acima do interesse público, podendo então ser considerada como uma forma de proteção as partes.
Por outro lado, importa apontar que dois dos fundamentos do Estado Democrático de Direito são os referentes aos valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, dispostos no art. 1º , inciso IV, da Constituição Federal. Desse modo, resta evidente que há um conflito aparente entre eles, já que a livre iniciativa é limitada, ainda que essa demarcação não ocorra de forma expressa. No entanto, é clara a busca da Carta Magna no sentido de efetivar uma concordância entre esses princípios constitucionais, não sendo em vão o fato de estarem posicionados no mesmo inciso.
Cabe destacar ainda que a relevância dada aos princípios se repete no preceituado no art. 170[vi] da CF/88, que os coloca como uma forma de garantia de uma existência digna. Nessa senda, ressalva-se ainda que a presente pesquisa retrata o âmbito principiológico e não aplicabilidade de tais princípios.
Ademais, impende colocar que segundo preceitua Eros Grau (2014, p. 34-93) a intervenção estatal na economia não deve ser vista como uma forma de limitação, mas sim como um princípio de segurança, sendo uma ferramenta para diminuir os riscos, tanto para os indivíduos quanto para as empresas, visto que é imprescindível para a manutenção do sistema capitalista. Para o ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) e autor da obra acima citada, no que concerne aos contratos, as limitações a liberdade são ponderalíssimas, tanto ao relacionado a liberdade de contratar como a de não contratar.
As limitações são uma consequência do fato de que no Direito do Trabalho o contrato de trabalho brasileiro é regido por uma legislação heterônoma, quais sejam, a Consolidação das Leis do Trabalho – CLT e a Constituição Federal.
Assim sendo, há itens no contrato que são considerados uma imposição estatal, como principal exemplo, deve-se mencionar os direitos trabalhistas, que são indisponíveis por serem de ordem pública. A garantia desses direitos é assegurada legalmente pelo disposto no art. 7o da Carta Magna, dentre eles, cita-se: a irredutibilidade salarial, o salário mínimo, o Fundo de Garantia de Tempo de Serviço (FGTS), seguro-desemprego e a duração do trabalho normal não superior a oito horas diárias e quarenta e quatro semanais.
É nessa perspectiva que entra a questão Estado Social, da justiça e da defesa dos interesses sociais, tendo em vista que há proteção – ainda que mínima – para que o Estado possa proteger o indivíduo que é colocado em uma posição de hipossuficiência, conduta que não acontece em um Estado Liberal.
Corroborando com o supracitado, Ferrajoli (2012, p. 24-56) defende a teoria do garantismo como uma forma de assegurar os direitos sociais e de demonstrar a força dada ao que é disposto constitucionalmente. Ele esclarece que:
“A teoria do direito, o constitucionalismo positivista ou garantista é uma teoria que tematiza a divergência entre o dever ser (constitucional) e o ser (legislativo) do direito. […] o constitucionalismo equivale a um projeto normativo que exige ser realizado através da construção, mediante políticas e leis de atuação, de idôneas garantias e instituições de garantia. Por isto, como escrevi outras vezes, o garantismo é a outra fase do constitucionalismo. […] Comporta, em síntese, o reconhecimento de uma normatividade forte das Constituições rígidas, em razão da qual, estabelecido constitucionalmente um direito fundamental, se a Constituição é levada a sério, não devem existir normas com ele em contradição.”
É por intermédio dessa proteção e das garantias fundamentais mínimas que os indivíduos conseguem ter a liberdade de reivindicar cláusulas contratuais que vão de encontro ao que lhes é assegurado. Tal possibilidade propicia uma redução na desigualdade entre as partes nas negociações privadas.
Outrossim, ainda na esfera das diferenças entre o Brasil e os EUA, é importante mencionar outro ponto divergente: o modo como o princípio do pacta sunt servanda é considerado. O brocardo em latim simboliza a força obrigatória dos contratos, sendo popularmente conhecido através da expressão “o contrato faz lei entre as partes”, sendo, portanto, uma consequência da liberdade contratual e da autonomia da vontade das partes.
Nos Estados Unidos, esse princípio encontra amparo legal, visto que está previsto na Constituição estadunidense, especificamente no art. 1o, seção 10, cláusula 1. Fortalecendo, portanto, os argumentos elencados no capítulo anterior para a aceitação do Disney look no território americano. O contrato assinado é fruto da autonomia da vontade das partes e o que nele é estabelecido deve ser cumprido, não devendo o Estado ir de encontro ao que foi definido contratualmente.
Entretanto, no Brasil, como já foi mencionado, a liberdade contratual encontra limitações e essa situação não é diferente quando se trata do pacta sunt servanda, posto que esse princípio fica em segundo plano quando em conflito com o princípio da função social do contrato, com fulcro no art. 421[vii] do Código Civil de 2002. Portanto, não é considerado absoluto e um exemplo disso é em contratos nos quais haja a obrigação de prestações desproporcionais, assim como evidente desigualdade entre as partes, tal como o contrato de adesão. Isso acontece porque o dirigismo estatal limita a autonomia de vontade das partes para que a função social do contrato seja preservada.
Dessa forma, a necessidade de equilíbrio entre as partes se justifica no fato de que o contrato não necessariamente gera efeitos apenas entre as partes, visto que em algumas situações, os resultados podem atingir a coletividade. Em vista disso, faz-se necessária a intervenção estatal para garantir que o interesse público, o legislado, esteja acima do interesse privado, do negociado. Apesar de haver uma tendência recente, com o advento da Reforma Trabalhista, para que aconteça o contrário.
Nessa seara, é necessário recordar a importância e poder do princípio da dignidade da pessoa humana no ordenamento jurídico brasileiro, uma vez que esse princípio é o responsável por amparar os direitos fundamentais garantidos pela Constituição. Nesse contexto, ao Estado seria imposta a função de tutelar esses direitos, protegê-los e observá-los, assumindo um caráter preventivo com o intuito de evitar a violação dos direitos por particulares (DIMOULIS; MARTINS, 2012, p. 114-115). O que demonstra, mais uma vez, a importância da intervenção estatal.
Volvendo-se a questão da liberdade, cabe destacar que Silva (2013, p. 805- 806) reforça todos os argumentos já elencados ao afirmar que:
“A liberdade de iniciativa envolve a liberdade de indústria e comércio ou liberdade de empresa e a liberdade de contrato. Consta do art. 170, como um dos esteios da ordem econômica, assim como de seu parágrafo único, que assegura a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo casos previstos em lei. […] Ora, a evolução das relações de produção e a necessidade de propiciar melhores condições de vida aos trabalhadores, bem como o mau uso dessa liberdade e a falácia da “harmonia social dos interesses” do Estado liberal, fizeram surgir mecanismos de condicionamento da iniciativa privada, em busca da realização de justiça social, de sorte que o texto supratranscrito do art. 170, parágrafo único, sujeito aos ditames da lei, há de ser entendido no contexto de uma Constituição preocupada com a justiça social e o bem-estar coletivo.”
Assim sendo, o constitucionalista se assemelha ao já aludido posicionamento de Paulo Bonavides, ao posicionar a Constituição no Estado Social e demonstrar que dentro dessa conjectura há uma preocupação com a justiça social. Preocupação essa que não acontece no regime estadunidense, pelo menos não nos moldes em que ocorre no Brasil. Corroborando com o explanado, Gordillo (1977, p. 74) esclarece que:
“A diferença básica entre a concepção clássica do liberalismo e a do Estado de Bem-Estar, é que enquanto naquela se trata tão-somente de colocar barreiras ao Estado, esquecendo de fixar-lhe também obrigações positivas, aqui sem deixar de manter as barreiras, se lhe agregam finalidades e tarefas às quais antes não se sentia obrigado. A identidade básica entre Estado de Direito e Estado de Bem-Estar, por sua vez, reside em que o segundo toma e mantém do primeiro o respeito aos direitos individuais e é sobre esta que constrói seus próprios princípios.”
Diante de tudo o que já foi exposto, é visível as diferenças políticas e econômicas entre os Estados Unidos e o Brasil. As divergências acabam por refletir diretamente na legislação de ambos os países, e principalmente, no modo como as pessoas se comportam, o que justifica, portanto, o fato de o Disney look ser aceito nos EUA. Quanto ao Brasil, perante todas os antagonismos já mostrados, a reação seria diferente, como será demonstrado nos próximos capítulos.
Após a discussão acerca dos aspectos políticos e econômicos referentes ao Brasil e aos Estados Unidos, merece realce a principal celeuma a respeito do hipotético impacto Disney look no território brasileiro: a questão da não discriminação. Nesse contexto, faz-se mister debater alguns tópicos: o conceito de discriminação, como o ordenamento nacional e internacional abordam essa temática e qual das nações em comento está mais próxima das diretrizes internacionais.
Inicialmente, cabe destacar que a discriminação está diretamente relacionada a igualdade. Levando-se em consideração o viés sociológico, Hannah Arendt (2004, p. 272-273) faz um paralelo entre esses dois conceitos:
“[…] a segregação é a discriminação imposta pela lei, e a dessegregação não pode fazer mais do que abolir as leis que impõem a discriminação; não pode abolir a discriminação e forçar a igualdade sobre a sociedade, mas pode e na verdade deve impor a igualdade dentro do corpo político. Pois a igualdade não tem a sua origem no corpo político; a sua validade é claramente restrita à esfera política. Apenas nesse âmbito todos são iguais. […] O que é a igualdade para o corpo político – seu princípio intrínseco -, a discriminação é para sociedade. A sociedade é essa esfera curiosa, um tanto híbrida, entre o político e o privado em que, desde o início da era moderna, a maioria dos homens tem passado a maior parte da vida. […] sem algum tipo de discriminação, a sociedade simplesmente deixaria de existir e possibilidades muito importantes de livre associação e formação de grupos desapareceriam.”
O trecho supracitado da filósofa alemã foi escrito levando-se em conta uma análise da questão racial na sociedade estadunidense. No entanto, mesmo diante desse contexto, as concepções expostas são relevantes e precisam ser analisadas. Hannah Arendt defende que a igualdade acontece apenas no âmbito político, e diante da diversidade presente na sociedade, ela enxerga a discriminação como uma forma de manutenção da existência social.
No entanto, para Arendt (2004, p. 274), há limites aceitáveis para a discriminação. Essa seria justificável quando restrita a esfera social, sendo inclusive um grande desafio preservá-la nesse âmbito, porque a partir do momento em que ela transpusesse essa área e adentrasse o setor político e pessoal, se tornaria inaceitável e maligna.
Rawls (2000, p. 108-111), filósofo norte-americano, associa a igualdade a ideia de liberdade e justiça. Ele assemelha-se um pouco ao pensamento supramencionado de Arendt, a medida que em que aceita existência das desigualdades. Todavia, visando uma sociedade equitativa, Rawls criou o que ele chamou de “princípio da diferença”, conforme esse princípio, a distribuição natural de aptidões que a sociedade é submetida não é considerada justa nem injusta e, portanto, não devem ser impostas “barreiras” aos mais afortunados. Pelo contrário, deve-se incentivá-los para que alcancem o melhor e compartilhem o resultado com os que não detém da mesma sorte, o que possibilitaria uma redução na desigualdade e de certa forma uma oferta de oportunidades mais igualitárias.
Saltando-se das concepções mais antigas para a atualidade, merece destaque um tema que recentemente tem sido constantemente trazido à baila: o preconceito em relação as lésbicas, gays, bissexuais e transexuais (LGBT). Além de em uma quantidade considerável de países continuar-se a criminalizar a homossexualidade, há ainda lugares em que novas leis discriminatórias estão sendo criadas. A preocupação é tamanha que a Organização das Nações Unidas (ONU) em 2011 adotou a primeira resolução referente ao assunto, englobando direitos humanos, orientação sexual e identidade de gênero (OIT, 2014, p. 7).
Nessa seara, é imperioso mencionar o modo como o Brasil se posiciona no que concerne a discriminação. O ordenamento jurídico pátrio veda as práticas discriminatórias através de vários meios, a começar pela lei fundamental da nação, a Carta Magna, e a seguir pela Lei nº 9.029/95 e pelos princípios do Direito do Trabalho nas relações de emprego. Na esfera internacional, a vedação também acontece, a exemplo da Convenção nº 111 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).
A Constituição Federal de 1988 é um símbolo contra a discriminação. No entanto, antes de abordar as proibições e proteções acerca dessa temática, deve-se reforçar que conforme já aludido, a igualdade está diretamente relacionada a esse assunto. No ordenamento jurídico brasileiro, além de ser considerada um princípio, ela está prevista no artigo 5o, caput, da CF/88, que dispõe que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes”.
O artigo mencionado acima assegura o tratamento isonômico de todos perante a lei, o que também é conhecido pela denominação de igualdade formal. Todavia, levando-se em consideração o contexto que em que a Constituição está inserida e o que já foi abordado sobre o Estado Social, deve-se entender a igualdade prevista no aludido artigo como além da formal.
Segundo Silva (2014, p. 215-217) o dispositivo supracitado não deve ser entendido de forma restrita, já que a constituição busca aproximar a isonomia formal da material. Nesse sentido, o autor remete a célere frase do filósofo Aristóteles “devemos tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na medida de sua desigualdade”.
Portanto, seria errôneo extrair do art. 5º a ideia de que todos devem ser tratados de forma igual, visto que caso exista motivação para que o indivíduo seja tratado de forma desigual, assim deve acontecer. Essa afirmação justifica o disposto no capítulo anterior a respeito da intervenção estatal como uma forma de garantia dos direitos fundamentais.
Além disso, fundamenta também a existência e aceitação da discriminação positiva no ordenamento jurídico brasileiro como uma forma de compensar aqueles em situação de hipossuficiência, visando extinguir ou reduzir a condição de desigualdade a que estão submetidos, assegurando, assim, o princípio norteador da constituição: o da dignidade da pessoa humana.
Nessa senda, é salutar abordar outros valores também previstos no referido artigo, precisamente no inciso X, que afirma que “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurando o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”. Assim sendo, infere-se que o que está sendo discutido neste trabalho transcende a questão da discriminação, envolvendo também os valores elencados acima, que, saliente-se, são considerados direitos fundamentais.
Transpondo-se a abordagem do artigo supracitado e dos valores nele mencionados para a esfera do Direito do Trabalho, faz-se mister retornar a questão do estabelecido no Disney look. O código de aparência da empresa estadunidense prevê categoricamente normas que interferem na privacidade dos funcionários. Nos EUA, como foi visto no segundo capítulo do trabalho em tela, o regramento especifico transcorre dentro de uma verdadeira normalidade.
No entanto, o Brasil, conforme já aludido, diverge em muitos aspectos dos Estados Unidos. Desse modo, a respeito do hipotético impacto do Disney look no território brasileiro, o inciso exposto ocupa uma posição de destaque ao considerar a privacidade como inviolável. Sendo assim, é essencial observar o limiar entre o acordado no âmbito profissional e a invasão descabida na seara pessoal. Tal discussão será pormenorizada e exemplificada através de casos concretos no capitulo seguinte.
Ademais, é importante especificar as proibições expressas presentes na Carta Magna quanto a discriminação. A relevância dada a esse assunto é enorme, tendo em vista constituir um dos objetivos fundamentais da nação, o de “promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”, conforme o disposto no artigo 3o, IV. No que se refere a cor, destaque-se que “a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito a pena de reclusão, nos termos da lei” (art. 5o, XLII, CF). Ainda no âmbito constitucional, outra vedação as práticas discriminatórias encontram arrimo no artigo 7o, caput, incisos XXX e XXXI, respectivamente:
“Art. 7o São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: […] XXX – proibição de diferenças de salários, de exercícios de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil; XXXI – proibição de qualquer discriminação no tocante a salário e critérios de admissão do trabalhador portador de deficiência;”
Além da ampla vedação prevista na Constituição Federal, há proibições ainda mais específicas na esfera do Direito do Trabalho. A Lei no 9029/95, por exemplo, reforça os impedimentos constitucionais e acrescenta outros no que concerne as relações de trabalho. Segundo o artigo 1o:
“Art. 1o É proibida a adoção de qualquer prática discriminatória e limitativa para efeito de acesso à relação de trabalho, ou de sua manutenção, por motivo de sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar, deficiência, reabilitação profissional, idade, entre outros, ressalvadas, nesse caso, as hipóteses de proteção à criança e ao adolescente previstas no inciso XXXIII do art. 7o da Constituição Federal.”
Compreende-se portanto que o rol elencado na lei não é taxativo, mas meramente exemplificativo, o que significa dizer que qualquer outro ato discriminatório ao empregado encontra-se abrangido pelo artigo supracitado. Assim sendo, mister se faz destacar que a possibilidade de estendê-lo viabiliza maior proteção no enfrentamento as práticas discriminatórias (CASSAR, 2017, p. 1162).
Outrossim, no artigo 2o, I, da aludida lei foi estabelecido que “a exigência de teste, exame, perícia, laudo, atestado, declaração ou qualquer outro procedimento relativo à esterilização ou a estado de gravidez” constitui crime com pena de detenção de um a dois anos e multa. Ademais, nos parâmetros dessa lei é asseverado a quem foi vítima de discriminação o direito à reparação pelo dano moral, podendo ser cumulado com outras medidas, conforme aduz o artigo 4º.
Já na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), também há vedação a discriminação a medida em que a lei assegura pagamento igual para funções idênticas, conforme dispõe o artigo 461, caput, que “sendo idêntica a função, a todo trabalho de igual valor, prestado ao mesmo empregador, no mesmo estabelecimento empresarial, corresponderá igual salário, sem distinção de sexo, etnia, nacionalidade ou idade”.
Outro aspecto importante no combate a discriminação são os princípios do Direito do Trabalho, sendo o da não discriminação o principal para a discussão em comento, visto que possibilita a proteção contra a discriminação por diversas razões. Impende mencionar ainda que a magnitude desse princípio não se restringe ao ordenamento jurídico nacional, tendo em vista que é garantido no âmbito internacional através da Convenção no 111 da OIT, que, ressalte-se, é ratificada pelo Brasil. Nesse sentido:
“Art. 1o — Para os fins da presente convenção o termo “discriminação” compreende:
Desse modo, depreende-se do artigo acima mencionado que seguir o preceituado na Convenção é uma forma de assegurar o princípio da igualdade. Além disso, diante de tudo o que já foi exposto a respeito do ordenamento jurídico pátrio, percebe-se que a Convenção Internacional foi integrada pelo conjunto de normas brasileiras.
De mais a mais, ainda na esfera internacional, impende destacar que a proteção ao princípio da igualdade também encontra amparo na Declaração Universal dos Direitos Humanos, conforme o disposto nos artigos 1o, 2o e 7o. De acordo com o artigo 2o, “todo ser humano tem capacidade para gozar os direitos e as liberdades […], sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, idioma, religião, opinião pública ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza, nascimento, ou qualquer outra condição”.
Depois de expostas as vedações legais as práticas discriminatórias no Brasil e no âmbito internacional, merece destaque como essa temática é abordada pela legislação estadunidense.
Os Estados Unidos, conforme já aludido, adota a conduta de um Estado Liberal, que se difere muito do Brasil. Contudo, é essencial salientar que mesmo diante das divergências, o ordenamento jurídico estadunidense também combate a discriminação.
Inicialmente ressalta-se que inversamente daquilo praticado no Brasil, em que há um número considerável de leis e artigos, nos Estados Unidos a quantidade de normas escritas é bem menor, sendo as sentenças baseadas no Direito Consuetudinário. No entanto, assim como no Brasil, nos EUA a igualdade ocupa uma posição relevante, a medida em que é garantida através da Décima Quarta Emenda à Constituição, que dispõe que:
“Todas as pessoas nascidas ou naturalizadas nos Estados Unidos, e sujeitas a jurisdição dele são cidadãos dos Estados Unidos e do Estado onde residirem. Nenhum Estado poderá fazer ou executar leis que restrinja os privilégios ou as imunidades dos cidadãos dos Estados Unidos; nem poderá nenhum Estado privar qualquer pessoa de vida, liberdade, ou bens sem processo legal; ou negar a qualquer pessoa sob sua jurisdição a igual proteção das leis.”[viii]
Infere-se do trecho acima a Cláusula de Proteção Igual, que possibilita a igualdade formal. A Emenda foi ratificada em 1868 e motivação para a criação dela foi a de acabar com a discriminação contra os negros, a história segregação racial estadunidense. Não obstante a razão do seu surgimento, ela vem sendo usada para além da questão racial, através de uma interpretação extensiva no enfrentamento as práticas discriminatórias (FITZPATRICK; SHAW, 2018).
Ademais, há uma lei específica contra a discriminação nas relações de trabalho, intitulada Employment Discrimination Law. A lei federal estadunidense estabelece um rol de características resguardadas pela legislação, também conhecidas como Protected Classes, qual seja, classes protegidas. O grupo amparado legalmente engloba: raça, cor, religião, sexo e origem nacional, conforme disposto no Título VII da Lei dos Direitos Civis de 1964. Mister se faz salientar que tais critérios foram ampliados através de emendas, com a extensão da proteção nas relações de emprego a idade, deficiência, gravidez e informação genética.
Outro aspecto interessante acerca da legislação estadunidense é o fato de que há pouquíssima proteção em relação as relações de trabalho no setor privado (PLAYER; MALIN, 2012, p. 4), e isso em muito se deve ao explanado a respeito do liberalismo e da não intervenção estatal no pactuado entre particulares. Os critérios de proteção no âmbito federal supracitados poderiam ser acrescidos de outros mais específicos para reverter essa situação, porém as Constituições Estaduais costumam ser omissas em relação a isso, e quando decidem atuar, acabam por restringir as novas garantias apenas as relações de emprego no setor público.
Diante da limitada proteção a não ocorrência de práticas discriminatórias na seara trabalhista, o ordenamento estadunidense possibilita a discriminação em virtude da aparência, tendo em vista que quando esta acontece não encontra amparo nas hipóteses previstas legalmente. Para exemplificar tal situação, faz-se mister analisar um caso emblemático que envolve essa problemática. Jespersen v. Harrah’s Operating Co. trata-se de um caso (PLAYER; MALIN, 2012, p. 66-69) no qual a parte autora alegou que era obrigada a usar maquiagem para trabalhar e que foi demitida por ter descumprido essa norma. Por considerar tal atitude discriminatória e enquadrá-la na categoria sexo, tendo em vista que somente as funcionárias eram submetidas a essa regra, a demandante buscou a justiça.
A decisão foi desfavorável a Darlene Jespersen, uma vez que o tribunal considerou que não haviam elementos suficientes para comprovar que o ocorrido estava relacionado a questão do estereótipo. Todavia, entende-se que a demandante só fundamentou o pedido com fulcro na discriminação sexual por não haver previsão concernente a aparência, porque é nítido que o acontecimento em comento refere-se a este setor.
Ainda no que tange ao ordenamento jurídico estadunidense, destaque-se que a limitada vedação a discriminação nas relações de emprego privada permite maior liberdade e autonomia das partes para negociar. Entretanto, a ausência da intromissão estatal faz com que contratos injustos aconteçam, visto que esses não devem ser considerados instrumentos morais autossuficientes (SANDEL, 2016, p. 179).
Voltando à temática de discriminação, após todos os argumentos elencados, é necessário apontar algumas constatações. A principal delas remete à notoriedade de que tanto o Brasil quanto os Estados Unidos visam evitar as práticas discriminatórias, havendo disposições legais a esse respeito. Além do combate no âmbito nacional, na esfera internacional essa temática tem bastante relevância, sendo o princípio da não discriminação respaldado por convenções internacionais.
Todavia, apesar de toda a proteção nacional e internacional a respeito da não discriminação, ainda é comum a ocorrência de práticas discriminatórias. Nas relações de emprego, o objetivo do Direito do Trabalho é evitá-las. Segundo as diretrizes internacionais e a busca pelo cumprimento do princípio da igualdade, é possível afirmar que o Brasil possui uma quantidade maior de normas voltadas ao enfrentamento a discriminação quando comparado aos Estados Unidos.
5. A importância do uso da analogia na projeção do hipotético julgamento do Disney look pela legislação brasileira
Depois de uma análise acerca do modo em que as práticas discriminatórias são abordadas pelo ordenamento jurídico brasileiro e o estadunidense, observa-se que o Brasil possui uma quantidade maior de normas voltadas a essa temática quando comparado aos Estados Unidos. Nesse sentido, corroborando com o examinado no capítulo anterior, é imperioso refletir sobre como o Disney look seria julgado pela legislação pátria. Para tanto, é salutar a apreciação do posicionamento dos tribunais em alguns casos análogos.
O uso da analogia se faz necessária uma vez que o Disney look não existe no Brasil, ele é um fenômeno estadunidense. Não obstante a ausência do código de aparência dos funcionários da Disney em território brasileiro, há algumas proibições similares as descritas no manual americano que já foram julgadas pelos tribunais brasileiros.
Diferentemente dos Estados Unidos, no Brasil o grau de autonomia das partes para negociar e estabelecer um contrato é muitas vezes alvo da intervenção do Estado. Essa ingerência acontece para evitar abusos e resguardar os direitos fundamentais da parte menos favorecida, conforme já foi discutido.
Entretanto, é imperioso salientar que nas relações de trabalho, o empregador possui a prerrogativa do poder diretivo, que tem fulcro no artigo 20, caput, da CLT, o qual dispõe que “considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviço”. Desse modo, o empregado encontra-se subordinado juridicamente ao empregador, visto que este tem o poder para estabelecer as regras contratuais e até mesmo elaborar regulamentos e manuais internos da empresa. Os limites das imposições é alvo de grandes discussões, já que não há disposição legal própria que aborde essa temática.
É nesse âmbito que entra a importância de analisar através da jurisprudência como os tribunais vem se colocando perante as proibições e exigências das empresas com relação a aparência. Apesar de o Disney look não ser adotado no Brasil, há empresas especificam contratualmente – ou de forma velada -, regras como a proibição de piercings, tatuagens, alargadores de orelha, bem como de uso de determinadas cores de cabelo e esmalte, além de diversas outras possibilidades.
A ausência de uma legislação específica sobre a discriminação estética, a linha tênue entre a liberdade contratual e os direitos de personalidade e imagem do trabalhador, bem como a necessidade de cumprimento dos princípios constitucionais faz com que hajam decisões divergentes acerca desse assunto.
Cabe destacar ainda que o rol de práticas discriminatórias preceituado na legislação brasileira não é taxativo, o que faz com que se tenha um número considerável de ações judiciais a respeito dessa questão. Por outro lado, apesar de a vedação a discriminação também encontrar amparo no ordenamento jurídico estadunidense, os critérios para se enquadrar-se são estritos. Como consequência, o número de ações relativas a esse assunto nos EUA é mínimo, visto que ao assinar o contrato o empregado demonstra concordar com o disposto, não havendo sentido em buscar a lei para tentar legitimar o descumprimento.
No Brasil, são diversas as ações na seara trabalhista referentes a trabalhadores que alegam ter seus direitos violados e serem vítimas de discriminação em virtude da submissão a exigências similares as dispostas no código de aparência da Disney.
Um caso emblemático relativo a discriminação estética é o concernente a proibição do uso de barba pelos trabalhadores do banco Bradesco. Tal vedação resultou na condenação, em primeira instância, do banco em indenização por dano moral coletivo no valor de R$ 100.000,00 (cem mil reais). O juiz de primeiro grau entendeu se tratar de uma conduta preconceituosa e discriminatória (TRT5, 2010).
Contudo, o banco recorreu e em sede de segunda instância a sentença foi reformada. A justificativa para a mudança de posicionamento foi a da ausência de elementos probatórios suficientes para demonstrar a conduta discriminatória e da detenção do poder diretivo do empregador para a estipulação de normas desse cunho. Segue trecho do voto da desembargadora relatora Maria Boness:
“[…] ainda que houvesse alguma norma do banco a proibir o uso de barba, cavanhaque, bigode ou costeleta, o que não ficou provado, entendo que não se poderia falar propriamente em conduta discriminatória, in casu, pois a maneira como o empregado deve se apresentar no ambiente de trabalho, as roupas que veste e a aparência geral, está inserido dentro do poder diretivo e discricionário do empregador, claro, dentro de certos limites que, no caso concreto, não teriam sido ultrapassados, acaso fosse exigido dos funcionários que mantivessem sempre aparadas a barba, o bigode ou costeleta quando em serviço. Não se pode negar ao empregador, em razão do seu poder diretivo, o direito de impor determinados padrões, de exigir dos seus empregados certa forma de se conduzir no ambiente de trabalho e de se apresentar para o público externo do banco, seus clientes, inclusive no que diz respeito ao asseio e à aparência geral, incluindo aí as roupas que veste e, também, o fato de se estar usando ou não barba, bigode, cavanhaque e costeletas. É assente na doutrina e jurisprudência que o empregador possui o poder diretivo, discricionário e regulamentar sobre a atividade laboral. Inegável que o empregador detém o direito de ditar as normas administrativas de disciplina e organização que irão reger a atividade empresarial, claro, desde que tais normas não impliquem em violação aos direitos dos seus empregados, o que, no caso concreto, não se verifica, pois, ainda que houvesse provas de que o recorrente exigia de seus empregados a barba feita, tal exigência não se mostraria desarrazoada, pois integra o poder diretivo do empregador.”[ix]
Assim sendo, conforme a decisão do Tribunal Regional do Trabalho da 5a Região/BA, infere-se que a proibição do uso de barba não seria considerada uma regra abusiva nem uma forma de discriminação estética. Não obstante o posicionamento supramencionado, saliente-se que há divergências e que ainda não se tem um entendimento consolidado.
Isto posto, faz-se mister analisar outro caso interessante envolvendo aparência que teve um desfecho completamente diferente do acima relatado. Trata-se de uma ação movida por um trabalhador que alegou ter sido demitido com fulcro em ato discriminatório estético, por estar com a barba por fazer e pelo fato de ter feito “luzes” no cabelo. Diante dessa situação, ele buscou a justiça para que houvesse a reparação do dano moral sofrido através de indenização, pleito que foi aceito no quantum de R$ 30.000,00 (trinta mil reais). Nesse sentido, segue fragmento extraído da decisão em sede de segunda instância do TRT da 8a Região no processo de nº 0011311-66.2013.5.08.0201.
“DANO MORAL. DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. Tendo restado configurado que a dispensa do obreiro constituiu abuso do direito potestativo do empregador, violando o princípio da dignidade da pessoa humana, faz jus o reclamante à indenização por dano moral. Recurso provido. […] Faz-se ver que, após o advento da Constituição Federal de 1988, tornou-se pacífica a possibilidade de o empregado pleitear indenização por danos morais e materiais decorrentes da violação de sua intimidade, de sua vida privada, de sua honra e de sua imagem pelo empregador, nos termos do inciso X do artigo 5º da Carta Constitucional. Já está sedimentado, na doutrina e na jurisprudência, que a responsabilidade do empresário perante seus empregados segue a regra da responsabilidade civil subjetiva, estabelecida nos artigos 186 e 187, combinados com o artigo 927 do CCB, fundando-se, portanto, na existência de dolo ou culpa. […] A discriminação pelo tamanho e pela cor dos cabelos não pode ser aceita, na medida em que diz respeito a direito da personalidade relativo à imagem pessoal, que o projeta socialmente, não tendo sido, em nenhum momento, deduzidas pela reclamada razões de higiene ou qualquer outra que justificasse a exigência. Por assim ser, tem-se que restou evidenciada a conduta discriminatória da reclamada, ao dispensar o reclamante 3 (três) meses após os fatos acima relatados, motivo pelo qual faz jus o reclamante à indenização por dano moral. […] In casu, a reclamada tem uma grande rede de supermercados no Amapá e inseriu, no seu “Manual do Colaborador” (ID37459), item relativo à boa aparência, o que oportuniza prática discriminatória e que deve ser fortemente desincentivado. Por assim ser, entendo que o valor de R$ 30.000,00 (trinta mil reais), requerido pelo autor na inicial, atende à finalidade de reparar o dano e ao caráter pedagógico que deve ter a condenação, sendo certo, ainda, que não contribuirá para o enriquecimento ilícito do reclamante e nem para o empobrecimento da reclamada.”[x]
Após analisar os dois casos acima, percebe-se posicionamentos divergentes em relação a mesma temática: discriminação estética. Em um exercício de projeção, se o Disney look fosse o manual de alguma empresa brasileira e tivesse sido julgado pelo TRT da 5a região/BA, provavelmente não seria considerado discriminatório, conforme aplicação análoga aos fundamentos expostos na aludida decisão relativa ao uso da barba pelos funcionários da Bradesco. Dado que os desembargadores acompanharam o voto da relatora e consideraram a conduta dentro dos limites do poder diretivo do empregador, sendo facultado a esse impor regras de aparência aos funcionários, não mostrando tais exigências serem desarrazoadas ou discriminatórias.
Todavia, possivelmente resultado diferente aconteceria se o código de aparência da empresa estadunidense hipoteticamente fosse julgado pelo TRT da 8a Região/PA. Segundo o exposto na decisão acima mencionada, a demissão de um funcionário com base em critérios de aparência como tamanho e cor do cabelo é considerado ato discriminatório.
Tal ocorrência é passível de punição através de indenização, isso acontece porque os desembargadores desse tribunal entendem que itens relativos a aparência estabelecidos no Manual do Colaborador constituem abuso do poder diretivo do empregador. Outrossim, afirmam ainda que violam princípios constitucionais, restando-se evidenciado que o limite da liberdade contratual do empregador é ultrapassado a medida em que estabelece regras que violam direitos do trabalhador.
Diante da ausência de legislação específica acerca do marco para determinar o poder diretivo do empregador, entende-se que o limite a ser estabelecido de tal prerrogativa é alcançado a partir do momento em que esse passa a interferir nos direitos e garantias fundamentais do empregado.
Assim, constata-se que o limite vem sendo determinado de forma subjetiva, tendo em vista os diferentes entendimentos dos magistrados acerca dessa temática. Nesse contexto, cabe ressaltar que as divergências de posicionamentos ocorrem porque é necessário garantir o direito do empregador em ter a liberdade de contratar seja assegurado. No entanto, em consonância com o disposto na legislação é pacífica a compreensão de que mesmo diante do poder atribuído ao empregador, a discriminação não pode acontecer de forma injustificada.
Ainda nesse âmbito, é importante destacar outra decisão marcante na limitação as imposições do empregador ao empregado. Trata-se do julgamento da ação civil pública nº 0001131-19.2015.5.12.0036, em que a juíza Ângela Maria Konrath, da 6a Vara do Trabalho de Florianópolis derrubou norma que impedia guardas municipais de usarem brincos, cabelos compridos, barba e bigodes “volumosos” (TRT12, 2016). O fundamento para tanto foi o de que a regra estabelecida pelo município de Florianópolis consistia em discriminação estética. Além disso, houve também a condenação no valor de R$ 200.000,00 (duzentos mil reais) em danos morais coletivos. A sentença desse caso é interessante porque aborda a vedação a discriminação estética no setor público. (TRT12, 2016).
O artigo 72, caput, inciso VII, “a”, do revogado Decreto n0 3868, o qual aprovava o regulamento da guarda municipal de Florianópolis, estipulava como transgressão disciplinar “apresentar-se nas formaturas diárias ou em público: com falta de asseio pessoal – costeletas, barbas ou cabelo crescidos, bigodes ou unhas desproporcionais; ou adornos (brincos ou outros enfeites)”, além de outras diversas restrições. O descumprimento do preceituado ocasionaria advertência. Diante dessa conjuntura, a magistrada que proferiu a decisão considerou a regra inconstitucional e sem nenhuma razão, visto que não há ligação entre as imposições e a atividade desenvolvida pela categoria.
Outra decisão recente e que merece ênfase remete ao entendimento exarado pelo Supremo Tribunal Federal ao julgar inconstitucional a proibição de tatuagem a candidatos a cargo público (STF, 2016). O caso que deu origem a esse entendimento foi o de um candidato a soldado da Polícia Militar que foi eliminado por possuir tatuagem na perna. Segue trecho extraído do voto do ministro relator Luiz Fux (2016, p. 15-16):
“In casu, evidencia-se a ausência de razoabilidade da restrição dirigida ao candidato de uma função pública pelo simples fato de possuir tatuagem, posto medida flagrantemente discriminatória e carente de qualquer justificativa racional que a ampare. Assim, o fato de uma pessoa possuir tatuagens, visíveis ou não, não pode ser tratado pelo Estado como parâmetro discriminatório quando do deferimento de participação em concursos de provas e títulos para ingresso em uma carreira pública.
É dizer, inexiste a correlação na diferenciação ora sub examine e os ditames constitucionais. Consoante delimitado, a citada restrição, no caso, não se revela amparada por razão lógica e necessária, decorrendo de arbitrariedade administrativa sem qualquer imbricação com as funções desempenhadas, posto não concretizar conduta contrária à imagem e aos valores de instituições públicas, qualquer que seja o conceito que a eles se queira atribuir. Dito de outro modo, inexiste qualquer relação de pertinência entre a proibição de possuir tatuagem e as características e peculiaridades inerentes à função pública a ser desempenhada pelo candidato. Um policial não é melhor ou pior nos seus afazeres públicos por ser tatuado.”
Cabe destacar ainda que o posicionamento do Supremo no caso supracitado chegou a ser usado como argumento na fundamentação da decisão que invalidou a norma que estipulava a proibições relativas a alguns aspectos da aparência do trabalhador.
Outrossim, faz-se mister ressaltar que a aparência também está relacionada aos padrões de beleza impostos. Desse modo, merece realce a decisão a respeito de um caso em que se constatou que a parte autora foi vítima de discriminação em virtude do peso. No referido caso a 8a Turma do Tribunal Superior do Trabalho manteve a decisão da instância ordinária no que concerne a reparação em danos morais, tendo inclusive usado a mesma fundamentação acima estudada, conforme segue trecho extraído do Acórdão:
“A apreciação do fato, no caso dos autos, foi muito bem feita pelo Juízo a quo, conforme o seguinte excerto – o que se adota como razões de decidir: […]Ora, esta conduta merece sérias restrições, à medida que visou condicionar uma progressão funcional exclusivamente a característica física da autora, o que importa em tratamento discriminatório, em clara ofensa ao disposto no artigo 5º da Constituição Federal. Não pode o empregador submeter o empregado exigir de seus empregados atributos físicos exagerados, inclusive com orientação para fazer gastos com cirurgias plásticas, inclusive com risco a sua integridade física. É evidente que o empregador tem direito de contratar quem mais atende as exigências da empresa e também conceder promoções aos empregados que inspirem maior confiança. Todavia, não pode impor como pré-requisito determinado padrão de beleza, assim como não pode deixar de contratar ou mesmo promover o empregado que detém todas as condições técnicas para o cargo, em razão de cor, sexo, opção sexual. A reclamante foi discriminada em razão do seu padrão de beleza. Todavia, tal critério não pode ser chancelado, mormente quando a Constituição Federal consagrou o princípio da dignidade humana. Assim, entendo que a reclamada cometeu ato ilícito, no caso discriminação, o que dá direito ao pagamento de uma indenização compensatória, mormente quando há comprovação que a autora sofreu com tal conduta. Registro, ainda, que não é possível valorar a prova oral produzida pela reclamada, em virtude das demais contradições verificadas nos demais itens. Neste caso, reconheço o direito do reclamante de pagamento de indenização por dano moral na medida em que atingidos direitos inerentes a sua personalidade e também porque a reclamada adotou conduta ilegal, com manifesto prejuízo a reclamante.”- fls. 748-748v.”[xi]
Além do que já foi discutido acerca da discriminação estética, há também outra questão englobada nessa temática que deve ser ressaltada: o responsável pelo pagamento das despesas necessárias para o cumprimento das exigências determinadas pela empresa. Existem casos em que o estabelecido para os trabalhadores no manual interno apesar de não serem considerados abusivos, demandam gastos.
Nessa conjuntura, há entendimento jurisprudencial atribuindo as despesas ao empregador, visto que esse é incumbido de fornecer os meios para o desenvolvimento do trabalho. Nesse sentido, segue trecho de decisão do Tribunal Regional da 4a Região que condenou a empresa a pagar indenização referente ao valor gasto com maquiagem e uniforme para atender as exigências do empregador:
“Com efeito, é possível depreender a manifesta obrigatoriedade do uso de sapatos em uma padronagem específica, além da maquiagem, o que não era fornecido pela reclamada. A obrigatoriedade de uso de sapatos em cores específicas (escura), além de maquiagem na prestação de trabalho integram o uniforme exigido pela ré, não sendo razoável presumir, ante a inexistência de qualquer elemento de prova, que não o tenham sido exigidos. O não fornecimento pelo empregador de acessório que integra o uniforme por ele exigido implica indevida transferência do ônus do empreendimento econômico ao empregado e, portanto, impositivo o dever de este ser ressarcido dos gastos suportados. Ou seja, havia uma imposição quanto ao tipo de vestimentas que a empresa considera mais adequado, bem como uma restrição a determinadas cores e modelos, tanto de roupas quanto de calçados, o que demanda certo investimento se o estilo de vestir do empregado não estiver enquadrado no exigido pela empresa. Dessa forma, considero razoável que se indenize tal despesa (TRT-4, 2017).”
Nessa seara, cabe ainda destacar a Ementa do Acórdão da 3a turma do Tribunal Superior do Trabalho (2012) que decidiu no mesmo sentido:
“AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. OBRIGAÇÕES DE FAZER E NÃO FAZER. EXIGÊNCIA DE USO DE CALÇADOS ESPECÍFICOS. NÃO FORNECIMENTO DO ITEM PELA EMPRESA. A partir do momento em que o empregador padroniza alguma peça do vestuário e exige a observância desse acessório, transfere para si a obrigação de fornecê-lo, pois a peça passa a deter caráter essencial e instrumental à prestação laborativa. Nesse contexto, compete ao empregador ofertar o item que considera necessário à consecução do trabalho, sob pena de se admitir a transferência ao empregado de obrigação contratual própria do empregador (art. 2º, “caput”, da CLT). Agravo de instrumento desprovido.”
Assim sendo, retornando ao tema proposto em discussão, o Disney look, se caso hipoteticamente ele fosse colocado em prática no território brasileiro e houvesse gastos para o cumprimento das medidas nele estipuladas, possivelmente haveria a possibilidade de ressarcimento das despesas ao empregado, projetando tal conjectura com base em decisões análogas ao exposto no julgado acima.
Outrossim, com base nos casos examinados e nos outros argumentos trazidos à baila, resta-se evidente que o Disney look, ao contrário do que acontece nos EUA, seria alvo das mais variadas ações judiciais caso fosse aplicado no Brasil. Tal estimativa é baseada não somente na ampla jurisprudência, mas também na proteção constitucional dada ao trabalhador em relação aos direitos relativos a intimidade e a privacidade, uma vez que o artigo 5º da Carta Magna preceitua como invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas. E conforme foi mostrado nos julgados acima, o vínculo de subordinação entre o empregado e o empregador não pode transgredir os direitos assegurados ao trabalhador.
Todavia, apesar das vedações expressas na legislação e nas jurisprudências a respeito do tema, ainda é comum a ocorrência de práticas discriminatórias nas relações de trabalho. Para combatê-las, há previsão legal de punição no artigo 5º, XLI, da CF/88, que preceitua que “a lei punirá qualquer discriminação atentatória aos direitos e liberdades fundamentais”.
Os atos discriminatórios em razão da estética, da aparência, tais como os expostos no Disney look são passíveis de condenação por danos morais e indenização na esfera cível, tendo em vista que esses ferem o direito à imagem e a intimidade do indivíduo. O fulcro para aplicação da penalidade encontra previsão no Código Civil de 2002.
O artigo 186 do referido diploma, estabelece que “aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar o direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”. Infere-se, portanto, que a discriminação em razão da aparência constitui ato ilícito. Acresce-se a isso o disposto no artigo 927[xii], que também estabelece o dever da reparação em casos de prática de ilícitos.
Outrossim, ressalve-se que com o advento da Reforma Trabalhista, a responsabilidade civil do empregador encontra-se limitada aos valores de danos morais estabelecidos nos artigos nos artigos 223A ao 223G[xiii] da CLT.
Constata-se, portanto, que as específicas proibições e exigências preceituadas pelo Disney look, se analisadas em um exercício projeção sob a ótica do ordenamento jurídico brasileiro violariam direitos e garantias dos trabalhadores.
Conforme foi demonstrado com a jurisprudência elencada, é provável que se o código de aparência da empresa estadunidense fosse aplicado de forma obrigatória em território brasileiro, haveria punição. A repreensão encontra amparo na Constituição brasileira, como uma forma de impedir a violação de direitos dos trabalhadores.
Seria necessário, de tal forma, que o manual estadunidense estipulasse regras de acordo com o disposto na lei fundamental da nação. Caso contrário, levando-se em conta situações análogas, os funcionários possuiriam direito a serem indenizados pelos eventuais danos sofridos.
CONCLUSÃO
Diante das diferenças econômicas, políticas, culturais e legislativas entre o Brasil e os Estados Unidos, o modo como hipoteticamente o Disney look seria analisado sob a ótica do ordenamento jurídico brasileiro provavelmente ocorreria de maneira distinta ao que acontece no território estadunidense.
Nos Estados Unidos, o aludido código de aparência encontra amparo no fato de a nação está inserida em um Estado liberal, o que acarreta uma intervenção estatal mínima e possibilita maior autonomia das partes para negociar. O pactuado contratualmente tem força de lei e é culturalmente respeitado, sendo prova disso a mínima quantidade de ações judiciais concernentes ao disposto no manual.
Nada obstante o Disney look transcorrer dentro de uma verdadeira normalidade na cultura estadunidense, ao projetá-lo à luz da legislação pátria, presume-se comportamento diferente. O Brasil, ao contrário dos EUA, enquadra-se nas características de um Estado Social, sendo a ingerência estatal uma forma de garantir o previsto constitucionalmente.
Assim sendo, no âmbito do Direito do Trabalho percebe-se a presença do dirigismo estatal nos contratos com o feitio de assegurar patamares mínimos aos trabalhadores. Portanto, a liberdade acerca do que é acordado contratualmente é menor em relação aos Estados Unidos.
À vista disso, é justificável que no Brasil a suposta implantação do manual formulado pela empresa estadunidense provocasse uma enxurrada de ações judiciais. Tal inferência encontra arrimo no disposto na legislação pátria, em especial no preceituado na Carta Maior, uma vez que a Constituição Federal de 1988 tem como princípio norteador o da dignidade da pessoa humana, que é fundamento para a vedação de atos discriminatórios e para a proteção de direitos tais como a honra, intimidade e imagem e modo de vida.
Desse modo, constata-se que o limite da liberdade contratual e do poder do empregador é ultrapassado no momento em que viola o estabelecido na Carta Magna. Nesse contexto, saliente-se que se caso fosse considerado obrigatório o cumprimento as exigências e proibições convencionados no Disney look em território brasileiro, seria provável a não aceitação, tanto por parte dos trabalhadores, quanto do ordenamento jurídico pátrio.
É presumível que os funcionários da empresa que estabelecesse o código de aparência buscassem a justiça para impedir a violação de direitos que aconteceria caso fosse forçoso o cumprimento do manual. Tendo em vista ser nítido o confronto do Disney look a princípios constitucionais como o da igualdade, dignidade da pessoa humana, o da não discriminação, a não invasão da intimidade e do modo de vida do trabalhador. Ainda nessa seara, mister se faz ressaltar que a aparência se torna uma forma de exclusão para quem não se encaixa nos padrões estipulados pelo guia estadunidense.
Além disso, os empregados poderiam ser reparados pelos eventuais danos morais sofridos através de indenização de natureza civil, que é expressa no Código Civil de 2002, especificamente nos artigos 186 e 927. Sendo esta a suposta consequência jurídica aplicável. Ressalva-se ainda que com o advento da reforma trabalhista a responsabilidade civil do empregador está limitada aos valores de morais estabelecidos nos artigos 223A ao 223G da Consolidação das Leis do Trabalho.
Ademais, é imperioso salientar que o hipotético não assentimento do Disney look no Brasil sustenta-se na vedação as práticas discriminatórias presentes na legislação brasileira, bem como na previsão de punição em caso de ocorrência de discriminação. Outrossim, cabe mencionar que a jurisprudência ocupa uma posição de destaque no que se refere a legislação da temática tratada.
Perante a ausência de leis específicas acerca do assunto, as decisões a respeito desse tópico na seara trabalhista tem especial relevância, uma vez que, levando-se em conta os posicionamentos de julgados em situações análogas, constata-se que por versar sobre critérios subjetivos, há decisões conflitantes.
No entanto, após a análise de julgados acerca do tópico em comento, infere-se que há uma tendência maior a considerar tais normas, a exemplo daquelas dispostas no Disney look, como algo que transcende a esfera do poder diretivo do empregador, atingindo a seara pessoal do trabalhador, havendo, portanto discriminação e violação a direitos e garantias fundamentais.
Para que o Disney look pudesse, em um exercício de projeção, ser aceito pelo ordenamento jurídico brasileiro, seriam necessárias mudanças que o tornassem compatíveis com o estabelecido pela legislação pátria, sem afrontar a Carta Maior. Compreende-se, portanto, que a discriminação não pode acontecer de forma injustificada.
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TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 8a REGIÃO (TRT8). RO 00113116620135080201 0011311-66.2013.5. 08.0201. Relatora: Desembargadora Suzy Elizabeth Cavalcante Koury. DP: 12/03/2014, Jusbrasil, 2014. Disponível em: <https://trt-8.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/300307666/recurso-ordinario-ro-113116620135080201-0011311-6620135080201/inteiro-teor-300307679> Acesso em 05 nov. 2018.
TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO (TST). AIRR 1912820135040010. Ministra Relatora Maria Cristina Irigoyen Peduzzi. DJ: 26/08/2016, Jusbrasil, 2016. Disponível em: <https://tst.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/377901035/agravo-de-instrumento-em-recurso-de-revista-airr-1912820135040010/inteiro-teor-377901055> Acesso em: 09 nov. 2018.
TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO (TST). AIRR 313004520095040028 31300 – 45.2009.5.04.0028. Relator Mauricio Godinho Delgado, DJ: 30/04/2012, 3a Turma, Jusbrasil, 2012. Disponível em: <https://tst.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/21678734/agravo-de-instrumento-em-recurso-de-revista-airr-313004520095040028-31300-4520095040028-tst> Acesso em: 09 nov. 2018.
TRT da 5ª região: Bradesco não pratica discriminação estética contra empregados. Disponível em: <https://www.migalhas.com.br/Quentes/17,MI136961,41046-TRT+da+5+regiao+Bradesco+nao+pratica+discriminacao+estetica+contra> Acesso em: 05 nov. 2018.
U.S. EQUAL EMPLOYMENT OPPORTUNITY COMMISSION. Title VII of the Civil Rights Act of 1994. Disponível em: <https://www.eeoc.gov/laws/statutes/titlevii.cfm> Acesso em: 02 nov. 2018.
[i] Termo em inglês que se refere aos visitantes do parque como pessoas individualmente muito importantes.
[ii] Texto original em inglês: “Regardless of your role, when you take pride in your appearance, you become a role model for those around you, and you convey the attitude of excellence that has become synonymous with the Disney name”.
[iii] Expressão em inglês que tem como tradução literal: “Isso é América”. Ressalta-se que no caso em comento refere-se a América do Norte, precisamente aos Estados Unidos.
[iv] Expressão em inglês que tem como tradução literal “Isso é Brasil”, com o intuito de opor-se ao título do capítulo anterior.
[v] Por determinação constitucional, no plano teórico, o Brasil é um Estado de Bem Estar Social e ao longo dessa pesquisa será analisado sob esta perspectiva.
[vi] Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: I – soberania nacional; II – propriedade privada; III – função social da propriedade; IV – livre concorrência; V – defesa do consumidor; VI – defesa do meio ambiente; VII – redução das desigualdades regionais e sociais; VIII – busca do pleno emprego; IX – tratamento favorecido para as empresas brasileiras de capital nacional de pequeno porte. Parágrafo único. É assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvos nos casos previstos em lei.
[vii] Art. 421. A liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato.
[viii] Tradução livre para o português do texto original em inglês: “Amendment XIV. Section 1. All persons born or naturalized in the United States, and subject to the jurisdiction thereof, are citizens of the United States and of the state wherein they reside. No state shall make or enforce any law which shall abridge the privileges or immunities of citizens of the United States; nor shall any state deprive any person of life, liberty, or property, without due process of law; nor deny to any person within its jurisdiction the equal protection of the laws”.
[ix] Ementa: PROIBIÇÃO AO USO DE BARBA NO TRABALHO. INEXISTÊNCIA DE DANO MORAL COLETIVO. Não se pode negar ao empregador, em razão do seu poder diretivo, o direito de impor determinados padrões, de exigir dos seus empregados certa forma de se conduzir e de se apresentar no ambiente de trabalho, inclusive no que diz respeito à proibição do uso de barba, bigode, cavanhaque ou costeleta, quando em serviço, o que não se revela como exigência abusiva ou desarrazoada. (TRT – 4 – RO: 0073200-78.2008.5.05.0007, Relatora: Des. Maria das Graças Oliva Boness, Data de Julgamento: 06/07/2011, 4a Turma). Disponível em: <https://www.migalhas.com.br/Quentes/17,MI136961,41046-TRT+da+5+regiao+Bradesco+nao+pratica+discriminacao+estetica+contra> Acesso em: 05 nov. 2018.
[x] Ementa: DANO MORAL. DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. Tendo restado configurado que a dispensa do obreiro constituiu abuso do direito potestativo do empregador, violando o princípio da dignidade da pessoa humana, faz jus o reclamante à indenização por dano moral. Recurso provido. (TRT – 8 – RO: 0011311-66.2013.5.08.0201, Relatora: Des. Suzy Elizabeth Cavalcante Koury, 1a Turma, Data de Publicação: 12/03/2014). Disponível em: <https://trt-8.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/300307666/recurso-ordinario-ro-113116620135080201-0011311-6620135080201/inteiro-teor-300307679> Acesso em: 05 nov. 2018.
[xi] Ementa: AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO SOB A ÉGIDE DA LEI Nº 13.015/ 2014 – PRELIMINAR DE NULIDADE POR NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL – PRECLUSÃO A matéria está preclusa. Incidência da Súmula nº 297, II, do TST. MULTA POR EMBARGOS DE DECLARAÇÃO PROTELATÓRIOS Evidenciado o intuito protelatório dos Embargos de Declaração, devida é a multa do artigo 538, parágrafo único, do CPC. HORAS EXTRAS – CARGO DE CONFIANÇA – ENQUADRAMENTO – ART. 62, II, DA CLT Consoante o panorama fático delineado pela Corte de origem, a função exercida pela Reclamante – encarregada de setor – não era dotada de fidúcia especial hábil a enquadrá-la na previsão do art. 62, II, da CLT. Entender de maneira diversa demandaria o revolvimento de fatos e provas, procedimento vedado pela Súmula nº 126 do TST. DIFERENÇAS DE COMISSÕES – ÔNUS DA PROVA O Eg. TRT registrou que a Reclamada não se desincumbiu de seu ônus de comprovar a inexistência de diferenças de comissões. Dessa forma, aplicou corretamente a regra de distribuição do ônus da prova, prevista nos artigos 333, I, do CPC de 1973 e 818 da CLT. DESCANSO SEMANAL REMUNERADO SOBRE AS COMISSÕES A matéria, tal como posta pelo Eg. TRT, reveste-se de cunho fático-probatório, de reexame vedado, nos termos da Súmula nº 126 do TST. DANOS MORAIS – ÔNUS DA PROVA Os arts. 818 da CLT e 333 do CPC de 1973 são impertinentes, porquanto a Corte de origem decidiu a controvérsia com base na valoração das provas dos autos, e não pela regra de distribuição do ônus da prova. DANOS MORAIS – QUANTUM INDENIZATÓRIO A instância ordinária, ao fixar o quantum indenizatório, pautou-se pelo princípio da razoabilidade, obedecendo aos critérios de justiça e equidade, não se justificando a excepcional intervenção desta Corte Superior. RESCISÃO INDIRETA –CONFIGURAÇÃO O Eg. TRT concluiu pela existência dos elementos configuradores da rescisão indireta, nos termos do art. 483, d, da CLT. Súmula nº 126 do TST. Agravo de Instrumento a que se nega provimento. (TST – AIRR: 1912820135040010, Relatora: Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, Data de Julgamento: 26/08/2016, 8a Turma, Data de Publicação: DEJT 26/08/2016). Disponível em: <https://tst.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/377901035/agravo-de-instrumento-em-recurso-de-revista-airr-1912820135040010/inteiro-teor-377901055> Acesso em: 09 nov. 2018.
[xii] Artigo 927 da Lei n0 10,406 de 10 de janeiro de 2002: Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independente da culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.
[xiii] TÍTULO II-A
DO DANO EXTRAPATRIMONIAL
‘Art. 223-A. Aplicam-se à reparação de danos de natureza extrapatrimonial decorrentes da relação de trabalho apenas os dispositivos deste Título.’
‘Art. 223-B. Causa dano de natureza extrapatrimonial a ação ou omissão que ofenda a esfera moral ou existencial da pessoa física ou jurídica, as quais são as titulares exclusivas do direito à reparação.’
‘Art. 223-C. A honra, a imagem, a intimidade, a liberdade de ação, a autoestima, a sexualidade, a saúde, o lazer e a integridade física são os bens juridicamente tutelados inerentes à pessoa física.’
‘Art. 223-D. A imagem, a marca, o nome, o segredo empresarial e o sigilo da correspondência são bens juridicamente tutelados inerentes à pessoa jurídica.’
‘Art. 223-E. São responsáveis pelo dano extrapatrimonial todos os que tenham colaborado para a ofensa ao bem jurídico tutelado, na proporção da ação ou da omissão.’
‘Art. 223-F. A reparação por danos extrapatrimoniais pode ser pedida cumulativamente com a indenização por danos materiais decorrentes do mesmo ato lesivo.
‘Art. 223-G. Ao apreciar o pedido, o juízo considerará:
I – a natureza do bem jurídico tutelado;
II – a intensidade do sofrimento ou da humilhação;
III – a possibilidade de superação física ou psicológica;
IV – os reflexos pessoais e sociais da ação ou da omissão;
V – a extensão e a duração dos efeitos da ofensa;
VI – as condições em que ocorreu a ofensa ou o prejuízo moral;
VII – o grau de dolo ou culpa;
VIII – a ocorrência de retratação espontânea;
IX – o esforço efetivo para minimizar a ofensa;
X – o perdão, tácito ou expresso;
XI – a situação social e econômica das partes envolvidas;
XII – o grau de publicidade da ofensa.
I – ofensa de natureza leve, até três vezes o último salário contratual do ofendido;
II – ofensa de natureza média, até cinco vezes o último salário contratual do ofendido;
III – ofensa de natureza grave, até vinte vezes o último salário contratual do ofendido;
IV – ofensa de natureza gravíssima, até cinquenta vezes o último salário contratual do ofendido.
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2017/lei/l13467.htm> Acesso em: 06 nov. 2018.
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