Dos atos e fatos jurídicos

Resumo: O artigo esmiuçará a composição dos atos jurídicos traçando seus aspectos fundamentais, suas espécies assim como a sua conceitualização, fornecendo a oportunidade de compartilharmos com essa pesquisa a importância dos fatos e atos jurídicos. Assim, ao tratarmos desses institutos jurídicos algumas questões vem a tona no que se refere as condições de validade desses elementos, como se distinguem e sobre quais critérios se classificam. O presente ensaio discorre sobre o tema abordando a conexão dos mesmos esclarecendo inclusive os seus critérios distintivos conforme mencionado anteriormente, agindo de forma contrária ou permissiva a recepção do texto normativo. Abordar de forma objetiva e segura é a maior pretensão desse estudo, ressaltando as diversas controvérsias apontadas por esse tema em questão. Um posicionamento mais antigo, mas nem por isso menos importante, vem de Savigny que expressa que fatos jurídicos são os acontecimentos em virtude dos quais as relações de direito nascem e se extinguem. (SAVIGNY apud CARRIDE, 1997, p.3). Muitas vezes nem percebemos o impacto que esses institutos refletem em diversas situações ou abordagens diferenciadas que podem gerar impacto tanto de caráter positivo como negativo até mesmo e não reparamos que o desenrolar de tais situações afetam todo o cenário jurídico.[1]

Palavras-Chave: jurídico, atos, fatos, direito.

Sumário: 1. Co.nceitualização 2. Classificação. 2.1 Dos Atos lícitos. 2.2 Dos Atos ilícitos. 3. Fatos Jurídicos.

1 DA CONCEITUALIZAÇÃO

Aplica-se a ato jurídico a mesma denominação que se dá para toda ação ou conduta humana, podendo ser caracterizada como: lícita ou ilícita que tenha por finalidade eminente alcançar, transferir, resguardar, modificar ou extinguir direitos.

Para que os atos jurídicos ocorram é fundamental ressaltar que a sua aplicação ocorra independe da vontade humana, já para os atos qualificados como tipicamente ilícitos o feito se dá independe da vontade do agente, que, ao agir com dolo ou culpa e ocasionar dano a outrem. Mas em se tratando de atos que apresentam a dependência da vontade humana como é o caso dos atos lícitos, tidos também como ato Jurídico ou lícito, o efeito jurídico deriva da vontade direta do agente (contratos, testamentos).

Assim uma conduta típica do indivíduo, seja ela positiva ou negativa é capaz de realizar atos e ocasionando diversas implicações jurídicas. Mas importante se faz mencionar, que dentre todas as ações humanas independente da forma voluntária ou involuntárias desse consentimento algumas dessas ocorrências não resultam apenas em impactos jurídicos, podendo resultar num mero ato de recorrente de uma conduta humana.

Por fim, Miguel Reale ao analisar os dispositivos pertencentes ao Código Civil apresenta um argumento de que o ato jurídico abrange não só o ato que se denomina lícito como também alcança o ato ilícito; sendo que o segundo resulta inúmeras conseqüências no universo do Direito.

2 CLASSIFICAÇÃO

Os atos jurídicos dividem-se ainda em atos ilícitos e atos lícitos alicerçados ou não no consentimento da pessoa jurídica ou física em sua ação sistematizada da vontade que lhes dá existência imediata e conseqüentemente efeitos jurídicos.

Portanto esses atos que surgem como mero pressuposto de efeito jurídico, com a categoria básica e delimitadora da manifestação ou não da vontade, preordenado ou não pela lei, com ou sem função e natureza de auto-regulamento para distinguir meros atos jurídicos; classificam-se em atos lícitos e ilícitos.

Essa classificação definidora dos atos jurídicos, nos leva a buscar cada vez mais a razão para distinguir meros atos de manifestação da vontade humana, juntamente com a analise da sua intenção, ou seja, seu ponto de alcance o que de fato interessa com o modelar dessa conduta, separando daqueles atos jurídicos que a lei permite seu modelar, atos estes oriundos de intenção negocial jurídica.

2.1 Dos Atos Lícitos

São os atos praticados em conformidade com o nosso então ordenamento jurídico vigente. O ato jurídico é na verdade aquele que desencadeia diversas conseqüências jurídicas previamente determinadas em lei.

É o que diz Maria Helena Diniz, (1995) acerca do ato jurídico: “ato jurídico strictu sensu que surge como mero pressuposto de efeito jurídico, preordenado pela lei, sem função e natureza de auto-regulamento”. 

Diante disso, o ato  jurídico pode ser entendido como sendo na verdade um acontecimento oriundo da vontade de uma pessoa física ou jurídica, que produz efeitos de ordem jurídica. Mas é importante frisar que para tal aplicação da vontade se faz imprescindível que tenhamos a ocorrência de um acontecimento lícito fundado em direito, que não esteja em desacordo com o nosso então ordenamento jurídico.

Segundo Fábio Maria de Mattia, 1967 “o ato jurídico stricto sensu seria aquele que surge como mero pressuposto de efeito jurídico, preordenado pela lei, sem função e natureza de auto-regulamento”.

Tomei como forma de exemplificar, buscando uma melhor maneira de elucidar a conceitualização de um ato em plena conformidade com a nossa ordem jurídica vigente introduzindo alguns detalhes sobre o contrato de compra e venda celebrado por ambas as partes devidamente legitimadas e dotadas da capacidade civil conformidade exigência na lei, isto é, sendo formalizada por meio de documento de escritura pública  e observados todos os demais aspectos formais e materiais que a legislação brasileira , temos aí um exemplo simples e objetivo de um ato lícito.

Todos os detalhes devem ser observados e devidamente analisados, qualquer ausência de formalidade por mais simples que possa representar tem condições suficientes para modificar toda a configuração de um caso. Eu diria que cada detalhe faz toda a diferença, podendo com isso chegar até mesmo a invalidação do ato, por se apresentar em desconformidade com a ordem jurídica vigente.

2.2 Dos Atos Ilícitos

O ato ilícito é derivado da manifestação da vontade humana, sendo praticado em desacordo com a ordem jurídica, violando direito subjetivo. Assim, é a conduta realizada juntamente com a infração de um dever legal previamente estipulado, resultando dano, prejuízo para outrem, o que gera o dever de ressarcimento a vítima. O ato ilícito produz efeitos jurídicos, sendo estes por sua vez não desejados pelo agente, mas impostos pela lei

Conforme o art 186 do CC. “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”.

Vale frisar que boa parte da nossa doutrina vigente não recepciona como jurídico o ato ilícito, por se apresentar de forma contraria ao dispositivo normativo, embora este produza efeitos que ensejam responsabilidade civil.

Porém, hoje se admite que estes atos integrem a categoria dos atos jurídicos, tomando como base os efeitos que eles geram ou produzem.

3 FATOS JURÍDICOS

Um fato jurídico é um acontecimento que se dá proveniente de uma origem seja ela natural ou humana que ao seu surgimento repercute conseqüências jurídicas. Mas nem todos os atos são de grande relevância para o direito, uma vez que nem todos exercem a função de criar, extinguir ou modificar alguma situação prevista na ordem jurídica. Segundo a teoria tridimensional do direito de Miguel Reale o fato é elemento constitutivo do direito por si só.

Os fatos jurídicos vistos sob um sentido mais amplo dividem-se em fatos jurídicos em sentido estrito (fatos naturais) e ato jurídico (fatos humanos). É o que diz Monteiro Barros,1967 acerca da conceitualização de fato jurídico classificando este como sendo: “fatos jurídicos seriam acontecimentos, previstos em norma de direito, em razão das quais nascem, se modificam, substituem e se extinguem as relações jurídicas”.

Em sentido estrito, fato jurídico é aquele oriundo, por via de regra, de uma ordem de fenômenos naturais, sem a presença afirmativa da intervenção da vontade humana e que produz efeito jurídico. Classifica-se em ordinário e extraordinário. 

O Fato Jurídico Lato Sensu divide-se em:

1-Fato Jurídico “strito sensu” que nada mais é do que a ocorrência de um fato que se dá independentemente da vontade humana, fato este previsto em norma jurídica, uma vez que não poderá ocorrer fato sem norma que o delimite, ato este capaz de produzir efeitos jurídicos. Podendo classificar– se em fato jurídico ordinário e extraordinário.

a) Do Originário: O Direito se apresenta no ato da apropriação do bem, ou da ocorrência do mesmo por seu titular de maneira direta e objetiva, mesmo que este venha a agir sozinho sem a interferência de terceiros ou por inércia do seu titular não contribuindo para o surgimento do ato ordinário o mesmo poderá ocorrer, atribuindo as devidas consequências nas relações jurídicas.

Dessa forma trago alguns exemplos para melhor conceituar os fatos jurídicos naturais ordinários.

A morte do indivíduo é a extinção da personalidade jurídica do homem, assim como a abertura das obrigações para os diretamente ligados ou vinculados juridicamente como sucessores do individuo falecido (Art. 10 º NCC).

Por sua vez o nascimento é o oposto ao fato mencionado assim, com ele temos o estabelecimento da personalidade jurídica, outorgando direitos e deveres intrínsecos à vida. Ressalto ainda que até mesmo o sopro de vida no ventre materno pode ser alcançado pela ordem jurídica, atribuindo direitos ao nascituro antes mesmo de contemplar seus primeiros momentos de existência (Art. 4º, NCC).

b) Do Extraordinário: São atos que apresentam como característica a sua eventualidade, ou seja, a não repetição contínua dos atos. Exibindo ainda como critérios de caracterização dois requisitos sendo eles: caso fortuito ou força maior e "factumprincipis".

No que se refere ao caso fortuito ou força maior, entende-se que o mesmo, encontra-se alicerçado na impossibilidade de evitar o acontecimento e na ausência de culpa para a colaboração do fato por meio das partes envolvidas na relação afetada, nesse caso serão desobrigadas as partes da responsabilidade acordada anteriormente.

Interessante se faz mencionar que na força maior a causa do ocorrido não é desconhecida, podendo ser causas naturais, apenas impossíveis de serem evitadas, é o caso de um raio, por exemplo, que chega a provocar uma descarga de energia matando alguém, ensejando graves prejuízos.

Já no caso fortuito, a idéia central é de que um pode ser proveniente de causas tanto conhecidas como desconhecidas, ressaltando a possibilidade de até mesmo ter a interferência de um terceiro surgir impossibilitando o cumprimento da execução da obrigação.

Seria o caso, por exemplo, de uma transportadora não ter a sua carga devidamente entregue na hora acordada por conta de um acidente ocasionado por um motorista embriagado que acarretou no fechamento do trânsito por alguns momentos.

Por fim temos o "factumprincipis" este ato tem como capacidade a alteração das relações jurídicas já celebradas, porém, essa intervenção não se dá por agente naturais nem dotados de personificação, a sua participação se dá através da atuação proveniente do Estado titular do exercício desse ato.

Tal interferência se configura quando o Estado, independentes de seus motivos, mas munido de interesse público devidamente observado, entende de interferir numa relação jurídica de âmbito eminentemente privado, acarretando assim alterações em relações já vigentes.

Uma boa forma de exemplificar essa inversão de valores seria pensar no caso de uma decisão de desapropriação de toda uma área por parte do Estado, com a intenção de construção de um metrô, provocando uma enorme alteração no local, pois teremos que ressarcir tantos os moradores que irão mudar de endereço sofrendo prejuízos reais com essa mudança, assim como os proprietários de negócios no local, ambos precisaram ser indenizados pelo Estado o agente individual dessa ação, titular absoluto dessa demanda.

 

Referências
BARROS, MONTEIRO, W. Curso de direito Civil; parte geral. São Paulo, Saraiva, 1967. 6v.
CARRIDE, Norberto de Almeida. Vícios do Negócio Jurídico. São Paulo: Editora Saraiva, 1997.
DINIZ, Maria Helena. Compêndio de Introdução à Ciência do Direito. Editora Saraiva. 5. edição, São Paulo, SP, 1995. 
GOMES, Orlando. Introdução ao Direito Civil. Editora Forense, 13 edição, Rio de Janeiro, RJ, 1998. 
GUSMÃO, Paulo Dourado de. Introdução à Ciência do Direito. Editora Forense, 5. edição, Rio de Janeiro, RJ, 1969. 
KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. Editora Martins Fontes, São Paulo, SP, 1998. 
MATTIA, Fabio M. de. Ato Jurídico em sentido estrito e negócio jurídico. In: Enciclopédia Saraiva do Direito, V.9 e Revista da Universidade Católica de São Paulo, v.32, 1967.
NADER, Paulo. Introdução ao Estudo do Direito. Editora Forense, 14. edição, Rio de Janeiro, RJ, 1997.
REALE, Miguel. Lições Preliminares de Direito. Editora Saraiva, 22. edição, São Paulo, SP, 1995.
RODRIGUES, Silvio. Direito Civil. Editora Saraiva, 27. edição, São Paulo, SP, 1997. 
 
Nota:
[1] Artigo produzido sob a orientação do Ms. Prof.  Francisco Antônio Nogueira Bezerra. Dezembro 2007


Informações Sobre o Autor

Thercya Jamily Ribeiro Barroso Cruz

Professora Universitária, Especialista em Direito Processual Civil


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