Adoção à brasileira

Resumo: A adoção irregular conhecida popularmente como adoção à brasileira constitui o fato de registrar filho alheio como próprio, e tem se tornado cada vez mais freqüente a sua prática na sociedade. O ato de adotar de forma irregular é previsto no ordenamento jurídico brasileiro como crime, sendo tal ato inclusive tipificado no Código Penal. Ocorre que com o advento do Código Civil de 2002, o Estatuto da Criança e do Adolescente, e a recente modificação na legislação através da lei 12.010/09, o vínculo afetivo vem sendo privilegiado em prol do vinculo biológico, isso pode ser comprovado através dos inúmeros julgados concedendo o perdão judicial para pessoas que praticaram a adoção à brasileira, o que contribui para a não punição desse tipo de adoção e que juntamente com vários outros fatores que dificultam o processo regular de adoção resultam no aumento da prática deste ato na sociedade.[1]

Palavras-Chave: Adoção à brasileira; família; Direito Penal; Código Civil; Adoção.

Abstract: Irregular adoption popularly well-known as Brazilian adoptionis thefact thatregisteringanother'schild asown, and hasbecomeincreasingly common practice inthissociety. The actof adoptingirregularlyispredicted in the Brazilian law as a crime, and this act iscriminalizedin the Penal Code. That occurs with the coming of the Civil Code 2012, the status of children and adolescents, and recent modification in legislation through law 12.010/09, the affective bond has been privileged in favor of the biological bond, this can be proven by numerous trial court give judicial forgiveness to people who practiced the Brazilian adoption what contributes not to punish this kind of adoption and together with several other factors that make difficult the regular process of adoption result in the rising of the practice of this act in this society.

Keywords: Brazilian adoption; Family; Penal Code; Civil Code, Adoption

Sumário: Introdução; 1.Contexto Histórico da Adoção; 2. Adoção no Ordenamento Jurídico Brasileiro; 2.1. Adoção no Código Civil de 1916; 2.2. Adoção na Constituição de 1988; 2.3. Adoção no Estatuto da Criança e do Adolescente e a Nova Lei da Adoção- Lei 12.010/09; 3. Processo Judicial para Adoção e Suas Formalidade; 4. Fatores que Levam a Prática da Adoção à Brasileira; 4.1. Constituição da Entidade Familiar; 4.2. Realidade do Abandono de Crianças; 4.3 O Princípio da Afetividade Para a Construção da Entidade Familiar; 5. Adoção à Brasileira; 6. Análise Jurisprudencial; Conclusão.

INTRODUÇÃO

O trabalho abordado será referente à adoção, especificadamente sobre a adoção que ocorre de maneira irregular, mais conhecida por alguns doutrinadores como adoção à brasileira. Constitui adoção à brasileira o fato das pessoas registrarem em seu nome filhos não biológicos sem observar as exigências legais, muitas vezes utilizando documentos falsos de maternidade ou hospitais.

A filiação é um meio de ligação entre as crianças e os pais, essas crianças passam a ter um vínculo, não só afetivo, mas jurídico com seus pais, dando origem assim a uma família. Com a intenção de formar uma família, e dar um lar a essas crianças, varias pessoas acabam optando por esse meio de adoção, alegando que o processo para uma adoção legal seria muito demorado e cansativo, passando assim a fazer a filiação de tais crianças.

A adoção à brasileira é mais comum do que se possa imaginar, e no decorrer do trabalho busca-se esclarecer alguns costumes inadequados previstos na sociedade brasileira, que muitas vezes sem saber ou sem desejar acaba optando por este método, pois apesar da pessoa que adotou ter a melhor das intenções, e ser passível de perdão judicial, tal adoção é contra nossa legislação e constitui crime.

A metodologia utilizada na confecção do artigo científico será a bibliográfica pautada pelo método histórico-jurídico.

Busca-se apresentar neste trabalho o instituto da adoção à brasileira, já que grande parte da sociedade age de maneira irregular, observando os motivos que levam as pessoas a optar por essa via de adoção, onde as mesmas não atentam para a legislação e acabam praticando um ato ilícito,

Objetiva-se abordar o conceito de adoção, analisar seus efeitos positivos e negativos para a sociedade, bem como fazer um comparativo com a adoção que ocorre de forma regular, ressaltando as leis vigentes no ordenamento jurídico brasileiro, o posicionamento da doutrina e jurisprudências acerca do tema, visando demonstrar os possíveis motivos que levam as pessoas a praticarem esses atos.

Com base no exposto, espera-se demonstrar do decorrer do trabalho que a pratica da adoção à brasileira ocorre constantemente na sociedade, e merece uma atenção especial dos legisladores, pois acaba colocando em risco o interesse da criança e do adolescente, bem como a importância da organização familiar.

1-CONTEXTO HISTÓRICO DA ADOÇÃO

A adoção sempre teve como objetivo a necessidade de dar continuidade à família, visto que a família é a base da sociedade, sendo assim a adoção se tornou uma forma de perpetuar o culto familiar. Na antiguidade era necessário que o homem cultuasse a memória dos seus antepassados comuns, isso era feito através do casamento, onde o homem era obrigado a ter filhos para que não tivesse sua família extinta, e quando não era possível dar continuidade a sua linhagem, o ultimo recurso utilizado para perpetuar a família era o instituto da adoção.

A adoção tem seus primeiros indícios na Bíblia, onde os hebreus iniciaram a sua pratica, logo depois na Grécia ela chegou a desempenhar relevante papel social e político, sendo a manutenção do culto familiar pela linha masculina, visto que, se alguém viesse a falecer sem um descente, não haveria pessoa capaz de continuar o culto aos Deuses-lares. Mas foi em Roma que a adoção teve o seu mais importante desempenho, pois foi no direito romano que a adoção encontrou disciplina a passou a ser regulada. (GONÇALVES, Carlos Roberto, 2008)

A adoção teve maior força em Roma, e segundo as lições de Silvio Venosa (2012, p.278), no Direito Romano existiam duas modalidades de adoção: A “Adoptio” e a “Adrogatio”. A “Adrogatio” era a modalidade mais antiga de adoção, e por pertencer ao Direito Público exigia formas mais solenes que se modificaram e se simplificaram no curso da historia, visto que a tendência era essa, pois como é sabida a sociedade é fonte do Direito, e o mesmo deve se adequar as suas modificações. A “Adrogatio” era tão complexa, que abrangia não só o adotando, mas toda a sua família, não sendo permitida ao estrangeiro. Além disso, a referida adoção só estaria completa, ou seja, formalizada, após aprovação dos pontífices, e do povo através de decisões em comícios. (VENOSA, Silvio de Salvo, 2011)

A outra modalidade de adoção era a “Adoptio”, essa modalidade era mais simples, pertencia ao direito privado, consistia na adoção de um “sui iuris”, muitas vezes um “pater famílias”, que tinha que abandonar publicamente sua família, para assumir o culto doméstico do adotante, tornando-se assim seu herdeiro. Por ser um ato destinado ao direito privado, os que praticavam possuíssem o pátrio poder, sendo um ato de menor gravidade e não exigindo a autorização dos pontífices e nem do povo.

Ambas as formas de adoção tinham o intuito de perpetuar o culto familiar, seja pelo interesse do Estado, através da “Adrogatio”, seja pelo interesse do próprio ser humano através da “Adoptio”, mostrando assim que a adoção ocorria com muita força em Roma, e que a família sempre foi à base da sociedade.

Porem apesar de ter ocorrido com tanta força em Roma, na Idade Média, sob influências religiosas e com a preponderância do Direito Canônico, a adoção cai em desuso, e só reaparece na Revolução Francesa, sendo incluída no Código de Napoleão em 1804, mas de forma bem tímida, evoluindo no decorrer do tempo.

Com o sentimento humanitário acentuado, atualmente a adoção é prevista em quase todas as legislações modernas, seja com maior ou menor intensidade, onde o bem estar do menor é umas das preocupações dominantes.

2. A ADOÇÃO NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO

A adoção no ordenamento jurídico brasileiro vem a ser muito relevante, pois mostrará a evolução do instituto da adoção acerca do nosso ordenamento jurídico.

2.1 A ADOÇAO NO CÓDIGO CIVIL DE 1916

O Código de 1916 caracterizava-se pela originalidade ou nacionalidade. Seu mentor soube aproveitar as contribuições das ciências jurídicas de outros povos. Adaptou o que se enquadrava em nossa realidade; rejeitou o que não servia, criando algo, por muitas vezes, genuinamente brasileiro; destacou-se, inclusive por sua forma literária, por pureza de linguagem.

O instituto da adoção foi incorporado no Brasil na Monarquia Portuguesa, vindo a surgir no ordenamento jurídico brasileiro no Código Civil de 1916 no art. 368 a 378, tendo como forma de constituição do ato a escritura pública, a adoção foi disciplinada com base nos princípios romanos, ou seja, com objetivo de dar continuidade ao culto familiar, e proporcionar a constituição de uma família a casais que não poderiam ter filhos biológicos, por esse motivo só era permitida aos casais com mais de 50 anos, sem prole legítima ou legitimada, pois com essa idade era grande a probabilidade de não virem a ter mais filhos. (GONÇALVES, Carlos Roberto, 2008)

Como a sociedade está em constante evolução, e o Direito deve acompanhar a evolução da sociedade, foi assim com o instituto da adoção. Em 1957 com a entrada em vigor no dia 8 de Maio da Lei N° 3.133 a adoção passou a desempenhar um papel muito importante na sociedade, transformando-se em instituto filantrópico, com caráter humanitário, destinado não só aqueles casais que não poderiam ter filhos, mas também possibilitando a menores desamparados a possibilidade de ter um novo lar. Isso se deu porque um dos fatores importantes trazidos pela nova lei era a diminuição da idade para poder adotar, antes de 50 anos agora para 30 anos de idade, sendo que a pessoa poderia ou não ter prole natural.

O artigo 378 do referido Código Civil não extinguia os laços com a família biológica ao afirmar que: “os direitos e deveres que resultam do parentesco natural não se extinguem pela adoção, exceto o pátrio poder, que será transferido do natural para o adotivo”. (Código Civil Brasileiro, 1916)

Diante dessa situação dos adotantes terem que partilhar os filhos adotivos com sua as famílias biológicas, os mesmos começaram então a registrar os adotados como filhos próprios, dando origem assim ao que muitos doutrinadores chamam de adoção à brasileira.

Essa lei também determinou na redação dada ao art. 377, do Antigo Código, que, quando o adotante tivesse filhos legítimos, legitimados ou reconhecidos, a relação de adoção não envolvia a sucessão hereditária. Esse preceito teve vigência até a constituição de 1988, pois o art. 227 da CF§6° equiparou os filhos de qualquer natureza, para todos os fins.

2.2 ADOÇÃO NA CONSTITUIÇÃO DE 1988

A Constituição Brasileira de 1988 marca a consolidação da democracia após anos de ditadura militar, pois traz alterações importantes no ordenamento jurídico brasileiro como garantias sócias, individuais, políticas, entre outras. Ao cuidar dos Direitos Sociais, faz referencia em seu Art. 6° sobre a maternidade e a infância como garantias fundamentais para o desenvolvimento da pessoa.

Porem é no Art. 277 da Carta Magna, em seus § 5° e 6° que a adoção está presente de forma específica, onde o legislador assegura os direitos da criança e do adolescente, garantindo a fiscalização pelo Poder Público das condições para a efetivação da colocação da criança e do adolescente em família substituta na modalidade da adoção, objetivando, por conseguinte, entre outros, evitar o trafico de infanto-juvenis. Com o intuito de promover a igualdade o referido artigo, também veio regular a antiga diferença que existia entre filhos biológicos e os adotados, proibindo expressamente qualquer espécie de discriminação face à filiação adotiva, no que diz respeito aos direitos alimentícios, sucessórios, ao nome, etc., salvo os impedimentos matrimoniais. (Constituição Federal de 1988, art. 227§5° e 6°)

2.3 ADOÇÃO NO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE E A NOVA LEI DA ADOÇÃO- LEI 12.010/2009

A nova lei da adoção foi introduzida no ordenamento jurídico brasileiro visando reduzir o tempo de permanência de crianças e adolescentes em instituições, buscando acelerar o processo de adoção.

O que se pode observar é que não temos uma nova lei de adoção, o que acontece é que a referida lei trouxe uma nova redação a dois artigos do Código Civil (1.618 e 1.619) e revogou todos os demais referentes ao Capitulo da Adoção, deixando assim que a adoção fosse exclusivamente tratada pelo Estatuto da criança e adolescente.

“Apesar de a referida lei conter apenas 8 (oito) artigos, introduziu 227 (duzentas e vinte e sete) modificações no ECA. Sendo que seu primeiro artigo ressalta que é dever do Estado prestar assistência, orientação, e apoio a promoção social da família natural, procurando assim evitar o aumento de crianças e adolescentes em instituições para adoção, diante disso a criança e o adolescente devem permanecer com a família natural e somente em caso de absoluta impossibilidade, sendo esta reconhecida por decisão judicial fundamenta, é que a criança e o adolescente deverão ser colocados em uma família substituta, adoção, tutela e guarda”. (DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias, São Paulo, 2013)

Outro fator importante trazido pela Lei da Adoção é o Cadastro Nacional de Adoção, onde reúne todas as pessoas que desejam adotar um filho, bem como todas as crianças e adolescentes que estão aptos para adoção, isso promoveu uma grande evolução para adoção, visto que antes o cadastro era Regional, hoje passou a ser Nacional, e segundo Maria Berenice Dias (2013, p. 518) isso possibilita que crianças de um Estado possam ser adotas por alguém de outro Estado, aumentado assim a possibilidade de uma criança ter um lar de forma mais rápida.

Apesar de a lei condicionar que para adoção é necessário o prévio cadastro dos candidatos, ela admite exceções (ECA 50§13) tais como: a adoção unilateral, adoção por parentes com o qual a criança ou adolescente mantenha vínculos de afetividade ou afinidade, ou se o pedido de adoção é feito por pessoa que detém a guarda ou tutela de criança maior de 3(três) anos ou adolescente, desde que o lapso de convivência comprove a fixação de laços de afinidade e afetividade, e não seja constatada a ocorrência de má fé. (GRANATO, Eunice Ferreira Rodrigues, 2012)

Além disso, a lei trouxe conceitos fundamentais para o entendimento da adoção tais como o conceito de família substituta, que é aquela que acolhe uma criança ou adolescente desprovido de família natural, ou seja, a família por laços de sangue.

Também trouxe o conceito de família extensa ou família ampliada, onde o adotando só será encaminhado para uma família substituta caso seja esgotadas todas as tentativas de adoção da criança e do adolescente por parentes próximos, com os quais o adotante tenha laços de afinidade e afetividade.

Outra inovação trazida pela lei é que qualquer pessoa maior de 18(dezoito) anos, independentemente do seu estado civil poderá adotar. Contudo, em se tratando de adoção conjunta é indispensável que os adotantes sejam casados civilmente, ou mantenham união estável, comprovada a estabilidade familiar. Porém a referida lei não contempla a adoção conjunta por união homo afetiva, estando essa ainda vedada no ordenamento jurídico brasileiro, devido à necessidade de comprovação do estado civil de casado, ou de união estável. Vale destacar que a sociedade vem sofrendo modificações, e já existem jurisprudências acerca do reconhecimento de união estável por casais homossexuais, bem como já houve decisão judicial acerca de adoção por união homo afetiva estável, com fundamento de atender o melhor interesse da criança.

Um fator que vem causando controvérsia entre a doutrina é o fato de que irmãos não poderão ser adotados separadamente, o que pode resultar em uma dificuldade para tais crianças serem adotadas, visto que é muito raro quem queira adotar mais de uma criança ao mesmo tempo.

A nova lei da adoção visa à permanência da criança e do adolescente com a família natural, e para garantir isso proporciona à gestante ou a mãe que queira entregar os filhos para adoção assistência psicológica no período pré e pós natal, sendo que a mãe deverá ser encaminhada a Justiça da Infância e juventude.

Sendo assim a Lei da Adoção, trouxe para o ordenamento jurídico brasileiro transformações relevantes a adoção, onde privilegia o convívio com a família natural, e possibilita maiores oportunidades para aqueles que querem adotar, sempre visando o melhor para a criança e adolescente.

3- PROCESSO JUDICIAL PARA ADOÇÃO E SUAS FORMALIDADES

A adoção depende do processo judicial, e quando há a necessidade de adotar é necessário que se procure os meios legais para proceder com a adoção.

Para dar início ao processo legal para adoção é necessário primeiramente que ocorra a natureza subjetiva do agente, ou seja, a vontade de adotar uma a criança, reconhecendo-a como seu próprio filho, e lhe proporcionando amor, carinho, saúde, enfim, todos os institutos que entidade familiar oferece.

Depois de demonstrada a vontade de adotar uma criança ou adolescente, é necessário ter idade mínima de 18(dezoito) anos, como ressalta o ECA, ou em caso de adoção conjunta, deve haver a comprovação do vínculo do casamento ou da união estável, conforme determinam os parágrafos 3° e 5° do Art. 227 da Constituição Federal, o que pressupõe a união de pessoas de sexo diferentes, o que não ocorre quando há a adoção individual, pois a mesma independe do estado civil, opção sexual, bastando que o interessado tenha mais de 18 (dezoito) anos.

A competência para os processos de adoção é da Vara de Criança e Juventude, onde o interessado deverá comparecer manifestando sua vontade de proceder com o processo de adoção, não sendo necessário estar acompanhado de advogado.

Juntamente com a petição inicial é necessária a apresentação de inúmeros documentos tais como: comprovante de renda e de domicílio, atestado de sanidade física e mental; certidão de antecedentes criminais e negativa de distribuição cível, conforme o ECA art. 197-A, na oportunidade os candidatos devem indicar o perfil de quem aceita adotar. Após a verificação da documentação apresentada, será realizado um cadastro, onde o candidato se habilita a uma fila de adoção, visto que a inscrição no cadastro só será realizada após a investigação do candidato, onde a mesma tenha um resultado positivo, estando este apto a adotar. (Dias, Maria Berenice. 2013)

Além disso, a inscrição também estará condicionada a um período de preparação psicossocial e jurídica (ECA 50§3°.), mediante freqüência obrigatória a programa de preparação psicológica, orientação e estimulo à adoção inter-racial, de crianças maiores ou de adolescentes, com necessidades especificas de saúde ou com deficiências e de grupos de irmãos (ECA 197-C§1. °).

A fase de estudo psicossocial é extremamente relevante, pois é um instrumento de avaliação do contexto familiar no qual o adotando será inserido. Visando assim a proteção integral do bom desenvolvimento da criança e do adolescente, bem como evitando possíveis negligências, tais como abusos, rejeição maus tratos ou devoluções, pois o ato é adoção é irrevogável.

A etapa mais longa do processo de adoção é da aprovação dos adotantes. Depois das entrevistas, da visita às residências dos pretensos adotantes e, depois de esclarecidas todas as dúvidas dos técnicos do Juizado, este processo segue para o Promotor que manifestará sobre a habilitação e, finalmente, o processo segue para o juiz que, encontrando-o satisfatoriamente instruído, poderá deferir a habilitação dos adotantes. Os pretensos adotantes, depois de aprovados pelo juiz, estarão em condições de adotar e passarão a integrar um cadastro ou relação de possíveis adotantes. (BOCHNIA, Simone Franzoni. 2010)

Também se faz necessário o estagio de convivência (ECA 46), havendo a possibilidade de o juiz dispensá-lo quando o adotante já estiver sob tutela ou guarda por tempo suficiente para se avaliar a conveniência da consolidação do vínculo (ECA46§1).

Por fim, a adoção é estabelecida por sentença judicial, que dispõe de eficácia constitutiva, e produz efeito a partir de seu transito em julgado. Há uma exceção a essa regra: na hipótese de ocorrer o falecimento do adotante no curso do processo de adoção, a sentença dispõe de efeito retroativo à data do óbito (ECA 47§7°), desde que já tenha havido inequívoca manifestação de vontade. (ECA42§6°).

4. FATORES QUE LEVAM A PRÁTICA DA ADOÇÃO À BRASILEIRA

Antes de falar instituto da adoção à brasileira, se faz necessário entender os principais fatores que levam a prática deste tipo de adoção. Onde há três fatores relevantes para essa prática, que são: o desejo da constituição da entidade familiar, o abandono de crianças e adolescentes e o laço afetivo. Partindo dessas premissas começaremos a entender a prática da adoção à brasileira pela sociedade.

4.1 CONSTITUIÇÃO DA ENTIDADE FAMILIAR.

O primeiro fator a ser apresentado é a constituição da entidade familiar, muitos têm o desejo de constituir uma família, dar e receber amor, e para isso acabam recorrendo ao instituto da adoção à brasileira por acreditarem que é uma forma mais rápida e fácil de garantir a construção da família.

Para entender o desejo pela constituição de uma família, é necessário entender o conceito e a definição de família, visto que a família vem a ser a célula “mater” da sociedade, e sua constituição é almejada por grande parte da população.

A família é uma sociedade natural, formada por indivíduos unidos pelos laços de sangue, ou por afinidade. Entende-se como laço sanguíneo aquele que resulta da descendência, e laços por afinidade são aqueles que resultam da entrada dos cônjuges e seus parentes à entidade familiar. (VENOSA, Silvio de Salvo, 2012)

Na antiguidade a família romana era eminentemente patriarcal, com base na comodidade e na necessidade de manutenção e subsistência da propriedade, onde não havia nenhum laço afetivo entre seus membros, onde a família era instituída com interesse unicamente financeiro.

No século XVIII, se consolidou o modelo patriarcal de família, onde cada membro tinha suas funções e não questionava suas atribuições e deveres, e os interesses individuais eram desprezados. No modelo de família patriarcal, o marido comandava a família, tendo esse poder atribuído pela sociedade e pela lei.

Sendo assim, a colonização brasileira seguiu os modelos europeus, ou seja, estabilidade patriarcal, obediência a igreja, aristocracia e escravidão, sendo que o sistema de filiação estava vinculado ao casamento e não ao sangue, muito menos ao afeto e amor.

Porem esse conceito de família foi se modificando ao longo do tempo, onde fatores como amor e afeto passaram a ser mais relevantes para a constituição da entidade familiar. Conforme Maria Berenice Dias (2013, p.41), hoje é difícil encontrar uma definição de família, pois nos dias de hoje o contexto social nos leva a ter inúmeras definições do que vem a ser uma família. Aquela visão de identificar a família através do matrimonio, ou ter em mente uma imagem de família patriarcal como figura central, com o tempo foi sofrendo significativas transformações.

Uma mudança relevante para a sociedade que contribuiu para a evolução do conceito de família foi à emancipação feminina e o ingresso da mulher no mercado de trabalho, pois esses fatores acabaram levando a mulher para fora do lar, deixando assim o homem de ser provedor exclusivo da família, e participando mais das atividades domésticas.

Além dessas transformações sociais, o afrouxamento entre o Estado e a Igreja também contribuiu para a evolução social do conceito de família. Começaram a surgir novas estruturas de convívio sem uma terminologia adequada que as diferencie.

No dizer de Paulo Lôbo (2011, p.29-40) a família é sempre socioafetiva, em razão de ser um grupo social considerado base da sociedade e unida na convivência afetiva. A afetividade como categoria jurídica, resulta da transferência de parte dos fatos psicossociais que a converte em fato jurídico, gerador de efeitos jurídicos.

Hoje, é necessário ter uma visão pluralista de família, abrigando os mais diversos arranjos familiares, devendo-se buscar o elemento que permite enlaçar no conceito de entidade familiar todos os relacionamentos que tem origem em um elo de afetividade, independentemente de sua conformação.

Maria Berenice Dias (2013, p.43) ensina que o novo modelo de família funda-se sobre os pilares da repersonalização, da afetividade e da pluralidade, sendo esses elementos essenciais para a construção da entidade familiar, e é isso que justifica a proteção do estado em relação à família, pois com tantas evoluções a família passou a existir tanto para o desenvolvimento da personalidade de seus integrantes como para o crescimento e formação da sociedade.

A teoria e a pratica das instituições familiares dependem, em ultima análise, da competência em dar e receber amor, onde a família continua mais empenhada do que nunca em ser feliz. A manutenção da família visa, sobretudo, buscar a felicidade.

4.2 A REALIDADE DO ABANDONO DE CRIANÇAS

O abandono de crianças é outro fator muito relevante que influencia a prática da adoção à brasileira, pois é muito difícil não se comover com a realidade de ver crianças sendo abandonadas, correndo o risco de morrer, e não fazer nada. O abandono, juntamente com a morosidade do processo de adoção legal, leva muitas pessoas a optarem pela adoção de forma irregular.

O abandono é algo tão antigo quanto à sociedade, pois é uma pratica que se tornou comum em todos os tempos e lugares, o que vai se modificando em decorrer do tempo são os motivos, as circunstancias, as atitudes, ou seja, os fatores que levam a praticar o abandono.

No Brasil, a história social do abandono não pode deixar de lado à forte presença da pobreza, marginalidade social, a criança ilegítima, o concubinato, a mestiçagem. Tanto que, há relatos de abandono no Brasil desde o século XVIII, pois o sistema colonial implantado de escravidão e a concentração de riqueza em torno da grande propriedade monocultora acabaram determinando a existência de uma linha de pobreza grave, onde muitas mães e famílias não tinham condições de criar seus filhos, e acabavam abandonando-os nas ruas, sendo assim um dos principais fatores que sempre levaram ao abandono infantil foi à miséria. (PAULA, Tatiana Wagner Lauand de, 2007)

Outro fator importante que influenciou o a prática do abandono, foi o culto da igreja católica à virgindade da mulher, onde isso determinou um modelo de comportamento na sociedade brasileira, onde as mulheres que não cultuavam a virgindade até o casamento, e as adulteras sofriam preconceitos, tendo seu respeito diminuído perante a sociedade. Para evitar a vergonha de ser mãe solteira, ou de ter cometido adultério, muitas mulheres acabaram optando por abandonarem seus filhos. Hoje esse reflexo ainda é presente na sociedade, pois muitas mulheres preferem abandonar seus filhos a serem mães solteiras, justamente por haver tanto preconceito da sociedade, além da falta de condições para criar seus filhos.

Os fatores apresentados continuam refletindo na sociedade, onde hoje ainda é muito grande o índice de crianças abandonadas. Além dessa forma de abandono, para a doutrina e para a jurisprudência brasileira, são consideradas abandonadas as crianças que vivam na companhia de pai, mãe, tutor ou pessoa que se entregue a pratica de atos contrários à moral e aos bons costumes, bem como aquelas vítimas de maus tratos, exploração, privada de alimentos e cuidados necessários para a preservação da saúde.

Há também crianças que são abandonadas quando as famílias as deixam em abrigos ou instituições destinadas aos cuidados de crianças, com a “desculpa” de que será por um pequeno período até obter um emprego, porem nunca mais retornam, e as crianças acabam ficando esquecidas, ou acabam indo para tais instituições devido serem vítimas de maus tratos, espancamentos, abusos sexuais, filhos de pais alcoólatras ou com vício em drogas e etc.

Enfim, os vários motivos que levam ao abandono de tais crianças nunca poderão ser analisados de forma isolada, visto que são inúmeros os fatores que levam a prática do referido ato. O que é possível perceber acerca do abandono de crianças, é que grande parte dessas crianças que hoje se encontram em abrigos é oriunda de famílias que não possuem condições financeiras para cuidar dessas crianças, onde apresentam enorme dificuldades para garantir os direitos fundamentais essenciais para a sobrevivência destas crianças, bem como meios necessários para uma sobrevivência digna.

Todos esses fatores resultam em uma carência não só material como emocional, sendo que a carência emocional chega a ser mais relevante, pois uma criança necessita de cuidados, amor, carinho, de um lar onde possa estar devidamente amparada. Diante de toda essa carência, de todos os motivos que levam ao abandono, muitas pessoas acabam sentido a necessidade de fornecer um lar digno a essas crianças através da adoção, muitos tentam pela forma legal, mas a morosidade deste processo acaba resultando na adoção à brasileira, pois a “vontade” de instituir uma família e fornecer um lar a quem não possui nada acaba se sobrepondo aos meios legais para adoção.

4.3 O PRINCÍPIO DA AFETIVIDADE PARA A CONSTRUÇÃO DA ENTIDADE FAMILIAR.

O Código Civil de 1916 instituía o modelo de família patriarcal, monogâmica, parental e patrimonial, isto é, a tradicional família romana, onde o padrão ideal de família seria aquele instituído por pai, mãe e filho, além disso, a entidade familiar formada nesses moldes colocava de lado o ser, e acabava privilegiando o ter, onde questões como afeto, amor, carinho não eram relevantes.

A constituição Federal de 1988, chamada de constituição Cidadã, trouxe transformações importantes acerca da entidade familiar, onde as renovações das tendências sociais acabaram derrotando aquele modelo de família patriarcal que se manteve vigente por séculos. De acordo com Tatiana Wagner Lauand de Paula (2007, p.45), nesse momento de profundas transformações, abandonou-se a ideia principal de hierarquia e a afetividade passou a ser função basilar, sendo responsável pela viabilidade e continuidade das relações familiares.

Diante disso, Paulo Lôbo (2010, p.47) identifica da constituição quatro fundamentos essenciais do princípio da afetividade:

a)    Igualdade de todos os filhos independentemente da origem (CF 227§6°)

b)    A adoção, como escolha afetiva com igualdade de direitos (CF227 § 5° e 6°)

c)    A comunidade formada por qualquer um dos pais e seus descentes, incluindo adotivos, com a mesma dignidade da família (CF 226§ 4?)

d)    O direito a convivência familiar como prioridade absoluta da criança, do adolescente e do jovem (CF 227).

O afeto não é fruto da biologia, os lações de afeto e de solidariedade derivam da convivência familiar, não do sangue. Maria Berenice Dias explica que a “posse de Estado de filho nada mais é do que o reconhecimento jurídico de afeto, com o claro objeto de garantir a felicidade, como um direito a ser alcançado” (DIAS, Maria Berenice, Manual de Direito das Famílias, Revista dos Tribunais, p. 73, 2013).

A família se transforma na medida em que se acentuam as relações de sentimento entre seus membros, ou seja, o afeto passa a ser mais valorizado nas entidades familiares. Essas constantes transformações trazem novos modelos de família, pois as diferenças que eram evidentes entre homens e mulheres passaram a ser mais igualitária, e os novos modelos de família passaram a ser mais flexíveis tanto em sua temporalidade como em seus componentes, sendo menos sujeitas as regras e mais ao desejo.

A afetividade entrou na concepção moderna dos juristas buscando explicar as relações familiares contemporâneas, visto que, o afeto não representa um modelo único de família, matrimonial, o afeto representa a diversidade familiar.

Enfim, a familiar converteu-se hoje em um ambiente propicio para a realização do ser humano, ou seja, somente se justifica a proteção da família para que se efetive a tutela da própria pessoa humana, não sendo mais vislumbrada como simples constituição jurídica e social, voltada apenas para fins patrimoniais e reprodutivos. Sendo assim, todas as relações familiares, sejam elas formais ou informais, indígenas ou exóticas, por mais complexas que se apresentem, nutrem-se todas elas de substancias triviais e ilimitadamente disponíveis a quem delas queira tomar afeto, perdão, amor, carinho, paciência, por fim tudo aquilo que de um modo ou de outro possa ser reconduzido a arte e a virtude de vier em comum, dependendo assim das instituições familiares unicamente da nossa capacidade de dar e receber amor. (PAULA, Tatiana Lauand de, 2007)

5. ADOÇÃO À BRASILEIRA

Convencionou-se a vulgarmente a chamar de adoção à brasileira, um sistema de adoção feito sem o procedimento legal para o processo de adoção, onde consiste no ato de registrar filho alheio como próprio, ou seja, a criança é registrada por pais não biológicos sem atender aos requisitos estabelecidos em lei. Essa prática já existe no Brasil de forma disseminada, e seu nome foi eleito pela jurisprudência, no entender de Maria Berenice Dias (2013, p.509).

O registro da criança é feito no Cartório de Registro Civil das Pessoas Naturais, de forma extremamente fácil, pois com base no disposto no art. 54 da Lei de Registros Públicos (Lei 6.015/73), basta o suposto pai ou mãe declarar o nascimento relatando que a criança nasceu em casa.

Além dos motivos que já foram relatados, existem outros fatores que também influenciam na prática da adoção à brasileira, dentre eles estão à esquiva de um processo judicial para adoção, demorado e dispendioso e o medo de não lhe ser concedida a adoção pelos meios regulares, pois há uma grande formalidade a ser seguida durante o processo devendo aguardar no final uma sentença do juiz, que analisará os requisitos, e caso o adotante não esteja apto, rejeitará o pedido. (PAULA, Tatiana Wagner Lauand de, 2007)

Desta forma, as pessoas passam a optar pela adoção à brasileira para atingir seu objetivo de forma rápida e fácil, sem pensar nas conseqüências que poderão surgir através desta prática ilegal. Destacam-se duas conseqüências relevantes de tal ato.

A primeira delas consiste na anulação do registro de nascimento, isso poderá ocorrer caso a mãe venha a se arrepender futuramente de ter dado seu filho para que outro registrasse, e com um simples exame de DNA, a mãe biológica poderá comprovar seus laços sanguíneos, e assim poderá resultar na desconstituição daquela entidade familiar, o que demonstra que tal relação é muito frágil, onde a família que prefere pela forma irregular, acaba também optando por viver uma situação instável e arriscada, se submetendo ao medo de que no futuro a verdade possa vir à tona.

Vale ressaltar que o arrependimento dos pais biológicos não garante que a criança voltará para o convívio deles, pois a legislação brasileira que trata da adoção legal (Lei12. 010/09), tem como prioridade o convívio familiar, onde a família se sobrepõe a instituição, e o afeto tem mais importância que o vínculo biológico, o que dificultaria o retorno dessa criança aos pais biológicos. Lembrando ainda que a adoção à brasileira não goza da irrevogabilidade nem da proteção e segurança jurídica dada à adoção legal.

Além do mais, quando faticamente há uma adoção consolidada, a regularização da situação se faz necessária e tem base no princípio constitucional do melhor interesse da criança, disposto no artigo 227 da Constituição Federal e art. 39 e seguintes do Estatuto da Criança e do Adolescente. A regularização, neste caso, representa efetivo benefício à criança que tem direito absoluto à convivência e, para quem, muitas vezes, os únicos pais que conhece são os pais adotivos.

Nos casos de adoção através de registro de filho alheio em nome próprio o vínculo familiar representa a verdade sócio afetiva e traz consigo uma estabilidade e segurança física e emocional à criança. Essa proteção é o bem jurídico de maior relevância e é a efetivação do disposto no princípio constitucional do melhor interesse da criança.

A segunda consequência importante é a que trata da esfera penal, visto que há previsão legal do ilícito de registrar filho alheio como próprio, sendo assim a adoção à brasileira é um crime previsto no ordenamento jurídico brasileiro.

A adoção à brasileira vem sendo comumente praticada do Brasil, por mais que seja por nobre motivo, tal pratica vem a ser uma dissimulação e uma infração a lei, visto que é tratada como crime no capítulo “dos crimes contra o estado de filiação” (capítulo II do Título VII), tipificada no artigo 242 do Código Penal Brasileiro (Decreto Lei 2.848/1940). (BOCHNIA, Simone Franzoni, 2010)

Ademais, o crime de falsidade ideológica trazido pelo art. 299 do Código Penal (Decreto Lei 2.848/1940) vem complementar a tipicidade da prática de registro de filho alheio em nome próprio.

Além de dar proteção e garantia ao estado de filiação, o legislador teve intuito de preservar a autenticidade e a veracidade dos documentos públicos. Protegem-se a segurança e a certeza do estado de filiação evitando supressão ou alteração de direito inerente ao verdadeiro estado civil da criança, que poderia ficar juridicamente vinculado a pais diversos de seus verdadeiros.

O combate à adoção à brasileira também se justifica na medida em que a adoção pode ser praticada com fins lucrativos. E a criminalização da adoção à brasileira é a forma de amparar a família, essencial na formação da dignidade de todo cidadão, principalmente das crianças e dos adolescentes. O Estado tem o dever de proteger a família, já que dela depende a subsistência de toda a sociedade.

Todavia, se o crime é praticado com reconhecida nobreza, o próprio Código Penal (Decreto Lei 2.848/1940) reconhece no parágrafo único do art. 242 que poderá o juiz deixar de aplicar à pena e esta tem sido a conduta adotada pela jurisprudência. Tal fato ganhou ainda mais força com o advento da lei 12.010/2009 onde a prioridade é a convivência familiar, através da qual a família se sobrepõe a instituição, e com isso, acredita-se que a adoção à brasileira será analisada sem que haja punição.

Embora se possa pensar que a adoção à brasileira é uma exceção, a ela se arriscando apenas pessoas de menor esclarecimento e de baixa renda, pesquisa elaborada demonstra o contrário. Há quase a mesma proporção de adoções regulares e irregulares no Brasil.

“Destacando-se o percentual de 52,1% de adoções regulares e o restando compondo as adoções irregulares, em que a maioria das adoções informais, ou seja, 41,5% ocorreram através de registro em cartório da criança de outrem, como filho legítimo, através de uma declaração falsa de nascimento. O restante das adoções informais, 6,4% seguiu o procedimento conhecido como filhos de criação, isto é a criança passa a morar definitivamente com outra família, mas sua certidão de nascimento não é alterada, permanecendo com a filiação de seus pais biológicos”. (GRANATO, Eunice Ferreira Rodrigues, Adoção Doutrina e Prática, Curitiba, 2012, p.139)

Outro fator que merece destaque é que a adoção à brasileira pode gerar não só uma possibilidade de condenação penal, como a nulidade do registro, pois o mesmo não está em conformidade com a lei, sendo assim a qualquer momento o mesmo poderá ser declarado como nulo, pois quem se sujeita a adoção à brasileira está constantemente exposto ao risco de descoberta do ocorrido.

Todavia, são unanimes a doutrina e a jurisprudência em diligenciar meio e pretextos para contornar o texto álgido da lei a fim de não cominar pena alguma. Ademais, com o advento da lei 12.010/2009, a prioridade é a garantia do direito à convivência familiar a todas as crianças e adolescentes e, com isso, pode o adotante, de fato, requerer a regularização da situação de sua adoção irregular utilizando o melhor interesse da criança e o fato dela já se encontrar incluída em uma família. Entretanto, será necessária a comprovação dos requisitos para efetivação da adoção legal.

Deve-se ressaltar, contudo, que a adoção, atualmente, só poderá ser deferida pelo juiz quando apresentar reais vantagens para o adotando e tão somente quando não mais houver possibilidades de resgatar a filiação biológica.

6. ANALÍSE JURISPRUDENCIAL

A análise jurisprudencial referente à adoção à brasileira vem a ser muito importante, pois vem dispor sobre as decisões dos tribunais acerca da desconstituição do vínculo parental nas adoções de forma irregular.

Pode-se concluir que a doutrina e a jurisprudência são pacificas na busca pelo melhor interesse para criança, garantindo assim a convivência familiar, onde pôr fim acabam desconstituindo o vínculo parental em face do vínculo socioafetivo.

Sendo assim a doutrina e a jurisprudência são unânimes em diligenciar meios e pretextos para contornar o texto álgido da lei a fim de não cominar pena alguma, quando alguns, entre esses milhares de casos que anualmente ocorrem, chegam por qualquer circunstancias as barras dos tribunais. Ninguém resiste à verdadeira coação de ordem moral decorrente do alto valor espiritual e humano que inspiram tais gestos. (GRANATO, Eunice Ferreira Rodrigues, 2012)

Com base nisso, encontrou-se, por proposta da Associação Brasileira de Juízes e Promotores da Infância e da Juventude, uma solução legislativa que, embora não descriminalizasse o fato, penalizava-o de forma mais branda, permitindo até o perdão judicial.

Com efeito, a lei 6.898 de 30.03.1981, passou a tipificar o “registrar como seu o filho de outrem”, como crime no Código Penal, em seu art. 242, onde a pena é de dois a seis anos de reclusão, mas em contrapartida vem excepcionar em seu parágrafo único, onde diz “se o crime é praticado por motivo de reconhecida nobreza, a pena é de um a dois anos, podendo o juiz deixar de aplicar à pena.

O que se observa é que cada vez mais as decisões são em favor do vínculo afetivo e da entidade familiar, onde os acórdãos absolutórios são quase que unanimes.

A título de exemplo podem ser citados os pronunciamentos: RT 149/706; 155/305; 167/541, 542, 190/65; 195/97, bem como TJ-RS – Apelação Crime: ACR 70042425280 RS; 2ª Vara Cível, Criminal e de Execuções Penais de Manga
Processo: 0393.03.006610-3; Natureza: Ação penal (art. 242 do CP) Autor: Ministério Público do Estado de Minas Gerais; TJ-SC – Apelação Criminal : APR 722784 SC 2008.072278-4, além dos julgados do Superior Tribunal de Justiça: Resp 1172067/MG, RESP 234833/MG, RESP 1088157/PB e RESP878941.

Entende-se que a jurisprudência afirma que a paternidade jurídica afasta a paternidade biológica, e a paternidade socioafetiva passou a ter reconhecimento, uma vez que nenhum interesse pode se sobrepor a República Federativa do Brasil, onde esta tem como base a dignidade da pessoa humana. Diante disso fica claro e justificado os inúmeros posicionamentos dos tribunais em preservar a paternidade socioafetiva, bem como conceder o perdão judicial para pessoas que optaram pela pratica da adoção à brasileira.

Todos os julgados consultados demostram que os Tribunais Brasileiros preferem decidir pela preservação da paternidade socioafetiva, mesmo sendo ela resultado de uma adoção irregular, e havendo previsão legal de crime para tal ato, do que desconstituir os laços afetivos criados, privilegiando a paternidade biológica, na qual houve abandono.

Há decisões, inclusive, que acreditam não haver uma falsidade no registro, indo contra o que determina a lei para privilegiar os laços afetivos, sob alegação de que o registro é o espelho das relações sociais de parentesco, sendo o registro sempre verdadeiro se estiver conciliado com o fato jurídico que lhe deu origem. Ademais, não pode o direito ser baseado numa racionalidade de formas, devendo ser baseado numa razão de conteúdo e, portanto, não se pode decidir de acordo com o simples vinculo biológico.

Diante disso, verifica-se que a tipificação prevista no Código Penal, em seu Art. 242, referente à punição daquele que registra filho alheio como próprio, está em completo desuso, visto que, não há condenação para pais que registraram aquela criança como sua, pois suas atitudes foram motivadas pelo afeto e amor, e não podem, por não ser justo, serem punidos por darem uma vida melhor aquela criança, resultando assim no perdão judicial para os atos praticados.

CONCLUSÃO

A adoção à brasileira vem se tornando uma prática comum na sociedade, visto que grande parcela da população está optando por agir de forma irregular em razão do longo e demorado processo de adoção legal, o que resulta no aumento da adoção à brasileira.

As características do processo de adoção legal fazem dele um momento demorado, visto que se busca atender as garantias constitucionais do melhor interesse da criança, além disso, há outros obstáculos durante o processo para aquele que deseja adotar uma criança de forma regular, como por exemplo: passar pelo estudo social, as exigências das características da criança que deseja adotar, e o principal é o medo de não conseguir o tão almejado sonho de ter filho, sendo assim tais obstáculos costumam desempenhar papeis determinantes na hora de optar pela adoção à brasileira.

Apesar da boa intenção do adotante, que busca uma criança para ser seu filho e dar a ela todo o necessário para um bom desenvolvimento de criação, não se pode esquecer que o ato de registrar filho alheio como próprio constitui crime, e está tipificado no Código Penal Brasileiro.

A nova lei da adoção (Lei 12.010/09), porém tem como objetivo a garantia do direito à convivência familiar a todas as crianças e adolescentes, privilegiando assim o vinculo afetivo em detrimento ao vinculo biológico. A doutrina também da proteção integral a criança e ao adolescente, reafirmando no Estatuto da Criança e do Adolescente o princípio constitucional do melhor interesse da criança, refletindo assim a evolução que o conceito de família passou ao longo do tempo, onde hoje uma família pode ser constituída a partir dos laços de afetividade.

Dessa forma, a não punição dos adotantes vem ser tornando cada vez mais frequente, seja no âmbito civil, através da não desconstituição do vinculo afetivo, seja na esfera penal, pela não aplicação do Código Penal, no que tange a tipificação de registrar filho alheio como próprio, já que a busca e apreensão do adotado e a anulação do seu registro civil, com a conseqüente prisão daqueles que sempre teve como pai, seria muito prejudicial à criança e ao adolescente, e iria contra o principio que o Estado defende, que é a busca pelo melhor para aquele que está em desenvolvimento, o que resulta assim na exceção do art. 242 do Código Penal, em seu parágrafo único que é o perdão judicial.

 

Referencias
DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 9. ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013.
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. Vol. VI 5. ed., São Paulo: Saraiva, 2008.
GRANATO, Eunice Ferreira Rodrigues. Adoção: Doutrina e Prática. 2 ed., Curitiba: Juruá, 2012.
BOCHNIA. Simone Franzoni. Da Adoção: Categorias, Paradigmas e Práticas do Direito de Família. Curitiba: Juruá, 2010
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: Direito de Família. 12 ed., São Paulo: Atlas, 2012.
PAULA, Tatiana Wagner Lauand de Paula. Adoção à Brasileira: Registro de Filho Alheio em Nome Próprio. Curitiba: J.M Livraria Jurídica, 2007
BRASIL, Constituição da República Federativa de 05 de outubro de 1988.
BRASIL. Lei nº 10.406 de 10 de janeiro de 2002.
BRASIL. Lei nº 12.010 de 03 de agosto de 2009.
LÔBO, Paulo. Despatrimonialização do Direito de Família. Revista do Tribunal de Justiça do Maranhão. São Luiz: TJMA, v. 5, n.2, 2011.
LÔBO, Paulo. Código Civil Comentado. Famílias. 3 ed. São Paulo: Saraiva, 2010.DINIZ, Maria Helena. Direito Civil Brasileiro: direito de família. Vol. 5. 19. ed. São Paulo:Saraiva, 2004
 
Nota:
[1] Trabalho orientado pela Profa. Esp. Adriana Cristina Rodrigues Angelin


Informações Sobre o Autor

Joacinay Fernanda do Carmo Nascimento

Acadêmica de Direito na Faculdade Estácio Seama


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