Assédio moral no ambiente de trabalho

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Resumo: Este trabalho apresenta uma análise sistemática de assédio moral no ambiente de trabalho com a ótica de experiências práticastanto em escritório de advocacia de Reclamante como de Reclamada, buscando passar um estudo a fim de evitar este mal que vem causando tanto desentendimento perante o meio ambiente de trabalho. 

Palavras Chave: Assédio Moral no Ambiente de Trabalho; Características  do Assédio Moral; Consequências do Assédio Moral; Tipos Jurídicos de Assédio Moral.

Introdução

O assédio moral é um mal, que surgiu com a própriaatividade laboral. Entretanto, passou a ser encarado como um problema social, quando o trabalho se tornou competitivo e agressivo entre os trabalhadores visando a melhores condições financeiras e posição social.

Humilhações, afrontas, constrangimentos, rebaixamento, xingamentos, vexame. Estas e outras situações enfrentam os trabalhadores que são mortificados pelo Assédio Moral.

Quando há uma espécie de tortura psicológica, que se destina a ferir a autoestima do empregado, visando forçar demissão do empregado ou apressar a sua dispensa através de métodos que resultem em sobrecarregar o empregado de tarefas inúteis,

No presente trabalho será abordado questões práticas sobre os motivos que resultam o assédio moral, que ocorre de forma vertical ascendente, vertical descendente e horizontal.

1. Características  do assédio moral

Basicamente os elementos podem dar-se de forma explícita ou implícita, mas sempre manifesto através de condutas abusivas e agressivas.Consiste naquela que por ação ou omissão possui um potencial lesivo que torne insuportável o ambiente de trabalho, sendo manifestadas através de comportamentos, palavras, atitudes com o intuito de ofender a personalidade e dignidade da vítima.

A conduta assediante é aquela que atinge diretamente o equilíbrio do meio ambiente de trabalho, ou seja, aquela contraria aos bons costumes da relação da coletividade que vive em sociedade.

O critério para mensurar   o  dano causado é feito de forma individualizada, pois cada ser humano possui resistência emocional diferenciada leva em consideração a sensibilidade normal do “homo medius”.

Logo não será qualquer conduta considerada assédio moral tal conduta deve ter potencial lesivo para atingir a psique, a alma, a saúde física e mental, a dignidade pessoal, as liberdades individuais e direitos da personalidade em geral, a honra, imagem e privacidade do trabalhador.

Não poderá ser conduta que aconteça casuisticamente, deverá ser praticada com certa frequência, de tal forma que qualquer conflito no ambiente de trabalho não enseja assédio moral.

A repetição deve acontecer com habitualidade de forma regular e permanente preleciona H. Leymann “o ataque deve ocorrer pelo menos uma vez na semana numa frequência media de seis meses de duração, tempo necessário para a manifestação dos sintomas”, mas a s consequências irão variar de acordo com cada capacidade de resistência de cada um, por isso necessário o estudo de casos concretos.

1.1 O que é Assédio Moral?

São todas as exposições a situações humilhantes e constrangedoras sendo elas repetitivas e prolongadas, condutas negativas, desumanas e antiéticas tendo como objetivo desestabilizar a relação da vítima com o ambiente de trabalho, forçando-o a desistir do emprego.

1.2 Como se Caracteriza o Assédio Moral?

A vítima escolhida é isolada do grupo sem explicações, passando a ser ridicularizada, inferiorizada e desacreditada perante os demais empregados.

Por medo do desemprego e de serem também humilhados, associados ao estímulo constante à competitividade, os demais empregados rompem os laços afetivos com a vítima e, frequentemente, reproduzem as ações e atos do agressor (Pacto da tolerância e do silêncio).

1.3 Consciência do agente

Ocorre quando o sujeito ativo do assédio tem consciência, intenção de causar um efeito danoso sobre o ambiente de trabalho, pode ocorrer que o sujeito ativo do assédio moral pratique a conduta assediante sem ter noção de seus efeitos ou intenção de afetar o trabalhador no aspecto pessoal (integridade e intimidade).

O professorJESUS, Damásio Evangelista ensina que, “ante a consciência da conduta, os resultados danosos devem ser previsíveis, ou seja, uma pessoa prudente e de discernimento tem a possibilidade de prever ou antever o resultado”.[1]

1.4 Natureza psicológica

O assédio moral é visto como forma de "terror psicológico" praticado pela empresa ou pelos colegas, que também é definido como "qualquer conduta imprópria que se manifesta através de comportamentos, palavras, atos, gestos, escritos capazes de causar ofensa à personalidade, à dignidade ou à integridade física ou psíquica de uma pessoa”.

O assédio moral não é tarefa fácil identificação por ser uma forma sutil de degradação psicológica de difícil comprovação, pois os danos sofridos não podem ser palpáveis.

1.5 Do Dano Psíquico

Há controvérsias nas doutrinas, pois é discutido se o dano psíquico é elemento imprescindível para caracterizar assédio moral. Visto que o dano psíquico decorre de uma enfermidade que enseja comprovação médica para efetiva ocorrência Alice Monteiro de Barros menciona a diferenciação, reunindo entendimento da doutrina, entre o dano psíquico e o dano moral:

“O primeiro se expressa por meio de uma alteração psicopatológica comprovada, e o segundo lesa os direitos da personalidade e gera consequências extrapatrimoniais independentes de prova, pois se presume. O dano moral independe do dano psíquico”. [2]

Essa corrente defende o que define assédio moral é a conduta do assediante e não o resultado danoso.Mas outra corrente defendida por Sonia A. C. Mascaro Nascimento:

“A configuração do assédio moral depende de previa constatação da existência do dano, no caso, a doença psiquicoemocional. Para tanto, necessária a perícia feita por psiquiatra ou outro especialista da área para que, por meio de um laudo técnico, informe o magistrado, que não poderia chegar a tal conclusão sem uma opinião profissional, sobre a existência desse dano, inclusive fazendo a aferição do nexo causal”.[3]

Essa corrente afirma que a ocorrência do dano psíquico é inevitável, logo é necessário haver dano para efetiva caracterização do assédio moral.

1.6 Consequências do Assédio Moral

A humilhação repetitiva e de longa duração interfere na vida do trabalhador e trabalhadora de modo direto, comprometendo sua identidade, dignidade e relações afetivas e sociais; Ocasiona graves danos à saúde física e mental do empregado, que podem evoluir para a incapacidade laborativa, desemprego ou mesmo a morte.

Diante da violência sofrida no ambiente de trabalho, ambas as partes sofrem prejuízos, pois o assédio moral é manifestado pela conduta ilícita que viola o dever jurídico de respeito e consideração à pessoa do trabalhador, contaminando assim o meio ambiente de trabalho que deverá ser equilibrado e saudável.

Para o empregador, o assédio moral ocorrido no ambiente de trabalho, poderá caracterizar o inadimplemento contratual, além de violação ao “dever jurídico” traçado na CLT, bem como as garantias fundamentais do trabalhador inseridas na Constituição Federal/88.

Logo incide  prejuízos econômicos para o empregador, pois com o afastamento do trabalhador em caso comprovado de doença por assédio moral, aumentam o pagamento de indenizações, afetando diretamente a produtividade e lucratividade do empregador.

A violência sofrida contra o trabalhador será maléfica para a vítima, acarretando prejuízo no seu rendimento laboral, decorrente do desequilíbrio psíquico que é instalado na vítima gradativamente e consiste num intenso sofrimento, evoluindo assim para um quadro psicossomático através dos aparecimentos de mazelas físicas.

Destacam-se também outros danos na vida da vítima, como exemplo a baixa autoestima profissional e pessoal e prejuízo no convívio social e familiar.

2 tipos jurídicos de assédio moral

2.1 Relação Vertical Descendente:         

Tem como característica a subordinação, é praticado por superiores hierárquicos que adotam medidas autoritárias e arrogantes, que aproveitam do cargo elevado para abusar do poder de mando, trata-se da espécie de assédio moral mais comum nos dias atuais, consequência da situação privilegiada que encontra o empregador.Como preleciona Maria Aparecida Alkimin (2010, p.62)

“O assédio moral cometido por superior hierárquico, em regra, tem por objetivo eliminar do ambiente de trabalho o empregado que por alguma característica represente uma ameaça ao superior, no que tange ao seu cargo ou desempenho do mesmo, também o empregado que não se adapta, por qualquer fator, à organização produtiva, ou que esteja doente ou debilitado.”

Como exemplo, temos o caso da mulher: a gravidez pode se tornar um fator de incomodo para alguns. Outrossim, o assédio moral pode ser praticado com o objetivo de eliminar custos e forçar o pedido de demissão.

2.2 Relação Vertical Ascendente:

É aquele que parte diretamente do subordinado contra o superior hierárquico. Normalmente, esse tipo de assédio pode ser praticado contra o superior que adotam condutas que ultrapassam o poder de direção, adotando posturas autoritárias e arrogantes.

2.3 Relação Horizontal:

Não existe relação de subordinação, logo é cometido pelos colegas de serviço àqueles que estão no mesmo patamar hierárquico.

O assediante geralmente manifesta o assédio pelas brincadeiras maldosas, piadinhas que menosprezam o colega e até mesmo gestos obscenos, que poderá consistir no começo de violência psicológica.

Ou seja ocorre no mesmo nível hierárquico, em razão da competitividade por uma melhor condição dentro da empresa, por melhor salário ou prestígio perante o chefe.Nesse sentido, Isabel Pimenta Rocha (apud Alkimin) leciona que:

“O Código do Trabalho Português dispõe em seu art. 20, que o trabalhador deve respeitar e tratar com urbanidade e lealdade a entidade patronal, os superiores hierárquicos, os companheiros de trabalho e as demais pessoas, que estejam ou entrem em relações com a empresa (art.20,I,”a”).”[4]

3 Formas mais comuns de assédio moral

Começar reunião amedrontando quanto ao desemprego ou ameaçar constantemente com a demissão, chamar os empregados de incompetentes, repetir a mesma ordem para realizar uma tarefa simples centenas de vezes até desestabilizar emocionalmente o trabalhador ou dar ordens confusas e contraditórias.

Sobrecarregar de trabalho ou impedir a continuidade do trabalho, negando informações, desmoralizar publicamente, afirmando que tudo está errado ou elogiar, mas afirmar que seu trabalho é desnecessário à empresa ou instituição, rir a distância e em pequeno grupo, conversar baixinho, suspirar e executar gestos direcionados ao trabalhador.

Não cumprimentar e impedir os colegas de almoçar, cumprimentar ou conversar com a vítima, mesmo que a conversa esteja relacionada à tarefa, querer saber o que estavam conversando ou ameaçar quando há colegas próximos conversando, ignorar a presença do(a) trabalhador(a), desviar da função ou retirar material necessário à execução da tarefa, impedindo o trabalho.

Mandar executar tarefas acima ou abaixo do conhecimento do trabalhador.

Hostilizar, não promover ou premiar colega mais novo(a) e recém-chegado(a) à empresa e com menos experiência, como forma de desqualificar o trabalho realizado, espalhar entre os colegas que o(a) trabalhador(a) está com problema nervoso, sugerir que peça demissão, por sua saúde ou motivo relacionado à sua convivência no trabalho, divulgar boatos sobre sua moral.

3.1 Frases Discriminatórias Frequentes

Você é mesmo difícil… Não consegue aprender as coisas mais simples! Até uma criança faz isso… E só você não consegue! É melhor você desistir! É muito difícil e isso é pra quem tem garra! Não é para gente como você! Não quer trabalhar… Fique em casa! Lugar de doente é em casa! Quer ficar folgando… descansando… de férias pra dormir até mais tarde!

Não posso ficar com você! A empresa precisa de quem dá produção! E você só atrapalha! Como você pode ter um currículo tão extenso e não consegue fazer essa coisa tão simples? Você me enganou com seu currículo… Não sabe fazer metade do que colocou no papel. Vou ter de arranjar alguém que tenha uma memória boa, para trabalhar comigo, porque você esquece tudo!

A empresa não precisa de um incompetente igual a você! Ela faz confusão com tudo… É muito encrenqueira! É histérica! É mal casada! Não existe lugar aqui pra quem não quer trabalhar! Se você ficar pedindo saída eu vou ter de transferir você de empresa… de posto de trabalho… de horário…

3.2 Recomendações Para Se Evitar O Assédio Moral

Estabelecer treinamentos e palestras com os lideres de setor e gerentes, ensinando-lhes as políticas de gestão empresarial e de bom comportamento aplicado na empresa, criar um serviço de captação de “reclamações”, de forma sigilosa, dos empregados para que a empresa possa ter ciência dos seus problemas internos.

Construir uma liderança capacitada a coibir de forma radical a prática de Assédio Moral, com advertências, suspensões e demissões dos agressores, para um bom desempenho da atividade laboral. O Trabalho deve ser feito de maneira preventiva nas empresas. Em primeiro lugar a empresa deve ter um código de ética interno, que condiz com o pensamento e os objetivos da empresa.

Não resolve a situação, a empresa somente pregar ser, e, não ser ética, e ainda exigir do trabalhador esta conduta, isso porque só vai levar o trabalhador a “boicotar” a empresa e ficar desmotivado com a conduta. Junto com o código de ética deve ser feita uma política de conscientização dentro da empresa.

Neste código a empresa deve deixar claras as regras internas e “punição” para quem desrespeitar as mesmas principalmente ao que se diz sobre o respeito com o colega de trabalho, devendo ser uma cultura, a ser iniciada com os superiores uma vez que a maior parte do assédio ocorre por iniciativa deles.

Um canal aberto de comunicação entre RH e colaborador pode ajudar a identificar o problema logo de início e tratá-lo de forma eficaz. O trabalho deve ser iniciado nas empresas que ainda não tem essa conduta o quanto antes, pois temos que valorizar e cuidar do nosso “Capital Humano”, cliente interno insatisfeito e desmotivado é prejuízo para empresa.

Mais não basta somente o canal de comunicação com o RH, deve haver comunicação entre colaborador, colegas e entre superiores, para que de alguma forma a relação seja saudável.

Ações que visam o bem estar da equipe como linha direta de comunicação dentro ou fora da empresa, reuniões semanais, para discutição do andamento das atividades, café da manhã (lanche, almoço…), de forma a propiciar a interação de equipes, comemoração de aniversários dos colaboradores, para que ele se sinta importante em ambiente familiar.

Para construção de ambiente corporativo produtivo e lucrativo o investimento inicial deverá ser no seu consumidor interno, ou seja, o trabalhador.

4.0. Considerações finais

Conclui-se que com a implantação de códigos de ética que objetivam a educação de relacionamento social podemos evitar então o assédio moral e conviver melhor no ambiente de trabalho.

Acredito que assim como a norma busca o principio, o ser humano busca o seu Criador, sendo assim, a sociedade juntamente com o Estado devem agir em unidade para a busca de educação social em todas as suas ramificações, sejam elas na política, nas cadeias, nas relações de trabalho.

Trabalhando juntos para devolver podemos oferecer alegrias para quem nos ofereceu um dia.

 No trabalho procurei ressaltar a importância de evitarmos o assédio moral, divulgando que poderá ser causado por qualquer pessoa em um ambiente de trabalho, e, expondo recomendações de como evitá-lo, colocando a disposição frases discriminatórias frequentes que poderiam ser impedidas.

A medida de indenização por assédio moral adotada na justiça do trabalho deve ser mantida e melhorada, porque com o dinheiro a pessoa que sofreu o dano ou assédio se sente acolhida e protegida.

Porém é necessário muito mais que isto para ver solucionado o problema, e para isto acontecer não depende só de uma pessoa ou organização e sim de um conjunto, cada um fazendo a sua parte. Concordando ou discordando não importa, o importante é estar contribuindo com ideais para uma justiça cada vez mais humana justa e solidaria.

Concluindo espero que a mensagem passada no presente trabalho seja clara e que ao ler esta mensagem divulguem esta ideia e acrescente com a sua também para provar ao mundo que um bom trabalho é feito de respeito, relacionamento social, honestidade, defendendo sempre um dos maiores dadiva do ser humano que é o Trabalho.

Referências
ALKIMIN, Maria Aparecida. Assédio moral na relação de trabalho. 2ª. Ed.Curitiba: Juruá, 2010. ASSÉDIO MORAL NO TRABALHO. p.38, 64 e 119.
ASSÉDIO MORAL NO TRABALHO. Legislação. Disponível em: http://www.assediomoral.org/. Acesso em 20 set. 2010. apud
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado, 1988.
CERVO, Amado L. Metodologia Cientifica. 6ª Ed. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2007.
FERREIRA, Hádassa Dolores Bonilha. Assédio Moral nas Relações de Trabalho, 2004, Ed. Russel, Campinas, SP, P. 37. apud
JESUS, Damásio Evangelista de. Direito Penal – Parte Geral. 2. Ed. Ver. E atual. São Paulo: Saraiva, 1999. v. I, p. 293. apud
MANSUR JÚNIOR, Maurício. Assédio Moral: a violência contra o trabalhador no contexto neoliberal. Revista do Direito do Trabalho, São Paulo, ano 3, n. 37, jan-mar/2010, p.240-287.
NASCIMENTO, Grasiele Augusta Ferreira; ALKIMIN, Maria Aparecida, Assédio mora na empresa e responsabilidade civil do empregador. Revista de Direito Privado, Ano10, n. 39, São Paulo, Revista dos Tribunais, 2009.
NASCIMENTO, Sônia Mascaro. Tudo que você precisa ouvir sobre Assédio Moral. São Paulo: Saraiva, 2009. CD- ROM.
 
Notas:
[1] JESUS, Damásio Evangelista de. Direito Penal – Parte Geral. 2. Ed. Ver. E atual. São Paulo: Saraiva, 1999. v. I, p. 293.

[2] MANSUR JÚNIOR, Maurício. Assédio Moral: a violência contra o trabalhador no contexto neoliberal. Revista do Direito do Trabalho, São Paulo, ano 3, n. 37, jan-mar/2010, p.240-287.

[3]Ibidem, p.240-287.

[4]ALKIMIM, Maria Aparecida. Assédio Moral na relação de trabalho. 2ª Ed.(ano 2008)  2°. Reimp. Curitiba:Juruá, 2010, p.64.


Informações Sobre o Autor

Edmar de Oliveira Mira

Advogado inscrito na Ordem dos Advogados do Estado de São Paulo, militando nas áreas: Trabalhista; Cível; Família; Previdenciária; Criminal e do Consumidor no escritório Romão Junior Advogados e Associados. Graduado na Faculdade de Direito de Guarulhos – UNIFIG – UNIMESP. Pós-graduando em Direito do Trabalho; Processo do Trabalho; Direito Previdenciário; Metodologia de Ensino e Didática de Ensino na Faculdade Legale


Assédio moral no ambiente de trabalho

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Resumo: As relações empregatícias encontram-se bem protegidas por uma gama de leis em favor do trabalhador, tendo várias decisões positivas na Justiça do Trabalho, todavia o assédio moral ocorre mais por submissão, temor do desemprego ou desconhecimento do assunto; vez que o empregado se permite passar por situações vexatórias e humilhantes no ambiente de trabalho; enquanto que o assediador usa de seu status hierárquico para impor seus caprichos e imposições absurdas sobre seus subalternos sem motivo aparente, causando assim, grande abalo psíquico nestas pessoas.


Assédio moral no trabalho é a exposição dos trabalhadores e trabalhadoras a situações humilhantes e constrangedoras, repetitivas e prolongadas durante a jornada de trabalho e no exercício de suas funções, sendo mais comuns em relações hierárquicas autoritárias e assimétricas, em que predominam condutas negativas, relações desumanas e aéticas de longa duração, de um ou mais chefes dirigida a um ou mais subordinado(s), desestabilizando a relação da vítima com o ambiente de trabalho e a organização, forçando-o desistir do emprego[1].


A vítima assediada é, geralmente, eleita porque tem características que turbam os interesses do elemento assediador por suas capacidades, destreza, conhecimento, desempenho e exemplo, ou simplesmente, por desajustamento sexual ou psíquico por parte do assediador. De acordo com a juíza do trabalho Schmidt[2] o novo perfil exigido do trabalhador beneficia o desenvolvimento de situações de assédio moral, uma vez que de um lado estabelece-se que este deve ser competitivo, capaz, qualificado, criativo e ter múltiplas habilidades. Por outro lado, esse novo trabalhador sabe que não estar apto a essa nova realidade pode implicar na perda do emprego.


Em razão disso, o temor ao desemprego favorece o começo da submissão e, a procedente impunidade dos agressores, já que, na maior parte das vezes a vítima desconhece a existência do assédio moral, não sabe as medidas que podem ser tomadas para reprimi-lo e, receia tomar qualquer atitude que possa o prejudicar frente ao competitivo mercado de trabalho. Ligado a este fato, tem-se ainda a competição que existe entre os próprios colaboradores, a hierarquização rígida que torna impossível a comunicação e o diálogo franco, além da terceirização e a horizontalidade do processo de produção, que tem por objetivo o crescimento da competitividade, proporcionando o nascimento de compartimentos produtivos estagnados, mais favoráveis ao desenvolvimento de “pequenos impérios”, onde a lei que prevalece é a daquele que “governa”. Assim sendo, tem-se então um clima que facilita o aparecimento do assédio moral, com a sucessão de uma série de afrontas, fortalecidas pela submissão.


É preciso delinear as características do agressor, a fim de que o assediado possa identificá-lo em meio às indiretas diárias daquele. Deste modo, quem assedia procura causar instabilidade à sua vítima e, para isso, usa uma técnica continuada, isto é, um conjunto de ações e métodos destinados a colocar a vítima em situações constrangedoras e humilhantes. O assediador é astuto, pois a ofensiva aberta admite uma réplica e torna conhecida sua estratégia indiciosa. Por isso a primazia pela comunicação não-verbal, por meio de sinais, boatos, ironias, sarcasmos ou de até mesmo, ignorar a vítima. Essas táticas fazem com que o assediador, quando interrogado, assegurar não existir intencionalidade, não reconhecer seus atos, afirmando serem estes apenas brincadeiras sem nenhuma intenção e, permitindo a troca de papéis, ou seja, coloca-se como vítima, se desculpa e diz que o assediado está paranóico.


Em virtude desta tática sutil e pessoal, o assédio moral pode ser caracterizado como uma violência invisível, uma vez que, pouco a pouco, faz com que as vítimas crêem ser aquilo que seus agressores querem. Geralmente, o agressor é alguém que está visivelmente muito satisfeito consigo mesmo e raramente se questiona a respeito de suas ações, sendo incapaz de sentir empatia, encobre uma baixa auto-estima que causa insegurança, tornando complexa a vida dos que são mais competentes que ele.


Assim sendo, a manifestação do assédio moral acontece por meio de diversas ocasiões, tais como: rigidez exagerada, delegar afazeres inúteis ou humilhantes, desqualificação, críticas em público, afastamento, ociosidade coagida, advertências, abuso de fraquezas psíquica ou física, limitação ou repressão de qualquer inovação ou iniciativa do colaborador, exposição de doença e problemas pessoais, gestos, agressões verbais, conduta obsessiva e vexatória, humilhações públicas e privadas, amedrontamento, zombaria, sorrisos, suspiros, apatia à presença do outro, ensinamentos confusos, trabalho superior às forças do colaborador, dentre outras.


Há vários fatores que levam ao desenvolvimento do assédio moral e colaboram para a sua impunidade. De acordo com Menezes[3], pode-se citar como agentes motivadores desse mal que aflige o trabalho, inicialmente, a iniqüidade do ser humano e, somado a esta, a competitividade excessiva; o individualismo acirrado; o temor de perder o emprego ou o cargo para colegas mais aptos, ou experientes; o medo em ver falhas descobertas, ilegalidades; a aversão ao novo, ao diferente, ou até ao tradicional.


Alguns gestores usam seu poder para humilhar as pessoas sob seu comando, isso porque o empregador está informado que: é longo o tempo de demora para solucionar as causas trabalhistas; o trabalhador intimida-se por receio de usar o direito constitucional de ação, em razão das conhecidas listas negras que ainda prevalecem; o risco do desemprego, frente a um mercado inconstante, com um desemprego estrutural mundial ameaçador; o empregado fica com medo de represálias, como mudanças desvantajosas de cargo e local; e também, acusações podem tornar manifesta a humilhação através da qual sofreram as vítimas, fazendo aumentar mais ainda o sofrimento destas. Desse modo, na maioria das vezes, as vítimas de assédio moral mantêm segredo sobre o caso, o que acaba favorecendo o aumento dessas situações perante sua impunidade.


Heloani[4] sustenta que o assédio moral no trabalho geralmente provoca patologias em suas vítimas, pois faz com que elas acreditem ser exatamente o que seus agressores pensam, ou esperam que sejam. Ainda que seus agressores tentem tirar suas qualificações, as vítimas não costumam ser pessoas doentes ou frágeis. São indivíduos que tomam, de maneira consciente ou inconsciente, atitudes de enfrentamento, algumas vezes interrogando a respeito de regalias ou situações injustas. Isso acontece exatamente por não se deixarem reprimir, por não se curvarem ou por não aceitarem atos de desrespeito ou opressão.


Sendo as conseqüências dessas agressões sofridas pelos colaboradores no próprio recinto de trabalho, resultam nos conhecidos distúrbios físicos e psíquicos que levam ao aumento de patologias múltiplas que podem até causar sua morte no trabalho e levá-lo ao suicídio. De uma forma sistêmica, Schmidt[5] aponta os efeitos do assédio moral como: endurecimento e esfriamento das relações no ambiente de trabalho; dificuldade para enfrentar as agressões e trabalhar em equipe; afastamento dos colegas e internalização; sentimento de pouca utilidade e de fracasso; pouco entusiasmo pelo trabalho; falta de controle emocional; redução da produtividade; aumento do absenteísmo; demissão; desemprego; conflito nos relacionamentos afetivos; desenvolvimento de doenças físicas ou psíquicas; suicídio.


Na sociedade, os efeitos gerados por essa ação destruidora do sentimento de serventia da pessoa humana, não convém a ninguém. É trágico à própria empresa que o colocou em prática através de seus executivos, como também é trágico a toda a sociedade no geral, ficando sobrecarregada com os preços das despesas previdenciárias que decorre das incapacidades causadas para o trabalho, pela perda da produção da vítima ou do próprio emprego, como acontece na maior parte das vezes.


Silva[6] defende que a Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, desde 1943, prevê como motivos de rescisão indireta (hipótese de rescisão de iniciativa do empregado por culpa do empregador), que podem ser invocados para respaldar eventual ação de indenização por assédio moral: artigo 482, alínea “j” – o empregador pode ser demitido por justa causa por “ato lesivo da honra, ou da boa fama praticado no serviço contra qualquer pessoa, ou ofensas físicas, nas mesmas condições, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem”; artigo 483 – comete falta grave o empregador que exigir serviços superiores às forças do empregado (alínea “a”), tratá-lo  (diretamente ou através de superiores hierárquicos) com rigor excessivo (alínea “b”), colocá-lo em perigo manifesto de mal considerável  (alínea “c”), descumprir as obrigações do contrato  (alínea “d”), praticar contra ele ou pessoas de sua família atos lesivos da honra e da boa fama (alínea “e”) e ofensivas físicas (alínea “f”).


Já para Schmidt[7], no Brasil a Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, ainda não possui disposições específicas para a precaução do assédio moral e, enquanto não existir uma legislação exclusiva para esse assunto, também poderão ser evocados pela vítima os artigos 146 e 147 do Código Penal, que se localizam na parte dos crimes contrários à liberdade pessoal. O primeiro aborda a coação ilícita, sendo seu tipo legal definido da seguinte forma: “Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, ou depois de lhe haver reduzido, por qualquer outro meio, a capacidade de resistência a não fazer o que a lei permite, ou a fazer o que ela não manda”. E o artigo seguinte trata do crime de ameaça, sendo assim estabelecido: “Ameaçar alguém, por palavra, escrito ou gesto, ou qualquer outro meio simbólico de causar-lhe mal injusto e grave”.


Contudo, para quem defende a criminalização dessas atitudes no Brasil, a instituição de um dispositivo legal cooperaria para a coibição de atos que já passaram e a prudência para com os atos futuros. Desta forma, compreendem que, sob o amparo do direito penal, tal procedimento nocivo tende a atenuar, já que a hipossuficiência da vítima seria preenchida pela mão forte da justiça criminal, ou seja, a pena iria auxiliar a exterminar o problema, uma vez que conferiria um limite ao cidadão perverso.


Diversos são os projetos de lei na esfera municipal, estadual e federal, que estão em trâmite diante do poder legislativo, tendo como objetivo introduzir no Código Penal Brasileiro pena de prisão e multa àquele que praticar esses atos abusivos. Porém, não é plausível a criminalização de tal atitude, já que corre enorme risco de se ver o direito penal sendo usado como meio de permuta nas relações de trabalho, assim como em transações entre chefes e colaboradores. Não se pode deixar sem punição o agressor, porém, da mesma maneira as finalidades da lei penal não devem ser distorcidas, transformando-se em mina de favorecimentos. O visivelmente inofensivo encaminhamento de um hipotético assediador ao banco dos réus, quando este é inocente, por si só, pode apontar uma verdadeira injustiça: se remido quem irá reparar tal constrangimento?


A grande dificuldade no que se refere ao tratamento do assédio moral é exatamente sua “invisibilidade” e o elevado grau de subjetividade envolvido no assunto. A constatação da relação entre efeito (aflição da vítima) e sua causa (agressão), é imprescindível no âmbito criminal, porém, nem sempre é visível, na medida em que tais humilhações são, principalmente, feitas sem deixar as digitais do assediador.


 


Notas:

[1] Assédio Moral no Trabalho – Chega de Humilhação. O que é assédio moral? Disponível em: http://www.assediomoral.org/site/assedio/AMconceito.php>. Acesso em: 21 jul. 2011.

[2] SCHMIDT, M. H. F. de M. O assédio moral no direito do trabalho. Revista do Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região, Curitiba, Serviço de Biblioteca e Jurisprudência, a. 27, n. 47, jan./jun. 2002, p. 177.

[3] MENEZES, C. A. C. de. Assédio moral e seus efeitos jurídicos. Síntese Trabalhista, Porto Alegre: Editora Síntese, a. 15, n. 169, jul./2003, p. 140-150.

[4] HELOANI, R. Violência invisível. Revista de Administração de Empresas, São Paulo, Fundação Getúlio Vargas, a. 2, n. 3, ago./out. 2003, p.57.

[5] SCHMIDT, M. H. F. de M. O assédio moral no direito do trabalho. Revista do Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região, Curitiba, Serviço de Biblioteca e Jurisprudência, a. 27, n. 47, jan./jun. 2002, p. 227.

[6] SILVA, Fernanda Albini da. As legislações aplicáveis ao assédio moral. DireitoNet, São Paulo, 7 jun. 2004. Disponível em: < http://www.direitonet.com.br/artigos/x/15/90/1590/>. Acesso em: 22 jul. 2011.

[7] SCHMIDT, M. H. F. de M. O assédio moral no direito do trabalho. Revista do Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região, Curitiba, Serviço de Biblioteca e Jurisprudência, a. 27, n. 47, jan./jun. 2002, p. 230.


Informações Sobre o Autor

Tobias de Oliveira Andrade

Advogado no Rio de Janeiro/RJ, Pósgraduado em Direito Civil e Processo Civil na (UCAM) Universidade Cândido Mendes/RJ


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