Revelação de segredos de empresa por quem tem obrigação legal ou contratual de guardar reservas: aplicação na Espanha

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Sumário:
1. Introdução – 2. Segredo de Empresa – 3.Tempo
estabelecido ou legal para guardar segredo –  4.Bem Jurídido Protegido – 5.Tipo Privilegiado.

1. Introdução:

A apresentação do presente tema visa a
possibilidade do estabelecimento do estudo no âmbito direito comparado, em
decorrência das relações diplomáticas, comerciais e culturais envolvendo Brasil
e Espanha. (1)

A legislação penal espanhola sempre nutriu um
especial interesse na proteção do mercado industrial e empresarial, com o
objetivo de possibilitar uma melhor competitividade neste setor. O destinatário
final de tal preocupação é o consumidor, pois o delito relacionado a violação
de segredo encontra-se abrigado no Livro III, Título I, Seção Terceira, que
trata “De los delitos relativos al mercado y a los consumidores”.

2. Segredo de empresa

É de imprescindível
importância apresentar um conceito de segredo, que é o conhecimento reservado a
um determinado círculo de pessoas, e que não seja do conhecimento de terceiros.
Não sendo objeto de proteção penal todo e qualquer feito que se pretende manter
fora do alcance de outras pessoas.

Segredo é um conceito
formal, uma técnica jurídica instrumental, que pode estar a serviço de vários
interesses ou bens jurídicos. É o conhecimento reservado de produtos, idéias ou
procedimentos empresariais que se pretende manter oculto diante da sua
importância no âmbito da competitividade. O conhecimento reservado será típico,
na medida em que afete a capacidade competitiva da empresa.2

A figura do segredo de
empresa é denominada de diversas formas, como a apontada por Massanguer
Fuentes, e citada por Mª Tereza Sanchez Fernández: ao enfocar que consiste no
“conjunto de informações ou conhecimentos que não são de domínio público,
necessários para a fabricação ou comercialização de um produto, para a
apresentação de um serviço, ou bem, para a organização, administração
financeira de uma unidade ou dependência empresarial, e que procura a que
dispõe, uma vantagem competitiva no mercado, que se esforça em conservar,
evitando sua divulgação”3

Como demonstrativo do que é
segredo de empresa se faz necessário a ocorrência de três requisitos: 1- que o conhecimento
não seja do domínio público, restringindo-se a um estreito circo de pessoas; 2-
que esse conhecimento, traga alguma vantagem para a empresa titular do provável
segredo, frente a seus competidores no mercado; 3 – e que não haja nenhum
interesse na sua divulgação.

As empresas possuem
importantes conhecimentos de natureza diversificada, podendo desta forma
melhorar sua condição competitiva, que é compreendida por: “a) os segredos
pertencentes ao setor técnico industrial da empresa, como procedimento de
fabricação ou práticas manuais; b) Os segredos relativos ao setor comercial da
empresa, constantes da carteira de clientes, provedores, etc; c) segredos
correspondentes a outros aspectos de organização interna da empresa, como
relação entre empresa e funcionários, situação financeira, projetos e políticas
adotadas sobre celebração de contratos. Tudo objetivando a capacidade competitiva
da empresa. 4

O antigo Código Penal
español, em seu derrogado artigo 499, definia o objetivo do delito como segredo
de indústria, vindo alguns doutrinadores à época, a estender dito conceito
também a segredos empresariais, de igual forma os comerciais, e os refentes a
organização interna e relações da empresa.

Por isso, uma corrente
doutrinária considerando que o objetivo material do delito não poderia reservar
a proteção dos segredos estritamente ao setor industrial, alargou sua aplicabilidade,
pois ambos setores são merecedores da proteção penal.

O artigo 279, do Código
Penal em vigor, já não exige a relação de dependência ou subordinação, que
reduzia significativamente o número de sujeitos ativos. Hoje está previsto
sanção para aqueles que têm obrigação contratual ou legal de guardar segredos,
não podendo revelar ou ceder a terceiros, nem utilizar em proveito próprio.
Esta última modalidade, prevista de maneira atenuada (art. 279.2), que será
objeto de reflexão mais adiante.

Quando existe um contrato
com a determinação legal de se guardar segredos impostos pela empresa, inexiste
maiores discussões. Em contrapartida, resulta-se problemático quando não está
estabelecido de maneira clara ou mediante contrato, ou seja, de forma genérica.

Deste modo, se pode
apreciar como sujeito ativo desta conduta todo aquele que conhece o segredo de
empresa em função de uma realização laboral, profissional ou empresarial em
sentido amplo, que mantém com a empresa titular, quer dizer, pode ser sujeito
ativo deste tipo de conduta delitiva tanto o trabalhador como os diretores e
administradores de sociedades anônimas detentora de uma importante carteira de
clientes que convém manter com caráter confidencial.

3. O tempo legal estabelecido para guardar segredo

Não é pacífica a duração da
obrigatoriedade em guardar o segredo empresarial. O dever durará o tempo que se
especifique legal ou contratualmente, mesmo que o sujeito finalize sua relação
com a empresa pode surgir vinculação do dever de segredo, deduzindo-se assim, expressa
ou tacitamente da própria relação.5 É distinto se o sujeito mantém ou terminou
sua relação com a empresa, os limites temporais da obrigação de sigilo deverão
derivar-se em cada caso de um juízo de ponderação racional.

No decorrer da vigência do
antigo Código Penal, em seu artigo 499, a doutrina apresentava duas correntes
distintas:

“– De um lado, aqueles que
de acordo com a letra da lei se opuseram a admitir a possibilidade de
considerar que se dá a conduta típica quando a relação contratual desaparece y
se aplica a sanção penal. O argumento se fundamenta que se essa aplicação do
art. 499 do Código Penal derrogado se realizasse uma vez que determinado o período
de vigência do contrato, estaria utilizando-se a analogia in mala partem
dentro do âmbito penal, o que é inadmissível.

– Outros autores consideram
que, apesar de tudo, deveria aplicar-se a normativa penal, já que de outro modo
o titular de um segredo de empresa ficaria em posição de indefesa com relativa
facilidade, tanto que poderia se dar situações como a uma determinada pessoa
com conhecimento de informação confidencial decidisse romper o vínculo
contratual para logo poder difundi-lo, revelá-lo, cedê-lo ou usá-lo em seu próprio
benefício.6

No entanto, a melhor e mais
eficaz forma de garantir a proteção de um segredo é através da via contratual,
sendo imprescindível que qualquer empresa que queira salvaguardar seus
conhecimentos secretos imponha com caráter amplo o dever de secreto e o
estabelecimento de tempo, seja com o empregado, ou com quem a empresa mantenha
uma relação de negócios. “No entanto, contra essa interpretação em que
fundamenta em todos essas suposições uma responsabilidade penal ad eternum
advogam diversos argumentos: resultará desproporcionada e
politico-criminalmente inaceitável, devido que até os segredos de Estado têm
data limite (MORENO CÁNOVES/RUIZ MARCO); passado um determinado tempo o segredo
normalmente deixa de ostentar um valor econômico e se o segue ostentando (vgr.
A formula de determinadas bebidas) deve incumbir ao empresário adoção de
medidas que garantam que o segredo se mantenha (vgr. Contratualmente). Por isto,
estes supostos deverão resolver-se sobre a base do princípio de irrelevância e
de atingir ao bem jurídico (assim MORENO CÁNOVES/RUIZ MARCO, MORALES PRATS/MARÓN
LERMA)”.7

4. Bem jurídico protegido

É de imprescindível importância
a correta determinação do bem jurídico protegido em todas as classe de delito,
pois a través da sua determinação que se faz possível uma eficaz política
criminal e também uma correta interpretação da norma penal.

A natureza do bem jurídico
a ser protegido e reconhecido ao segredo empresarial é a proteção como um meio
de garantir o que é essencial ao sistema econômico de mercado, ou seja, a
competitividade, como instituição essencial da ordem econômica
constitucionalmente estabelecida.

O Tribunal Constitucional 8
através das Resoluções de 30 de novembro de 1982 e 88/1986, reforça que:

“O reconhecimento da
liberdade de empresa e o compromisso de proteger esta – art. 38.2 CE – por parte
dos poderes públicos, supõem a necessidade de uma atuação especificamente
encaminhada a defender tais objetivos constitucionais. E uma das atuações que
podem ser necessárias é a consciente em evitar aquelas práticas que podem
afetar ou prejudicar seriamente a um elemento tão decisivo na economia de
mercado como é a concorrência entre as empresas, aparecendo assim a defesa da
competição como uma necessária defesa e como uma restrição da liberdade de
empresa ou da economia de mercado.”

O ataque a posição adquirida
pelo empresário representa a revelação ou utilização do segredo empresarial,
afetando de modo mediato ao correto funcionamento de mercado.  Pois quem se apropria ilicitamente daqueles
conhecimentos reservados vislumbra melhoras de suas posição no mercado.9

5. Tipo privilegiado

O artigo 279, parágrafo 2º,
do Código Penal espanhol, atenua a sanção penal (de dois a quatro anos e
multa de doze a vinte e quatro meses
) a sua metade inferior na hipótese em
que o sujeito que tem o dever legal de guardar segredo utiliza-o em seu próprio
proveito. Não se fazendo necessário que o segredo a ser violado seja de
natureza estritamente econômica, conforme foi enfatizado anteriormente.

É um delito especial
próprio, ou seja, a conduta típica exige que a pessoa que está obrigada a um
dever especial de reserva seja a que utiliza o segredo de empresa em seu
proveito benefício.

O autor deve estar
vinculado de forma legal ou contratualmente ao dever de reserva do segredo da
empresa. Se pode atuar como direto ou mediato no caso em que utilize
instrumento não doloso para desenvolver seu ato ilícito.

Por último, o tratamento
atenuado assegurado pelo Código Penal en vigor (279.2), foi merecedor de
diversos posicionamentos.

Uma corrente considera que
com a utilização em benefício próprio do segredo, evita-se a exploração de
outras empresas, o que fatalmente evita-se um prejuízo maior para a empresa.

Existe outra corrente, que
entende que mesmo que ocorra uma maior demora na obtenção dos benefícios com a
utilização do segredo, pode-se desenvolver uma concorrência desleal.

Existe ademais, os críticos
da atenuação da pena, ora comentada, que são partidários de que a forma
privilegiada da conduta da utilização do segredo em proveito próprio deveria
ser acrescentada com as tipificadas no primeiro parágrafo do artigo 279 do
Código Penal Espanhol.

Apesar dos diferentes
posicionamentos doutrinários enfocados, o que mais importa é que a forma atual
que trata a violação de segredo por quem tem legal ou contratualmente o dever
de reserva (279 CP), encontra-se em melhores condições de entendimento e
aplicação do que na forma capitulada anteriormente (499 CP derrogado).

 

Bibliografía:

BAJO FERNÁNDEZ,
Miguel, y otros, Empresa y Derecho Penal (II), Cuaderno de Derecho Judicial,
1998.

CABO DEL ROSAL, Manuel
y otros, Compendio de Derecho Penal Español, Parte Especial, Editora Marcial
Pons, Madrid, 2000.

CAPEZ, Fernando, “Curso de
Direito Penal – Parte Geral”, Volume 1, 4ª edición, Editora Saraiva, São Paulo,
2003.

CARRASCO ANDRINO,
María del Mar, La
Protección Penal del Secreto de Empresa, Cedecs Editorial,
Barcelona, 1998

CONDE-PUMPIDO TOURON,
Cándido, Código Penal – Doctrina y Jurisprudencia, Tomo II, Ed. Trivium, Madrid, 1997.

GOMEZ SEGADE, Jose
Antonio, El Secreto Industrial (know-how) Concepto u Protección, Editorial
Tecnos, Madrid.

GONZÁLEZ SUÁREZ,
Carlos J., BAJO FERNÁNDEZ, Miguel, y otros Compendio de Derecho Penal – Parte
Especial, Vol. II,
Editorial Centro de Estudios Ramón Areces.

MARCIÁ GÓMEZ, Ramón,
Nuevo Código Penal de 1995, Cedecs Editorial, Barcelona, 1996.

MORALES PRATS, Firman
y LERMA MORON, Esther, Comentarios a la Parte Especial del
Derecho Penal, Editora Aranzadi, 2ª edición, 1999.

MUÑOZ CONDE, Francisco.
Derecho Penal – Parte Especial, 14ª edición, Editora Tirant lo Blanch, Valencia,
2002.

SÁNCHEZ FERNÁNDEZ, Mª
Tereza, Protección Penal del Secreto de Empresa, Editorial Colex, Madrid, 2000.

VIVES ANTÓN, Tomás S.; DEL
ROSAL, M. Cabo, Derecho Penal – Parte General, Editora Tirant lo Blanch, 5ª
ed., Valencia, 1999.

VIVES ANTÓN, Tomás S.;
´BOIX REIG, J; ORTS BERENGUER, E.; CARBONELL MATEU, J. C.; GONZÁLEZ CUSSAC, J.
L. Derecho Penal – Parte Especial, 3ª ecição, Editora Tirant lo Blanch,
Valencia,, 1999.

 

Notas:

1. Dentre os paises pertencentes a
União Europea, Espanha é quem mais mantém relações comerciais com o Brasil

2. MORALES PRATS, Firman y LERMA MORON, Esther, “Comentarios a la Parte Especial del
Derecho Penal”
, Editora Aranzadi, 2ª edición, 1999, p.647

3. SÁNCHEZ FERNÁNDEZ, Mª Tereza, Protección
Penal del Secreto de Empresa
, Editorial Colex, Madrid, 2000, p. 30.

4 Ob cit. p. 31

5. MUÑOZ CONDE, Francisco. Derecho Penal – Parte
Especial
, 14ª edición, Editora Tirant lo Blanch, Valencia, 2002, p.487.

6. Ob cit. p. 294

7 GONZÁLEZ SUÁREZ, Carlos J., BAJO FERNÁNDEZ,
Miguel, y otros – Ob. Cit. p. 537-

8. O Tribunal Constitucional
encontra-se estabelecido pelo Título IX da Constituição Espanhola de 1978,
composto por 12 membros nomeados pelo rei, dentre eles, quatro nomes propostos
pelo Congresso, quatro pelo Senado, dois pelo Governo, e dois Conselho Geral do
Poder Judicial, art. 159 da CE. O TC é o intérprete da Constituição, exercendo
a competência definida no artigo 161 da Carta Magna. Site do Tribunal
Constitucional: http://www.tribunalconstitucional.es

9 CARRASCO ANDRINO, María del
Mar, La
Protección Penal
del Secreto de Empresa, Cedecs
Editorial, Barcelona, 1998, p. 142.


Informações Sobre o Autor

Romulo Rhemo Palitot Braga

Doutor em Direito Penal – Universitat de Valéncia; Professor Adjunto de Direito Penal da UFPB; Coordenador Regional Adjunto do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais; Advogado Criminalista


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