O projeto de lei nº 4.376/93, em tramitação no Congresso, é considerado mais
moderno que a legislação sobre falências e concordatas em vigor (Decreto-Lei nº 7.661, de 1945). O projeto prevê um capítulo especial
para as Micro e Pequenas Empresas (MPEs),
mas entendemos que o tratamento dispensado a elas ainda são bastante tímidos.
O
substitutivo amplia o objeto da legislação atual ao estender a sua aplicação,
hoje restrita a comerciantes, às sociedades empresárias, sociedades simples,
empresários e pessoas físicas que exerçam atividade econômica em nome próprio e
de forma organizada.
Estão fora da aplicação
do projeto de lei: a sociedade cooperativa; o agricultor que explore
propriedade rural para fins de subsistência familiar; o artesão, ao que presta
serviços ou ao que exerce atividade profissional organizada preponderantemente
com o trabalho próprio ou dos membros da família, para fins de subsistência
familiar; o profissional liberal e a sua sociedade civil de trabalho; a empresa
pública e a sociedade de economia mista.
O
enfoque da concordata passa a ser tratada como recuperação judicial
(negociada em juízo) ou extrajudicial (negociada fora da esfera
judicial, mas onde será homologada) da empresa que estiver em crise econômica/financeira. A intenção do legislador é criar
condições favoráveis para que as empresas se recuperem e continuem
cumprindo sua função social que é gerar empregos, pagar tributos, gerar divisas
e aquecer a economia nacional. Portanto busca-se com maior acuidade a
recuperação da empresa e não um estado pré-falimentar, como acabou se
transformando a lei de falências atual por meio da concordata.
A
recuperação judicial é definida pelo artigo 45 do projeto de lei como sendo a
ação judicial destinada a sanear a situação de crise econômico-financeira do
devedor, salvaguardando a manutenção da fonte produtora, do emprego de seus
trabalhadores e os interesses dos credores, e viabilizando, dessa forma, a
realização da função social da empresa.
O
prazo do parcelamento de débitos de MPEs
na recuperação judicial é de 3 anos, podendo ser prorrogado por mais 1 ano, com
aprovação do juiz. Para as demais empresas o prazo máximo está fixado em 2
anos.
Ao determinar o
processamento do pedido de recuperação o juiz nomeará o Administrador
Judicial e determinará a convocação da Assembléia Geral de Credores para
que sejam eleitos os representantes do Comitê de Recuperação Judicial
que irá atuar em nome dos credores a partir deste momento.
Administrador judicial: profissional
idôneo nomeado pelo juiz, de nível superior, formado preferencialmente nas
áreas de direito, economia, administração de empresas ou contabilidade.
Assembléia
geral de credores: composto por credores trabalhistas, credores com direitos reais de garantia ou
privilégios especiais, credores quirografários, subordinados ou com privilégios
gerais. Tem entre seus objetivos deliberar sobre o plano de
recuperação judicial, a proposta de recuperação extrajudicial e os incidentes
do procedimento de falência.
Já o Comitê
de Recuperação Judicial é composto por 3 membros e suplentes com
representantes de cada grupo de credores e tem por função elaborar, se for o
caso, plano de recuperação judicial alternativo; fiscalizar a administração do
devedor; apurar reclamações dos interessados; fiscalizar a execução do plano de
recuperação judicial; e, submeter à apreciação do juiz a alienação,
constituição de ônus reais e garantias dos bens do devedor em determinados
casos. A MPE está dispensada do Comitê de Recuperação Judicial, cuja
reivindicação inicial foi de iniciativa do Sebrae/SP a fim de se evitar maiores
custos a estas empresas.
O
projeto foi alterado para pior quando excluiu o FISCO das regras da recuperação
judicial. Pela redação anterior, o FISCO receberia o mesmo tratamento dos
demais credores. Com a atual redação do projeto os créditos fiscais não se sujeitam à recuperação e independem de
habilitação, tendo rito executório próprio, que deve também ser conciliado com
o Código Tributário Nacional. A situação anterior deveria ser mantida
ao menos às MPEs, pois, não
devemos nos esquecer que muitas delas, embora estejam enquadradas no Estatuto
das MPEs, não foram recepcionadas pelo Simples
Federal e estão sujeitas às mesmas regras tributárias impostas às médias e
grandes empresas, em completa desconexão com a ordem constitucional.
Homologada
a proposta de recuperação judicial, o devedor (MPE) passará a cumprir as
obrigações assumidas, não podendo, contudo, determinar o aumento de despesas
ou contratar empregados, exceto se houver expressa
concordância do juiz, ouvidos os credores.
Pelo
novo projeto, há um valor mínimo para se requerer pedido de falência das
empresas e é preciso também que exista mais de um título protestado (títulos
que representem 20 salários mínimos para as MPEs e 40 salários mínimos para as demais empresas).
Atualmente, qualquer credor pode pedir a falência da empresa, independentemente
do valor de seu crédito. Chegam com freqüência em juízo
pedidos de falência de até R$ 20. Embora muitos juízes indefiram tais
pedidos, a lei atual não determina nenhum valor mínimo para a propositura da
ação.
Para os
fins deste projeto de lei, a MPE poderá manter escrituração contábil
simplificada, conforme prevê a lei do Simples. Esta
também é uma reivindicação antiga do Sebrae/SP e muito importante para seus titulares,
pois muitos empresários que mantinham sua escrituração fiscal nos moldes
estabelecidos pala Lei do Simples Federal eram surpreendidos por pedidos de
prisão por não possuírem os livros comerciais exigidos pela legislação
comercial e pela atual lei de falências (já que a falta destes livros
caracterizam crime fiscal).
Outro
pedido feito pelo Sebrae/SP à época era de equiparar as MPEs aos credores com créditos privilegiados nos
processos de falência, de modo que elas tivessem preferência no recebimento de
seus créditos. Isto porque, estas empresas possuem pequenos créditos e quase
sempre estão situadas entre os últimos na fila de preferência para recebimento
dos seus valores e, muitas vezes, ficam sem recebe-los
por não restar mais bens do devedor ao final da falência. Embora sejam quantias
baixas, tais valores são de extrema importância para a sobrevivência das MPEs. Infelizmente esta idéia não
foi acatada pelos legisladores que acreditam que a natureza do crédito não pode
privilegiar o porte da empresa. Ora, a justificativa é juridicamente fraca e só
seria plausível se a nossa Constituição Federal não estabelecesse tratamento
diferenciado às micro e pequenas empresas. A inconstitucionalidade reside
quando se pretende tratar as pequenas de forma igual ou pior em relação às
demais empresas, como é o caso da atual proposta!
O projeto
estabelece o prazo máximo de 5 anos de duração do processo de falência de
MPE, cabendo ao juiz tomar todas as providências para tal, inclusive, se
for o caso, a remessa ao representante do Ministério Público das peças
necessárias à propositura de ações civis e criminais contra os responsáveis.
Esta é uma medida importante, pois há processos de falência que duram cerca de
10, 15 ou mais anos. Esta lentidão tem se mostrado maléfica às partes, já que
cerceia demasiadamente a liberdade de devedores que simplesmente não conseguem
obter bons resultados em um mercado extremamente concorrido, bem como oneram os
que necessitam receber seus créditos.
Conforme
dissemos, de um modo geral as MPEs
estão tendo um tratamento muito modesto neste projeto de lei de falências e que
não estão à altura dos princípios constitucionais que determinam tratamento
diferenciado, favorecido e simplificado contidos nos artigos 170 e 179 da
Constituição Federal de 1988. Sem dúvida nenhuma, a função social que as MPEs desempenham é significativo,
haja vista o número de pessoas que empregam, o forte escoamento dos produtos
que realizam em todo território brasileiro, o intenso movimento da economia
nacional que proporciona, os tributos que recolhem, sem falar da oportunidade
que cria à massa de cidadãos desempregados que buscam opções ao desemprego. Não
podemos perder de vista que neste mercado globalizado e extremamente concorrido
em que as grandes empresas ocupam cada vez mais espaços, as MPES estão em
desvantagens e apresentam enorme fragilidade.
Informações Sobre o Autor
Paulo Melchor
Mestre em Direito pela UNIMES
Consultor Jurídico de Pequenas Empresas
Professor de Direito Tributário e Empresarial