Resumo: O presente artigo traz à baila a possibilidade de eleição dos termos do contrato de trabalho entre as partes, à luz da análise dos dispositivos da Lei Complementar 150 de 1º de junho de 2015. Onde, sob este viés, investiga acerca dos avanços pela possibilidade de certa autonomia dada ao trabalhador. Desta forma, inicia-se por um breve apanhado dos conceitos básicos e dos pressupostos definidores do empregado doméstico; através da CLT e da Lei Complementar, passando para a evolução dos direitos dos trabalhadores domésticos, no Brasil, desde a sua total desconsideração jurídica; sua inclusão jurídico-social anterior à Constituição de 1988; passando ao período de deflagração e ampliação da cidadania trabalhista doméstica, após a CRF/88 e finalmente a sua consolidação legislativa. Em um segundo momento se perpassada sobre a evolução do Sindicalismo no Brasil, através da análise então adotada de forma indiscriminada da doutrina e legislações pertinentes. Observa-se critérios jurídicos atualmente existentes acerca dos direitos e garantias dos trabalhadores, através da análise da Evolução dos Sindicatos de forma pormenorizada, onde é tratada a figura da Flexibilização e da Desregulamentação de direitos,nas relações de trabalho,em que é realizado um exame acerca dos reflexos do Neoliberalismo nas relações de trabalho e conclui-se pela apreciação do instituto da Flexibilização e sua incidência no cenário brasileiro E por fim, aborda a repercussão,através de uma análise pontual dos dispositivos da Lei Complementar 150/2015, onde se analisa da possibilidade de acordo entre as partes, fazendo um comparativo com a Consolidação das Leis Trabalhistas,onde se instiga se a possibilidade de acordo se deu via de consequência do instituto da Flexibilização dos direitos,ocorrida no período Neoliberal e, se traz consigo, avanços legislativos ao trabalhador doméstico , culminando na avaliação da possibilidade de os acordos trazerem mais efetividade ao trabalhador doméstico de forma a dirimir as incongruências ainda existentes em sua realidade.[1]
Palavras-Chave: Lei Complementar 150/2015 – Evolução dos Direitos dos Trabalhadores Domésticos – Evolução Sindical no Brasil – Flexibilização e Desregulamentação – Acordo entre as partes.
Abstract: This monograph shows the possibility of term work contract election between the parts of this process, with the clarity of analysis of the provisions of Complementary Law 150 of June 1, 2015, researching around the possibility of a certain autonomy given to the worker. Thus, it begins with a brief survey of the basic concepts and defining assumptions of domestic servants in Brazil since the total disregard for the law; its legal and social inclusion prior to the 1988 Constitution, passing to the period of deflagration and expansion of domestic labor citizenship, after the CRF / 88 and finally its legislative consolidation. At second glance, it is pervaded on the evolution of the Syndicalism in Brazil, through the indiscriminately adopted analysis of relevant doctrine and legislation. It is observed the current legal criteria regarding workers' rights and guarantees through the analysis of the evolution of trade unions in detail, which is treated the figure of Flexibilization and Deregulation of rights, in labor relations, which an examination is made of the reflexes of Neoliberalism in labor relations. It is concluded by the appreciation of the Institute of Flexibilization and its incidence in the Brazilian scenario. Lastly, it addresses the repercussion, through a punctual analysis of the provisions of Complementary Law 150/2015 It analyzes the possibility of agreement between the parties, comparing with the Consolidation of Labor Laws where it is instigated if the possibility of agreement took place through a consequence of the institute of Flexibilization of the rights, occurred in the Neoliberal period; it brings with it legislative advances to the domestic worker, culminating in the evaluation of the possibility of the agreements bringing more effectiveness to the domestic worker in order to resolve the incongruities still existing in their reality.
Key-words: Complementary Law 150/2015 – Evolution of the Rights of Domestic Workers – Trade Union Evolution in Brazil – Flexibility and Deregulation – Agreement between the parts.
Sumário: Introdução:1. Conceitos básicos e pressupostos caracterizadores do trabalho doméstico.1.2. Histórico da evolução dos direitos dos trabalhadores domésticos no brasil- fase da desconsideração jurídica.1.2.1 fase de inclusão jurídico/social-período anterior à Constituição de 1988.1.2.2. Fase de deflagração e ampliação da cidadania trabalhista doméstica pela Constituição de 1988.1.2.3. Consolidação das leis trabalhistas domésticas. 2. Histórico da evolução sindical no Brasil.2.1. A flexibilização e a desregulamentação nas relações de trabalho: neoliberalismo e estado intervencionista.2.2. Análise da flexibilização no contexto brasileiro.3. Trabalho doméstico no brasil: os avanços nas negociações trazidos pela Lei Complementar 150/2015. 3.1. Artigo 2º -horas-extras. 3.2. Artigo 3º- trabalho em regime de tempo parcial (horas suplementares). 3.3. Artigo 4º- contratação por prazo indeterminado. 3.4. Artigo 10-jornada de plantão. 3.5. Artigo 11- jornada de trabalho empregado que presta serviços em viagem. 3.6. Artigo 13- intervalo para repouso ou alimentação. 3.7. Artigo 18 descontos no salário do empregador. Conclusão. Referências.
INTRODUÇÃO
O tema sobre a lei dos trabalhadores domésticos como sendo um avanço nas negociações coletivas promoveu intensa movimentação no mundo jurídico, bem como discussões acerca da efetividade dos direitos reconhecidos através de lei específica, tanto na realidade do seio familiar, como na sociedade.
Sabe-se que o ambiente de trabalho doméstico por si só, demanda maior análise no que se refere à efetividade dos direitos, haja vista suas peculiaridades, sendo que deve ser assegurado, como qualquer outro contrato de trabalho, imprescindível ao homem, não apenas propiciar o sustento material, mas também promover sua valorização como pessoa e sua integração com a sociedade.
Contudo, os valores existentes na lógica do capital, sobretudo no âmbito familiar, nunca se ateve ao trabalhador doméstico, cuja busca pela grande demanda de trabalho e a proximidade com o empregador, passaram a relegar o aspecto humano a um plano inferior, reforçada pela ausência de dispositivos legais mais efetivos, culminando em certa opressão do trabalhador tanto no que se refere à sua utilização indiscriminada durante a jornada, quanto na exigência de jornadas extenuantes e situações arbitrárias.
A realidade mostra que pouco se alcança de efetividade em relação aos direitos dos domésticos, uma vez que não possuíam ferramentas capazes de promover maior efetividade aos seus direitos, durante a jornada de trabalho.
Paralelo a isso temos uma história sindical no Brasil que nas últimas décadas, pouco proporcionou aos trabalhadores.
Com o Neoliberalismo trazido com o advento da Constituição de 1988, foi trazida a figura da Flexibilização dos direitos, trazendo consigo também a possibilidade de certa autonomia aos empregados, e maior segurança às relações laborais dos empregados sindicalizados.
Neste sentido, a figura da Flexibilização teve seu reflexo nos demais contratos de trabalho, inclusive nas relações laborais domésticas, visto que Direito não é estanque, mas deve ter compasso com as modificações da sociedade, de maneira a flexibilizar e dar mais autonomia ao trabalhador, de forma a propiciar maior efetividade e praticidade à sua realidade tão peculiar, ao poder negociar melhor suas prioridades, de modo que urge proceder a novas modificações nessa seara.
Assim, surge ao operador do Direito, promover uma análise mais pontual acerca da questão, de modo gerar um posicionamento crítico, onde se possam cotejar as implicações e benefícios da Lei dois Domésticos, bem como o cabimento das negociações laborais entre as partes, expressas na Lei Complementar 150/2015.
O Poder Judiciário enfrenta vários debates dentro desta realidade, nos autos de reclamatórias trabalhistas, devido ao fato de ser revestido de certa complexidade cada caso, promovendo interpretações dos mais diversos entendimentos, acobertados pela parcialidade que incide no contraditório, onde ultrapassa promovendo debates na academia e várias produções doutrinárias, pois foge do rigor técnico a ser aplicado, dando lugar à Flexibilização em grande parte das situações incidentes neste tipo de contrato de trabalho.
A realidade das situações que chega até o poder judiciário, em grande parte, objetiva o reconhecimento de direitos já legitimados aos demais trabalhadores, o que mostra que a efetividade da garantia dos direitos dos trabalhadores domésticos em verdade não está sedimentada na sociedade como se pensa, em que não se respeita o horário de descanso, as horas extras, intervalo intrajornada, onde muitas vezes não há condições mínimas para uma convivência salutar.
Em situações repetidas, antes da LC nº 150/2015, não havia sequer a fruição de férias pois consideram que o trabalhador também está usufruindo quando na verdade está à disposição do empregador.
Nesta seara, a sociedade, aos poucos vem dando o mais espaço e atendendo aos direitos do trabalhador doméstico, de modo que as mudanças podem ser sentidas pela busca, por parte dos empregadores, do enquadramento à legislação, no entanto, ainda persiste a falta de autonomia por parte do trabalhador em recorrer às melhores condições que uma negociação direta pode trazer ao seu contrato de trabalho, uma vez que somente este sabe melhor da sua realidade, podendo efetivamente melhor dirimir problemas pontuais da sua jornada de trabalho.
Faz-se necessário, neste contexto, o enfrentamento e análise de tal acerca dos avanços trazidos pela Lei Complementar 150/2015, na possibilidade de acordo entre as partes
Assevera-se que este patamar negocial, somente foi possível pelo histórico legislativo e pelo neoliberalismo, na figura da Flexibilização sindical, onde culminou pela adequação legislativa também na esfera laboral doméstica.
As novidades trazidas com a LC 150/2015, demonstram que as mudanças trazidas pela sociedade, que a rigor agora não pode deixar de atentar-se a categoria de profissionais que sempre esteve presente no seu dia-a-dia e que notoriamente teve seu reconhecimento constitucional bastante lento, de tal forma que este reconhecimento legislativo traz consigo,por um lado uma autonomia laboral, em tese por outro, preocupações quanto à efetividade dessa emancipação no quadro prático, cujas conclusões, a depender do radicalismo das posições adotadas, podem representar sério atentado ao trabalhador, que se insere a especial relevância do tema.
Neste sentido surge o problema a ser investigado nesta monografia: a autonomia dada ao trabalhador doméstico em negociar diretamente com o empregador, trará efetividade e garantias, frente às peculiaridades que envolvem seu contrato de trabalho, diante da LC nº 150/2015? Tal flexibilidade pode ser benéfica ao trabalhador, na busca pela efetividade de seus direitos?
Com o intuito de compreender tais questionamentos, observou-se a evolução dos direitos dos trabalhadores domésticos, bem como a evolução dos trabalhadores sindicalizados, onde a neste caso se verifica até então, o monopólio das negociações coletivas, pelos mesmos.
Assim analisou-se o instituto da flexibilização, trazida pelo neoliberalismo, como ferramenta capaz de garantir direitos e proteger os trabalhadores, através de autores clássicos da esfera trabalhista, e em contrapartida, autores mais contemporâneos, que trazem a possibilidade de fornecer o arcabouço doutrinário relativo a este instituto, sobretudo sua implicância no Brasil, onde se inicia a busca pela autonomia dos trabalhadores de um modo geral.
E por foi realizada uma análise das inovações quanto às negociações coletivas, fruto do neoliberalismo e da flexibilização, trazidas pela Lei Complementar 150/2015, onde traz maior independência ao trabalhador doméstico quanto à escolha de suas condições de trabalho, onde é esmiuçada com mais pontualidade os dispositivos legais onde esta possibilidade de acordo entre as partes é recorrente
O estudo será dividido em três capítulos. Inicialmente com o apontamento de conceitos básicos e pressupostos caracterizadores do trabalhador doméstico, logo após, tecer-se-á um breve panorama acerca evolução dos direitos dos trabalhadores domésticos no Brasil, desde a sua total inobservância, até a institucionalização, por meio da Constituição Federal de 1988, até o reconhecimento como classe ntrabalhadora, com LC 150/2015. Em um segundo momento, será realizada uma análise mais acurada da evolução dos sindicatos Brasileiros, como ferramenta capaz de efetivar garantias e direitos dos trabalhadores e suas classes, através das negociações coletivas, sendo até então um monopólio sindical, tanto no aspecto constitucional, pela inclusão de regras referentes à matéria, quanto pela via infraconstitucional, através das recentes modificações legislativas.
Ainda, é analisado o instituto da Flexibilização e Desregulamentação, trazidas pelo Neoliberalismo, e sua incidência no cenário brasileiro, como norte para as mudanças posteriores, e sobretudo como fonte para as recentes mudanças no cenário do trabalhador doméstico.
E por último realizar uma abordagem comparativa, de cada dispositivo da Lei Complementar 150/2015 de forma pontual, onde há possibilidade de acordo entre as partes, fazendo um comparativo com dispositivos da Consolidação das leis Trabalhistas (CLT) examinando as inovações trazidas pela nova lei no campo das negociações, onde servirão de base para a abordagem da questão da autonomia, e melhores condições de trabalho, no que concerne ao tema deste estudo monográfico.
Por todo exposto, importa ressaltar que com esse estudo, conveniente por versar de questão precípua ao trabalho, que é a dignidade da pessoa humana, bem como aos valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, onde apenas traz à baila a discussão acadêmica acerca do tema e instigar à reflexão acerca do assunto, sem, contudo, exauri-lo.
1. CONCEITOS BÁSICOS E PRESSUPOSTOS CARACTERIZADORES DO TRABALHO DOMÉSTICO
Define-se empregado doméstico segundo a CLT, em seu artigo 3º, como “toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário”.
No entendimento de Alice Monteiro de Barros, “empregado pode ser conceituado como a pessoa física que presta serviço de natureza não eventual a empregador mediante salário e subordinação jurídica”[2].[i]
Deste modo, baseando-se nas erudições expostas, os pressupostos caracterizadores da relação empregatícia segundo a CLT[3] são: a) trabalho realizado por pessoa física; b) pessoalidade; c) não eventualidade; d) onerosidade; e, e) subordinação jurídica. A falta de algum desses elementos descaracteriza a relação empregatícia.
Com relação ao empregado doméstico, segundo a Lei 5.859/72[4], revogado pela Lei Complementar 150 de 1º de junho de 2015[5], que tratava especificamente desta categoria, em seu artigo primeiro assim dispunha suas características: “aquele que presta serviços de natureza contínua e de finalidade não lucrativa à pessoa ou à família, no âmbito residencial destas”.
Partindo-se da análise dos dois conceitos, verifica-se a desigualdade existente a existência de alguns pressupostos que somente estão presentes nessa relação de trabalho.
Neste sentido, devido às suas peculiaridades, seus pressupostos vão além dos previstos na CLT, quais sejam: que o trabalho realizado seja feito em âmbito residencial de pessoa ou família e que não haja finalidade lucrativa no seu exercício.
Assim, são considerados empregados domésticos: o jardineiro, motorista, mordomo babá, cozinheira, caseiro, vigia e todos aqueles que possuem em sua relação de trabalho, todos os pressupostos presentes no vínculo empregatício doméstico.
O vínculo trabalhista é bastante peculiar e se mostra bem evidente conforme os termos dos artigo 1º da Lei nº 5.859/1972, já revogada e que tratava dos domésticos[6].
Assim, para caracterizar o vínculo empregatício doméstico, é necessário que haja a presença dos requisitos que seguem:
a) Prestação de serviço de natureza contínua ou não eventual
A não eventualidade do trabalho doméstico presente no artigo 1º da Lei 5.859/72,segundo o professor Luciano Martinez[7].
“(…) deve ser observada levando-se em consideração que na época em que foi publicada a Lei dos Domésticos, não havia previsão do repouso semanal remunerado,sendo que justificava a continuidade como característica de todo serviço realizado em favor das famílias, de forma ininterrupta,trazendo a ideia de continuidade.”
Assim sendo o repouso semanal remunerado foi incluído no rol dos direitos dos trabalhadores domésticos somente após a promulgação da Constituição Federal de 1988, sendo que somente através da Lei 11.324/2006[8], foram finalmente incluídas as folgas em feriados.
Em uma interpretação mais contemporânea, baseada nas jurisprudências, o trabalho doméstico não é interpretado como eventual, muito embora com interrupções para repouso semanal, folga ou férias, pois a ideia de continuidade está presente.
De acordo com a lição de Delgado[9] “o termo continuidade é entendido como uma forma de diferenciar o empregado doméstico,através de Lei especial,onde não se estende esse direito ao trabalhador eventual doméstico,e diarista igual tratamento”.
b) Trabalho em âmbito residencial de pessoas ou de família
Pressuposto existente somente nesta categoria,a atividade do empregado tem que ser exercida em âmbito residencial ou de família, sem trazer lucros ao empregador e voltado somente para esta.
Nascimento[10] afirma a incorreção do art.1º da Lei nº 5.859/72:
“Não foi correta quando dispôs que o doméstico presta, serviços no âmbito
residencial.Melhor seria se dissesse” para o âmbito residencial”.
Há domésticos que exercem serviços externos, como o motorista”
Desse modo tem-se o exemplo do vigia e do motorista particular que, mesmo não exercendo serviços dentro da residência do empregador, tem seus trabalhos voltados para a família a qual prestam serviço.
c) Finalidade não lucrativa
Pressuposto também peculiar aos trabalhadores domésticos, a finalidade não lucrativa,conforme alínea “a” do artigo. 7º da CLT:“aos empregados domésticos, assim considerados, de um modo geral, os que prestam serviços de natureza não econômica à pessoa ou à família, no âmbito residencial destas.”
Por finalidade não lucrativa prestada pelo trabalhador doméstico entende o legislador, que esta atividade somente será prestada pelo doméstico atendendo somente aos interesses pessoais da família ou tomador para qual presta serviço.
Melhor interpretação dada a referido pressuposto por Mozart Victor Russomano[11]:
“Toda e qualquer atividade que crie bens e serviços é econômica. Nesse sentido próprio, o empregado doméstico presta serviços de natureza econômica, embora não lucrativos. […] a característica do serviço doméstico é que o trabalho empregado não se dirija a fins lucrativos”
d) Pessoalidade
Pessoalidade é o termo empregado ao trabalhador, cujo trabalho exige que somente ele execute o que a ele designado,sem substituição por outro.
O pressuposto da pessoalidade exige que o empregado execute suas atividades pessoalmente, sem se fazer substituir, assumindo o caráter intuitu personae[12].“(…) o obreiro não pode se fazer substituir por outro colega de ofício, sem anuência do patrão. […] Logo, para o empregado a obrigação é infungível, personalíssima (intuitu personae)”
Assevera-se que a pessoalidade é elemento incidente somente na figura do empregado, pois com relação ao empregador prevalece o princípio da despersonalização da figura do empregador, podendo haver a alteração subjetiva do contrato, não havendo qualquer mudança nas regras contratuais já vigentes em relação ao mesmo empregado.
No entanto, existem nesse caso, algumas situações de excepcionalidade, onde a substituição é permitida, como férias, licença-gestante, afastamento para cumprimento de mandato sindical, etc.
Deste modo, bem observa Maranhão[13]:”(…) se a prestação é a título oneroso não poder ser de mera benevolência,condições que se repelem”.
e) Prestação do trabalho por pessoa física
Sob a ótica do direito do trabalho, o empregado é sempre pessoa física.Tal particularidade justifica a razão do direito trabalhista, que é tutelar bens jurídicos fundamentais à pessoa física, como saúde, vida, bem-estar, integridade moral, etc..
f) Onerosidade
O valor econômico da força de trabalho colocada à disposição do empregador deve corresponder uma contrapartida econômica em benefício obreiro, isto é, o salário.
A onerosidade manifesta-se objetivamente pelo pagamento ao empregado, em dinheiro ou parcialmente em utilidades seja, subjetivamente, pela intenção contra prestativa.
Esclarecendo acerca do pressuposto é o conceito de Delgado[14]:
“A prestação laboral teria-se feito visando à formação de um vínculo empregatício entre as partes,com as consequências econômicas favoráveis ao prestador oriundas das normas jurídicas trabalhistas incidentes”.
Nesta mesma linha,a toda prestação do serviço do doméstico, exige-se uma contraprestação pecuniária, que é o valor econômico da força de trabalho que colocou à disposição do empregador.
g) Subordinação jurídica
A subordinação engendra-se como característica da relação contratual trabalhista através do aspecto relacional:de um lado o poder diretivo;do outro a disposição do empregado em permitir ser dirigido
Trata-se do elemento que distingue a relação de emprego de todas as demais formas de relações de trabalho.
Melhor definição possui Amorim[15]:
“O elemento subordinação, presente às relações empregatícias genérica e doméstica, não se confunde, portanto com sujeição pessoal do empregado ao empregador, não possuindo o caráter aviltante do trabalho escravo e servil, ou mesmo dos regimes medievais posteriores. A subordinação é efetivamente, portanto, jurídica, derivada do contrato de trabalho e referindo-se à maneira de prestação do trabalho pactuado e não à pessoa do trabalhador. (…) Trata-se, portanto, de uma dependência hierárquica, fruto da natureza ou da organização interna da empresa empregadora, sendo assim contratual, voluntariamente aceita pelo empregado, como resultado de sua posição e do seu destino dentro do contemporâneo sistema de produção capitalista
h) Prestação de serviço para pessoa ou família
Uma das grandes peculiaridades do labor doméstico se trata do ambiente de trabalho, uma vez que somente é considerado empregado doméstico aquele que presta serviços para pessoa física ou família.
O professor Martinez[16], muito bem define esta relação de proximidade: “Somente pessoas físicas ou agrupamento familiar de pessoas físicas, unidas por laços de parentesco ou de afinidade, podem contratar empregados domésticos”.
Se a contratação for feita por empresa ou outra entidade, o vínculo não será doméstico.
1.2 Histórico da evolução dos direitos dos trabalhadores domésticos no Brasil- Fase da Desconsideração Jurídica
Através de uma visão Marxista, como base para a definição do trabalho doméstico, acerca do seu valor, em cotejo com a contraprestação, discutiu-se por muito tempo se o trabalho doméstico era produtivo ou improdutivo.
Neste sentido, se percebe a desconsideração do trabalho doméstico, pois sequer tinham reconhecimento pelo trabalho desempenhado.
Segundo a teoria Marxista é produtivo o trabalho que traz lucro, ou seja, o qual é extraído valor excedente, o qual é obtido através da venda da sua força de trabalho, transformada em mercadoria, sendo esta a diferença entre produto e mercadoria.[17]
A partir deste conceito, constata-se que não há diretamente uma produção excedente advinda do trabalho doméstico, de modo que não há que se falar em lucro.
O histórico do trabalho doméstico relata a ocorrência de marginalização, baseada na exploração econômica e também psicológica.
No Brasil, colônia o trabalho doméstico era desempenhado por negros e escravos, pois eram a mão de obra disponível em larga escala.
Dessa forma, o trabalho doméstico passa a ser um reflexo da violação dos direitos humanos, e mesmo após a abolição da escravatura, não restava nenhuma perspectiva para os libertos, pois continuavam nas fazendas, em troca de comida e teto, onde em realidade a liberdade não se deu na realidade, pois continuavam aprisionados no aspecto social e econômico.
Neste contexto, a evolução do trabalho doméstico se manteve a mesma, com a presença de uma lacuna que era a exclusão civilizatória no século XX.
Nas décadas de 30 e 40, houve uma farta ascensão quanto à sistematização da legislação trabalhista brasileira.
Getúlio Vargas, criou o Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio,onde por consequência,provocou a regulamentação nas áreas do sindicalismo e previdência social e trabalho, como forma de manter a ordem entre as classes.
Foi criada a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT),[18] compreendendo a sistematização dos direitos, obrigações e garantias, inerentes à relação trabalhista.
Desta forma, considera-se empregado todo aquele trabalhador que exerce sua atividade sendo pessoa física, com pessoalidade, subordinação jurídica, não eventualidade e onerosidade, senão vejamos:
“Art. 3º – Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário.
Parágrafo único – Não haverá distinções relativas à espécie de emprego e a condição de trabalhador, nem entre o trabalho intelectual, técnico e manual”.
Referida Consolidação foi criada com a finalidade de uniformizar as normas trabalhistas, que até então eram esparsas.
Com o advento da nova Constituição Federal, promulgada em 1988[19], todas as normas que com ela colidirem não devem ser recepcionadas, por serem inconstitucionais, desta forma, é mais evidente que o art.7º da CLT, foi totalmente banido frente ao art. 5º, caput c/c. o art.7º, caput, da Lei Magna c/c, Declaração Universal dos Direitos do Homem[20], entre outras normas de direito interno e internacional.
Nas palavras de Maurício Godinho Delgado[21]
“A categoria doméstica não recebeu qualquer proteção jurídica do Direito do Trabalho em sua fase clássica de institucionalização (1930, em diante). Por décadas permaneceu excluída de qualquer cidadania trabalhista, previdenciária e institucional.”
De fato, a CLT exclui, expressamente os empregados domésticos de suas normas protetivas (art.7º, “a’’). A categoria permaneceu, assim, por extenso período, em constrangedor limbo jurídico, sem direito sequer a salário mínimo e reconhecimento previdenciário do tempo de serviço.
Assim, pormenoriza Delgado[22]
“Um antigo diploma fez referência a esses trabalhadores (Decreto-lei n.3.078 de 1941)[23], com fito de lhes atribuir determinados direitos. Porém, impôs, expressamente, para sua efetiva vigência a necessidade de regulamentação inferior, a qual jamais foi procedida”.
Neste compasso, a fase de desconsideração jurídica ainda iria perdurar por muito tempo, em processo bastante lento sendo somente implantado timidamente com a Lei n.5859, de 1971 e Lei Complementar n. 150, de 2015.
1.2.1 Fase de inclusão jurídico/social-Período anterior à Constituição de 1988
No Brasil, a Lei 5.859/1972, foi elaborada em meio ao regime militar, que vigorou no Brasil desde o início da década de 60(sessenta) até o inicio da década de 80 (oitenta) e ela sofreu alterações e inclusões ao longo do tempo, sendo que as principais modificações foram introduzidas pelas Leis 10.208/2001 que facultou a inclusão do empregado doméstico ao regime do FGTS e pela Lei 11.324/2006, onde se destacam os seguintes direitos que foram incluídos aos domésticos:
a) vedado o desconto no salário do empregado doméstico a título de alimentação, vestuário, higiene e moradia no local;
b) férias de 30 dias acrescidas do terço constitucional;
c) vedada a dispensa arbitrária da empregada gestante até 5(cinco) meses após o parto;
d) instituído o seguro desemprego pago por 3 (três) meses àqueles que fossem dispensados e que lhe fossem oferecidos o benefício do FGTS.
O lapso temporal que antecede à nova Constituição da República no que se refere aos domésticos teve como fruto, apenas a Lei 5.859,de 1972,que estendeu exclusivamente dois únicos direitos aos trabalhadores domésticos (assinatura da CTPS e direito às férias anuais remineradas de 20 dias úteis,além da possibilidade de inserção da categoria no sistema previdenciário (INSS),
Mesmo sendo um passo dado na inserção de direitos exclusivos à classe, foi considerado extremamente modesto no que se refere a realidade do ponto de vista da categoria.
Ainda, no período antecedente à Constituição, com as Leis ns. 7.418/85[24] e 7.619/87[25], com seu regulamento normativo aprovado pelo Decreto n. 95.247/87[26], concedeu além do rol de direitos o direito a/o vale transporte.
A lei 5.859 de 1972 trouxe à categoria, um mínimo de cidadania, pois apenas formalizou a exclusão já existente, não estendendo os demais direitos à categoria, sendo este período, pouco fértil em relação à evolução dos direitos dos trabalhadores.
Assim, mesmo que de forma opcional, sem nenhuma cogência, não trouxe efetivamente nenhuma alteração significativa na realidade do empregado doméstico, uma vez que sairia mais oneroso ainda para o empregador.[27]
Partindo-se da análise de que a Constituição Federal não proíbe a concessão aos domésticos de outros direitos trabalhistas, além dos relacionados no parágrafo único do art. 7º, e diante dos direitos fundamentais, deve-se compreender que aos domésticos são estendidos todos os direitos sociais, relacionados ao texto constitucional, no que for compatível.
Assevera-se que a Constituição de 1988 é posterior às leis que regulam o trabalho doméstico e, no que for incompatível com os princípios constitucionais, devem ser desconsideradas.
Canotilho diz: ‘‘quando se fala de violação dos direitos fundamentais pelo legislador, pensa-se logo, em atos positivos de legiferação”
Esta lesão aos princípios fundamentais ocorre com pela omissão do legislador, que conta igualmente com a inércia dos órgãos de direção política, pois a desigualdade de direitos contraria o direito fundamental inerente ao princípio da igualdade e da valorização do trabalho.
1.2.2 Fase de deflagração e ampliação da cidadania trabalhista doméstica pela Constituição de 1988
Com o advento da Constituição de 1988 e reforçando a aplicabilidade dos direitos e garantias fundamentais, instituiu-se o princípio da aplicabilidade imediata dessas normas (art.5º, § 1º) [28], ratificando que os direitos,liberdades e garantias são regras e princípios de aplicação autônoma, conforme preceitua Canotilho[29]:
“Aplicação direta não significa apenas que os direitos, liberdades e garantias se aplicam independentemente de intervenção legislativa.
Significa também que eles valem diretamente contra a lei, quando esta estabelece restrições em desconformidade com a Constituição”.
A Constituição deflagrou um período de institucionalização da cidadania trabalhista para os trabalhadores domésticos, vindo a consolidar e ampliar direitos 8 novos direitos, o que foi um marco evolutivo, em contrapartida aos 4 direitos existentes até então.
Além disso, restou clara a necessidade de normas específicas capazes de regulamentarem o trabalho doméstico, dadas as suas peculiaridades.
Este período garantiu e consolidou oito novos direitos à categoria com o advento da Lei 11.324, de 2006 e também neste período, foi promulgada a Emenda Constitucional n. 72, de 2013[30] e a aprovação da Lei Complementar n. 150, de 2015, que veio a regulamentar os avanços da EC n. 72, que iremos discorrer.
Com primazia, conceitua Godinho[31] :
“A Constituição de 1988 garantiu à categoria doméstica um leque muito mais extenso de direitos do que conquistas anteriormente alcançadas (até então, somente quatro direitos).O rol constitucional compreende as seguintes parcelas:salário mínimo;irredutibilidade salarial;13º salário;repouso semanal remunerado,preferencialmente aos domingos,gozo de férias anuais remuneradas com,pelo menos um terço a mais do que o salário normal;licença gestante,sem prejuízo do emprego e do salário com duração de cento e vinte dias;licença-paternidade,nos termos fixados em lei;aviso-prévio proporcional o tempo de serviço,sendo no mínimo de trinta dias,nos termos da lei;aposentadoria (art.7º,parágrafo único,CF).
O mesmo dispositivo refere-se, ainda, à integração à previdência social- o que já constava da legislação anterior”
Até a aprovação desta lei, o empregador podia descontar do seu empregado os valores com a sua alimentação e moradia, caso morasse na casa da família a qual trabalhava e caso se alimentasse no mesmo local. Referida Lei passou a proibir tal desconto, através da inserção de novo artigo na Lei 5859/72:
“Artigo 2º-A. É vedado ao empregador doméstico efetuar descontos no salário do empregado por fornecimento de alimentação, vestuário, higiene ou moradia”.
Antes da promulgação da Lei 11.324, o empregador doméstico podia exigir do seu empregado o trabalho nos feriados, pois este direito não estava incluso no rol dos seus direitos, pela lei específica dos feriados, a Lei 605/49
No entanto, tal exclusão foi expressamente revogada pela nova lei: “Art. 9º Fica revogada a alínea a do art. 5º da Lei nº 605, de 5 de janeiro de 1949”.
Deste modo, o doméstico passou a ter direito ao repouso nos feriados oficiais.
Com a Lei 11.324, deu final à controvérsia relativa ao número de dias de férias do doméstico
A partir de julho de 2006, não resta dúvida: o doméstico tem direito a férias anuais remuneradas de 30 dias corridos, como os demais empregados.
Outro direito estendido à doméstica, pela Lei 11324/06, foi a estabilidade da gestante. Motivo de muitas críticas da doutrina, o fato de a doméstica poder ser dispensada quando grávida era permitido pela legislação anterior, mas não mais pelo novo artigo 4°-A da Lei 5859/72, cuja redação é clara:
"Artigo 4º-A. É vedada a dispensa arbitrária ou sem justa causa da empregada doméstica gestante desde a confirmação da gravidez até 5 (cinco) meses após o parto”
Uma vez constatada a gravidez pela doméstica, somente poderá ser dispensada, a acaso cometa falta grave, essa estabilidade essa que começa da confirmação da gravidez até 5 meses após o parto.
Trata-se, destarte, de alguns direitos suplementares assegurados ao doméstico, direitos bastante relevantes, para a evolução de sua cidadania.
A Lei 11.324 também traria incentivos fiscais em benefício do empregador doméstico de modo incentivar a realidade dos contratos e a favorecer a formalização trabalhista.
No entanto, um ponto bastante divergente com relação aos direitos da categoria, não foi completamente solucionado: a questão do FGTS e do Seguro Desemprego.
Este item continuou a ser facultativo para o empregador, se inscreve ou não o empregado.decisão, esta que implica em consequências bastante dispendiosas ao empregador, as quais: obrigação de o empregador depositar, todo mês, 8% do salário do seu empregado na conta vinculada deste; pagar, em caso de dispensa sem justa causa do doméstico, além de multa equivalente a 40% do valor dos depósitos do FGTS realizados durante aquele contrato de trabalho.
O seguro desemprego, também, é consequência da opção do empregador, caso opte por inscrever o empregado doméstico junto ao FGTS, este, em poderá receber até três parcelas do seguro desemprego, no valor ao salário mínimo; redação mantida pelo artigo 6-A da Lei 5.859/72.
Este período foi marcado por maior envolvimento de organismos internacionais acerca dos trabalhadores e das condições de trabalho, conforme destaca Alice Monteiro de Barros[32].
“Neste sentido, a Organização Internacional do trabalho também assumiu destacado protagonismo nesse percurso civilizatório de direitos, ao indicar as medidas assecuratórias de direitos para os trabalhadores domésticos,em sua Conferência Geral em Genebra, em 16 de junho de 2011.Entre as medidas compiladas e favor dos trabalhadores domésticos destacam-se:necessidade de fixação de idade mínima para o trabalho; proteção contra assédio e violência;respeito à privacidade;pagamento regular de salário”.
Neste rol de direitos consagrados e defendidos pela OIT, ainda se cita a regulação legal do aviso–prévio proporcional.
1.2.3 Consolidação das leis trabalhistas domésticas
A evolução dos direitos do trabalhador doméstico somente iria se consagrar mais de duas décadas após a promulgação da Constituição de 1988, chamada de “Constituição Cidadã” e ainda em respostas à Convenção 189 da OIT, surge a PEC nº 66/2012 com o intuito de revogar o parágrafo único do artigo 7º da CRFB/1988, estabelecendo a igualdade de direitos trabalhistas entre os empregados domésticos e demais trabalhadores urbanos e rurais.
A Emenda Constitucional 72, de março de 2013, tal Emenda trouxe mais 16 novos direitos aos trabalhadores domésticos, consolidando de fato a categoria, através da Lei Complementar 150 de 2 de junho de 2015.
A fundamentação jurídico-política da PEC das domésticas e, consequentemente, da EC 72/2013 se encontra na nos direitos humanos trabalhistas e sociais. Segundo Patrick Maia Merísio[33], tais direitos descendem da forma da execução do trabalho e não da natureza do empregador ou da própria função do empregado. O elemento determinador é a prestação pessoal, onerosa, contínua e subordinada juridicamente a outrem. “A partir disso, o direito do trabalho passa a ser parte essencial dos direitos sociais, cabendo ao Estado promovê-los e assegurá-los. Eis a razão da medida legislativa suprema”
Deste modo passaram a fazer parte dos direitos do trabalhador doméstico, dezesseis incisos da CRF/88,artigo 7º in verbis:
“I – relação de emprego protegida contra despedida arbitrária ou sem justa causa, nos termos de lei complementar, que preverá indenização compensatória, dentre outros direitos; II – seguro-desemprego, em caso de desemprego involuntário; III – fundo de garantia do tempo de serviço; IV – salário mínimo, fixado em lei, nacionalmente unificado, capaz de atender a suas necessidades vitais básicas e às de sua família com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, com reajustes periódicos que lhe preservem o poder aquisitivo, sendo vedada sua vinculação para qualquer fim; VI – irredutibilidade do salário, salvo o disposto em convenção ou acordo coletivo; VII – garantia de salário, nunca inferior ao mínimo, para os que percebem remuneração variável; VIII – décimo terceiro salário com base na remuneração integral ou no valor da aposentadoria;
IX – remuneração do trabalho noturno superior à do diurno; X – proteção do salário na forma da lei, constituindo crime sua retenção dolosa; XII – salário-família pago em razão do dependente do trabalhador de baixa renda nos termos da lei; XIII – duração do trabalho normal não superior a oito horas diárias e quarenta e quatro semanais, facultada a compensação de horários e a redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho; XV – repouso semanal remunerado, preferencialmente aos domingos; XVI – remuneração do serviço extraordinário superior, no mínimo, em cinqüenta por cento à do normal; XVII – gozo de férias anuais remuneradas com, pelo menos, um terço a mais do que o salário normal; XVIII – licença à gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, com a duração de cento e vinte dias; XIX – licença-paternidade, nos termos fixados em lei; XXI – aviso prévio proporcional ao tempo de serviço, sendo no mínimo de trinta dias, nos termos da lei; XXII – redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança; XXIV – aposentadoria. XXV – assistência gratuita aos filhos e dependentes desde o nascimento até 5 (cinco) anos de idade em creches e pré-escolas; XXVI – reconhecimento das convenções e acordos coletivos de trabalho; XXVIII – seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa; XXX – proibição de diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil; XXXI – proibição de qualquer discriminação no tocante a salário e critérios de admissão do trabalhador portador de deficiência; XXXIII – proibição de trabalho noturno, perigoso ou insalubre a menores de dezoito e de qualquer trabalho a menores de dezesseis anos, salvo na condição de aprendiz, a partir de quatorze anos.”
Efetivamente, poucos incisos não passaram efetivamente ao rol de direitos e garantias do trabalhador doméstico pela inviabilidade formal ou por outras questões entre os quais são eles:salário-família,piso salarial à extensão da complexidade do trabalho,turnos ininterruptos de revezamento e a jornada de 6 horas neste caso, salvo negociação coletiva;adicional de insalubridade ou periculosidade, nos termos da lei; proteção em face da automação, na forma da lei; ação, ainda quanto aos créditos resultantes das relações de trabalho, com prazo prescricional de cinco anos para os trabalhadores urbanos e rurais, até o limite de dois anos após a extinção do contrato de trabalho; proteção do mercado de trabalho e da mulher, proibição de distinção entre trabalho manual, técnico e intelectual ou entre os profissionais respectivos; igualdade de direitos entre o trabalhador com vínculo empregatício permanente e o trabalhador avulso.
Também neste rol ainda pendente de regulamentação encontra-se o instituto do FGTS (regulamentado após através da LC.n. 150/2015)
No entanto a Emenda Constitucional 72, veio definitivamente consolidar os direitos do trabalhador doméstico, mesmo que alguns ainda carentes de regulamentação.
Nesse diapasão, os novos direitos advindos com a Emenda, no entender de Godinho[34], trouxeram um impacto multidimensional em outras parcelas jurídicas específicas, senão vejamos
“Se não bastasse diversos desses direitos aprovados ostentam caráter multidimensional-ilustrativamente, jornada de trabalho, e reconhecimentos de acordos e convenções coletivos de trabalho em razão dessa sua qualidade, tais direitos se desdobram em inúmeras outras parcelas jurídicas específicas”.
A completude dos direitos do empregado doméstico, foi consolidada somente coma Lei Complementar 150 e 2015; sob o ponto de vista normativo, a legislação referente a esta categoria atinge a sua maturidade,pois a integração dos direitos estabelecidos e previstos pela CRF/88 se completa.
2. HISTÓRICO DA EVOLUÇÃO SINDICAL NO BRASIL
O sindicalismo no Brasil tem seu nascimento em momento após o movimento europeia, a economia ainda pouco desenvolvida e a mão de obra pouco especializada, corroboram esta fase.
Surge no Brasil, a partir da ideia das corporações de ofício[35] (não nos moldes medievais e observada a escala, em virtude do domínio agrícola), passando pelas influências liberais (com supressão das poucas corporações de ofício existentes e, culminando com a criação de associações isoladas de coalizão de trabalhadores.
Nas palavras de Russomano[36]:
“É certo porém que inexistia clima social capaz de autorizar, entre nós, um associativismo, mesmo incipiente ,do mesmo modo que não há dúvida de que as corporações que teriam surgido nas principais cidades do país (São Paulo,Rio de Janeiro,Olinda,ETC.) nada tinham a ver com as corporações medievais”.
Conforme alude Segadas Vianna[37] o surgimento de algumas uniões de trabalhadores: a Liga Operária (1870) e a União Operária (1880) que, como afirma, ‘’não visavam propriamente _a defesa de seus interesses, tanto que abriam o acesso a seus quadros sociais a elementos estranhos”.
No final do século XIX, surgiram condições para o efetivo início do sindicalismo brasileiro.
O sindicalismo que surge no Brasil é um sindicalismo de ofício, que conforme já mencionado, sua concentração ocorre em São Paulo, cuja mão- de – obra era basicamente composta de estrangeiros.
No entendimento de Alice Monteiro de Barros[38]:
”Com a abolição da escravatura e a necessidade de trazer estrangeiros para substituir o trabalho escravo, teve o Estado que criar” regalias “para os imigrantes ,que temiam os maus tratos dos patrões habituados a conviver como escravos,.pois com a Lei do Ventre Livre em 1971 e a Lei Áurea,1888,corre a abolição da mão-de-obra escrava.”
Com a promulgação da primeira Constituição Republicana brasileira, em 1891, em seu artigo 72, §8º, foi garantido o direito de associação, desde que pacificamente.
Tem-se, o que se considera um novo período para o sindicalismo brasileiro, que perdurou quase 40 anos.
A expressão sindicato, segundo Vianna[39] passou a ser utilizada de forma generalizada a partir de 1903, em virtude do disciplinamento legal dos sindicatos rurais e urbanos.
Desta forma, com a adoção do liberalismo como doutrina, o Estado neste primeiro período da História da República, deixa de regular as relações de trabalho, dentro da concepção de ser o contrato, apto a regulara a relação entre trabalhador e empregador[40]
Este período, de certa forma, tem um período fértil para o sindicalismo. Criam-se associações de classe, embora sem caráter sindical, aparecem as primeiras leis sindicais: o Decreto n.979, de 6 de janeiro de 1903 e o Decreto n.1.603 de 5 de janeiro de 1907.
O Decreto 979 trata do setor rural, que segundo Octavio Magano[41] sentido cooperativista, tendo sido editado para atribuir ao sindicato a função de intermediário no crédito a favor dos sócios”. Podia o agrupamento previsto, segundo o autor, ser misto.
Assim, referido Decreto garantiu o direito de acesso e saída dos indivíduos dos sindicatos (liberdade individual e sindical), bem como seu caráter assistencial, com a criação de caixas para sócios e cooperativas de crédito e venda dos produtos dos associados.
Assim assinala Aryon Sayão[42]:
“Por sua vez, o Decreto 1.637, garantiu a pluralidade sindical, além de observar que as ideias que deram ensejo à sua criação, são oriundas da Lei francesa de 1884, que mencionava a livre constituição, bastando ser efetuado o depósito dos estatutos, ata de instalação e lista da diretoria no registro de hipotecas do distrito. Foi somente a partir de 1930, que de fato se verifica, a expansão do sindicalismo no Brasil, porém não mais nos moldes do liberalismo e sim com caráter intervencionista”
Em razão de vários fatores[43] entre os quais o Governo Getúlio Vargas, começa uma fase de sindicalismo intervencionista, nas palavras de Batalha[44]
“A partir da Era Vargas os sindicatos formados como pessoas jurídicas de direito privado, livremente criados e administrados pelos interessados, passam a ser órgãos de colaboração do governo, com estatutos padronizados, sem autonomia e dependentes de reconhecimento do Estado.Em 16 de julho 1934, foi promulgada a Nova Constituição, que em seu artigo 120, § único, previa a pluralidade e autonomia sindicais, rompendo com o modelo anterior”
No entanto o DECRETO 24.694[45], manteve os mesmos princípios do estatuto de 1931.
Para Mascaro[46], referido decreto teve cunho detalhista, interferindo de forma acentuada nas organizações sindicais.Ainda assim para o autor[47] houve o rompimento com a regra da unicidade sindical, permitindo-se a fundação de sindicato desde que 1/3 de empregados com a mesma profissão e na mesma localidade dele participassem.
Neste contexto a pluralidade sindical, de fato não foi possível, pois o decreto teve cunho também intervencionista.
Em 1937, é implantado por Vargas, um regime de força chamado “Estado Novo”, onde é implantada nova ordem constitucional, no país.
Desta forma, mais uma vez o cenário sindical teria a unicidade sindical como base e todo o aparato corporativista, que desde então permanece até o atual texto constitucional.
Surge então, em 1943, a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), aprovada pelo Decreto-Lei 5.452, de 1º de maio de 1943[48], que, salvo alguns ajustes-como alterações das disposições que regem a contratação coletiva de trabalho, permanece nos mesmos moldes até hoje.[49] Enquanto isso, no cenário político com o ‘Estado Novo” e juntamente a Era Vargas, em 18 de setembro de 1946, foi promulgada novamente a Constituição, declarando a liberdade sindical, contudo, condicionando-a, como se lei fosse, pelo costume.
Segundo bem interpreta Evaristo[50]
“Trazida pela Nova Constituição as seguintes modificações, além de assegurar os direitos básicos de liberdade, propriedade e segurança individual, a Carta de 1946 garantiu o direito de livre expressão sem medo de censura (a greve deixe ser ilícito e reconhecida pelo artigo 158), a inviolabilidade do sigilo de correspondências e da liberdade de livre associação (para fins lícitos) e a proteção dos direitos do cidadão independente de suas convicções religiosas, filosóficas ou políticas.”
Com a ditadura militar, em 1964, há um abafamento de qualquer manifestação sindical, estando o Estado no controle do movimento sindical, com caráter repressivo que lhe foi próprio.Neste mesmo período é promulgada a Constituição de 1967, que foi alterada pela Emenda Constitucional 1 , de 1969[51].
Neste período, houveram algumas mudanças que merecem ser destacadas como a edição da Lei de Greve, n.4.330/1964[52] e neste mesmo contexto, houve uma intensificação do controle estatal sobre as entidades sindicais.
Bem resume este período de transição Armando Boito Jr.[53], no que se refere a redução da atividade sindical, pela falta de liberdade:”a principal-e praticamente única- atividade dos ilhares sindicatos oficiais no período de 1968-1978 consistiu em implantar ou expandir grandes e dispendiosos serviços assistenciais” Na década de 70 e 80,o movimento sindical,se manifesta de forma contundente, com grandes movimentos grevistas;criação da Central Única dos Trabalhadores (CUT) em 1983 e Central Geral dos Trabalhadores (CGT) em 1986.
A CUT, tinha foco, a reforma do movimento sindical, indicando o caminho da liberdade e autonomia sindicais, enquanto A CGT propunha a intervenção do Estado, contudo com a manutenção da unicidade sindical.
Começa em São Paulo, uma onde de greves, aberta em 1978 pelos metalúrgicos da região do ABC Paulista[54].
“Em maio de 1978, para a surpresa geral, até mesmo das direções sindicais, os trabalhadores da Scania, uma montadora de veículos localizada em São Bernardo do Campo, cruzam os braços depois o mesmo se deu com a Ford, na Volkswagen e nas grandes indústrias metalúrgicas do ABC paulista. Anotável onda de greves espalhou-se fácil e rápida para outros municípios e empolgou outras categorias”, gerando ciclo sem precedentes, no Brasil”.
Verifica-se, nesse particular, a ideia do pluralismo sindical, onde observam-se, como traços que marcam o movimento sindical brasileiro, entre outros, o pluralismo, devido a criação das associações que não estavam submetidas a restrições quanto ao seu número em uma base territorial,já que nem mesmo esta era disciplinada pelo Estado.
Até a promulgação da Constituição Federal de 1988, a organização sindical brasileira era regulamentada pela CLT, em seus artigos 511 a 610 que, até então, permitia forte intervenção do Estado nas relações coletivas de trabalho.
Finalizando arcabouço histórico do sindicalismo no Brasil, tem-se a promulgação da Constituição da República de 1988, onde desde então as tentativas de alteração do modelo de organização brasileiro, não tiveram êxito, como a Mensagem 1.330 de 3 de novembro de 1998 em que parte da mensagem visava submeter o congresso a proposta de emenda constitucional que alteraria o art. 8º,111 e 114 da Constituição Federal.
No entanto, com o princípio da liberdade sindical, já consagrado no artigo 8º da CLT, parte dos dispositivos consolidados estariam incompatíveis, muitos sendo revogados ou derrogados.
Certo é, que parte da doutrina entende que o princípio da liberdade sindical não seria pleno, pois teriam como obstáculo, alguns incisos da nova Constituição.
Passaria então a haver uma certa liberdade relativa, pois no plano externo haviam entraves na legislação brasileira, como a unicidade sindical (artigo 8º,inciso II,,CF),a contribuição sindical obrigatória (artigo 8º,inciso IV,parte final, da CF),sistema confederativo e conceito de enquadramento sindical por categoria (artigo 8º,inciso VI,da CF) e poder normativo da Justiça do Trabalho (artigo 114,§§ 2º e 3º.da CF).[55]
O objetivo era implantar um sistema sindical, baseado na liberdade sindical, coadunando coma concepção da Convenção 87 da Organização Internacional do Trabalho.
No entanto a proposta não foi aprovada devido ao seu caráter parcial, pois não chegaria ao objetivo almejado.
O hibridismo sindical brasileiro[56][57]é ratificado pela explicação dada pelo Ministério do Trabalho em resposta ao questionamento de ser o modelo de liberdade ou unicidade:
“O novo modelo conjuga princípios que derivam da unicidade como exclusividade de representação, com princípios da liberdade sindical com a possibilidade de existência de mais de uma entidade sindical em um mesmo âmbito de representação.Pela nova lei,os trabalhadores e os empregados têm o direito de constituir suas entidades sindicais,sem autorização previa,cabendo ao MTE o reconhecimento de representatividade da entidade sindical”
Ressalte-se que o que deveria ser implantado no Brasil, seria o modelo que enaltecesse a liberdade sindical, eis que com suas criações naturalmente seriam mais representativos.
O que de fato ocorre é que o modelo de sindicalismo hoje existente está lentamente e parcialmente indo para o caminho da ruptura com este modelo ultrapassado,não se falando de ruptura total, eis que muito sedimentado há quase 70 anos.
2.1. A Flexibilização e a Desregulamentação nas relações de trabalho: Neoliberalismo e Estado intervencionista
A sistemática de globalização da economia, vêm propagando e deixando patente, as profundas mudanças no âmbito das relações trabalhistas.
Inúmeros fenômenos passam a ser despontados a partir da Constituição de 1988, tanto no Direto do Trabalho, quanto nas relações trabalhistas.
Estabelece-se a criação de vários pólos de produção normativa, de certa forma independentes do poder estatal, onde as relações jurídicas ultrapassam as fronteiras legislativas consolidadas e fronteiras nacionais e tendem a se pautar por normas outras que não as de um ordenamento jurídico específico.
Buscou-se, nestes casos, a busca por meios capazes de fortalecer a atividade de criação do Direito na esfera infra-estatal (corporações, particulares, onde se inserem as convenções e os acordos coletivos de trabalho) e no contexto transnacional (organismos internacionais e blocos econômicos).
Assim, para que o Direito do Trabalho se adapte a este novo cenário das relações do trabalho, fala-se constantemente em Flexibilização, que em sentido amplo, significaria promover a adequação das legislações à nova realidade.
Esta questão tem alavancado grandes debates no âmbito do Direito do Trabalho. Alguns doutrinadores admitindo e outros por não vislumbrarem essa tendência impreterível.
E mesmo aos que não admitem a sua tendência, ainda existe um desacordo sobre como esta ocorreria de fato, já que não se sabe quais seriam os efeitos provocados nas relações individuais de trabalho.
Define-se, deste modo a flexibilização como o processo natural de adaptação do Direito do Trabalho à globalização econômica, visando sua permanência como zona de regulamentação das relações laborais, bem como, de maneira indireta, de sua manutenção , como fonte fértil ao exercício da cidadania, ou como fase para, aceitar de forma direta, a necessidade de intervenção estatal, de modo a dissipar a desproporção entre empregado e empregador na contratação, para que se concretize o paradigma do contrato civil fundado na livre negociação das partes envolvidas.
Neste compasso, se faz necessária, a distinção entre flexibilização e desregulamentação: desregulamentar significa revogar, ignorar, abandonar, deixar de lado a legislação vigente, por outro lado, flexibilização possui outro sentido, que, no ensinamento de Amauri Mascaro Nascimento[58] assim traduz “o afastamento da rigidez de algumas leis para permitir, diante de situações que o exijam, maior dispositividade das partes para alterar ou reduzir os seus comandos”.
A Desregulamentação por sua vez, tem por finalidade, retirar certas regras para que exista um tipo de flexibilização capaz de diminuir a rigidez das leis trabalhistas, por meio de um contrato individual. Crepaldi[59] explica que:
“Desregulamentar significa retirar as normas heterônomas das relações de trabalho, de tal forma que a vontade dos sujeitos é que estabelecerá as normas que devem comandar as suas relações, ou seja, é a extinção gradual de regras imperativas, com a consequente ampliação da liberdade de convenção”.
Significa retirar as regras, com intuito de dar espaço à flexibilização, que por sua vez, busca a diminuição da rigidez das leis de trabalho, com sua desregulamentação, na flexibilidade na contratação e rescisão dos contratos de trabalho de empregados, e, na própria extinção do princípio protetor do empregado.
Por fim, no entendimento de Leandro Dorneles, assim distingue[60]:
“a desregulamentação é de fato “um tipo de flexibilização promovida pela legislação”, destarte, é possível dizer que a desregulamentação incentiva a competitividade entre as empresas ao possibilitar a flexibilidade dos paradigmas referentes ao recrutamento de mão de obra, em face da rigidez das normas trabalhistas.”
Por seu turno, de modo a distinguir o instituto da flexibilização, da desregulamentação, para, Sérgio Pinto Martins[61], significa:
“A flexibilização das condições de trabalho é um conjunto de regras que tem por objetivo instituir mecanismos tendentes a compatibilizar as mudanças de ordem econômica, tecnológica ou social existentes na relação entre o capital e o trabalho”.
Assim esclarece José Cairo Júnior[62]:,quanto a autonomia de vontade:
“Consiste na terceira mudança radical no regime de trabalho, após a revolução industrial, e decorre da realidade política atual do neoliberalismo, que pretende conferir efeitos plenos à autonomia da vontade privada de patrões e empregados, por meio de atos praticados por si próprios ou representados pela entidade sindical.”
O fim precípuo da flexibilização, visa a proteção, do direito do trabalho que é flexível, como é o caso do art. 7º, da Constituição Federal, que dispõe sobre os direitos dos trabalhadores urbanos e rurais; e a adaptação das normas legais às novas circunstâncias empresariais, fazendo uso das negociações coletivas, em benefício ao trabalhado, como uma forma de proteção a estes, pela flexibilidade existente no direito do trabalho.
Existem linhas de pensamentos diversos, alguns desfavoráveis, outros favoráveis, e até mesmo um pensamento híbrido (os semiflexibilistas) com relação à finalidade e natureza da flexibilização, bem como o grau de intervencionismo Estatal, senão vejamos:
Conforme estes doutrinadores, o escopo principal da flexibilização é notório: moldar as regras à realidade da relação trabalhista e, especialmente, tutelar a parte hipossuficiente. Os antiflexibilistas, contudo, não creem na igualdade pretendida pelo instituto em questão. Acreditam que o manejo das normas, ao contrário, deixa o empregado ainda mais sob o domínio do empregador e não põe fim ao desemprego, conforme afirma Luiz Carlos Robortella[63]:
“A flexibilização realmente não produziu os resultados esperados, no campo da melhoria das condições de vida do trabalhador. O desemprego continua grande nos países europeus e os padrões salariais não apresentam elevações; ao contrário, mostram-se inferiores aos de outras épocas.”
Esta corrente, pode ser sintetizada pelo discurso do prof. Arion Sayão Romita[64]:,também desfavorável a aplicação do instituto da flexibilização.
“Não é função do Direito do Trabalho proteger o empregado. Função do Direito do Trabalho é regular as relações entre empregador e empregado, tout court. Afirmar a priori a função protecionista do direito do trabalho em benefício do empregado é desconhecer a bilateralidade da relação de emprego (…)
Para exercer sua função social, ao reconhecer a inicial posição de desvantagem em que se encontra o trabalhador enquanto celebra o contrato subordinativo, o direito do trabalho equilibra as posições econômicas dos respectivos sujeitos por meio de concessão de garantias ao mais fraco, com intuito não de”protegê-lo,”mas de realizar o ideal de justiça. Repugna ao ideal de justiça a proteção de um dos sujeitos de certa relação social. O ideal de justiça se realiza quando o direito compensa as desigualdades iniciais pela outorga de garantias aptas a igualar as posições (ou, pelo menos, atenuar a desigualdade inicial).
O direito do trabalho, como ramo do direito que é, não pode ‘proteger’ o empregado. Deve- isto sim – regular a relação de trabalho para realizar o ideal de justiça mediante a previsão de garantias que compensem a inicial desigualdade social e econômica entre os sujeitos da relação.(…) Segundo uma quarta maneira de encarar a proteção – modo realista, de índole democrática -, a proteção dos trabalhadores representa uma conquista do Estado social e democrático de direito. A proteção visa à eliminação da desigualdade social e econômica entre o empregado e o empregador e a substituição da noção de igualdade meramente jurídica (formal) por uma igualdade material. Longe de desconfiar dos atores sociais, o Estado democrático neles deposita confiança e vê no entendimento direto das classes a melhor maneira de compor os recíprocos interesses”.(Grifo Nosso)
Assim, a corrente antiflexibilista não acredita na possibilidade de conformidade da flexibilização com o princípio da proteção do empregado, trazendo a este muito mais ônus do que bônus para os seguidores desta linha de raciocínio, a flexibilização surge como um retrocesso ao trabalhador, sendo incapaz de atingir o fim a que se propõe.
Por outro lado, existe uma parcela que defende a flexibilização das normas trabalhistas, cuja motivação para haver a flexibilização está baseada na realidade do direito do trabalho contemporâneo, o qual precisa adaptar-se à realidade da sociedade, e das situações fáticas, de acordo com o cenário mundial, de forma a assegurar melhores condições de trabalho.
As adaptações realizadas frente às crises, explica Sérgio Pinto Martins[65] “tanto podem assegurar melhores condições de trabalho como também situações in pejus. Num momento em que a economia está normal, aplica-se a lei. Na fase em que ela apresenta as crises, haveria a flexibilização das regras trabalhistas, inclusive para pior
Assim conceitua Mariana Gusso[66]:
“(…) a evolução do direito do trabalho implica necessariamente na flexibilização das normas trabalhistas, concedendo uma maior liberdade às negociações entre as partes, o que diminuiria encargos das empresas e, por consequência, possibilitaria uma maior contratação.”
O que prevalece para esta teoria segundo Sergio Pinto Martins[67], é a autonomia privada coletiva, onde as regras seriam calcadas pela necessidade e coletividade, cuja espécie de valorização privada, visa atender empregados e empregadores e empregados, diante das dificuldades econômicas, sociais e políticas
Ressalta-se que esta teoria é defendida por poucos, que acreditam que o modelo atual sobrecarrega de forma excessiva as empresas e aumenta, por consequência, o desemprego.
O que os defensores desta teoria ressaltam é que uma negociação mais pontual entre as partes sobre os termos do contrato de trabalho, aumentaria a empregabilidade e também evitaria demissões,
Para este rol de defensores da flexibilização, acreditam que a evolução do direito do trabalho,tem que seguir o caminho da flexibilização,com maior liberdade às negociações, e diminuição dos encargos,com o incremento,por consequência, das contratações.
Existe ainda uma corrente mista resumidamente pelo conceito de Sussekind[68] em que a redução do grau de intervenção só é admitido de forma muito restrita, nas relações de trabalho afirmando que:
“1) sistema consolidado constituem de regras indisponíveis, capazes de estabelecer um mínimo de proteção a todos os trabalhadores,aos quais não ,se vislumbra a dignidade do ser humano;2) Os sistemas abram espaço para a complementação da base de proteção mínima e irrenunciável ou para flexibilizar a aplicação das normas gerais de nível superior, mediante a negociação coletiva, isto é, com a participação dos correspondentes sindicatos, aos quais cumpre assegurar a liberdade sindical, tal como prevista na Convenção da OIT n.º 87.3) A flexibilização deve ter por objetivo: a) o atendimento a peculiaridades regionais, empresariais ou profissionais; b) a implementação de nova tecnologia ou de novos métodos de trabalho; c) a preservação da saúde econômica da empresa e dos respectivos empregos.”
Ainda segundo o prof. Sussekind[69], esses motivos seriam ensejadores de uma redução à flexibilização dos preceitos reguladores das relações de trabalho, sempre sob a tutela sindical, e respeitariam a tradição do direito brasileiro, cujas raízes são ‘’romano-germânicas” de direito escrito, tendo como base as leis, agraciando ao mesmo tempo a defesa da empresa e os legítimos interesses dos trabalhadores.
Por derradeiro, Sérgio Pinto Martins[70] conclui o posicionamento da corrente mista ao asseverar que “sob a ótica da teoria semiflexibilista, seria possível afirmar a existência de uma norma legal mínima, estabelecendo regras básicas, e o restante seria determinado pelas convenções ou acordos coletivos”
Resumidamente, para os adeptos a esta teoria, seria possível garantir aos trabalhadores o não retrocesso a direitos que lhe são tão caros, aos mesmo tempo que apresentar aos empregadores alternativas para a sobrevivência de seus estabelecimentos em situações adversas.
Neste contexto, com globalização da economia e com a ideologia neoliberal, o que ocorre, são que as normas de proteção do trabalhador vêm sendo consideradas economicamente pesadas e inflexíveis, aliado a isso, o alto custo da produção, dificulta a competitividade entre empresas e sua manutenção, devido a alta carga tributária e fiscal.
Neste diapasão, como forma de dirimir o impasse. e finalmente esclarecer, a polêmica é encontrada na Carta Constitucional, onde pode-se definir qual a flexibilização possível nas relações de trabalho no Brasil, prestando-se seus princípios e normas como base norteadora, para apontar qual caminho escolhido pelo legislador constituinte originário em tal matéria.
Segundo Leonardo Barros Souza[71]:
“O estudo do texto constitucional permite ainda dizer se esse caminho tem como um dos seus objetivos a flexibilização como desregulamentação das relações de trabalho, com gradativa diminuição da intervenção estatal até a passagem final para um modelo de contrato civil, ou como acomodação do Direito do Trabalho aos efeitos da globalização econômica, com preservação de um núcleo mínimo de direitos trabalhistas, processo esse, em última análise, entendido como consequência necessária, gradativa e permanente acomodação da Constituição às transformações históricas que inevitavelmente ocorrem com o curso da linha do tempo e, por conseguinte, à realidade social.”
São princípios fundamentais da Constituição os arrolados no art. 1.º, o princípio da dignidade da pessoa humana (inciso III) e os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa (inciso IV), onde no artigo 170, caput, dispõe que “a ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social”.
Assim, o principio da dignidade da pessoa humana, serve como um norte às relações sociais em geral e também servirá às relações de trabalho. A discussão a respeito da sua extensão ainda permanece e de forma acirrada, não havendo nenhum consenso, no entanto não afasta a possibilidade de sua aplicação efetiva, uma vez que é facilmente perceptível a sua violação.
Assevera-se, o fato de a Constituição Federal, prever normas de eficácia plena e eficácia imediata, e uma série de direitos sociais cuja ausência pode violar o princípio referido. Nesse caso, o processo de flexibilização encontra um limite intransponível.
Conclui-se dessa forma, que a flexibilização, fruto da evolução das relações sociais laborais, bem como do Direito, atinge não somente atinentes à questões de ordem pública, como muitos contratos de trabalho, por exemplo, que foram manejados para garantir a manutenção do emprego, razão mais que suficiente para que não se descarte de plano, a proposta de flexibilização nem se tenha preconceitos em relação a ela.
O Direito do Trabalho, como se sabe, engloba um conjunto de leis, institutos e princípios que tem como dever a proteção aos trabalhadores, sendo possível que se permita progresso e garantia de direitos ao mesmo tempo, restando ao Estado um papel apenas fiscalizador de direitos e não regulador.
Destarte, é nesse sentido que os Tribunais vêm se pautando, pois, o instituto da flexibilização é inegável e deve ser utilizado apenas em favor do trabalhador. Referente às adaptações in pejus, como as que ferem a indisponibilidade dos direitos, resta claro que não há espaço para serem realizadas, pois ferem a essência do Direito do Trabalho brasileiro.
Diante do exposto, resta evidente a importância da flexibilização contemporaneamente, quer seja para manutenção de empregos; ou para evitar o desmantelamento da empresa, surgindo como uma escapula para ambas as partes da relação laboral em tempos de crise.
2.2 Análise da Flexibilização no contexto brasileiro
Na década de 90, houve um incremento da estrutura produtiva do capital, com a reestruturação produtiva do capital a partir dos anos 90 no Brasil, e com isso aumentando a necessidade de subcontratações e terceirizações, de modo a complementar o excedente de trabalho daquela fase, que foi alcançada pelo Estado através de privatizações de setores pontuais da economia, com políticas neoliberais já iniciadas no governo Collor e continuada pelo governo Fernando Henrique Cardoso (1998).[72]
Com as privatizações de determinadas empresas, o governo teve como meta, fomentar o Estado, trazendo para este, uma nova administração em que a preocupação era a ampliação do mercado, tendo como o marketing da sua estratégia fundamental.[73]
Via de consequência, tais prerrogativas, propiciaram uma estrutura mais flexível e a derrocada clássica do emprego tradicional. Foi através deste governo, que a flexibilização da jornada de trabalho,bando de horas e a contratação por tempo determinado deu origem à Lei 9.601/98[74]
Referida Lei, trouxe a possibilidade de flexibilização da norma trabalhista, onde não se prepondera mais a simples adequação do caráter genérico das leis laborais, o que, por consequência gera a perda de alguns direitos trabalhistas que eram regulados através de negociação coletiva.
Neste sentido, fere o princípio da continuidade da relação de emprego, além de estar incompatível a Constituição, no que tange ao princípio do art. 7º, da norma mais benéfica
“A Constituição Federal, ao inserir tal principio, não autoriza ao legislador ordinário a elaboração de norma trabalhista que conspire contra os objetivos de elevação das condições de pactuação da força de trabalho. O caráter informativo e normativo do princípio da norma mais favorável atua na fase pré-jurídica de construção da norma legal, e não só na fase jurídica quando já construída a norma de Direito”[75].
No século XX, praticamente não teve nenhuma alteração nos direitos trabalhistas; somente no início do novo século é que passa a se falar em flexibilização de direitos,com o objetivo de regular as relações sociais a partir da contratualização liberal e individualista nos moldes do direito civil.
Assim, se forma uma barreira pela estrutura sociopolítica do país, onde a viabilidade da flexibilização das normas trabalhistas,não se configura,pois a realidade do Brasil, não se amolda à realidade europeia,onde a flexibilização se insere.
No país, a discrepância social, e educacional, repercute na má distribuição de renda, que não possui qualificação. A Europa se mostra nitidamente inadequada à sociedade brasileira. Além disso, a possibilidade de flexibilizar direitos traz a capacidade de desestruturar todo o ordenamento jurídico trabalhista, onde persiste situações graves como o problema do trabalho escravo e infantil, enraizado em nossa cultura.
A injunção de uma política econômica, baseada nos moldes dos mercados “livres”, tem arguido incompetência para reestruturar as relações de trabalho, a partir de alguns fatores externos e determinantes, em breve síntese abaixo:
Pela primeira vez na história da modernidade, a nova tecnologia é capaz de economizar mais trabalho em termos absolutos, do que é necessário para a expansão dos mercados de novos produtos.
A nova revolução industrial tem a capacidade de racionalização maior do que a capacidade de expansão. Sua eficácia expansionista, criadora de emprego deixou de existir. O desemprego tecnológico da antiga história da industrialização teve seu retorno, só que agora não se limita a um ramo de produção, mas se espalha em todas as indústrias, por todo o planeta.[76]
Muito bem elucida Nildo Domingues[77] este período:
“É a forma nova do império capitalista, nesta é a moderna perspectiva atual, que foi ampliada pelos meios de comunicação e o comércio de produção industrializada. A diluição e despersonalização da relação patrão e empregado; o trabalho produtivo vai-se tornando cada vez mais intenso em conhecimento; há necessidade de desenvolver um esforço permanente de incorporar os setores atrasados de mão-de-obra; impõe-se a necessidade de reavaliar as regras que regulam as relações de trabalho, de modo a não perder a competitividade frente aos concorrentes internacionais”.
O instituto da flexibilização, não é estranho ao cenário jurídico nacional.Neste sentido, inclusive, consagra medidas especiais, das quais, onde foram alargadas na Constituição de 1988, como por exemplo: a sub empreitada; locação de mão-de-obra; contrato por prazo determinado; redução no tempo de trabalho, entre outros.
Assim, tais procedimentos são aceitos de forma não consensual, como já vimos no item anterior[78], não havendo recusa pela classe trabalhadora, à exceção das tentativas de redução salarial, exigida pela lei. O Direito trabalhista brasileiro se pronuncia nas sentenças normativas da justiça do trabalho, que foram incorporadas ao texto da Lei Maior.
A sistemática das jurisprudências, são oriundas das ações coletivas, em que parte dessas normas são refletidas somente o que, de forma autônoma, e em certas ocasiões, empregados e empregadores ajustam através de convenções acordos coletivos de trabalho.
Este processo deveria ser orientado de maneira sistemática, não de forma impositória, como deseja os agentes externos. Pois, o grave problema que vivenciamos, seria paulatinamente equacionado e efetivado. O que temos é pouco, talvez pobre, mas é o que representa a nossa realidade jurídico-laboral no momento[79].
Por fim, conclui-se que o neoliberalismo vem por evidenciar a flexibilização, se aderindo de forma lenta e gradual aos direitos trabalhistas, na medida do possível pois as negociações neoliberais não se mostram isonômicas.
Desta forma, a flexibilização tem de ser analisada com cautela, pois deve ser, examinada caso a caso, para que não se sobreponha (e nem poderia) aos direitos fundamentais e à Constituição.
Na realidade brasileira, a flexibilização, deve ser vista com cautela, onde a realidade social do cenário nacional não pode ser deixada de lado.Além disso, para a solução de conflitos, a premissa maior é a Constituição, que tem o cunho de garantir os direitos trabalhistas e proteger empregado.
A flexibilização, nos moldes em que foi posta, visou apenas o capital e o lucro, deixando de lado a dignidade humana e o trabalho digno.
O Estado é protecionista, logo o instituto da flexibilização possui dificuldade em romper essa barreira, além disso, poucos são os movimentos para dirimir as disparidades existentes na realidade brasileira.
Assim, com a abertura da Constituição, o que em outras palavras pode-se traduzir como a flexibilização da Lei Maior do Estado brasileiro, precisa procurar um meio termo entre a flexibilização dos direitos,sem, contudo desrespeitar os preceitos Constitucionais,buscando um caminho adequado para a solução dos problemas de equilíbrio entre o capital e o trabalho e da realização do bem-estar da sociedade, ideário do Estado Democrático de Direito.
Por fim, o instituto da flexibilização é inegável, contudo, o processo de adequação à realidade brasileira, é lento, de modo a adequar-se ,pois o texto Constitucional,sempre irá se sobrepor a este instituto.
No entanto, o que a jurisprudência e a doutrina trazem, é uma adequação caso a caso, trazendo da própria Constituição , meios de impor força normativa aos seus princípios, mantendo a estrutura democrática declarada pela Constituição Federal,sem contudo atentar-se ao bem maior que é a garantia de emprego e bem estar do trabalhador,através da flexibilização.
3 TRABALHO DOMÉSTICO NO BRASIL: OS AVANÇOS NAS NEGOCIAÇÕES TRAZIDOS PELA LEI COMPLEMENTAR 150/2015
A então Lei Complementar 150/2015, que fora aprovada em junho de 2015 veio com o intuito de regulamentar e garantir direitos já considerados na Emenda Constitucional nº 72/2013, esta; que alterou a redação do parágrafo único do art.7º da Constituição Federal a fim de estabelecer a igualdade de direitos trabalhistas entre trabalhadores domésticos e os demais trabalhadores urbanos e rurais;e modificar alguns conceitos como o próprio conceito de empregado doméstico.
Segundo Sousa[80], houveram mudanças positivas para o trabalhador domestico com o advento da Lei Complementar 150/2015:
“Com o advento da Lei Complementar 150 de 1º de junho de 2015, surgiram, expressamente, os direitos trabalhistas aos empregados domésticos, visando garantir, portanto, uma maior qualidade na prestação dos serviços destes para com seus empregadores.”
Ressalta-se que o rol de direitos presentes na lei, já se encontrava na CLT, para os trabalhadores rurais e urbanos.
Alguns outros direitos foram modificados; e também inseridos n lei, considerando as peculiaridades da relação e doméstica.
Além disso, o conceito de empregado doméstico foi adequado com a referida Lei Complementar, tornando-a mais precisa e do que era.
Desta forma o mesmo autor[81]:
“O empregado doméstico, assim considerado aquele que presta serviços de natureza contínua e de finalidade não lucrativa à pessoa ou à família no âmbito residencial destas, aplica-se o disposto nesta lei. Todavia, o conceito apresentado era bastante genérico e, com o intuito de deixar mais específico quem se enquadraria como empregado doméstico, a Lei Complementar 150/2015 trouxe um conceito mais detalhado.”
Assim é definido o empregado doméstico, de acordo com a Lei Complementar 150/2015:
“Art. 1o Ao empregado doméstico, assim considerado aquele que presta serviços de forma contínua, subordinada, onerosa e pessoal e de finalidade não lucrativa à pessoa ou à família, no âmbito residencial destas, por mais de 2 (dois) dias por ll
Parágrafo único. É vedada a contratação de menor de 18 (dezoito) anos para desempenho de trabalho doméstico, de acordo com a Convenção no 182, de 1999, da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e com o Decreto no 6.481, de 12 de junho de 2008.”
Torna-se perceptível que referida lei define o conceito, bem como define a categoria do que venha a ser um empregado doméstico
Neste sentido, a lei veio para resguardar e também garantir direitos, já garantidos a outras categorias, estendendo assim também aos domésticos.
Nota-se que a todo o momento, a Lei Complementar enfatiza o caráter singular da relação social e jurídica doméstica, sendo necessária especialidade de normas próprias, capazes de atender à realidade da categoria.
Dentro destas garantias e inovações trazidas pela Lei Complementar 150/2015, podemos ressaltar na lei, alguns avanços no que diz respeito a possibilidade de acordo/negociação, entre as partes, tendo como base o caráter único da relação de trabalho doméstica, ideário trazido pelos adeptos ao instituto da flexibilização dos direitos dos trabalhadores.
Teceremos a seguir, pontualmente cada inovação de cunho negocial, trazida pela Lei Complementar 150/2015.
3.1 Artigo 2º -Horas-extras
O art. 2.º da LC 150/2015 dispõe sobre as horas extras e refere-se aos empregados domésticos de forma semelhante ao dos demais trabalhadores, senão vejamos:
a) o módulo de oito horas diárias;
b) há limitação há 44 horas semanais, ainda que sejam trabalhados seis dias;
c) o adicional de 50% para as horas extras, podendo ser melhorado por negociação entre as partes;
d) o divisor 220 para se localizar o salário-hora;
e) o divisor 30 para se localizar o salário-dia;
f) o direito à compensação da jornada.
Neste dispositivo ressalta-se uma das principais inovações quanto a possibilidade de negociação senão vejamos:
“Art. 2o A duração normal do trabalho doméstico não excederá 8 (oito) horas diárias e 44 (quarenta e quatro) semanais, observado o disposto nesta Lei.
§ 1o A remuneração da hora extraordinária será, no mínimo, 50% (cinquenta por cento) superior ao valor da hora normal.
§ 2o O salário-hora normal, em caso de empregado mensalista, será obtido dividindo-se o salário mensal por 220 (duzentas e vinte) horas, salvo se o contrato estipular jornada mensal inferior que resulte em divisor diverso.” (…) grifo nosso
A jornada dos empregados domésticos, na Lei Complementar 150/2015 traz a possibilidade e compensação da jornada, pois trata-se de tratamento único dado somente à categoria dos empregados domésticos.
Na redação do artigo 2º nota-se a omissão quanto à limitação do número de horas que podem ser prorrogadas em um dia, para descanso nos dias ou meses seguintes.
Inicia-se referido dispositivo pelo parágrafo 2º, onde o divisor do salário-hora normal, pode ser inferior a 220 horas, caso seja estipulada jornada de trabalho diversa. Esta situação abre espaço para que seja negociada a jornada de trabalho diretamente entre empregado e empregador, mesmo que seja inferior a jornada mensal, não sendo ilícito, pois, que o divisor seja diverso do previsto na lei complementar.
No entanto assevera Godinho[82]:
“(…) é preciso ficar claro que, mesmo nestes divisores menores,estão englobados os dias de descanso semanal remunerado e descanso em feriados” (art.7º,XIII,CF/88;art.2º,§2º),LC N. 150/2015)
Mais adiante, no § 4.ºrefere apenas o direito à compensação; assevera-se que o artigo 7º, da Constituição Federal, que estipula a duração de oito horas ao dia e 44 horas semanais (conforme EC 72/13) onde passa o empregado doméstico a ter direito as horas extras, em caso de ser ultrapassar a carga horária constitucional, ou contratual de trabalho.
Também em decorrência desta prática, prevaleceu a possibilidade de pactuação por escrito, entre as partes (empregado e empregador somente) por escrito, o regime de compensação de jornada, caso o excesso de horas de um dia, for compensado em outro dia, podendo ajustar a forma de compensação que melhor se adeque à sua realidade.
Neste sentido, o § 5º delimita os parâmetros da forma de descanso compensatório, mesmo que ajustados entre as partes, de modo a manter certa equidade na relação entre empregado empregador.Esta foi a principal inovação trazida pela nova lei;
Assim, embora exista o regime de compensação de horas, as 40 (quarenta) primeiras horas extras deverão ser pagas com o respectivo adicional. De modo que, somente as horas que ultrapassarem as 40 (quarenta) primeiras horas poderão ser compensadas no limite de até 1 (um) ano. No entanto, caso as referidas horas não sejam compensadas, estas deverão ser remuneradas como horas extras.
O § 6.º traz o comando, caso as horas extras não possam ser compensadas antes do término do contrato de trabalho.
Sendo assim, não existe um teto máximo de horas a serem compensadas em um mesmo dia.de modo que o ajuste entre as partes, deve sobretudo levar em conta o bom senso, não sobrecarregando o trabalhador.
Regra geral é que as partes devem compor um acordo capaz de não violar preceitos constitucionais, como a Dignidade da Pessoa Humana, devendo-se recorrer o disposto no art. 19 da LC 150/2015, aplicando de forma subsidiária a CLT: não há violação alguma às peculiaridades do trabalho doméstico nem se esvazia o conteúdo do art. 2.º da LC 150; apenas se limitam as horas prorrogadas a duas por dia, tal como consta do art. 59 da CLT, aplicado para trabalhadores urbanos e rurais.
Tal limitação é reforçada pela necessidade de limitação de duas horas prorrogadas por dia quanto se nota que o art. 2.º, § 4.º e § 5.º, da LC 150/2015, mesclou a compensação semanal de jornada com a compensação anual, chamada de “banco de horas”.
A compensação anual, chamada banco de horas é negociada individualmente (característica somente dos domésticos), diferentemente dos demais trabalhadores, para os quais se oferece a garantia do banco de horas, negociado coletivamente. Motivo mais forte para se garantir que nenhuma jornada exceda dez horas,ainda que para fins de compensação, de modo a garantir a efetividade deste dispositivo.
3.2 Artigo 3º-Trabalho em regime de tempo parcial (horas suplementares)
Em função das horas extras, e de forma a se adequar a realidade do empregado doméstico, a lei traz a possibilidade de realização de horas extras ao empregado que exerça o trabalho em regime de tempo parcial.
Senão vejamos:
“art. 3o Considera-se trabalho em regime de tempo parcial aquele cuja duração não exceda 25 (vinte e cinco) horas semanais.
§ 1o O salário a ser pago ao empregado sob regime de tempo parcial será proporcional a sua jornada, em relação ao empregado que cumpre, nas mesmas funções, tempo integral.
§ 2o A duração normal do trabalho do empregado em regime de tempo parcial poderá ser acrescida de horas suplementares, em número não excedente a 1 (uma) hora diária, mediante acordo escrito entre empregador e empregado, aplicando-se-lhe, ainda, o disposto nos §§ 2o e 3o do art. 2o, com o limite máximo de 6 (seis) horas diárias.(…)” Grifo nosso.
No entanto, este somente poderá laborar em jornada extraordinária até o limite de 1 hora diária, desde que haja acordo escrito entre as partes, onde exista expressa previsão do labor extraordinário.
Muito embora exista a possibilidade da jornada extraordinária diária, o empregador doméstico deve ficar atento ao fato de que o empregado doméstico que labora em regime de tempo parcial deve ter sua jornada diária composta de no máximo 6 horas diárias, caso contrário não será em regime parcial e sim integral, onde, por consequência, incidem as regras incidentes aos contratos por tempo indeterminado.
Assim, o labor extraordinário que exceda 6 horas diárias descaracterizaria o trabalho em regime de tempo parcial, passando a ter que cumprir o disposto em lei a respeito da jornada normal de um trabalhador doméstico.
Nota-se que o simples acordo por escrito entre as partes, supre a lacuna existente, deixando a cargo do empregado doméstico e do empregador, a forma como será formalizado este acordo escrito.
Esta possibilidade de negociação traz ao trabalhador a garantia de que o empregado doméstico irá cumprir a jornada de tempo parcial, pois excedendo a hora extraordinária, o contrato não terá validade, pois descaracterizaria o regime parcial.
Nesta seara, há certa diferença entre o regime do trabalho parcial doméstico, criado pela LC 150, e o regime do trabalho parcial urbano, disposto pelo art. 58-A da CLT.
Na legislação do trabalhador doméstico, admite-se a realização de uma hora extra por dia (art. 3.º, § 2.º, da LC 150/2015), sendo que em se tratando da legislação do trabalhador urbano, há uma vedação de que seja realizada qualquer hora extra, por tratar-se de fraude pela prorrogação [83]
Conforme denota Godinho[84]:
“O salário-dia normal, em caso de empregado mensalista submetido ao regime de tempo parcial.será obtido dividindo-se o salário mensal por 30,já computado neste índice,o pagamento do repouso remunerado e dos feriados trabalhados” (art. 2º,§3º LC n. 150/2015)
Neste caso, qualquer hora extra deve ser paga com o divisor adequado ao regime de contratação e não aplica-se neste caso o divisor 220, que são característicos de regime de tempo integral.
3.3 Artigo 4º-Contratação por prazo indeterminado
A regra é a contratação por prazo indeterminado, pois está em conformidade com princípio da continuidade da relação de emprego, pois trata-se de natureza alimentar do salário, já que é de onde o empregado retira seu sustento e de sua família.
No entanto, o Princípio da Continuidade, vem sendo relativizado, desde a Lei 5.107/66, onde criou-se a possibilidade de opção entre FGTS e estabilidade decenal,então vigente,posteriormente revogada pela Lei 5.859/73.
Seguiram-se diversas medidas, tais como a Lei nº 9.601/98, permitindo os contratos a prazo, independentemente das restrições impostas pelo art. 443 da CLT.[85], desde que tais contratos sejam celebrados, mediante previsão no acordo coletivo da empresa ou na convenção coletiva da categoria, para admissões que signifiquem aumento do número de empregados da empresa.
O entendimento acerca da contratação por prazo determinado não era pacífico, não havendo nenhum dispositivo que permitisse a sua imediata aplicação nem na CLT e nem no parágrafo único da Constituição; assim, era por analogia apenas, aplicado à categoria dos domésticos.
Com isso, em hipóteses especificamente permitidas admite-se a contratação trabalhista à termo.
Nota-se que não há autorização legal de acordo entre as partes fora das hipóteses legalmente previstas. Assim, caso ocorra, é irregular sendo nula qualquer cláusula de prazo determinado, considerando-se para todos os fins, contrato por tempo indeterminado.
Desta forma, a LC 150/2015 buscou eliminar de vez o impasse, trazendo para a lei a expressa possibilidade de contratação a prazo, na seara trabalhista doméstica, via de exceção.
Conclui-se que é permitida a negociação entre as partes (empregado e empregador) da prefixação do prazo do contrato de trabalho, nos seguintes casos:
a) contrato de experiência (art.4º, I, LC 150/2015);
b) atendimento a necessidades familiares do empregador doméstico, desde que de natureza transitória (art. 4º, II, LC 150/2015);
c) substituição temporária de empregado doméstico com o contrato de trabalho interrompido ou suspenso (art. 4º, II, LC 150/2015);
Mesmo trazendo a possibilidade de contratação por prazo determinado, a Lei Complementar 150/205, delimitou o tempo de duração do contrato a termo, conforme expresso no artigo 5º da referida lei[86]:
“Art. 5o O contrato de experiência não poderá exceder 90 (noventa) dias.
§ 1o O contrato de experiência poderá ser prorrogado 1 (uma) vez, desde que a soma dos 2 (dois) períodos não ultrapasse 90 (noventa) dias.
§ 2o O contrato de experiência que, havendo continuidade do serviço, não for prorrogado após o decurso de seu prazo previamente estabelecido ou que ultrapassar o período de 90 (noventa) dias passará a vigorar como contrato de trabalho por prazo indeterminado.”
Logo, a duração do contrato de experiência tem o período máximo de 90(noventa) dias.
Somente nos casos do art. 4º, II, é (para atender necessidades familiares de natureza transitória e para substituição temporária de empregado doméstico com contrato de trabalho interrompido ou suspenso.) o prazo máximo do período de experiência pode chegar a 2(dois) anos, limitado ao término do evento que motivou a contratação (art.4º,§ ú.).
3.4 Artigo 10-Jornada de plantão
A compensação de horas na modalidade de plantão, veio como uma necessidade de adequar a realidade de alguns trabalhos domésticos, realizados com maior rigor ou técnica, por assim dizer.
O artigo 10 da Lei Complementar, melhor se define nas palavras Godinho[87]:
“A compensação de horas na modalidade de plantão, veio como uma necessidade de adequar a realidade de alguns trabalhos domésticos, realizados com maior rigor ou técnica,por assim dizer.n.150/2015,enfrentou um tema importante no universo das famílias brasileiras e dos trabalhadores da área de cuidados especiais e de saúde a indivíduos portadores de necessidades especiais (pessoas com deficiência),além de indivíduos idosos ou enfermos, que necessitam de acompanhamento individual mesmo no âmbito familiar.Trata-se do trabalho dos atendentes pessoais, acompanhantes e/ou cuidadores de pessoas debilitadas,profissionais que exercem suas atribuições no contexto do ambiente residencial do empregador ou de algum membro de sua família.Em tais casos, algumas vezes a própria pessoa debilitada assume a posição de empregador;outras vezes,trata-se de alguém da família.”
Referida necessidade de regular tal situação, teve ensejo através da Súmula 444 do TST[88].em normas esparsas.
Por ser uma jornada desgastante, tal circunstância teve maior atenção do legislador que tratou de definir estas situações que ocorrem no âmbito doméstico.
Pois em casos especiais, há necessidade de que a atividade seja realizada através de plantão, ou até mesmo 24 horas, por dia como no caso de cuidadores de pessoas severamente debilitadas, ou portadoras de necessidades especiais.
Neste sentido, a família, acaso necessite de profissional por período integral, terá que optar por pessoas com conhecimentos técnicos, ou seja, que demandem maior complexidade no serviço, seja ele manual ou com mais rigor.
Neste sentido, o Direito do Trabalho entende que tal labor, se distingue das demais atribuições domésticas, contudo, tal distinção não é fato impeditivo para o enquadramento jurídico da relação doméstica.
Tal atividade, é de tamanha importância que a Convenção Internacional sobre os direitos das pessoas com deficiência número 186[89] e ratificada pelo Brasil, ressalta a relevância do trabalho deste tipo de profissional.
Deste modo, as regras aplicadas aos atendentes, ou cuidadores domésticos (artigo 10 LC 105/2015)[90] somente aplicam-se a estes profissionais devido as peculiaridades já relatadas.
Pelo caráter excepcional, a lei faculta às partes, mediante acordo por escrito, quando forem exercidas em ambiente doméstico, onde irão abarcar os pagamentos devidos pelo descanso semanal remunerado e pelo descanso em feriados.Neste mesmo sentido, serão considerados compensados os feriados e as prorrogações de trabalho noturno, quando houver de que tratam o art. 70 e o § 5º do art. 73 da CLT, assim como o art. 9º da Lei n.605/1949.
3.5 Artigo 11- Jornada de trabalho empregado que presta serviços em viagem
Por se tratar de trabalho prestado à família, muitas vezes o trabalhador é solicitado para prestar o seu serviço durante o período de viagem.
Neste caso, vislumbram-se alguns profissionais, como as babás, cozinheiras, cuidadoras que sempre acompanham a família nos deslocamentos.
Situação que ficou bem esclarecida com o artigo 11 da Lei Complementar 150/2015, em que somente será fixada por prévio acordo bilateral, por escrito, entre as partes, onde será permitida a utilização dos serviços do trabalhador com sua anuência expressa e nos moldes acordados, para isso deverá pagar um adicional, salarial de hora de, no mínimo 25% (art. 11§2º LC 150/2015).
Também uma inovação bastante importante trazida pela Lei complementar foi a distinção entre horas efetivamente trabalhadas e não efetivamente trabalhadas, no período onde determina o preceito especial doméstico (caput art. 11 LC 150/2015)[91] ‘’serão consideradas apenas as horas efetivamente trabalhadas neste período”.
Desta forma, é afastado da norma trabalhista doméstica os períodos meramente à disposição do empregador, prevalecendo as horas trabalhadas efetivamente.
Por fim, poderá ser mediante acordo entre as partes, a remuneração-hora do serviço em viagem, disposto no § 2º do arttigo11, podendo ser convertido em acréscimo no banco de horas, a ser utilizado a critério do empregado.(artigo 11 § 3º LC 150/2015) [92].
3.6 Artigo 13- Intervalo para repouso ou alimentação
O intervalo para refeição e descanso está previsto no artigo 71 da CLT.
“Art. 71 – Em qualquer trabalho contínuo, cuja duração exceda de 6 (seis) horas, é obrigatória a concessão de um intervalo para repouso ou alimentação, o qual será, no mínimo, de 1 (uma) hora e, salvo acordo escrito ou contrato coletivo em contrário, não poderá exceder de 2 (duas) horas.
§ 1º – Não excedendo de 6 (seis) horas o trabalho, será, entretanto, obrigatório um intervalo de 15 (quinze) minutos quando a duração ultrapassar 4 (quatro) horas.
§ 2º – Os intervalos de descanso não serão computados na duração do trabalho.
§ 3º O limite mínimo de uma hora para repouso ou refeição poderá ser reduzido por ato do Ministro do Trabalho, Indústria e Comércio, quando ouvido o Serviço de Alimentação de Previdência Social, se verificar que o estabelecimento atende integralmente às exigências concernentes à organização dos refeitórios, e quando os respectivos empregados não estiverem sob regime de trabalho prorrogado há horas suplementares.
§ 4º – Quando o intervalo para repouso e alimentação, previsto neste artigo, não for concedido pelo empregador, este ficará obrigado a remunerar o período correspondente com um acréscimo de no mínimo 50% (cinquenta por cento) sobre o valor da remuneração da hora normal de trabalho. (Incluído pela Lei nº 8.923, de 27.7.1994)
§ 5º Os intervalos expressos no caput e no § 1o poderão ser fracionados quando compreendidos entre o término da primeira hora trabalhada e o início da última hora trabalhada, desde que previsto em convenção ou acordo coletivo de trabalho, ante a natureza do serviço e em virtude das condições especiais do trabalho a que são submetidos estritamente os motoristas, cobradores, fiscalização de campo e afins nos serviços de operação de veículos rodoviários, empregados no setor de transporte coletivo de passageiros, mantida a mesma remuneração e concedidos intervalos para descanso menores e fracionados ao final de cada viagem, não descontados da jornada. (Incluído pela Lei nº 12.619, de 2012) (Vigência)
§ 5o O intervalo expresso no caput poderá ser reduzido e/ou fracionado, e aquele estabelecido no § 1o poderá ser fracionado, quando compreendidos entre o término da primeira hora trabalhada e o início da última hora trabalhada, desde que previsto em convenção ou acordo coletivo de trabalho, ante a natureza do serviço e em virtude das condições especiais de trabalho a que são submetidos estritamente os motoristas, cobradores, fiscalização de campo e afins nos serviços de operação de veículos rodoviários, empregados no setor de transporte coletivo de passageiros, mantida a remuneração e concedidos intervalos para descanso menores ao final de cada viagem”. (Redação dada pela Lei nº 13.103, de 2015) (Vigência).
Dessa forma é inerente ao período trabalhado, intervalo para refeição e descanso.
O descanso da jornada é muito importante para a saúde do trabalhador, visto que está ligado diretamente à resistência do empregado de suportar sua jornada de trabalho diária.
No entanto, a Lei Complementar não aplica de forma subsidiária o dispositivo da CLT, referente ao intervalo.
Por se tratar de um regime especial de trabalho, em que o trabalhador fica mais tempo em seu ambiente de labor, o artigo 13 traz uma flexibilidade maior que o artigo 71 da CLT, pois prevê a sua redução ou ampliação:
“Art. 13. É obrigatória a concessão de intervalo para repouso ou alimentação pelo período de, no mínimo, 1 (uma) hora e, no máximo, 2 (duas) horas, admitindo-se, mediante prévio acordo escrito entre empregador e empregado, sua redução a 30 (trinta) minutos.
§ 1o Caso o empregado resida no local de trabalho, o período de intervalo poderá ser desmembrado em 2 (dois) períodos, desde que cada um deles tenha, no mínimo, 1 (uma) hora, até o limite de 4 (quatro) horas ao dia.
§ 2o Em caso de modificação do intervalo, na forma do § 1o, é obrigatória a sua anotação no registro diário de horário, vedada sua prenotação.”
Neste sentido, a possibilidade de redução do intervalo na CLT, já é bastante controvertida, pois o TST considera matéria atinente à negociação coletiva, por se tratar de saúde e segurança no trabalho (Súmula 437 TST) [93]
Embora a CLT tenha a previsão de cláusula de norma coletiva prevendo a redução de jornada de trabalho para trinta minutos, e mesmo que o empregador forneça alimentação no local de trabalho, é considerada abusiva pelo TST ao determinar o pagamento como hora extra.
Nota-se que existe a hipótese de autorização prévia da autoridade de fiscalização (art. 71, § 3º, da CLT)
A Lei Complementar 150/2015, neste sentido, se mostra mais flexível e prática.
Podendo ser ajustado por simples acordo escrito entre empregado e empregador para que a pausa seja reduzida para meia hora, não havendo, neste caso, questionamento sobre o fornecimento da alimentação e sem vistoria prévia da fiscalização do trabalho, através de simples prenotação nas folhas de ponto, podendo ser desmembrado em dois períodos, desde que um deles, tenha, no mínimo, uma hora, até o limite de quatro horas ao dia (§ 1º do art. 13).
No entanto, havendo desmembramento do intervalo, sua anotação deve ser realizada no registro de ponto, sendo vedada a simples prenotação.
Caso não se obedeça ao intervalo mínimo intrajornada (de uma hora) incidirá ao pagamento das horas extras, com o adicional (horas extras fictas) na leitura da Súmula 146 do TST[94].
3.7 Artigo 18-Descontos no salário do empregador
O conceito de salário para alguns doutrinadores, como Amauri Mascaro Nascimento[95] define salário como:
“conjunto de percepções econômicas devidas pelo empregador ao empregado não só como contraprestação do trabalho, mas, também, pelos períodos em que estiver à disposição daquele aguardando ordens, pelos descansos remunerados, pelas interrupções do contrato de trabalho ou por força de lei”.
Por seu turno, Mozart Victor Russomano[96] assevera que salário é "o valor pago, diretamente, pelo empresário ao trabalhador como contraprestação do serviço por este realizado”.
No entanto, relações menos complexas como a doméstica, é possível a utilização do salário básico, este composto pela parcela salarial mensal fixa paga ao empregado, pelo empregador, em virtude do contrato de trabalho.
Entretanto os descontos salariais é um ponto bastante complexo, na relação trabalhista.
Ocorre ainda, a possibilidade de existirem outras parcelas a serem pagas pelo empregado, possuindo também natureza salarial, como as horas extras e o adicional de 50%%, adicional noturno, se devido, bem como seus reflexos em repouso semanal remunerado, seja de natureza não salarial (como o FGTS) caso o empregador não tenha sido inscrito antes de 1º de outubro e 2015.
Nesta celeuma, há descontos autorizados e não autorizados; via de regra, prevalece a vedação de descontos salariais, pelo princípio da intangibilidade dos salários. Neste sentido, existem algumas exceções a esta vedação:
a) contribuição previdenciária relativa ao empregado;
b) imposto de renda que supere o piso salarial de retenção;
c) 6% do salário em face do vale transporte ou despesa de transporte para o percurso do trabalho até a residência e vice-versa;
d) desconto pela não concessão do aviso-prévio pelo empregado ao empregador em caso de demissão do trabalhador;
e) dedução ou adiantamento salarial feito pelo empregador.
O artigo 18, § 2º da Lei Complementar 150/2015[97], segue a linha do artigo 2º-A, Lei n.5.859/72, conforme redação da Lei n. 11.324/2006;), no que se trata de possibilidade de desconto com moradia no caso de esta se referia a local distinto do trabalhado pelo doméstico, desde que esta possibilidade tenha sido expressamente acordada pelas partes, inovação na legislação, portanto.
Mas a LC 150/2015 trouxe maior flexibilidade a esta categoria específica: trata-se do art.18caput e §1º da Lei[98], que permite, desde que com prévio acordo por escrito entre as partes, de desconto de até 20% do salário mensal para a que seja o empregado incluído no plano de assistência médico-hospitalar e odontológica de seguro e previdência privada.
A moradia efetivada no próprio local de trabalho (na residência do empregador), não é passível de desconto nos salários mensais do empregado, dada pela ordem jurídica do artigo 2º-A, caput, da Lei n. 5.859/72, conforme redação da Lei n. 11.324/2006; art 18, caput, LC n. 150/2015.
Trazida como inovação, a possibilidade de ajuste entre as partes advinda da Lei Complementar, traz ao empregado doméstico, a possibilidade de optar pelo benefício que melhor lhe convier, não sendo uma imposição apenas para satisfazer e beneficiar o empregador.
Além disso, busca adequar as peculiaridades da sua jornada de trabalho, através da flexibilidade dada ao trabalhador doméstico de acordar, individualmente, com o empregador, conforme a sua realidade.
A Lei Complementar 150/2015, veio como uma demonstração de que a respeito de estar o trabalhador doméstico sob a proteção constitucional, também houve a flexibilização, em termos, de seu contrato de trabalho e isso não foge, dos princípios constitucionais de proteção ao trabalho e nem da dignidade da pessoa humana.
Por certo, a Lei Complementar, veio fechar o ciclo legislativo do trabalhador doméstico, que atingiu a plenitude de seus direitos constitucionais e, sobretudo, sensível frente às suas peculiaridades.
CONCLUSÃO
O trabalho doméstico sempre foi motivo de extensos debates no meio jurídico, consolidados em numerosa doutrina e decisões judicial dissonantes.
Por longo período histórico inexistiu regulamentação e nem reconhecimento de sua força de trabalho, pois o empregado doméstico era desconsiderado do cenário legislativo, não havendo proteção nenhuma de seus direitos.
Seus contratos eram regidos somente pelo alvedrio do empregador, que detinha o monopólio das condições de trabalho do trabalhador.
Embora existisse lei definidora dos pressupostos caracterizadores do empregado, Lei 5.859/72, a valorização dos direitos, por não existir equiparação com a Carta Maior, manteve os domésticos à sombra da Lei e de norma específicas, capazes de atender suas peculiaridades.
Com a evolução do Direito do Trabalho Doméstico, no Brasil passou-se a delinear melhor algumas fases, das quais em passos lentos, teve suas conquistas legislativas; no entanto não havia ainda uma isonomia com relação aos demais trabalhadores;
Pode-se dizer que os direitos que amparam os domésticos, foram adquiridos no decorrer dos anos, de maneira bastante lenta, mas mesmo assim esse tempo foi insuficiente para que pudessem conquistar os demais direitos concedidos aos demais empregados.
O empregado doméstico, dentre todas as espécies de empregados existentes, era o único que não possuía regulamentação em sua jornada de trabalho, exercendo atividade laboral diária por tempo ilimitado, e como consequência disso, não tinha direito a hora extra e adicional noturno.
Situação também importante é o fato de a classe não fazer jus a organização sindical e negociação coletiva, e por conta disso não formam uma categoria econômica. Assim, aqueles interessados buscam os seus direitos de forma individual por não possuírem um sindicato que proporcione lutas em busca de melhores condições de trabalho e de conquistas.
Neste contexto, diante das transformações porque passa a sociedade moderna, as relações de trabalho têm dificuldades em se comportarem dentro do modelo regulatório tradicional proposto pelo Direito do Trabalho, exigindo a Flexibilização.
Diferente da desregulamentação, quando se fala em flexibilizar, fala-se em adaptar, tornar maleável, flexível. Assim, o caminho que se vê possível é a acomodação do Direito do Trabalho aos efeitos da vida econômica contemporânea e da globalização, sem, no entanto, deixar de proteger um núcleo mínimo de direitos do trabalhador, constitucionalmente previstos.
Uma das formas de se tornar possível essa flexibilização é através da negociação coletiva, que poderia garantia uma participação democrática e efetiva das partes diretamente envolvidas nas relações de trabalho na produção normativa que lhes diriam respeito.
No entanto, se faz necessário repensar uma reconstrução de toda a estrutura sindical para que se possa falar em um sindicato realmente forte e representativo dentro do papel a ser desempenhado nesse novo cenário que se coloca.
Pode-se concluir que, desde as primeiras manifestações de relação de trabalho até os dias atuais, restou demonstrado a exploração dos trabalhadores por muitos séculos, na medida em que, por serem a parte mais frágil e por não possuírem os meios de produção, tiveram suprimidos os seus direitos mais básicos.
Nesse contexto, as reivindicações dos trabalhadores deram ensejo ao surgimento das primeiras leis trabalhistas, período marcado pela ausência de liberdade, haja vista a existência de uma grande e necessária intervenção por parte do Estado. No Brasil, entretanto, o aparecimento desses direitos não foi caracterizado por lutas, mas sim por concessão estatal, sobretudo no governo de Getúlio Vargas, com a criação de diversas garantias aos empregados, tuteladas até hoje.
Com efeito, os direitos conquistados caminharam automaticamente à indisponibilidade. A própria Constituição Federal de 1988 não autoriza a renúncia, a não ser que esteja expressamente prevista a possibilidade de acordo ou convenção coletiva sobre o assunto. Isso ratifica a segurança ao princípio de proteção ao trabalhador, que não mais teme a exploração por ser a parte vulnerável da relação laboral.
Dessa forma, a flexibilização, fruto da evolução das relações sociais laborais, bem como do Direito, atinge tão somente as questões que não são erigidas à categoria de normas de ordem pública. Muitos contratos de trabalho, por exemplo, foram manejados para garantir a manutenção do emprego, razão mais que suficiente para que não se descarte de imediato a proposta de elasticidade nem se tenha preconceitos em relação a ela.
O Direito do Trabalho, como se sabe, engloba um conjunto de leis, institutos e princípios que tem como dever a proteção aos trabalhadores. Dessa forma, é possível que se permita o progresso e, ao mesmo tempo, se garanta direitos, deixando ao Estado um papel mais fiscalizador de direitos básicos dos trabalhadores que propriamente regulador.
Destarte, é nesse sentido que os Tribunais pátrios têm decidido. O elemento flexibilização é inegável e deve ser utilizado apenas em favor do trabalhador. No tocante às adaptações in pejus, como as que ferem a indisponibilidade dos direitos, é pacífico que não podem ser realizadas, pois agridem a essência do Direito do Trabalho brasileiro.
Desta forma, resta evidente a importância da figura da flexibilização nos dias atuais, seja para manutenção de empregos, seja para evitar o desmantelamento da empresa, surgindo como verdadeira tábua de salvação para ambas as partes da relação laboral em tempos adversos.
Na seara laboral doméstica, os direitos conquistados pelos trabalhadores representam um grande avanço para sociedade tanto no aspecto jurídico como social, a despeito de especulações de que esses novos direitos e encargos aumentarão a informalidade ou inibirão de novas contratações só o tempo dirá.
De fato, a robustez nos direitos dos trabalhadores domésticos aumentara seu custo e evidenciam uma tendência que já ocorreu em vários países – elitização do serviço doméstico. Com efeito, a doutrina e jurisprudência ainda confrontaram novas discussões e óbices fático-jurídicos. Mas certamente os benefícios trazidos pela EC nº 72/2013 e LC nº 150/2015 são imensamente maiores.
O legislador reconheceu as peculiaridades da profissão trazendo maior segurança jurídica ao trabalhador, o que proporcionará uma maior qualidade de vida e trará mais reconhecimento à categoria, sendo um grande passo na luta pelos direitos dos trabalhadores domésticos, na busca por melhores condições de trabalho para a classe.
Assim, finalmente os empregados domésticos conseguiram a tão sonhada equiparação aos empregados rurais e urbanos, ainda que com algumas diferenças em razão das particularidades de seu contrato de trabalho e, sobretudo na possibilidade de acordo entre as partes, como instrumento de efetividade ao trabalhador, que poderá ter garantidos seus direitos através de um contrato por escrito.
Conclui-se, desta forma, a partir do presente estudo, que as alterações trazidas pela Lei Complementar 150/2015 causam impactos, gerando discussões sobre a matéria, pois muitas famílias terão que fazer ajustes de maneira a adequar-se à legislação, fazendo os acordos e dialogando com seu empregador.
Também é possível que surjam questões e situações não previstas e que necessitem de uma nova norma ou mesmo de um pronunciamento dos nossos tribunais, mas, isso, somente o tempo irá dizer, no entanto é um passo em sua evolução histórica, vindo extinguir os resquícios da escravidão que ainda existia no trabalho doméstico, onde os benefícios ainda teremos que analisar através de suas repercussões na sociedade.
Informações Sobre o Autor
Bruna dos Silva Santos
Graduada em Direito pelo Centro Universitário Franciscano2009.Especialista em Direito do Trabalho e Processual do Trabalho Pela Faculdade Damásio