Origens e características da sociedade anônima

Resumo: O escopo do presente artigo está assentado em promover um exame acerca da origem e principais características da sociedade anônima. A sociedade anônima possui objetivos característicos e funções sociais para com a sociedade. De tal sorte, são asseguradas determinadas normas legais para sua constituição, a fim de gerar segurança jurídica. Por outro lado, incumbe ao sócio acionista determinadas obrigações perante a sociedade e junto a terceiros, no exercício regular da atividade empresária. Isso ocorre porque ao Estado interessa que a atividade empresária ocorra de maneira legal, visto os seguimentos norteadores da função social da empresa podem ocasionar na sociedade como um todo. Apesar da relação de sociedade, a princípio, não ter prazo para terminar suas atividades, cabe ao sócio seu direito de retirada nos casos previstos em legislação, abordando a visão de uma dissolução parcial de sociedade. O método utilizado foi o hipotético-dedutivo e a metodologia empregada foi a revisão bibliográfica, com consulta a fontes bibliográficas específicas.[1]

Palavras-chave: Sociedade Anônima. Evolução. Características. Lei nº 6.404 de 1976.

Sumário: 1. Introdução; 2. Evolução histórica; 3. Principais características; 4. Do nome da função e da importância econômica; 5. Objeto social e natureza jurídica do ato constitutivo; 6. Sociedade anônima de pessoas; 7. Conclusão. Referências.

1 INTRODUÇÃO

O direito societário sofreu pontuais alterações no Direito, de forma ampla em seu conteúdo histórico de sociedade por ações e seus desdobramentos significativos no decorrer do tempo, bem como nos detalhes das corporações de ofícios até a atual conjuntura de empresa, suas principais características formadoras tal qual a formação empresarial per si, a formação do nome, da averbação no registro competente, da função e importância na atual conjuntura de mercado empresarial.

De tal modo, será observado no decorrer do capítulo o objeto social das sociedades anônimas, visto ser assunto demasiadamente importante no que tange sua constituição e autorização; bem como a natureza jurídica de seu ato constitutivo, evidenciando pontos divergentes na doutrina sob essa ótica. Tem-se que o ato constitutivo das sociedades anônimas seria um ato institucional.

O instituto da dissolução existe, a priori, para proteção de retirada de eventuais sócios remissos e dissidentes para a apuração de haveres da parte do capital social por via judicial, bem como execuções que a sociedade venha a sofrer, resguardando assim o patrimônio particular desse sócio. Assim sendo, o diploma legal delimita aqueles que possam promover tal medida, mas nem sempre visando o melhor interesse do sócio. Caso tal sócio use a sociedade a fim de burlar a legislação, o Estado após ser provocado deverá intervir em tal relação, fiscalizando, portanto os atos dos envolvidos.

Por isso, a lei disciplina os casos em que o titular acionista deve ter sua parcela no capital social retido ou simplesmente bloqueado, temporária ou definitivamente. Assim, na construção do presente artigo, o autor optou pelo estabelecimento de cinco seções alicerçadas em revisão teórico-bibliográfica especializada na matéria proposta, bem como exame de jurisprudência pertinente e análise da legislação posta.

O artigo, intitulado “Origens e características das sociedades anônimas”, propõe uma análise pertinente sobre a evolução histórica, doravante estruturado em cinco seções distintas, a saber: (I) Evolução Histórica, (II) Principais Características, (III) Do nome, da função e da importância econômica, (IV) Objeto social e natureza jurídica do ato constitutivo, (V) Sociedade anônima de pessoas.

2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA

Até contrair as feições atuais, as sociedades anônimas passaram por um longo processo de evolução, no qual exercem papel primordial para a contemporânea economia de mercado. Para a melhor doutrina, tem-se o ensinamento que tal evolução pode ser dividida em fases, quais sejam: privilégio, autorização governamental e liberdade plena (TOMAZETTE, 2016). A esse respeito, encontram-se os primeiros antecedentes iniciais das sociedades anônimas na Idade Média, situada na cidade de Gênova, que em 1407, teve a construção da Casa di San Giorgio. (GILISSEN, 1995, p. 774 apud TOMAZETTE, 2016; HALPERIN, 1987, p. 106 apud TOMAZETTE, 2016).

Nesse período histórico era habitual que particulares tomassem empréstimos junto ao Estado para que, em contrapartida, ter o direito de cobrar tributos. Para que tal situação ocorresse, os particulares se organizavam numa associação, de capital representado por títulos transmissíveis. Em meios históricos, trata-se da primeira instituição com os elementos de sociedade anônima, mas não da mesma propriamente dita (TOMAZETTE, 2016). Doutra maneira, boa parte da moderna doutrina acredita nos primórdios advindos nas sociedades coloniais do início do século XVII as primeiras companhias, reconhecendo a das Índias Orientais, de 20 de março de 1602, a primeira companhia. (ASCARELLI, 2001, p. 452 apud TOMAZETTE, 2016). Tais companhias foram constituídas pelo Estado com capitais particulares e públicos, evidenciando descentralização política social e econômica das funções Estatais (REQUIÃO, 1998).

No período histórico ora abordado, a constituição de uma companhia como sujeito autônomo de direitos, era deferida pelo poder público como um privilégio (GILISSEN, 1995, p. 774 apud TOMAZETTE, 2016). Contudo, de acordo com os ensinamentos de Garrigues (1987, p. 108 apud TOMAZETTE, 2016), tal sistema se justificava pelas companhias possuírem determinadas parcelas do poder Estatal, vinculando-se diretamente ao poder superior. Com a revolução Francesa, teve inicio a uma restrição imposta pelo código comercial de 1807, na qual para constituição de uma sociedade se necessitava de uma autorização governamental. Desse modo, a ideologia posta nada mais era do que a autorização seria concedida mediante a regularidade de uma sociedade constituída. (TOMAZETTE, 2016).

Apesar do grande avanço na legislação Francesa à época, tal sistema de autorização era altamente burocrático e dificultava que as sociedades se difundissem para realização de atividade econômica. Diante o quadro, captaram a ideia de que a sociedade anônima se fazia de um “divisor de águas” frente à economia, propiciando o desenvolvimento de atividades tipicamente industriais. Assim sendo, teve a modificação no regime de constituição a fim de facilitar tal tipo societário. (TOMAZETTE, 2016). Assim sendo, iniciou-se, em 1867, o regime de liberdade plena de constituição, surtindo efeitos no Brasil em 1882. Nesse diapasão, para constituição surgiu necessidade de se enquadrar diante regras específicas, mas neste caso, após o cumprimento das formalidades evidenciadas em lei, a sociedade se constituiria, usufruindo de privilégios concedidos as sociedades anônimas (BULGARELLI, 2001).

Por fim, tem-se o ensinamento de que essas fases evolutivas das sociedades anônimas não se excluem per si, pois as fases de privilégio, da autorização governamental e da liberdade plena estão presentes até os dias atuais. Tendo o escopo dos privilégios, tem as sociedades de economia mista, cuja autorização ainda depende de autorização legislativa, ou seja, concessão do Estado. Ainda subsiste em relação a determinadas atividades o pressuposto de autorização governamental, como seguradoras e financeiras, diante do forte interesse do Estado no exercício de tais atividades, com ampla fiscalização (REQUIÃO, 1998).

3 PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS

De maneira pontual, Spencer Vampré (1922, p. 9 apud TOMAZETTE, 2016) conceitua a sociedade anônima como “a sociedade, sem firma social, onde todos os sócios respondem somente pelo valor das ações, que subscrevem, ou lhes são cedidas, as quais, por sua vez, podem ceder-se livremente”. Para Modesto Carvalhosa (1997), “a pessoa jurídica de direito privado, de natureza mercantil, em que o capital se divide em ações de livre negociabilidade, limitando-se a responsabilidade dos subscritores ou acionistas ao preço de emissão das ações por eles subscritas”.

Assim sendo, tais conceitos tem o condão de reunir as principais características das sociedades anônimas, nas quais emana a natureza de sociedade de capitais, divisão do capital social em ações, responsabilidade limitada, bem como, a natureza mercantil, modernamente atualizada para natureza empresarial (TOMAZETTE, 2016).

Visto a grande importância atribuída à contribuição do sócio, e não as peculiaridades pessoais, evidencia-se para que a sociedade anônima tenha um caráter típico de sociedade de capitais, sendo livre a negociação de ações,na qual numa eventualidade poderia ser restringida de acordo com o artigo 36 da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, que dispõe sobre as sociedades por ações, mas sem impedimentos, pois, não importa a qualidade pessoal do sócio,mas sua contribuição patrimonial (BORBA, 1998). A esse respeito, tem-se que o falecimento de sócio não acarretará quaisquer consequências sobre a sociedade, ocorrendo a transmissão de pleno direito a condição de sócio a herdeiros (TOMAZETTE, 2016). Divergente se é o fato à época de 2001 o Superior Tribunal de Justiça reconhecer um caso no qual existia natureza personalista entre os sócios, conforme Recurso Especial nº 111.294, de relatoria do Ministro César Asfor Rocha, cujo julgamento deu-se em 28 de novembro de 2001, conforme ementa colacionada abaixo.

“Ementa: Direito Comercial. Sociedade Anônima. Grupo Familiar. Inexistência de lucros e distribuição de dividendos há vários anos. Dissolução Parcial. Sócios Minoritários. Possibilidade.

Pelas peculiaridades da espécie, em que o elemento preponderante, quando do recrutamento dos sócios, para a constituição da sociedade anônima envolvendo pequeno grupo familiar, foi a afeição pessoal que reinava entre eles, a quebra da affecttio societatis conjugada à inexistência de lucros e de distribuição de dividendos, por longos anos, pode se constituir em elemento ensejador da dissolução parcial da sociedade, pois seria injusto manter o acionista prisioneiro da sociedade, com seu investimento improdutivo, na expressão de Rubens Requião. O princípio da preservação da sociedade e de sua utilidade social afasta a dissolução integral da sociedade anônima, conduzindo à dissolução parcial. Recurso parcialmente conhecido, mas improvido” (BRASIL, 2001).

Tem como diferencial, perante as outras sociedades empresárias o fato de que o capital social da companhia é racionado em frações iguais, representando títulos negociáveis, inclusive no mercado de valores mobiliários, cujos títulos são denominados ações, que podem representar alternativa de investimento para o público em geral. Nesse ponto é que a sociedade anônima se difere da limitada, cujo capital é dividido em quotas que não tem possibilidade de serem negociadas no mercado de valores mobiliários (TOMAZETTE, 2016). De acordo com Francesco Galgano (1999, p. 3 apud TOMAZETTE, 2016), outra característica de suma importância nas sociedades anônimas dar-se ao fato de que a responsabilidade dos sócios aqui denominados acionistas é limitada ao preço da emissão da ação. Tal limitação de responsabilidade significa dizer que os acionistas só assumem o risco de perder o valor investido, não pondo em risco seu patrimônio particular.

Desse modo, não se pode afirmar que a responsabilidade dos acionistas é limitada ao valor nominal da ação, pois este guarda relação direta com o capital social. Já o preço de sua emissão poderia ser igual ou superior ao valor nominal, de acordo com o artigo 13 da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976 (Lei das Sociedades por Ações), representando o valor exigido pelo acionista em função de diversas circunstâncias (oferta, valorização, procura, dentre outros), tendo como limite mínimo o valor nominal da ação, sendo que o excedente do valor nominal seria destinado à formação de reserva de capital (TOMAZETTE, 2016).

A sociedade anônima merece o destaque por uma característica peculiar de ter sempre a natureza mercantil, seja qual for à atividade desenvolvida por ela, conforme o artigo 2º,§ 1º da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976 (Lei das Sociedades por Ações), in verbis: “(…) § 1º Qualquer que seja o objeto, a companhia é mercantil e se rege pelas leis e usos do comércio”. Assim, com o advento da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002, que institui o Código Civil, extingue-se a distinção entre atividades civis e comerciais. Conforme o novo regime, as sociedades anônimas são sempre sociedades empresárias, sem se importar com a atividade efetivamente desenvolvida pela mesma, conforme o artigo 982[2], parágrafo único da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil). (TOMAZETTE, 2016)

4 DO NOME, DA FUNÇÃO E DA IMPORTÂNCIA ECONÔMICA

A expressão “sociedade anônima” é um tanto quanto inadequada, pois a sociedade em si não é anônima, tendo um nome vinculando-se na vida jurídica (VAMPRÉ, 1922, p. 10 apud TOMAZETTE, 2016). Assim, ocorre uma imprecisão, visto que os anônimos são os sócios e não a sociedade em si, possuindo um nome, de ampla publicidade (PAPINI, 1979, p. 35 apud TOMAZETTE, 2016). Tratando de sociedade de capitais, não corresponde com a natureza da sociedade anônima a adoção de razão social, pois nesta estariam presentes nomes de sócios. Em se tratando de sociedade anônima, em que a contribuição social é mais importante que a pessoa do sócio, não teria motivos para se identificar a sociedade com qualquer dos sócios. Assim sendo, as sociedades anônimas só podem usar uma denominação, ou seja, sem nomes de sócios, por isso o nome de anônima. De acordo com Lei nº 10.406/2002 (Código Civil), em seu artigo 1.160, tal denominação deve ser indicativa do objeto da sociedade (TOMAZETTE, 2016).

A denominação da sociedade deve acompanhar as expressões companhia ou sociedade anônima por extenso ou abreviadamente, sendo vedada a expressão companhia ao final (Art. 3º da Lei nº 6.4041976), com intuito de se evitar confusão com outras sociedades, como as sociedades de nome coletivo (CARVALHOSA, 1997). De maneira excepcional, na denominação da sociedade anônima pode ser incluído nome de pessoa física, fundadores, acionistas, ou pessoas que por qualquer outro meio, tenham concorrido para o sucesso da empresa (art. 3º, §1º, da Lei 6.40476)[3] (TOMAZETTE, 2016).

As sociedades anônimas, nem no aspecto evidentemente financeiro, é um instrumento de financiamento de grandes empresas, como bem denomina Rubens Requião (1998).  Assim, as sociedades anônimas são instrumento hábil popular do desenvolvimento capitalista, pois, sem esse instrumento, seria inviável alcançar o grau de desenvolvimento atingido, pois não teria encontrado os meios para tanto (TOMAZETTE, 2016). De acordo com Manuel BrosetaPont (1994, p. 219 apud TOMAZETTE, 2016), com a introdução da Revolução Industrial, foram desenvolvidos polos industriais de grandes empreendimentos, os quais precisavam de um grande aporte de capital e a sociedade anônima foi a maneira encontrada para a concentração dessa grande quantidade de capital, pois permitia o apelo ao público para obtenção de tais recursos (TOMAZETTE, 2016).

Nesta linha de exposição, o que se obteve foi que tal apelo ao público surtia efeitos e resultados, pois a participação em sociedades era vista como uma forma de poupança particular extremamente atrativa, em vista das responsabilidades e possibilidades de ganhos, via percepção de lucros e negociação de títulos valorados no mercado financeiro. Conclui-se, desta forma, que as sociedades anônimas, mediante tal apelo ao público, é o instrumento capaz de obtenção de volumosos recursos, que movimentam atualmente a economia moderna (TOMAZETTE, 2016). Portanto, a sociedade anônima é o mecanismo fundamental de grande valia para os grandes empreendimentos, na medida em que se evidencia a capacidade ilimitada de atrair recursos financeiros e a possibilidade de limitar e dispersar os riscos do empreendimento (FRANCO, 2005).

5 Objeto social e natureza jurídica do ato constitutivo

Na atual conjuntura, tem-se que as sociedades anônimas serão sempre sociedades empresárias, sem importar a natureza da atividade exercida. Assim sendo, é necessário que o estatuto da sociedade defina, de maneira clara e precisa, o objeto que a sociedade se destina, pois, não se deve formular objeto social genericamente (PAPINI, 1999). Há de se indicar gênero e espécie de atividade a ser desenvolvida, nos termos preconizados pelo §1º do artigo 53 do Decreto nº 1.800, de 30 de janeiro de 1996, que regulamenta a Lei nº 8.934, de 18 de novembro de 1994, que dispõe sobre o Registro Público de Empresas Mercantis e Atividades Afins e dá outras providências, tendo como objeto social uma atividade econômica lícita, possível e de fins lucrativos (CARVALHOSA, 1997). No estatuto da sociedade, o objeto serve para delimitar a atuação da sociedade, vislumbrando a responsabilização do administrador e controladores que extrapolar limites impostos (CARVALHOSA, 1997). Portanto, ainda que não figure no estatuto a figura do objeto social, a participação no capital social de outras sociedades é possível como forma de realização do objeto social, ou para proveito de incentivos fiscais (art. 2º, § 3º da Lei 6.404/76) (TOMAZETTE, 2016).

A natureza jurídica do ato constitutivo da sociedade anônima é constantemente debatida na doutrina contemporânea, dadas particularidades inerentes a tal tipo societário, o que desencadeia uma divisão entre, pelo menos, duas correntes, a saber: contrato plurilateral e ato institucional (TOMAZETTE, 2016). Tem-se determinada corrente que entende que o ato constitutivo das sociedades anônimas é um contrato plurilateral, ou seja, um contrato sui generis, detentor de determinadas particularidades ante aos contratos bilaterais puros (BULGARELLI, 2001). No contrato plurilateral seria possível a participação de mais de duas partes, tendo finalidade comum entre os contratantes, surgindo obrigações entre todos participes, uma finalidade instrumental, a abertura do contrato de novas adesões, a inaplicabilidade da exceção do contrato não cumprido e pela distinção no que tange à adesão de cada sócio e ao contrato como um todo. Em breve síntese, o ato constitutivo seria contrato dotado de algumas particularidades (TOMAZETTE, 2016).

Outra corrente doutrinária defende que não seria cabível o conhecimento de contrato no ato constitutivo da sociedade anônima, mas sim um ato institucional, cujo escopo é abranger interesses de sócios acionistas empregados e da comunidade. Sendo instituição, seria um ato institucional (COELHO, 1999; MARTINS, 1998). Nesse tipo societário, a empresa envolve uma série de interesses, tais quais como empregados, comunidade, fisco, consumidores, além do mais, os interesses de seus membros, que há responsabilidade social a ser cobrada (LAMY FILHO, 1997). A supremacia do interesse social ante o interesse individual dos sócios reforça a natureza de instituição na relação (PAPINI, 1999), em oposição à natureza contratual, na qual se te supremacia de interesse comum dos sócios (HALPERIN, 1998 apud TOMAZETTE, 2016).

A ideia institucional é a obra a ser realizada, possuindo menor importância a vontade dos sócios, sendo restrita a aceitação da disciplina institucional, se maiores preocupações quantos efeitos ocasionados, ao contrario do que ocorreria nos contratos (REQUIÃO, 1998), sendo essa vontade dos sócios irrelevante na vida da sociedade quanto à realização da função a ser exercida. Portanto, o ato constitutivo das sociedades anônimas seria um ato institucional, o qual daria origem à determinada instituição (MARTINS, 1977). A Lei nº 6.4041976 recepcionou tal interpretação, afirmando em seu artigo 116, parágrafo único, que:

“[…] o acionista controlador deve usar o poder com o fim de fazer a companhia realizar o seu objeto e cumprir sua função social, e tem deveres e responsabilidades para com os demais acionistas da empresa que nela trabalham e para a comunidade em que atua cujos direitos e interesses deve lealmente respeitar e atender” (BRASIL, 1976).

A Lei 6.404 de 1976 constitui a mais moderna expressão da doutrina institucionalista, determinando as sociedades uma função social e privilegiando o interesse social daqueles que trabalham na sociedade, na comunidade e o interesse da nação (VILLEGAS, 1994 apud TOMAZETTE, 2016). O ato constitutivo seria um contrato que regularia as relações entre sócios, mas que após a formação, a sociedade anônima seria instituição voltada pata atingir o interesse do bem comum (REQUIÃO, 1998), contudo, a teoria dos atos institucionais pode ser usada nas sociedades anônimas, comumente para os administradores, não com intuito de explicar a formação da vontade social, na qual ainda prevaleceria a natureza de contrato plurilateral (GALGANO, 1999 apud TOMAZETTE, 2016). 

Contudo, mesmo se tratando de contrato plurilateral subsistem alguns princípios dos contratos inaplicáveis às sociedades por ações. Assim, no caso de contrato por prazo indeterminado, assiste o contratante o direito de denunciar o contrato, retirando-se da mesma e por vezes até extinguindo-a (PEREIRA, 1993). Embora não tenha o condão de extinguir o contrato societário, é cediço que nas sociedades empresariais há possibilidade de dissolução parcial, obtendo o reembolso da sociedade, conforme escólio de Tomazette (2016), com fundamento no artigo 1.029 da Lei nº 10.406/2002 (Código Civil), que ensina:

“[…] além dos casos previstos na lei ou no contrato, qualquer sócio pode retirar-se da sociedade; se de prazo indeterminado, mediante notificação aos demais sócios, com antecedência mínima de sessenta dias; se de prazo determinado, provando judicialmente justa causa” (BRASIL, 2002).

A princípio, tal possibilidade não se aplica as sociedades por ações, denotando a ausência da natureza contratual, reforçando a natureza institucional do ato constitutivo das sociedades (COELHO, 1998). Assim, o sócio não pode impor ônus à sociedade apenas por sua vontade de se retirar, pois há de se prevalecer o interesse social, sendo distinta a solução contratual, no qual é perfeitamente possível a retirada imotivada, portanto, a natureza contratual não é capaz de explicar o ato constitutivo das sociedades anônimas, devendo prevalecer à natureza institucional (TOMAZETTE 2016).

6 Sociedade anônima de pessoas

Por ter características específicas, a sociedade anônima apresenta-se como uma típica sociedade de capitais, onde o que mais valia é a contribuição do sócio acionista e não suas qualidades pessoais. De tal forma, ocorre que tal tipo societário vem sendo mais usado que outrora, abrangendo empreendimentos de pequeno e médio porte. Nesses casos específicos, pode ser formada uma sociedade anônima fechada, com poucos acionistas e muito próximos entre si, podendo ser parentes ou não. Diante esse cenário, a jurisprudência reconhece que algumas sociedades anônimas são sociedade de pessoas, a exemplo do que se verifica do Recurso Especial nº 917.531/RS, de relatoria do Ministro Luís Felipe Salomão, julgado em 17.11.2011, cuja ementa segue colacionada abaixo:

“Ementa: Direito societário e empresarial. Sociedade anônima de capital fechado em que prepondera a affectio societatis. Dissolução parcial Exclusão de acionistas. Configuração de justa causa. Possibilidade. Aplicação do Direito em espécie. Art. 257 do RISTJ e súmula 456 do STJ.

1. O instituto da dissolução parcial erigiu-se baseado nas sociedades contratuais e personalistas, como alternativa à dissolução total e, portanto, como medida mais consentânea ao princípio da preservação da sociedade e sua função social, contudo a complexa realidade das relações negociais hodiernas potencializa a extensão do referido instituto às sociedades "circunstancialmente" anônimas, ou seja, àquelas que, em virtude de cláusulas estatutárias restritivas à livre circulação das ações,ostentam caráter familiar ou fechado, onde as qualidades pessoais dos sócios adquirem relevância para o desenvolvimento das atividades sociais ("affectio societatis"). (Precedente: EREsp 111.294/PR, Segunda Seção, Rel. Ministro Castro Filho, DJ 10/09/2007)

2. É bem de ver que a dissolução parcial e a exclusão de sócio são fenômenos diversos, cabendo destacar, no caso vertente, o seguinte aspecto: na primeira, pretende o sócio dissidente a sua retirada da sociedade, bastando-lhe a comprovação da quebra da "affectio societatis"; na segunda, a pretensão é de excluir outros sócios, em decorrência de grave inadimplemento dos deveres essenciais, colocando em risco a continuidade da própria atividade social.

3. Em outras palavras, a exclusão é medida extrema que visa à eficiência da atividade empresarial, para o que se torna necessário expurgar o sócio que gera prejuízo ou a possibilidade de prejuízo grave ao exercício da empresa, sendo imprescindível a comprovação do justo motivo.

4. No caso em julgamento, a sentença, com ampla cognição fático-probatória, consignando a quebra da "bona fides societatis", salientou uma série de fatos tendentes a ensejar a exclusão dos ora recorridos da companhia, porquanto configuradores da justa causa, tais como: (i) o recorrente Leon, conquanto reeleito pela Assembleia Geral para o cargo de diretor, não pôde até agora nem exercê-lo nem conferir os livros e documentos sociais, em virtude de óbice imposto pelos recorridos; (ii) os recorridos, exercendo a diretoria de forma ilegítima, são os únicos a perceber rendimentos mensais, não distribuindo dividendos aos recorrentes.

5. Caracterizada a sociedade anônima como fechada e personalista, o que tem o condão de propiciar a sua dissolução parcial – fenômeno até recentemente vinculado às sociedades de pessoas -, é de se entender também pela possibilidade de aplicação das regras atinentes à exclusão de sócios das sociedades regidas pelo Código Civil, máxime diante da previsão contida no art. 1.089 do CC: "A sociedade anônima rege-se por lei especial, aplicando-se-lhe, nos casos omissos, as disposições deste Código."

6. Superado o juízo de admissibilidade, o recurso especial comporta efeito devolutivo amplo, porquanto cumpre ao Tribunal julgar a causa, aplicando o direito à espécie (art. 257 do RISTJ; Súmula 456 do STF). Precedentes.

7. Recurso especial provido, restaurando-se integralmente a sentença, inclusive quanto aos ônus sucumbenciais” (BRASIL, 2011).

O que se tem em apreço, ao comentar tal ementa, condiz com o atual modo de pensar em procedimento, posto em normas pelo Código de Processo Civil de 2015, no que tange a aplicação de normas de sociedades tipicamente contratuais às estatutárias, pelo caráter de afeto societário, evidente nas sociedades contratuais e, que no momento vivenciado pelo país, surgem companhias que poderiam ser sociedades contratuais pelo modo que se deu sua formação societária. 

Em determinadas companhias, para Tomazette (2016), se pode notar um caráter mais pessoal na relação entre acionistas, com consequente affectio societatis mais relevante entre os mesmos. De tal maneira, deve-se reconhecer um regime específico para essas sociedades, considerando a formação intuitu personae de sua constituição. Nessa situação específica, deve-se reconhecer a dissolução parcial da sociedade, pela simples quebra da affectio societatis, devendo admitir a resolução do vinculo de um acionista, independente das hipóteses legais do direito de retirada.

Não se admitindo tal regime específico, para Tomazette (2016), o resultado seria desastroso, pois com a dissolução parcial e a quebra da affectio societatis, poderia significar a dissolução total da companhia, prejudicando todos os interesses que a circundam. Doutra forma, o acionista não satisfeito poderia ficar vinculado à sociedade, pois não haveria terceiros interessados em ingressar naquela sociedade extremamente particular. Assim, tal resultado seria desastroso, indesejável e violaria a própria Constituição Federal no que tange a liberdade de associação, que impede que um cidadão seja forçado a permanecer associado. Portanto, para Tomazette (2016), configura-se uma relação personalíssima entre acionistas, devendo admitir regime específico para as sociedades anônimas.

7 CONCLUSÃO

O presente trabalho tem por análise as origens e características das sociedades anônimas, que por seu turno no decorrer dos anos se modificou. Historicamente, se deu início nas corporações de ofício durante a idade média, posteriormente em atos de comércio, em meados de 1807 na França e atualmente, pela teoria de empresa, com advento do Código Civil de 2002 angariando conhecimentos do Código Civil Italiano de 1942. Por características formadoras tem-se que a formação empresarial das sociedades anônimas é de natureza de sociedade de capitais, influindo assim no nome empresarial com as peculiaridades previstas em Legislação, bem como a competente averbação do registro para regularidade da atividade empresarial dentro dos ditames da legislação em vigor.

Torna-se fundamental a função e importância na atual conjuntura de mercado empresarial, visto ser as sociedades anônimas uma alavanca para o mercado de capitais, sendo um grande atrativo para vultuosas quantias injetadas no mercado financeiro. Portanto, o objeto social das sociedades anônimas deve-se indicar gênero e espécie, por ser um assunto demasiadamente importante no que tange a constituição e autorização, assim como a natureza jurídica de seu ato constitutivo, evidenciando pontos divergentes na doutrina sob essa ótica, entretanto, majoritariamente um ato institucional.

Portanto, no decorrer dos anos as sociedades anônimas se modificaram, ocasionando julgados controversos aos mandamentos regidos pela Lei nº 6.404 de 15 de dezembro de 1976. Nesse enfoque, consolida-se no Superior Tribunal de Justiça a possibilidade e razoabilidade da dissolução parcial da sociedade anônima fechada de caráter familiar, pois se entende que a pessoa do sócio é essencial para o desenvolvimento da sociedade ora abordada, tipicamente vislumbrada nas sociedades contratuais intuitu personae.

 

Referências

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PEREIRA, Caio Mario da Silva. Instituições de Direito Civil. v. 3. 9 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1993.
REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial. v. 1. 23 ed. São Paulo: Saraiva, 1998.
______________.Curso de Direito Comercial. v. 2. 21. ed. São Paulo: Saraiva, 1998.
TOMAZETTE, Marlon. Curso de Direito Empresarial: Teoria Geral do Direito Societário. v. 1. 7 ed., rev. atual e ampl. São Paulo: Atlas, 2016.
 
Notas
[1] Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa “Faces e Interfaces do Direito: Sociedade, Cultura e Interdisciplinaridade do Direito”

[2] Art. 982. Salvo as exceções expressas, considera-se empresária a sociedade que tem por objeto o exercício de atividade própria de empresário sujeito a registro (art. 967); e, simples, as demais.
Parágrafo único. Independentemente de seu objeto, considera-se empresária a sociedade por ações; e, simples, a cooperativa.

[3] Art. 3º A sociedade será designada por denominação acompanhada das expressões "companhia" ou "sociedade anônima", expressas por extenso ou abreviadamente mas vedada a utilização da primeira ao final. § 1º O nome do fundador, acionista, ou pessoa que por qualquer outro modo tenha concorrido para o êxito da empresa, poderá figurar na denominação. § 2º Se a denominação for idêntica ou semelhante a de companhia já existente, assistirá à prejudicada o direito de requerer a modificação, por via administrativa (artigo 97) ou em juízo, e demandar as perdas e danos resultantes.


Informações Sobre os Autores

Rodrigo Andrade Dias

Tauã Lima Verdan Rangel

Doutorando vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Direito da Universidade Federal Fluminense (UFF), linha de Pesquisa Conflitos Urbanos, Rurais e Socioambientais. Mestre em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidade Federal Fluminense. Especializando em Práticas Processuais – Processo Civil, Processo Penal e Processo do Trabalho pelo Centro Universitário São Camilo-ES. Bacharel em Direito pelo Centro Universitário São Camilo-ES


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