Jurisprudência trabalhista: a (in)aplicabilidade da teoria da desconsideração

Resumo: A aplicação da teoria da desconsideração vem sendo utilizada reiteradamente na justiça do trabalho, todavia esta aplicação sofre inúmeras críticas por parte da doutrina empresarialista. Buscou-se aqui trazer a origem do instituto, bem como as teorias formuladas sobre este, para, somente então, através do método comparativo, fazer uma análise entre a jurisprudência catarinense e o posicionamento da doutrina empresarialista. A metodologia utilizada nesse trabalho foi o entendimento consolidado pelo Tribunal Regional do Trabalho Catarinense e as críticas dos mais renomados autores do Direito Empresarial. Como resultado, foi evidenciado que a aplicação da desconsideração da personalidade jurídica, no âmbito trabalhista, afronta fortemente os pressupostos da teoria da desconsideração. Enfatizou-se, principalmente, a aplicabilidade deste instituto na Justiça do Trabalho, pois, além de contrariar os postulados da disregard doctrine, há uma ausência normativa para tal aplicação. Conclui-se, portanto, que a desconsideração da personalidade jurídica vem sendo utilizada de forma errônea no âmbito trabalhista, o que causa sérios danos à livre iniciativa e, consequentemente, prejudica a função social da empresa que, por sua vez, objetiva o bem-estar comum através da promoção de empregos, arrecadação de tributos, produção de mercadorias, bem como outros fatores que influem diretamente na economia do país.[1]

Palavras-chave: Teoria da desconsideração. Desconsideração da Personalidade Jurídica. Autonomia Patrimonial. Teoria menor.

Abstract: The application of the disregard theory has been used repeatedly in labor justice, but this application has been criticized by business law doctrine. It was sought here to bring the origin of the institute, as well as the theories formulated about it, only then, through the comparative method, to make an analysis between the jurisprudence Regional Court of Labor of Santa Catarina and the positioning of the business law doctrine. The methodology used in this work was the understanding consolidated by the Regional Court of Labor of Santa Catarina and the criticisms of the most renowned authors of Business Law. As a result, it was evidenced that the application of the disregard of the legal personality, in the labor scope, strongly defies the assumptions of the theory of disregard. It was emphasized, mainly, the applicability of this institute in the Labor Court, because, besides contradicting the postulates of disregard doctrine, there is a normative absence for such application. It is concluded, therefore, that the disregard of the legal personality has been used in an erroneous way in the labor scope, which causes serious damages to the free initiative and, consequently, damages the social function of the company that, in turn, being through the promotion of jobs, collection of taxes, production of goods, as well as other factors that directly influence the economy of the country.

Keywords: Disregard Theory. Disregard of Legal Entity. Patrimonial Autonomy. Minor theory.

Sumário: Introdução – 1. A Origem da Desconsideração da Personalidade Jurídica – 2. A teoria da desconsideração no direito brasileiro. 2.1. A aplicação correta da teoria da desconsideração. 2.2. A aplicação incorreta da teoria da desconsideração – 3. A aplicação da desconsideração da esfera trabalhista. 3.1. Análise da aplicação no Tribunal Regional do Trabalho Catarinense – Considerações finais – Referências.

INTRODUÇÃO

Esta produção científica traz uma análise de como a desconsideração da personalidade jurídica vem sendo aplicada nos tribunais, em específico, a aplicação deste instituto no âmbito da justiça do trabalho. Para tal, iniciar-se-á através de uma conotação histórica, buscando como objetivo principal fazer menção à finalidade deste instituto.

Feito isso, passar-se-á para análise prática, a qual será feita a partir da jurisprudência consolidada pelo Tribunal Regional do Trabalho de Santa Catarina, concomitantemente com os posicionamentos da doutrina empresarialista. Basicamente, a questão a ser abordada neste estudo será se, por acaso, existe uma relação entre o aspecto teleológico da desconsideração da personalidade jurídica e a sua aplicação prática.

Por fim, resolver-se-á tal problemática de modo comparativo, relacionando a jurisprudência com as menções doutrinárias trazidas nesta produção. Todavia, cabe alertar que a análise terá como norte o prisma dos autores do Direito Empresarial e, como dito, será limitada ao entendimento firmado pelo Tribunal Catarinense.

1 A ORIGEM DA DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA

A teoria da desconsideração da personalidade jurídica – também chamada de disregard of legal entity – teve sua origem através de uma construção jurisprudencial inglesa/norte-americana. Segundo alguns autores, pode se dizer que o caso percursor, que deu origem à disregard doctrine (doutrina da desconsideração), foi tratado em 1897, onde o tribunal da Inglaterra, no caso Salomon versus Salomon & Co. Ltd., evidenciou que Aaron Salomon, comerciante individual, constituiu uma limited company justamente com o intuito de fraudar suas dívidas, uma vez que todos os frutos contraídos pelo seu comércio individual eram destinados a esta sociedade, o que, por consequência, inviabilizaria qualquer liquidação por parte de seus credores.

Ainda sobre a origem, vale ressaltar que outros autores discordam, alegando que o percursor deste instituto foi o caso State versus Standard Oil Co., o qual foi julgado pela Corte Suprema de Ohio, em 1892. Porém, independente de qual destes casos deu origem à disregard doctrine, faz-se mais que necessário enfatizar que aplicação da desconsideração da personalidade jurídica traz consigo a essência da Common Law que, diferente do sistema jurídico vigente em nosso país, norteia-se na atividade jurisprudencial.

Pois bem, a partir da atividade jurisdicional anglo-saxônica, começaram os estudos sobre este fenômeno da desconsideração. Ocorre que, por se tratar de um instituto extremamente peculiar, a maioria dos autores não obtiveram sucesso no desenvolvimento de suas pesquisas. Em meio a tamanha dificuldade, por volta de 1953, o alemão Rolf Serick defendeu a mais brilhante tese até então, a qual delimitou certos pressupostos que permitiriam a permeabilidade da autonomia patrimonial presente nas pessoas jurídicas.

Dentre estes pressupostos, dois valem o destaque. O primeiro a ser destacado diz respeito ao abuso da personalidade jurídica, pois não poderá o magistrado determinar a desconsideração sem que se exprima o abuso da personalidade, sendo este caracterizado por “qualquer ato que, por meio do instrumento da pessoa jurídica, vise frustrar a aplicação da lei ou o cumprimento de obrigação contratual, ou, ainda, prejudicar terceiros de modo fraudulento”[1]. O segundo pressuposto diz respeito à preservação da autonomia patrimonial, uma vez que não é possível desconsiderar a personalidade apenas e tão somente com intuito de obter a satisfação de um crédito.

Inspirado na doutrina de Serick, Rubens Requião, em uma conferência na Faculdade de Direito da Universidade do Paraná, apresenta ao direito brasileiro a teoria da desconsideração. Defende Requião que “as fraudes e os abusos perpetrados através da pessoa jurídica não poderiam ser corrigidos caso não adotada a disregard doctrine pelo direito brasileiro”[2] e que, mesmo sem disposição legal, a aplicação da desconsideração poderia ser sustentada pelos tribunais, pois “deixar de aplicá-la, a pretexto de inexistência de dispositivo legal expresso, significaria o mesmo que amparar a fraude”[3].

2 A TEORIA DA DESCONSIDERAÇÃO NO DIREITO BRASILEIRO

Tendo em vista a necessidade da adequação da disregard doctrine ao direito brasileiro, considerando que esta seria a única forma de coibir o uso fraudulento da autonomia patrimonial, percebeu-se algumas manifestações jurisprudenciais antes mesmo de qualquer positivação legal, como é o caso do julgamento da 11ª Vara Cível do Distrito Federal em 25/02/1960, proferido pelo Juiz Antônio Pereira Pinto[4]:

“ABUSO DE DIREITO POR MEIO DE SOCIEDADE ANÔNIMA – DIRETOR OU ACIONISTA QUE SE SERVE DA SOCIEDADE PARA BURLAR A LEI, VIOLAR OBRIGAÇÕES CONTRATUAIS OU PREJUDICAR FRAUDULENTAMENTE TERCEIROS – NESSES CASOS, PODE-SE, OU NÃO, PRESCINDIR DA EXISTÊNCIA DA SOCIEDADE E CONSIDERAR O ATO COMO SE FOSSE PRATICADO DIRETAMENTE PELO ACIONISTA SOBERANO INTERESSADO.”

Porém, em nosso ordenamento jurídico, vigorava o forte positivismo. Muito delicado seria proferir qualquer decisão que não fosse fundada em uma disposição legal. Sendo assim, tinha-se a impressão de que, apesar de certos tribunais aplicarem a teoria da desconsideração, esta não seria legitima. Apenas e tão somente em 1990 que a disregard of legal entity foi inserida no direito brasileiro, através do Código de Defesa do Consumidor[5], in verbis:

“Art. 28. O juiz poderá desconsiderar a personalidade jurídica da sociedade quando, em detrimento do consumidor, houver abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social. A desconsideração também será efetivada quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração. (…) § 5° Também poderá ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre que sua personalidade for, de alguma forma, obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores. “

Percebe-se que as hipóteses elencadas pelo Código de Defesa do Consumidor estão em total desacordo com os pressupostos da disregard doctrine, notadamente no que diz respeito à autonomia patrimonial. Tendo em vista que o conflito entre esta normativa e os princípios norteadores da teoria da desconsideração gerou um intenso impasse na doutrina brasileira, Fabio Ulhoa Coelho[6], ao deparar-se com esta dissonância, formulou duas teorias: teoria maior e teoria menor.

“Há, no direito brasileiro, na verdade, duas teorias da desconsideração. De um lado, a teoria mais elaborada, de maior consistência e abstração, que condiciona o afastamento episódico da autonomia patrimonial das pessoas jurídicas à caracterização da manipulação fraudulenta ou abusiva do instituto. (…) De outro lado, a teoria menos elaborada, que se refere à desconsideração em toda e qualquer hipótese de execução do patrimônio do sócio por obrigação social, cuja tendência é condicionar o afastamento do princípio da autonomia à simples insatisfação de crédito perante a sociedade. Trata-se da teoria menor, que se contenta com a demonstração pelo credor da inexistência de bens sociais e da solvência de qualquer sócio, para atribuir a este a obrigação da pessoa jurídica.”

Todavia Fabio Ulhoa Coelho[7] retratou-se no que diz respeito a formulação destas teorias. Para o autor, estas teorias apresentam-se ultrapassadas, pois, em nosso cenário jurídica atual, o que se tem não são mais duas teorias, mas sim a aplicação incorreta ou correta da teoria da desconsideração:

“Em 1999, quando era significativa a quantidade de decisões judiciais desvirtuando a teoria da desconsideração, cheguei a chamar sua aplicação incorreta de “teoria menor”, reservando à correta a expressão “teoria maior”. Mas a evolução do tema na jurisprudência brasileira não permite mais falar-se em duas teorias distintas, razão pela qual esses conceitos de “maior” e “menor” mostram-se, agora, felizmente, ultrapassados.”

2.1 Aplicação correta da teoria da desconsideração

Apresenta-se aqui, para o estudo desta aplicação – ainda chamada por alguns autores de teoria maior – os pressupostos estudados por Serick. Como dito, este defende que para haver a desconsideração é necessário que haja abuso da autonomia patrimonial, seja por desvio da finalidade ou confusão do patrimônio, em outras palavras, o uso da personalidade jurídica com o intuito fraudulento. Caso tenha-se um crédito a ser executado, sem que haja abuso da personalidade jurídica, em hipótese alguma poderá ser desconsiderada a personalidade apenas para satisfazer esta execução.

Esta fundamentação traz consigo a essência da disregard doctrine, a qual, como dito anteriormente, se originou da jurisprudência anglo-saxônica. Também vale ressaltar que a aplicação correta da teoria da desconsideração foi recepcionada pelo Código Civil de 2002[8], in verbis:

“Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica. “

Sobre este dispositivo, leciona André Luiz Santa Cruz Ramos[9]:

“Ao prever a aplicação da teoria da desconsideração apenas quando demonstrado o abuso de personalidade jurídica, e caracterizando a ocorrência deste nos casos de desvio de finalidade e confusão patrimonial, o Código Civil manteve-se fiel aos postulados fundamentais da disregard doctrine, mas, infelizmente, não revogou as equivocadas regras especiais sobre o tema existentes em nosso ordenamento jurídico, as quais, por isso, continuam em vigor”.

Como menciona o autor, o Código Civil, apesar de trazer os princípios estipulados pela disregard doctrine, não revogou as disposições legais acerca do tema. Neste sentido, tem-se o Enunciado 51, do Conselho de Justiça Federal, I Jornada de Direito Civil: “A teoria da desconsideração da personalidade jurídica – disregard doctrine – fica positivada no novo Código Civil, mantidos os parâmetros existentes nos microssistemas legais e na construção jurídica sobre o tema".

2.2 Aplicação incorreta da teoria da desconsideração

Esta, por sua vez, adota-se a presunção de que a insatisfação de um crédito perante a sociedade seria suficiente para permeabilizar a autonomia patrimonial, buscando a satisfação deste no patrimônio pessoal dos sócios/acionistas. São regras legais que permitem a desconsideração da personalidade jurídica – independente do abuso da personalidade. Pode citar-se aqui, a título exemplificativo, o artigo 28 do Código de Defesa do Consumidor e o artigo 4º da Lei de Crimes Ambientais[10].

Marlon Tomazette[11] faz crítica a tal aplicação:

“Embora não aplicada a todos os ramos do direito, não vemos razoabilidade na aplicação dessa teoria menor. Tal teoria praticamente ignora a ideia de autonomia patrimonial das pessoas jurídicas e não se coaduna com a própria origem de aplicação da teoria da desconsideração. Ao contrário de proteger, a teoria menor acaba por minar a existência da autonomia patrimonial, em nada favorecendo aqueles que se dignam a exercer atividades econômicas”.

Destaca-se aqui que autor faz menção à “ultrapassada”[12] teoria menor. Todavia, apesar da nomenclatura, a crítica é pertinente, uma vez que a aplicação incorreta da teoria da desconsideração é completamente desproporcional, tendo em vista que, nestes campos de incidência, a autonomia patrimonial se torna inútil.

3 A APLICAÇÃO DA DESCONSIDERAÇÃO NA ESFERA TRABALHISTA

No âmbito das relações laborais, o instituto da desconsideração da personalidade jurídica vem sendo reiteradamente utilizado para satisfazer a execução do crédito trabalhista – independentemente de ter havido desvio de finalidade ou confusão patrimonial – tendo em vista que este crédito tem caráter alimentar. Porém, ocorre que tal aplicação não possui nenhuma normativa específica, bem como não há o que se falar na aplicação correta da teoria da desconsideração, pois, como dito, o instituto vem sendo aplicado ainda que não fique caracterizado o abuso da personalidade.

Não obstante, cabe ressaltar que, além da aplicação infundada, tem-se a extensão da obrigação a qualquer sócio, independentemente de quanto for a sua participação social. Deste modo, critica Gladston Mamede[13]:

“Como se não bastasse, equivoca-se também o judiciário Trabalhista quando, a partir da desconsideração da personalidade da sociedade, autoriza a extensão dos efeitos da obrigação sobre o patrimônio de qualquer dos sócios, independentemente de ter sido administrador ou ter responsabilidade direta sobre o dano verificado no patrimônio do empregado; o posicionamento é justificado apenas pela afirmação de que os créditos trabalhistas não podem ficar a descoberto.”

3.1 Análise da aplicação no Tribunal Regional do Trabalho Catarinense

Por fim, tendo em vista esta contextualização histórica/científica, passar-se-á para análise de como a teoria da desconsideração vem sendo aplicada pelo Tribunal Regional do Trabalho Catarinense. Para isso, coleciona-se o julgado proferido pelo desembargador Wanderley Godoy Junior[14]:

“DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. DIRECIONAMENTO DA EXECUÇÃO EM FACE DO SÓCO (sic) MINORITÁRIO. A jurisprudência trabalhista é pacífica no sentido de que os sócios, independentemente do percentual de participação na sociedade, respondem de forma solidária pela satisfação do débito, ressalvado, contudo, o direito de discutir eventual limitação da obrigação com os demais integrantes da sociedade, em foro próprio.”

Percebe-se aqui, que o sócio, independente do percentual de participação – seja ele 1% (um por cento) ou seja ele 99% (noventa e nove por cento) – responderá com seu patrimônio próprio em face da execução. Com base nesta aplicação, compor um quadro societário seria o mesmo que sujeitar-se a responder uma execução trabalhista pessoalmente, pois, segundo os critérios estipulados por este tribunal, a participação no capital social torna-se irrelevante. Gladston Mamede[15] expõe sua reprovação:

“A pretensão de fazer incidir os efeitos da obrigação sobre sócio minoritário que, de fato e de direito, não tinha como intervir na administração societária com eficácia, não senda o responsável pelo mau emprego da pessoa jurídica é absurda. Dentro da lógica despropositada da jurisprudência trabalhista, comprar ações no Brasil seria um ato de loucura, pois o acionista com ínfima participação é sócio e, diante de uma quebra, poderia ser responsabilizado pelos créditos trabalhistas em aberto. Um disparate!”

Ainda no referido julgado[16], argúi o relator:

“(…) Por fim, ressalto que, na seara trabalhista, é pacífica a aplicação da teoria menor de desconstituição da personalidade jurídica, nos termos do art. art. (sic) 28 da Lei 8.078/90, de modo que o mero inadimplemento da empresa dá ensejo à desconsideração da personalidade e à busca de bens patrimoniais dos sócios.”

Grifo para a menção ao artigo 28 do Código de Defesa do Consumidor. Este dispõe que o juiz poderá desconsiderar a personalidade jurídica da sociedade – mas apenas em detrimento do consumidor. Não há nenhuma normativa legal que sustenta a aplicação deste dispositivo em uma relação de trabalho.

Defender a não incidência da teoria da desconsideração em hipótese alguma seria marginalizar os direitos trabalhistas. Muito pelo contrário, significa valorar a função social da empresa, a qual visa, antes de tudo, o bem-estar comum. Entende-se por função social a criação de empregos, pagamento de tributos, geração de riqueza, contribuição para o desenvolvimento econômico, social e cultural do entorno, adoção de práticas sustentáveis e respeito aos direitos dos consumidores[17]. Portanto, Mamede[18] assim conclui:

“Há interesses a preservar dos dois lados, desde que legítimos, concretizando no plano das relações sociais a mútua valorização social do capital (livre iniciativa) e do trabalho que se encontra listada como fundamento do Estado Democrático de Direito, no artigo 1º, IV, da Constituição da República, e como fundamento da ordem econômica e financeira, como se lê no artigo 170, caput, da mesma Carta Política”

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Buscou-se aqui, através do método dedutivo, trazer a origem da teoria da desconsideração da personalidade jurídica, bem como seus primeiros resquícios de aplicabilidade em nosso ordenamento jurídico. Assim, somente após feita esta conotação histórica, chegou-se ao objeto de estudo, notadamente a aplicação da teoria da desconsideração na justiça do trabalho.

Evidenciou-se que, de fato, não existe uma relação entre o aspecto teleológico da desconsideração da personalidade jurídica e a sua aplicação prática na esfera trabalhista, pois, apesar das críticas por parte da doutrina, os tribunais mantem um posicionamento equivocado. Este resultado foi obtido através da comparação entre o julgado proferido pelo Tribunal Regional do Trabalho Catarinense concomitante com os preceitos doutrinários dos mais renomados autores do Direito Empresarial.

Para futuras produções científicas, recomenda-se a análise da desconsideração da personalidade jurídica no Direito do Consumidor, pois – diferentemente do que ocorre na justiça do trabalho – há uma normativa legal que sustenta tal aplicação.

 

Referências
COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. v. 2.
COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial: direito de empresa. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. v. 2.
MAMEDE, Gladston. Direito empresarial brasileiro: direito societário: sociedades simples e empresária. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2010. v. 2.
MAMEDE, Gladston. Manual de direito empresarial. 8. ed.­ São Paulo: Atlas, 2013.
RAMOS, André Luiz Santa Cruz. Direito empresarial. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2017.
SOUZA, Vanessa Ribeiro Corrêa Sampaio. Desconsideração da personalidade jurídica: teoria e legislação no Brasil. Revista da Faculdade de Direito de Campos, v. 7, n. 9, dez. 2006.
TOMAZETTE, Marlon. Curso de direito empresarial: teoria geral e direito societário. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2017. v. 1.
 
Notas
[1] Artigo orientado pelo Prof. Everaldo Medeiros Dias: Bacharél em Direito pela Univali; Pós-Graduado em nível de Especialização em Direito Societário e Empresarial pelo Cesusc, Mestre em Ciência Jurídica pela Univali; Doutorando em Ciéncia Jurídica pela PUC de Buenos Aires; Professor da Univali.

[1] COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial: direito de empresa. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. v. 2. p. 58.

[2] Ibidem.

[3] Ibidem, p. 58-59.

[4] BRASIL. Tribunal de Justiça do Distrito e Territórios. Juízo de Direito da 11ª Vara Cível do Distrito Federal. Relator: Juiz Antônio Pereira Pinto, 25.02.1960. Revista Forense, v. 188, p. 269-82.

[5] BRASIL. Lei n. 8.078, de 11 de setembro de 1990. Dispõe sobre a proteção do consumidor e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8078.htm>. Acesso em: 30 ago. 2017.

[6] COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. v. 2. p. 35.

[7] Idem. Curso de direito comercial: direito de empresa. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. v. 2. p. 70.

[8] BRASIL. Lei n. 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm>. Acesso em: 30 ago. 2017.

[9] RAMOS, André Luiz Santa Cruz. Direito empresarial. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2017. p. 503-504.

[10] BRASIL. Lei n. 9.605, de 12 de fevereiro de 1998. Dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9605.htm>. Acesso em: 27 jul. 2017.

[11] TOMAZETTE, Marlon. Curso de direito empresarial: teoria geral e direito societário. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2017. v. 1. p. 320.

[12] Termo utilizado por Fabio Ulhoa Coelho em sua obra Curso de Direito Comercial: Direito de empresa. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. v. 2. p. 70.

[13] MAMEDE, Gladston. Manual de direito empresarial. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2013. p. 237.

[14] BRASIL. Tribunal Regional do Trabalho (12. Região). Agravo de Petição nº 01711-1998-027-12-86-3. Agravante: Nabel Santo Silveira. Agravado: Albertina Borges Alves e outros. Relator: Desembargador Wanderley Godoy Junior. 16 de junho de 2017. Disponível em: <http://consultas.trt12.jus.br/SAP2/DocumentoListar.do?plocalConexao=sap2&ptipo=PDF&pidDoc=337795>. Acesso em: 27 jul. 2017.

[15] MAMEDE, Gladston. Direito empresarial brasileiro: direito societário: sociedades simples e empresária. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2010. v. 2. p. 256.

[16] BRASIL. Tribunal Regional do Trabalho (12. Região). Agravo de Petição nº 01711-1998-027-12-86-3. Agravante: Nabel Santo Silveira. Agravado: Albertina Borges Alves e outros. Relator: Desembargador Wanderley Godoy Junior. 16 de junho de 2017. Disponível em: <http://consultas.trt12.jus.br/SAP2/DocumentoListar.do?plocalConexao=sap2&ptipo=PDF&pidDoc=337795>. Acesso em: 27 jul. 2017.

[17] RAMOS, André Luiz Santa Cruz. Direito empresarial. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2017. p. 57.

[18] MAMEDE, Gladston. Direito empresarial brasileiro: direito societário: sociedades simples e empresária. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2010. v. 2. p. 257.


Informações Sobre o Autor

Franklin Guerreiro Zaniolo

Acadêmico de Direito na Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI – Campus Balneário Camboriú


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