A interpretação às aveças das ações de revisões de cláusulas contratuais


Quando se vê as instituições financeiras e até mesmo os tribunais manifestarem-se “friamente” sobre a impossibilidade de rever cláusulas contratuais injustas, haja vista o consumidor ter “assumido adimplir a obrigação avençada”, fica-se com a sensação de estar regredindo no tempo.


Levaram-se anos para que os direitos do consumidor fossem efetivamente regulamentados no ordenamento jurídico pátrio, frente à insuficiência dos diplomas legais que tratassem o tema com propriedade antes da vigência do Código de Defesa do Consumidor e de outras normas de interesse social.


Demorou muito para que se atentasse à necessidade de tratar com seriedade os princípios sociais do contrato, fazendo com que as relações nascidas de um desequilíbrio notório, gerado pelo contrato de adesão e demais contratos em que o consumidor tem apenas uma pseudo-liberdade, uma pseudo-igualdade, pudessem ser revistas.


Todavia, em contra-senso (talvez pela crescente quantidade de demandas e frente às dificuldades encontradas pelos servidores para dar fim às pilhas de processos que se avolumam nos cartórios, ou ainda, em face das políticas econômicas que minam a resistência dos trabalhadores levando-os a uma indesejada inadimplência) os autores de ações revisionais, modernamente, chegam a ser considerados “lobos em pele de cordeiros”, uma vez que “protegidos” pelo Estado por intermédio de normas que “incitam” as demandas consumeiristas.


Paira na atualidade a impressão de que os citados consumidores vivem em um país de contratos “perfeitamente elaborados”, com “avenças equânimes”, eis que “não há qualquer abuso ou excesso” que possa abalar o pacta sunt servanda.


Nessa ótica, pode-se imaginar que os consumidores saem de suas casas com o intuito ferrenho de burlar tal sistema “primoroso”. São milhares de brasileiros que procuram as instituições financeiras para adquirir crédito, comprar bens móveis, imóveis, aderindo, desenfreados, aos mais diversos mecanismos financeiros com a finalidade obscura de tornarem-se futuramente inadimplentes, desonrando suas obrigações para perturbar seus financiadores.


Tais financiadores, diante das práticas despudoradas dos consumidores, contabilizam “enormes prejuízos”, “não auferem mais” os lucros astronômicos, assim como, devem estar “retraídos”, logicamente, diante de spreads tão “insignificantes”.



Mesmo parecendo irônica, a hipótese ventilada encontra largo respaldo no cenário jurídico brasileiro.


Os consumidores não têm mais a certeza de que ao assinarem um instrumento contratual eivado de vícios, mormente oriundos de cláusulas de difícil compreensão, poderão recorrer ao judiciário para restaurar o equilíbrio de suas relações econômicas e sociais.


Os “bons acabam pagando pelos maus”, numa generalização nitidamente injusta.


Quanto ao narrado, é oportuno referir, que está cada vez mais fácil dar cabo das lides no seu “nascedouro”; antes mesmo que se tenha permitido uma maior análise de cada caso nas suas peculiaridades.


Portanto, não é coerente, diante de contratos cada vez mais massificados, fechar os olhos aos abusos e excessos mesmo que contratualmente determinados, pois foi esta a inspiração para a criação de leis de proteção ao consumidor, que embora não pareçam, ainda estão vigentes.



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Patrícia Fernandes Fraga


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