Algumas pessoas reclamadas pela justiça para responder a processos-crime ou que já possuem sentenças condenatórias aproveitam-se para homiziar-se em outros países e é nesse momento que o instituto da extradição mostra-se como um dos mais eficazes e eficientes meios de cooperação jurídica no combate ao crime. Assume posição ímpar para que as fronteiras dos países deixem de representar barreiras ao alcance da justiça.
Francisco Rezek, ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), conceitua extradição como a “entrega, por um Estado a outro, e a pedido deste, de pessoa que em seu território deva responder a processo penal ou cumprir pena. Cuida-se de uma relação executiva, com envolvimento judiciário de ambos os lados: o governo requerente da extradição só toma essa iniciativa em razão da existência do processo penal – findo ou em curso – ante sua Justiça; e o governo do Estado requerido (…) não goza, em geral, de uma prerrogativa de decidir sobre o atendimento do pedido senão depois de um pronunciamento da Justiça local.”[1]
Assim, a extradição de um indivíduo com “pendências na justiça”, no âmbito penal, não se limita à cooperação entre dois Estados, mas também traduz a união de esforços dos Poderes Executivo e Judiciário.
A extradição pode ser ativa ou passiva. Diz-se da extradição ativa quando o interessado é o Estado requerente e passiva quando o Estado requerido é o demandado.
No Brasil, o Ministério da Justiça, por meio da Secretaria Nacional de Justiça, é responsável por formalizar os pedidos de extradição feitos por autoridades judiciárias brasileiras a um determinado Estado estrangeiro (ativa) ou, ainda, processar, opinar e encaminhar as solicitações de extradição formuladas por outro país às autoridades brasileiras (passiva).
De forma geral, o Poder Judiciário do Estado requerido é o responsável por decidir se o pedido de extradição formulado deve ou não ser concedido. São analisados, principalmente, os aspectos formais que conduziram o processo criminal, objeto do pedido de extradição, levando-se em conta as garantias processuais do extraditando no curso de seu processo, as limitações prescricionais e a inexistência de motivações políticas ou ideológicas que prejudiquem o pedido formulado.
Os pedidos de extradição formulados ao Governo brasileiro são analisados pelo Supremo Tribunal Federal e da sua decisão não cabe recurso, apenas embargos de declaração.
A formalização de um pedido de extradição não depende, necessariamente, da existência de um Tratado firmado entre os Estados envolvidos, podendo ser amparado em promessa de reciprocidade para casos análogos. Tal promessa deve respeitar, acima de tudo, o princípio da especialidade que pauta o instituto da extradição, de forma que o extraditando não será detido, processado ou condenado por outros delitos cometidos previamente e que não estejam contemplados no pedido de extradição.
Na hipótese de encaminhamento e deferimento de pedido de extradição somente para um dos processos a que responde o extraditando, e havendo notícia sobre a existência de outro(s), os demais juízos são convidados a manifestar interesse em formalizar pedido de extensão ou ampliação (também conhecida como extradição supletiva ou complementar), já que não se vislumbra um pedido de “aditamento”.
A previsão de extensão encontra respaldo inclusive no modelo de tratado sugerido pelas Nações Unidas que, em seu artigo 14, explicita que “um indivíduo extraditado (…) não poderá, no território do Estado requerente, ser processado, condenado, detido ou reextraditado para um terceiro Estado, nem ser submetido a outras restrições em sua liberdade pessoal, por uma infração cometida antes da entrega, salvo: a) se se tratar de uma infração pela qual a extradição tenha sido concedida; ou b) se o Estado requerido manifestar a sua concordância”.
Outro princípio norteador da extradição é o da Dupla Incriminação do Fato, também conhecido como Princípio da Identidade ou da Incriminação Recíproca, que se legitima na necessidade de o crime assim ser considerado tanto no país que requer a extradição de um indivíduo como no Estado requerido. Sua interpretação traduz-se na garantia de não infringência ao princípio da legalidade, ou seja, de que não pode haver um crime se não houver previsão legal assim o definindo. No caso dos pedidos de extradição, estes não se restringem, porém, à existência de previsão de tipos legais idênticos, mas também se a ação é típica e antijurídica nos dois ordenamentos jurídicos, excluindo-se, daí, os delitos de natureza militar ou política.
Ademais, imprescindível a verificação do princípio do non bis in idem, ou seja, na hipótese de existir sentença condenatória transitada em julgado pelo mesmo crime em que se solicita a extradição, esta não será concedida.
Atualmente, estão em vigor 23 tratados bilaterais de extradição, quais sejam: Argentina, Austrália, Bélgica, Bolívia, Chile, Colômbia, Equador, Espanha, Estados Unidos da América, França, Itália, Lituânia, México, Paraguai, Portugal, Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte, República da Coréia, Romênia, Rússia, Suíça, Ucrânia, Uruguai e Venezuela. Entre os multilaterais estão em vigor Mercosul – só Estados Parte –, Mercosul, Bolívia e Chile, e a Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional, conhecida como Convenção de Palermo.
Tramitam no Congresso Nacional os tratados bilaterais de extradição com os seguintes países: Angola, Canadá, Guatemala, Líbano, Moçambique, Panamá, República Dominicana e Suriname.
Ademais, a Secretaria Nacional de Justiça tem buscado cada vez mais negociar instrumentos visando estreitar os laços e desburocratizar a tramitação dos pedidos de extradição. Entre as negociações em curso, temos os acordos bilaterais com: África do Sul, Albânia, Alemanha, Argélia, China, El Salvador, Guiana, Índia, Japão, Marrocos, Polônia, Síria e Turquia.
Informações Sobre o Autor
Romeu Tuma Júnior
Secretário Nacional de Justiça