Resumo: Entre os direitos fundamentais garantidos pela Constituição Brasileira de 1988 estão o direito à saúde e, dentre eles, o direito à saúde da mulher. Nesse contexto, foi criado o Sistema Único de Saúde, incorporando princípios e diretrizes de descentralização, hierarquização e regionalização dos serviços. Surgem, daí, iniciativas governamentais de estímulo à saúde materna, como forma de garantir o direito fundamental a saúde, com foco na redução da mortalidade materna, indicador sensível da adequação da assistência obstétrica e neonatal. Nesse sentido, melhorar a saúde materna surge como o quinto objetivo de desenvolvimento do milênio, segundo a Organização das Nações Unidas. O Brasil inclui, a partir de 2004, programas específicos para a busca desse objetivo. A discussão e reconstrução de um modelo de assistência à mulher pressupõem o respeito a sua individualidade e vontade como parte dos direitos humanos, sendo passível de proteção pelo Estado e de exigibilidade pela população brasileira.
Palavras-Chave: direitos fundamentais, direitos reprodutivos, mulher, saúde.
Abstract: Among the fundamental rights guaranteed by the Brazilian Constitution of 1988 are entitled to health and, among them the right to health of women. In this context it was created the “Sistema Único de Saúde”, a unified health system, incorporating principles and policies of decentralization, hierarchy and regionalization of services. Arise, then, government initiatives to stimulate maternal health, in order to guarantee the fundamental right to health, with a focus on reducing maternal mortality, a sensitive indicator of the adequacy of obstetric and neonatal care. The maternal health emerges as the fifth goal of the millennium development, as established by the United Nations and Brazil includes, since 2004, specific programs for that. The discussion and reconstruction of a model of care for women require respect for their individuality as a human right and is entitled to protection by the State and enforceability of the Brazilian population.
Keywords: fundamental rights, reproductive rights, women, health.
Sumário: 1. Introdução 2. Diretrizes do Sistema Único de Saúde (SUS) para atenção à saúde materna. 3. Quinto objetivo de desenvolvimento do milênio da ONU: “Melhoria da saúde materna” – uma busca pelos direitos humanos. 4. Referências.
Introdução
“A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para a promoção, proteção e recuperação”.[1]
Dentre os direitos garantidos pela Constituição Brasileira de 1988 encontra-se a saúde, mas quando a abordagem é a trajetória do movimento social que legitimou, na esfera pública brasileira, as noções de saúde da mulher ou saúde e direitos reprodutivos, pode-se dizer que esta é, ainda, muito recente.
No início da década de 80, o movimento se definiu pela saúde da mulher, terminologia que permanece até mesmo na denominação da política pública em que foram traduzidas suas demandas, quando em 1984, o Ministério da Saúde do Brasil, atendendo às reivindicações do movimento de mulheres, elaborou o Programa de Assistência Integral à Saúde da Mulher (PAISM), marcando, sobretudo, uma ruptura conceitual com os princípios norteadores da política de saúde das mulheres e os critérios para eleição de prioridades neste campo [2].
Diretrizes do Sistema Único de Saúde (SUS) para atenção à saúde materna
O PAISM tornou-se um marco histórico na evolução dos conceitos de saúde da mulher por ter sido ele pioneiro no cenário mundial, ao propor inclusão da saúde reprodutiva das mulheres no âmbito da atenção integral da saúde da mulher, não mais utilizando ações isoladas de planejamento familiar. No momento em que o conceito de saúde reprodutiva, entre outros, foi intensamente discutido nas conferências internacionais do Cairo, em 1994 e Beijing, em 1995, o processo já estava bastante avançado conceitualmente no Brasil [3], [4].
Dessa forma, ele incorporou como princípios e diretrizes as propostas de descentralização, hierarquização e regionalização dos serviços, bem como a integralidade e a eqüidade da atenção, num período em que, paralelamente, no âmbito do Movimento Sanitário, se concebia o arcabouço conceitual que embasaria a formulação do Sistema Único de Saúde, que incluía ações educativas, preventivas, de diagnóstico, tratamento e recuperação, englobando a assistência à mulher em clínica ginecológica, no pré-natal, parto e puerpério, no climatério, em planejamento familiar, doença sexualmente transmissível – DST, câncer de colo de útero e de mama, além de outras necessidades identificadas a partir do perfil populacional das mulheres [5].
A criação do SUS ocorreu no bojo do processo de democratização do país, quando por volta dos anos 80, sanitaristas históricos passaram a ocupar posições-chave na estrutura organizacional dos Ministérios da Saúde e da Previdência e Assistência Social [6].
O SUS nasceu “na contramão” de outras reformas setoriais nas décadas de 1980 e 1990. A proposta de atenção universal baseada na concepção da saúde como direito da cidadania e dever de Estado vai de encontro à dinâmica das reformas mundiais. O princípio da descentralização sustenta-se em um desenho institucional que busca garantir a institucionalização de governos subnacionais e da população, via conselhos de saúde, como convém a sistemas universalistas e aos princípios de descentralização e controle social do SUS. Com relação ao aspecto financeiro, em 1993, a Frente Parlamentar da Saúde nos legou medidas como a Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), inicialmente concebida como fonte de recurso, com término de sua arrecadação em 31 de dezembro de 2007, além da Emenda Constitucional 29, que vincula constitucionalmente recursos obrigatórios das três esferas de governo à saúde.
A implantação do SUS é contemporânea a uma crise de financiamento no país que se reflete na saúde, momento em que ocorreu a retirada do financiamento da saúde pela Previdência Social, em 1993. Ainda assim, provedores privados, com presença cada vez mais organizada nas arenas decisórias, buscavam ampliar sua participação no setor público, de início no segmento de atenção básica. Nesse mesmo ano, um consórcio de associações de provedores que congregava planos, estabelecimentos privados e profissionais de saúde propôs ao governo o Plano Básico de Assistência Médica, que seria, em parte, financiado com recursos previdenciários. Iniciava a era dos planos de saúde.
Surge, nessa mesma época, o Programa de Saúde de Família (PSF), concebido em dezembro de 1993, com o apoio de técnicos do Banco Mundial e da Organização Panamericana da Saúde (OPAS). Teve seu endosso favorecido pelo discurso anti-hospitalocêntrico, pela valorização das práticas de prevenção do Movimento Sanitário e pela crise financeira. O PSF passou a ser o modelo para a reorientação das práticas de atenção, sendo sua expansão uma estratégia prioritária do governo federal para a ampliação da cobertura da atenção à saúde da população. Sua estratégia inovadora propõe no cenário dos serviços de saúde, a priorização das ações de promoção e recuperação da saúde das pessoas e das famílias de forma integral, contínua e pró-ativa, tendo como meta a assistência básica humanizada e participativa, centrada na família, em conformidade com os princípios do SUS. [7], [8].
Com isso, ao longo da década de 1990 e início do século XXI, o expressivo crescimento da atenção ambulatorial básica e do PSF foi concomitante à diminuição relativa do financiamento de internações hospitalares e, em menor proporção, de procedimentos de média e alta complexidade.
Entre abril de 1992 e julho de 2003, houve uma queda de 12% no total de leitos disponíveis no SUS, com crescimento da fatia proporcional ocupada por hospitais públicos e universitários, em detrimento dos privados. Nesse período, mais de quatrocentos novos hospitais públicos, a maioria com menos de 30 leitos, somaram-se à rede do SUS. Essa tendência contrasta com o padrão histórico de grandes unidades hospitalares públicas e poderia tanto indicar o surgimento de um novo tipo de organização hospitalar, com atuação mais articulada com a atenção básica, como uma proliferação de hospitais de baixa capacidade resolutiva, cujo processo de criação estaria antes vinculado a interesses políticos do que a critérios técnicos. [9]
Políticas governamentais internacionais impulsionaram o Brasil a elaborar programas focalizando os direitos humanos, instituindo, a partir de 13 de maio de 1996, o Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH), considerado como um dos primeiros passos para a promoção e proteção dos direitos humanos no país e sua revisão, em 2002, que avalia a ampliação da participação do Brasil nos sistemas global da Organização das Nações Unidas (ONU) e regional da Organização dos Estados Americanos (OEA) de promoção e proteção dos direitos humanos, por meio da continuidade da política de adesão a pactos e convenções internacionais de direitos humanos e de plena inserção do País no sistema interamericano.
Nessa ocasião, na área materno-infantil surgiram propostas específicas em relação à humanização da assistência, dentre eles, a Iniciativa Hospital Amigo da Criança (IHAC), um programa da Organização Mundial de Saúde (OMS) e Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) que protege, promove e apóia o aleitamento materno. Esse projeto credencia as maternidades que conseguem atingir os dez passos pré-determinados para manutenção e estimulo ao aleitamento, considerado uma distinção na qualidade do atendimento os hospitais que conseguem esse credenciamento. [10]
Com a busca pela humanização do atendimento na área obstétrica, visando a promoção do parto e nascimento saudáveis e a prevenção da mortalidade materna e perinatal, foi lançado o Guia Prático para Assistência ao Parto Normal, no ano de 1996, pela OMS e Ministério da Saúde do Brasil.
Essa publicação incorporou as “recomendações da OMS”, classificando os procedimentos de rotina na assistência ao parto, em 4 categorias, conforme estudos da Biblioteca Cochrane, que preconiza a “Assistência Baseada em Evidências Científicas”, iniciando que aponta para o uso consciente, criterioso e explícito das melhores evidências para tomada de decisões sobre o atendimento a pacientes individuais (Enkin, 2005). As condutas recomendadas pela OMS, são:
– Condutas claramente úteis e que devem ser estimuladas;
– Condutas claramente prejudiciais ou ineficazes e que devem ser eliminadas;
– Condutas sem evidência suficiente para apoiar uma recomendação e que devem ser utilizadas com precaução, enquanto pesquisas comprovem o assunto;
– Condutas freqüentemente utilizadas de modo inadequado, provocando mais dano que benefício.
Dentro dessa mesma perspectiva, a partir de 2000, o Ministério da Saúde do Brasil lançou o Programa Nacional de Humanização da Assistência Hospitalar (PNHAH), com a implantação de Núcleos de Humanização em 36 hospitais e, em 2003, lançando a Política Nacional de Humanização (PNH), em 2004. [11]
Ainda em concomitância com a mesma linha de trabalho, o Ministério da Saúde, através da Portaria/GM n.º 569, de 1/6/2000, instituiu o Programa de Humanização no Pré-Natal e Nascimento, para adoção de medidas que assegurem a melhoria do acesso, cobertura e qualidade do acompanhamento pré-natal e da assistência ao parto, puerpério e ao cuidado neonatal; ampliando ações já existentes do Ministério da Saúde em relação ao cuidado da gestante. Dentre estes investimentos, observa-se à assistência, em nível estadual, da gestação de alto risco, o aumento no pagamento de procedimentos específicos, a capacitação de parteiras tradicionais, a formação de enfermeiras obstétricas, bem como o estímulo para a construção de centros de partos normais em unidades hospitalares. [12]
Preocupado com os índices alarmantes de cesariana no país, que em 1997, apresentadas no sistema SUS, atingem 32% do total de partos, portarias assinadas entre 1998 e 2000 , números 2816/98, 865/99, 466/00 e 426/00, pelo ministro da saúde, determinam o pagamento de um percentual máximo de cesarianas, contemplando a complexidade dos diferentes tipos de serviços que atendem às mulheres. Essa medida leva a uma redução para 24% na taxa de cesariana no ano de 2000.[13]
Outra iniciativa foi a produção de um manual técnico para a Assistência Pré-Natal, formulado pelo Ministério da Saúde em 2000, com o objetivo de oferecer referências para a organização da rede assistencial, capacitação profissional e normatização das práticas de saúde, a serem seguidas e adaptadas pelos serviços estaduais e municipais de atendimento ao parto.
Nesse mesmo ano, um conjunto de portarias instituiu o Programa de Humanização no Pré-Natal e Nascimento (PHPN), que tem sua base na integralidade da assistência obstétrica e na afirmação dos direitos da mulher incorporados nas diretrizes institucionais. Em seqüência, foi lançado em 2000, pelo Ministério da Saúde, o Manual Assistência pré-natal: manual técnico e no ano seguinte o Manual de Assistência Humanizada à Mulher: parto, aborto e puerpério. [14], [15]
O PSF, mantendo seu foco principal na educação em saúde, criou condições para melhoria da assistência pré-natal, fortalecendo o vínculo entre a gestante, família e profissional de saúde, com o objetivo de promover a participação ativa da comunidade em seu trabalho através do desenvolvimento de responsabilidade mútua. [16]
Em 2004, foi implantada a Política Nacional de Humanização da Atenção e Gestão no Sistema Único da Saúde, o Humaniza SUS. [17] A humanização passa a ser vista como uma política que atravessa as diferentes ações e instâncias gestoras no SUS, tendo como princípios:
– Traduzir os princípios do SUS em modos de operar dos diferentes equipamentos e sujeitos da rede de saúde;
– Construir trocas solidárias e comprometidas com a dupla tarefa de produção de saúde e de sujeitos;
– Oferecer um eixo articulador das práticas em saúde, destacando o aspecto subjetivo nelas presente;
– Contagiar por atitudes e ações humanizadoras a rede do SUS, incluindo gestores, trabalhadores da saúde e usuários.
Quinto objetivo de desenvolvimento do milênio da ONU: “Melhoria da saúde materna” – uma busca pelos direitos humanos
Melhorar a saúde materna é o quinto objetivo de desenvolvimento do milênio, conforme estabelecido pela ONU, no ano 2000. [18] Essa meta tem um objetivo específico, ou seja, reduzir a taxa de mortalidade materna em 75% entre 1990 e 2015. Dados de 2004 mostram que, no Brasil, a mortalidade estava em 110 mulheres para cada 100 mil bebês.[19]
A mortalidade perinatal, englobando nesse contexto a mortalidade materna, é considerada um indicador sensível da adequação da assistência obstétrica e neonatal e do impacto de programas de intervenção nesta área, pela relação estreita que guarda com a assistência prestada à gestante e ao recém-nascido. Está vinculada a causas que podem ser prevenidas, relativas ao acesso e à utilização dos serviços de saúde, além da qualidade dessa assistência, sendo mais elevada nos grupos sociais de baixa renda, além do mau preenchimento dos atestados de óbitos, que dificultam o acesso aos dados reais e ao estabelecimento de estatísticas de saúde. [20]
Programas governamentais foram propostos pelo Ministério da Saúde do Brasil, com o intuito de reduzir a taxa de morbimortalidade materna e perinatal, em concordância com o Plano de Ação Regional para Redução da Mortalidade Materna da Organização Pan-Americana de Saúde, classificando como principais causadores as seguintes situações[21]:
1. Baixa qualidade da assistência obstétrica e neonatal prestada,
2. Oferta insuficiente de profissionais capacitados para atuar na área obstétrica e neonatal,
3. Reconhecimento restrito da problemática a nível de saúde pública; e
4. Condições sócio-econômicas precárias.
Como proposta o Ministério da Saúde apresentou o programa denominado Pacto Nacional pela Redução da Mortalidade Materna e Neonatal, com o objetivo de articular ações de governo e da sociedade civil, envolvendo diferentes atores sociais na qualificação da atenção a mulheres e recém-nascidos, visando à redução da mortalidade materna e neonatal, tendo como meta a redução da mortalidade materna e neonatal em 15% até o final de 2006. [22]
Formulado pela Área Técnica de Saúde da Mulher do Ministério da Saúde, o Pacto envolveu as secretarias municipais e estaduais de saúde, associações médicas e Organizações Não Governamentais (ONG), propondo diversas ações, entre elas:
– Articular programas governamentais, como os de Saúde da Mulher, da Criança, do Adolescente, Programa de Saúde da Família, Urgência e Assistência Farmacêutica;
– Estimular a participação dos conselhos estaduais e municipais de saúde na definição de conteúdos e estruturação do pacto nacional;
– Qualificar e humanizar a atenção ao parto, ao nascimento e ao aborto legal;
– Assegurar à gestante o direito ao acompanhamento antes, durante e depois do parto, incluindo alojamento conjunto;
– Garantir que mulheres e recém-nascidos não sejam recusados nos serviços de saúde e que sejam assistidos até a transferência para outra unidade;
– Dar às mulheres acesso ao planejamento familiar;
– Apoiar ações de suporte social para gestante e recém nascidos de risco.
Em março de 2007 foi publicado um balanço de três anos do Pacto Nacional Pela Redução da Mortalidade Materna e Neonatal, listando entre as principais iniciativas[23]:
– Regulamentação da Lei 11.108/2005, que garante a presença do acompanhante durante o parto, fortalecendo desta forma as ações de humanização preconizadas pela Política Nacional de Humanização-PNH.
– Adesão de 1017 novos municípios ao Programa de Humanização do Pré-natal e Nascimento (PHPN), totalizando 5.211 municípios;
– Instalação de novos Comitês de mortalidade materna representando um aumento de 92% (2002/2006);
– Lançamento da Política de Direitos Sexuais e Reprodutivos, incluindo a ampliação da oferta de métodos anticoncepcionais;
– Regulamentação da Notificação Compulsória dos Casos de Violência Contra Mulheres e Crianças;
– Publicação de normas técnicas para o atendimento humanizado ao abortamento;
– Apoio técnico e financeiro ao projeto para formação de formação de multiplicadoras (es) em gênero, saúde, direitos sexuais e reprodutivos, com abrangência nacional, direcionado aos trabalhadores rurais;
– Inserção de recorte étnico-racial nas ações de atenção obstétrica e neonatal e saúde da mulher (ênfase na atenção à saúde da mulher negra / população indígena);
– Lançamento do Programa Nacional de Atenção aos Portadores de Anemia Falciforme / Programa de Vigilância do Óbito Infantil e Fetal / Ensaio clínico para produção nacional do surfactante / Agenda de Compromisso Saúde Integral da Criança e a Caderneta de Saúde da Criança / Rede Norte-Nordeste de Saúde Perinatal;
– Ampliação da Rede Nacional de Bancos de Leite Humano, totalizando 186 serviços;
– Publicação da Lei 11265/2006, que regulamenta a comercialização de alimentos para lactentes e crianças na primeira infância;
– Certificação de 21 novos hospitais na Iniciativa Hospital Amigo da Criança – IHAC (total de 329 hospitais);
– Apoio a organização de Comitês de Mortalidade Infantil e Fetal / Política Nacional de Atenção Integral à Saúde de Adolescentes e Jovens;
– Lançamento do Programa Saúde e Prevenção nas Escolas com , com política de incentivo em DST e Aids;
– Incrementada a utilização do AZT (Zidovudina) injetável no momento do parto, de 34,8% (2002) das gestantes portadoras de HIV estimadas, para 55,84% em 2006;
– Distribuição de testes rápidos para diagnóstico do HIV em 1142 maternidades para uso em triagem de parturientes não testadas durante o pré-natal;
– Distribuição de AZT injetável e xarope para as maternidades cadastradas, com a finalidade de profilaxia da transmissão vertical do HIV;
– Publicação das portarias para disponibilizar fórmula infantil às crianças verticalmente expostas ao HIV / obrigatoriedade da realização do teste de sífilis para todas as parturientes da rede SUS e notificação compulsória da doença / diretrizes para tratamento;
– Lançamento de campanha na mídia para redução da transmissão vertical do HIV e sífilis / qualificação para profissionais da saúde para alcance da redução do HIV e sífilis;
– Ampliação das Equipes de Saúde da Família, totalizando 26.860 equipes distribuídas em 5.274 municípios, numa cobertura de 95% dos municípios brasileiros;
– Habilitação de 113 Serviços de Atendimento Médico de Urgência – SAMU;
– Implantação de 2.879 novos leitos de UTI, totalizando 23.062 Leitos;
– Incorporação no Pacto do Plano Nacional de Política para as Mulheres, de julho de 2004, priorizando a atenção obstétrica e neonatal qualificada.
Outras iniciativas ocorreram nesse mesmo período, como a promulgação da Lei n. 11340/2006, conhecida por Lei Maria da Penha, que cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher e o lançamento do manual sobre Anticoncepção de Emergência, que visa orientar os profissionais para mudança da qualidade da atenção prestada às mulheres em situação de violência. [24], [25]
O Pacto Nacional pela Redução da Mortalidade Materna e Neonatal recebeu, em 2006, o prêmio Modelo de Mobilização e Diálogo Social para a Promoção dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio da ONU, devido à estratégia de construção compartilhada num processo de co-responsabilidade entre a sociedade civil e a gestão, garantindo a participação social prevista constitucionalmente, onde o protagonismo social foi reconhecido como necessário para o fortalecimento e qualificação da gestão do Sistema Único de Saúde[26].
Nesse sentido, o Pacto Nacional pela Redução da Mortalidade Materna e Neonatal foi pactuado nos três níveis de gestão do governo (municípios, estados e federação), juntamente com a sociedade civil organizada, fazendo parte desse contexto, além das secretarias estaduais e municipais de saúde, o Conselho Nacional de Secretários de Saúde (CONASS), o Conselho Nacional de Secretários Municipais de Saúde (CONASEMS), a Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres (SPM), a Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (SEPPIR) e a Secretaria Especial de Direitos Humanos (SEDH), entre outras instituições governamentais e da sociedade civil.
Fundamentando as discussões sobre o tema Mortalidade Materna e Neonatal, foram realizadas em julho de 2008 a 8ª Reunião Plenária da Comissão Nacional de Monitoramento e Avaliação do Pacto Nacional pela Redução da Mortalidade Materna e Neonatal e a 19ª Reunião da Executiva da Comissão Nacional, ferramentas estrategicamente técnicas e políticas utilizadas para a qualificação e avaliação das ações do Pacto e sua implantação.
A pauta da 8ª Reunião Plenária abrangeu uma avaliação da posição brasileira no cenário internacional, informando a participação do Brasil frente à agenda internacional com relação ao enfrentamento da mortalidade na infância e a melhoria da saúde materna nas Conferências Internacionais realizadas na Inglaterra e África do Sul sobre os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio, em 2008, bem como na 61ª Assembléia Mundial da Saúde da OMS, ocorrida nesse mesmo ano.
Foram também discutidas as estratégias necessárias ao fortalecimento do Pacto e seu impacto na redução da mortalidade materna e neonatal no país, abrangendo seminários de sensibilização e capacitação, articulação para a aprovação de leis e emendas parlamentares para ações consonantes ao Pacto, como a inclusão de novos parceiros para a ampliação da repercussão do Pacto, dentre outros.
Frente às ações de enfrentamento aos índices de mortalidade materna, o Brasil registrou uma queda de quase 50% na taxa de mortalidade materna de 1990 a 2007. De 140 óbitos para cada 100 mil nascidos vivos em 1990, a Razão da Mortalidade Materna passou para 75 mortes em 2007.
De acordo com o ministério, índices como o de partos assistidos por profissionais de saúde qualificados, gestante com acompanhamento pré-natal e uso de contraceptivos cresceram desde 2006. A cobertura pré-natal do Sistema Único de Saúde (SUS) cresceu 1904%, entre 1994 e 2009.
Apesar dos números animadores de redução de morte materna, o atual ministro da Saúde, José Gomes Temporão, a dificuldade em cumprir a meta do milênio, que estabelece uma queda de 75% na razão de mortes maternas até 2015.
A justificativa se dá, principalmente, pelas discrepâncias regionais, já que o Norte e o Nordeste apresentam índices maiores do que o Sul, Sudeste e o Centro-Oeste. Em 2008, por exemplo, a região Nordeste registrou em 543 mortes maternas. Na região Sul o número foi de 189.
Para continuidade dos índices alcançados com relação à diminuição dos níveis de mortalidade materna e neonatal, seguem as deliberações adotadas na Comissão Nacional de Monitoramento e Avaliação do Pacto Nacional pela Redução da Mortalidade Materna e Neonatal, em sua 8ª Reunião Plenária, ajustadas e complementadas pela 19ª Reunião da Comissão Executiva:
– Reafirmar a luta pela alteração do atual quadro de subfinaciamento da saúde pública brasileira cujo orçamento previsto para 46 bilhões de reais não chega a 45% do orçamento necessário e pensado a partir da constituição de 1988 e das necessidades expressas no “Mais Saúde” do SUS.
– Apoiar ações intersetoriais que contemplem a formação e o desenvolvimento dos profissionais da saúde em consonância com as necessidades, princípios e diretrizes do SUS.
– Reafirmar a importância da implementação da proposta da Escola Nacional de Gestores e da Universidade Aberta do SUS – UNASUS, reforçando as responsabilidades compartilhadas nas esferas de gestão.
– Apoiar e participar do processo de discussão da estruturação das redes assistenciais e linhas de cuidado na atenção à saúde da mulher e da criança, considerando as características loco-regionais.
– Realizar 5 seminários/encontros regionais do Pacto Nacional pela Redução da Mortalidade Materna e Neonatal, com apoio dos Comitês para Redução da Mortalidade Materna e Infantil municipais e estaduais.
– Participantes: Representantes dos comitês de mortalidade materna e neonatal; lideranças da sociedade civil; profissionais da saúde em especial da estratégia saúde da família e de agentes comunitários de saúde; representantes de Operadoras de planos de saúde.
– Representantes de Universidades, escolas técnicas do SUS (RET-SUS); e parteiras tradicionais.
– Temas a serem discutidos: (1) Redes Assistenciais; (2) Linhas de cuidado; (3) Regulação e avaliação; (4) Qualificação da gestão; (5) Pactos pela Saúde 2006; (6) Relação com a Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS; (7) Capilaridade dos compromissos do Pacto pela Redução da Mortalidade Materna e Neonatal; entre outros.
– Priorizar a implementação da política de Direitos sexuais e direitos reprodutivos nos Estados (MS), especialmente quanto ao acesso a contraceptivos.
– Realizar o mapeamento quanto à distribuição geográfica e composição dos Comitês de Estudo da Morte Materna e Perinatal e/ou morte infantil/fetal.
– Reafirmar a necessidade da realização do 2º Seminário Nacional de Experiências Bem Sucedidas na Redução da Mortalidade Materna e Infantil/neonatal em São Paulo em 2009, na medida em que a Secretaria Estadual de Saúde e a ANS se colocaram à disposição.
– Apoiar o lançamento e implementação da RDC n°36/2008 ANVISA/Ministério da Saúde.
– Realizar estudos que tratam da humanização da atenção ao parto e ao nascimento, sobre a presença do acompanhante na sala de pré-parto, parto e pós-parto, por meio do estabelecimento de parceria com o CONASEMS e da viabilização de uma pesquisa quantitativa abrangente que abranja a realidade nacional.
– Apoiar o processo de pactuação com os gestores estaduais e municipais para vincular a assistência pré-natal ao local do parto, por meio de centrais de regulação.
– Reafirmar estratégias nacionais e locais direcionadas ao resgate e ao estímulo do parto normal.
– Identificar as dificuldades no processo de distribuição dos anticoncepcionais de emergências e adotar as medidas legais cabíveis.
– Identificar as dificuldades no processo de distribuição dos métodos contraceptivos em geral e adotar medidas de superação, promovendo discussões nos conselhos de saúde.
– Apoiar a continuidade do projeto FIGO/FEBRASGO e a avaliação dos serviços ao atendimento a mulher em situação de violência numa parceria entre CEMICAMP/MS, que tem como meta que todo município com 100.000 habitantes ou mais disponha de serviços que prestam atendimento integral a mulher ou a adolescente que sofre violência sexual.
– Apoiar a realização de pesquisa sobre a mortalidade materna e violência, considerando a intersetorialidade necessária para seu desenvolvimento.
– Reafirmar o reconhecimento dos partos domiciliares realizados por parteiras e assegurar ações de educação permanente e a qualificação das parteiras tradicionais, considerando-as como força de trabalho em saúde pública. Apoiar a formação e consolidação de centros estaduais de referência e colaboração para o planejamento, monitoramento, avaliação e execução de políticas locais de inclusão do parto e nascimento domiciliar no SUS, com garantia de participação de parteiras tradicionais.
– Incorporar à Comissão Nacional de Monitoramento do Pacto Nacional as seguintes instituições/representações, após conversas com dirigentes: Movimento Nacional das Cidadãs PositHIVas, Ministério Público, Programa Nacional de DST/AIDS, Comissão de Cidadania e Reprodução. Convidar para as reuniões ordinárias as representações estaduais do pacto Nacional pela Redução da Mortalidade Materna e Neonatal e/ou representações dos Comitês Estaduais de Mortalidade Materna e Infantil.
– Propor que as instituições que participam da comissão apresentem na próxima reunião um balanço detalhado das estratégias e ações que vêm sendo conduzidas por cada instituição junto aos seus associados e gestores municipais e gestores estaduais.
– Revisar e atualizar as portarias afins ao Pacto Nacional.
– Revisar outras legislações correlatas ao Pacto.
– Apoiar a Regulamentação da Lei 11265 de 04 de janeiro de 2006 referente à NBCAL (Norma Brasileira de Comercialização de Alimentos para Lactentes e Crianças da Primeira Infância).
Apoiar a elaboração e aprovação de legislação para Rede Perinatal Norte/ Nordeste e Rede Amamenta Brasil.
– Propor representação desta comissão na Conferência Internacional de Monitoramento dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio Relativos ao setor Saúde, prevista para novembro de 2008 em Brasília.
– Avaliar as reais necessidades de atendimento das UTIS neonatais em todos os estados do Brasil para próximos 15 anos e preparar um plano nacional que permita atender essas necessidades.
– Registrar a posição desta comissão quanto às ocorrências da Santa Casa da Misericórdia de Belém/PA.
– Apoiar o Estado do Pará reconhecendo a gravidade da situação da atenção neonatal no Brasil com ênfase nas regiões Norte/Nordeste com maior índice de mortalidade neonatal.
– Definir estratégias que contemplem as especificidades regionais (transporte aéreo, ambulâncias), capacitação das várias categorias profissionais envolvidas e elaboração de políticas de fixação de recursos humanos nas regiões mais carentes.
– Enfatizar e apoiar a participação da Rede Norte e Nordeste de Perinatologia.
– Apresentar minuta de projeto da comissão aos parlamentares para que suas emendas orçamentárias possam contemplar demandas sobre fortalecimento dos comitês estaduais e municipais para redução da mortalidade materna e infantil, e outras demandas que favoreçam as políticas de atenção à Saúde da Mulher e da Criança e o fortalecimento do SUS.
– Estimular os comitês estaduais e municipais em buscar financiamentos para projetos que atendam as necessidades identificadas para prevenção da morte materna e infantil.
– Traçar estratégias de diálogo com o Congresso Nacional (Câmara dos Deputados e Senado Federal) visando apoiar a aprovação de leis que promovam direitos sexuais e direitos reprodutivos.
– Promover diálogo público com o Conselho Federal/Regionais de Medicina sobre privacidade e sigilo médico nos casos de abortos inseguros.
– Propor estratégias intersetoriais que contribuam para a diminuição da incidência de gravidez na adolescência.
Dessa forma, a República Federativa em que vivemos é um Estado Democrático de Direito, e por isso tem como fundamento que todo poder emana do povo, o qual pode ser exercido direta ou indiretamente, de modo que a atuação da cidadania deve ser efetiva, incluindo o direito à saúde como um dos principais objetivos à serem alcançados, estando este alencado dentre os direitos humanos.
O alcance de um dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio proposto pela ONU, melhoria da saúde materna, demonstra o estado de direito de um povo e o interesse no desenvolvimento do país.
Neste contexto, surgem os Conselhos de Saúde, instrumentos efetivos de consagração da diretriz constitucional que garante a participação da comunidade no SUS e que tem o direito de agir como órgãos fiscalizadores do direito fundamental à saúde, sendo mais uma das conquistas advinda das mobilizações sociais, assegurada na Constituição de 1988.
A participação de representantes da sociedade civil organizada, dos trabalhadores de saúde, dos prestadores de serviços de saúde e do governo na gestão do SUS marca um avanço importante no processo de democratização e fortalecimento do controle social[27].
Considerações finais
A saúde, incluindo nesse contexto especialmente a saúde materna, encontra respaldo favorável para sua melhoria nos esforços demonstrados pelo Ministério da Saúde, especialmente com relação ao exposto no balanço referente ao triênio 2004/2007 com relação ao Pacto Nacional Pela Redução da Mortalidade Materna e Neonatal. Esforços são observados no sentido de que este venha a ter uma abrangência muito maior que um simples enfrentamento à morbimortalidade materna e neonatal, propondo e implementando ações que garantam a melhoria da qualidade de vida da mulher brasileira e consequentemente a qualidade de sua saúde, incluindo a reprodutiva.
Esses espaços democráticos de gestão foram conquistados pela sociedade e precisam ser fortalecidos para permitir a participação efetiva do cidadão na formulação, monitoramento e fiscalização da execução das políticas de saúde para que o governo exerça suas funções de relevância pública, com eficiência.
A construção de uma gestão participativa, na qual a cidadania exerce um papel ativo no SUS, é um avanço social e tem como pressuposto a participação da população e o apoio institucional aos instrumentos de fortalecimento do controle social, sendo toda a sociedade responsável pela concretização desta conquista.
A reconstrução de um modelo de assistência à mulher pressupõe o respeito a sua individualidade e vontade, seu contexto familiar e vivência cultural. Pode ocorrer dentro ou fora de instituições de saúde, devendo priorizar aspectos preventivos, educativos e relacionais do processo de valorização à saúde. Faz parte, portanto, dos direitos fundamentais, cabendo ao Estado sua proteção e à população brasileira, sua exigibilidade.
Notas:
Informações Sobre os Autores
Lucia Cristina Florentino Pereira da Silva
Coordenadora e Docente do Curso de Obstetrícia da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo, mestre e doutora pela Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo, pós-graduada em Administração Hospitalar e Obstetrícia.
Evelyn Priscila Santinon
Doutora em Ciências pela Universidade de São Paulo (USP), mestre em Direito pela UNISANTOS, MBA em Comércio Internacional pela Universidade de São Paulo (USP) e máster Management Stratégigue et Génie des Organisations – CAEE Internacional Manager pela Universidade em Grenoble, França. Docente da Faculdade de Ciências de Guarulhos e FAPPES.