É desnecessária designação de audiência para retratação na Lei Maria da Penha


Reza a Lei Federal n. 11.340/2006, conhecida como “Lei Maria da Penha”, que cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher:


 “Art. 16. Nas ações penais públicas condicionadas à representação da ofendida de que trata esta Lei, só será admitida a renúncia à representação perante o juiz, em audiência especialmente designada com tal finalidade, antes do recebimento da denúncia e ouvido o Ministério Público”.


Renúncia e retratação são institutos jurídicos que não se confundem em Direito.


Não se pode encontrar na Lei aquilo que o legislador não previu.


Por renúncia à representação deve ser entendida a vontade manifestada pela suposta ofendida de não representar em desfavor de seu apontado agressor nos crimes em que a representação é condição de procedibilidade para a instauração de ação penal. Mas conserva a interessada o direito de representar dentro do semestre decadencial previsto no CPP e no CP.


A retratação significa voltar atrás, recuar, na representação já oferecida. Sendo possível a retratação da retratação também dentro do semestre decadencial legal.


O Art. 16 da Lei n. 11.340/2006, como se observa, não cuidou da retratação, mas, sim, da renúncia à representação.


O processo de interpretação das leis não pode importar em derrogação de suas disposições ou criação de normas fora do devido processo constitucional legislativo.


 Repito o comando legal em comento:


 “Art. 16. Nas ações penais públicas condicionadas à representação da ofendida de que trata esta Lei, só será admitida a renúncia à representação perante o juiz, em audiência especialmente designada com tal finalidade, antes do recebimento da denúncia e ouvido o Ministério Público”.


Uma vez oferecida a representação pela ofendida – momento a partir do qual não se pode mais se falar em renúncia – , assumindo os Núcleos Especializados da Mulher do Ministério Público e da Defensoria Pública o patrocínio dos direitos daquela, regularmente e ao seu tempo deferidas as medidas protetivas de urgência pleiteadas, desejando posteriormente a mesma retratar-se da representação oferecida na esfera policial inocorrente a hipótese legal de designação de audiência especial para oitiva da ofendida.


Diferentemente, jamais tendo a vítima representado em desfavor de seu agressor, nunca tendo sito assistida pelos Núcleos Especializados da Mulher do Ministério Público e da Defensoria Pública para defesa de seus direitos e interesses, a hipótese é induvidosamente de renúncia, a exigir a designação de audiência especial para esclarecimento do entrevero familiar e avaliação do caso.


Enfim, as retratações levadas a efeito pelas vítimas nos Núcleos Especializados da Mulher do Ministério Público e da Defensoria Pública devem importar na imediata extinção e arquivamento do procedimento, determinado pelo Juiz em gabinete, reservando-se a designação de audiência especial apenas para o ato de renúncia, como preconizado pelo Art. 16 da Lei n. 11.340/2006. Tudo, sem prejuízo do poder cautelar do Magistrado se entender por bem, em determinado caso, ouvir a ofendida antes do encerramento do feito, quando houver motivos para suspeitar da espontaneidade e sinceridade desta manifestação, quer se trate de renúncia ou retratação.



Informações Sobre o Autor

Carlos Eduardo Rios do Amaral

Defensor Público do Estado do Espírito Santo


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