Thomas Hobbes versus surgimento do estado

Resumo: O paper busca enfrentar o tema Surgimento do Estado, a fim de permitir uma melhor compreensão jurídico-social, tendo como ponto principal o enfoque proposto por Thomas Hobbes, em sua obra Leviatã, por considerar instrumento de validade a análise sobre o Estado uma vez que, os homens tem dificuldades para viver socialmente uns para com os outros, pois os pactos sem a espada não passam de palavras, sem força para dar qualquer segurança a ninguém.


Palavras-chave: Estado; fundamentos do poder e leis da natureza.


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Abstract: The paper seeks to address the issue Rise of the State, to enable a better understanding of legal and social, with the main point of the approach proposed by Thomas Hobbes in his Leviathan, considering the instrument validity analysis of the state since men have difficulty living socially to each other, because the covenants without the sword are but words, no power to give any security to anyone.


Keywords: State; foundations of power and laws of nature.


Thomas Hobbes[1] em sua obra Leviatã[2], explana sobre a natureza humana e sobre a necessidade de governos e sociedades. O autor ainda demonstra preocupação no que concerne a formação do Estado que segundo ele seria este o motivo principal para os homens saírem de sua condição de guerra. Para Hobbes, ”se não houver um poder visível que os mantenha em atitude de respeito, forçando-os, por temor à punição, a cumprir seus pactos e a observar as leis naturais”[3] ou seja, ”sem a espada, os pactos não passam de palavras sem força, que não dão a mínima segurança a ninguém”.[4]


Assim, o autor nos leva a crer que as leis da natureza são aceitas quando os homens sentem vontade pessoal de respeitá-las, ”se não for instituído um poder considerável para garantir sua segurança, o homem, para proteger-se dos outros, confiará, e poderá legitimamente confiar, apenas em sua própria força e capacidade”.[5]Existe uma dificuldade dos homens conviverem harmoniosamente uns com os outros, sem outro rumo senão suas vontades pessoais ou benéficas de comum acordo. É preciso que se crie um poder o qual os mantenha em respeito mútuo. Assim, e conforme ensina HOBBES[6]:


“Designar um homem ou uma assembléia de homens para representar a todos, considerando-se e reconhecendo-se cada membro da multidão como autor de todos os atos que aquele que representa sua pessoa praticar, em tudo o que se ferefe à paz e à segurança comuns, submetendo, assim, suas vontades à vontade do representante, e seus julgamentos a seu julgamento.”


Diante de tal afirmação, a multidão assim unida numa só pessoa passa a chamar-se Estado (em latim, Civitas)[7] conferindo-lhe poder e força. O argumento de Thomas Hobbes sobre o nascimento do Estado recai sobre toda multidão, os quais se encontram entristecidos e com medo de perder suas vidas de forma brutal, aceitando-se assim, unir-se uns aos outros estabelecendo contrato recíproco para livrar-se à condição desumana que vivem.


Importante as considerações do professor REALE[8]:


“A soberania é uma espécie de fenômeno genérico do poder. Uma forma histórica do poder que apresenta configurações especialíssimas que se não  encontram senão em esboços nos corpos políticos antigos e medievos.”


Vale lembrar que a soberania aparece por intermédio da constituição de um conjunto de normas jurídicas, almejando estabelecer as pautas fundamentais do comportamento humano. Para o francês Jean Bodin (1530-1596), no livro Os Seis Livros da República (1576), sustenta a tese de que a monarquia francesa é de origem hereditária. O Rei não está sujeito a condições postas pelo povo. Todo o poder do Estado pertence ao Rei e não pode ser partilhado com mais ninguém (clero, nobreza ou povo). De acordo com Bodin (1986): “soberania refere-se à entidade que não conhece superior na ordem externa nem igual na ordem interna”.


Hobbes complementa: ”os homens que escolhem seu soberano fazem-no por temor mútuo, e não daquele a quem instituem, mas, no caso do domínio por aquisição, submetem-se àquele a quem temem”.[9]


No tocante as várias espécies de governo, o autor as diferencia pelo soberano.  Assevera HOBBES[10]:


”Monarquia quando o governo tem como representante um só homem; a democracia ou governo popular, se a representação é feita por uma assembléia de todos os que se uniram; e a aristrocacia, nos casos em que a assembléia é constituída por apenas uma parte dos homens.”


Hobbes afirma ainda que ”não pode haver outras espécies de governo, porque o poder soberano total (que já mostrei ser indivisível) precisa pertencer a um ou mais homens ou a todos”.[11] Assim, ele reconhece que os que estão insatisfeitos com a forma de monarquia passam a chamar de tirania, e os que não estão satisfeitos com o regime de aristrocacia chamam a de oligarquia. Hobbes elucida, os que se sentem prejudicados por uma democracia chamam-na (isto é, inexistência de governo), embora, creio eu, ninguém pense que a ausência de governo seja uma nova espécie de governo.[12]


Portanto, a diferença que recai sobre as três diferentes espécies de governo não reside em uma distinção de poder, mas em uma distinção de capacidade visando a garantia da paz e à segurança do povo, finalidade a qual foram instituídas.


Segundo Hobbes, ”quanto mais próximos estiverem o interesse público e o interesse pessoal, mais se beneficiará o interesse público”[13] ou seja, na maioria dos casos, onde existir conflito entre o interesse público e o interesse pessoal, o soberano escolherá o interesse pessoal, ”pois em geral as paixões humanas são mais fortes que a razão”.[14]


Na forma de governo de monarquia, Hobbes é claro ao afirmar que ”o interesse pessoal é o mesmo que o interesse público. Vejamos adiante o que ele afirma: ”nenhum rei pode ser rico ou glorioso ou ter seguranças se seus súditos são pobres, desprezíveis ou demasiado fracos, por carência ou dissensão, para manter uma guerra civil contra seus inimigos”[15] e ”um monarca não pode discordar de si mesmo, movido pela inveja ou pelo interesse, entretanto, isso é possível numa assembléia, e em grau capaz de provocar uma guerra civil”.[16]


Hobbes demonstra preocupação com a manutenção da paz entre os homens afirmando ser necessária criação de propostas para uma eternidade artificial, ”almejando conseguir a paz, e por meio dela sua própria conservação, criaram um homem artificial chamado Estado”.[17] Esta eternidade artificial para Hobbes é entendida como direito de sucessão, sem a qual os homens que são governados por uma assembléia ou por um soberano retornarão à vivência de guerra em cada geração. Mister lembrar que ”quando a decisão da sucessão não estiver nas mãos do próprio soberano, a forma de governo não será perfeita”[18]


Hobbes trás como debate que em nenhuma forma de Estado foi estabelecido regras com fulcro a regular ações e palavras dos homens e também ações não previstas em lei, algo que pra ele seria impossível uma vez que ”os homens têm a liberdade de fazer o que for sugerido por sua razão e que estiver de acordo com seu interesse”.[19] Olhando sobre outra ótica para compreender a liberdade como a maneira de isenção das leis, ao rejeitá-los, os homens ficam desprotegidos caso não se tenha ”uma espada nas mãos de um homem ou homens encarregados de fazê-lo cumprir”.[20]


Nas questões pertinentes a propriedade, Hobbes entende ser de responsabilidade do poder do soberano em todas as espécies de Estado a sua nutrição e procriação. Para Hobbes a ausência do Estado é sinônimo de guerra perpétua de todos contra todos.


Assim, o início da propriedade é uma responsabilidade do Estado sendo apenas realizada por seu soberano como assim também é para o cumprimento de suas leis. Hobbes é claro ao afirmar que ”leis civis são aquelas que os homens são obrigados a respeitar, não por serem membros deste ou daquele Estado em particular, mas por serem membros de um Estado”.[21] Para Hobbes, ”a lei civil contêm-se uma na outra, e sua extensão é idêntica”[22] ou seja, as leis de natureza que tem princípio de justiça não são tidas propriamente como leis, mas como obediência estabelecendo assim um elo de paz.


Vejamos, ”as leis existem desde o momento em que o Estado é constituído, não antes”[23] assim, com a criação do Estado as leis da natureza passam a estar sobre as ordens do Estado e também constituindo como leis civis, ”pois é o poder soberano que obriga os homens a obedecê-lo”[24]. Hobbes é brilhante quando entende que, a lei civil e a lei natural não são de diferentes espécies, mas diferentes partes da lei, sendo a lei escrita a lei civil e a não escrita, a natural; ”a finalidade das leis não é outra senão essa restrição, sem a qual não será possível haver paz”[25].


Na compreensão de Hobbes, o povo tende a descumprir as leis para buscar seguir um desconhecido cujas virtudes e leis se desconhece. A finalidade do soberano consiste ”no fim para o qual foi investido com o soberano poder, que não é outro senão o de obter a segurança do povo”[26].


Com o olhar atendo, Thomas Hobbes deixa claro que sua argumentação sobre o nascimento do Estado surge por uma motivação básica advinda do próprio homem sendo ele o temor da morte violenta. Tal violência não tem ligação com religiosidade, uma vez que provém de parte de alguns seres humanos que se enfrentam acabando com suas vidas que é o valor mais significante da natureza.


A teoria de Hobbes chamada de hobbesiana[27], entende que o temor a morte violenta é requisito básico a lei natureza, pois todos os seres humanos procuram sua segurança evitando a morte violenta. É com fulcro neste contexto que Thomas Hobbes desenvolve sua argumentação sobre o nascimento do Estado.


Conclui-se que Hobbes procura utilizar o poder político como instrumento de garantia buscando-se a paz e o bem estar social entre os homens, estabelecendo uma forma que se torne eficaz à concentração de poder nas mãos de um único homem que é o soberano. É preciso lembrar ainda que na visão do autor, a ordem natural das coisas é trocada por uma ordem que o chama de artificial, almejando um único fim que é o desejo por uma vida mais segura.


Saliento que as contribuições de Thomas Hobbes nos faz apreender o valor de suas considerações não apenas para um processo de desenvolvimento, mas também para os acontecimentos políticos em nossa atual realidade.


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Referências

BODIN, Jean. Les Six Livres de la République. Reimpressão da 12a edição (1593). Paris, Librarie Artheme Fayard, 1986.

Disponível em: <www.arcos.org.br/cursos/teoria-politica-moderna/thomas-bobbes/o-que-e-leviata/>. Acesso em: 28.11.2011.

HOBBES, Thomas. Leviatã. Ed. Martin Claret, São Paulo, 2009.

REALE, Miguel. Teoria do direito e do Estado. São Paulo, Saraiva, 2003.

YAMAUTI, Nilson Nobuaki. A teoria política hobbesiana. Disponível em: <www.urutagua.uem.br//ru02_politica.htm>. Acesso em: 01.12.2011.

 

Notas:

[1] HOBBES, Thomas. Leviatã. Ed. Martin Claret, São Paulo, 2009.

[2] Disponível em: <www.arcos.org.br/cursos/teoria-politica-moderna/thomas-bobbes/o-que-e-leviata/>. Acesso em: 01.12.2011. Leviatã é nome que se atribui a um ”monstro marinho” citado na bílbia em Jó 3.8 e Jó 40.25 (tradução: Bílbia de Jerusalém). ”Que a almadiçoem o dia, os entendidos em conjurar Leviatã!” (Jó 3.8). (…) Suas origens remontam à mitologia fenícia em que simbolizava o caos e possuía a imagem de um crocodilo. Na crença judaíca, o Leviatã (também chamado de dragão em Ezequiel 29.3 e de crocodilo em Ezequiel 32.2) simboliza um poder contrário ao de Deus que, segundo o cristianismo, deverá sucumbir no Juízo Final. Em Jó, mais especificamente no capítulo 41, encotramos uma descrição do Leviatã como um monstro terrível a ponto de ”ninguém poder desafiá-lo e ficar ileso”, irresitível e muito poderoso. No livro ”O Leviatã” de Thomas Hobbes, o autor descreve um Estado que deteria consigo todo o poder da sociedade, uma vez que a ele seria transferido o poder de todos os indivíduos com o fim de ser-lhes garantida a paz e a defesa comum. A partir de então, todos lhe tornam súditos e ele o soberano, representante da vontade do povo, detentor da autoridade delegada pelos homens. Sendo assim, vê-se um paralelo claramente traçado pelo autor e a figura bílbica do Leviatã. O Estado seria, então, um poder irresistível, mas com o fim de salvaguardar os interesses da população que se submete a ele.

[3] HOBBES, Op. cit., p.123.

[4] HOBBES, Op. cit., p.123.

[5] HOBBES, Op. cit., p.123.

[6] HOBBES, Op. cit., p.126.

[7] HOBBES, Op. cit., p.126.

[8] REALE, Miguel. Teoria do direito e do Estado. São Paulo, Saraiva, 2003. p. 74.

[9] HOBBES, Op. cit., p. 144.

[10] HOBBES, Op. cit., p. 135.

[11] HOBBES, Op. cit., p. 135.

[12] HOBBES, Op. cit., p. 135.

[13] HOBBES, Op. cit., p. 137.

[14] HOBBES, Op. cit., p. 137.

[15] HOBBES, Op. cit., p. 137.

[16] BOBBES, Op. cit., p. 137.

[17] HOBBES, Op. cit., p. 153.

[18] HOBBES, Op. cit., p. 141.

[19] HOBBES, Op. cit., p. 153.

[20] HOBBES, Op. cit., p. 154.

[21] HOBBES, Op. cit., p. 188.

[22] HOBBES, Op. cit., p. 189.

[23] HOBBES, Op. cit., p. 189.

[24] HOBBES, Op. cit., p. 190.

[25] HOBBES, Op. cit., p. 190.

[26] HOBBES, Op. cit., p. 234.

[27] YAMAUTI, Nilson Nobuaki. A teoria política hobbesiana. Disponível em: <www.urutagua.uem.br//ru02_politica.htm>. Acesso em: 01.12.2011. As doutrinas políticas existentes não estavam solucionando o problema do entendimento entre os homens, ou seja, garantindo a efetividade de sua convivência pacífica em sociedade. Thomas Hobbes constatava as devastações produzidas pela guerra civil na Inglaterra e concluía que as lutas fratricidas resultavam de um poder político que não era reconhecido como legítimo por todos. o filósofo inglês acreditou que a solução seria aplicar o método da Matemática que propicia conclusões certas e indiscutíveis ao contrário das ciências morais que produzem apenas controvérsias infindáveis. Partiu da suposição de que a formulação de uma teoria política baseada em fundamentos lógico-racionais poderia estabelecer a paz social. O autor de O Leviatã irá, portanto, aplicar o método lógico-dedutivo a fim de demontrar a necessidade de um poder absoluto para eliminar os conflitos existentes. Hobbes inicia sua argumentação com a premissa de que no estado de natureza todos os homens são movidos pelo instinto de conservação. A luta pela sobrevivência instaura a guerra de todos contra todos. O medo da morte violenta associado à consciência de que é mais vantajoso viver no estado civil (instinto de conservação +razão produz no homem o desejo de viver em paz. Desta forma, de livre vontade, visando apenas o interesse próprio de conservação, os homens chegam, então, a um acordo. Todos irão renunciar aos seus direitos naturais e submeter-se integralmente a um poder soberano. A função do soberano é assegurar que todos respeitem o contrato social e, dessa forma, garantir a vontade de todos que é a paz e a segurança individual. Para desempenhar bem essa função, o soberano deve exercer um poder absoluto, sem estar subordinado a ninguém; e nem mesmo a uma Carta Magna. Só dessa fomra seria possível subjugar os interesses particulares, o individualismo cada vez mais acirrado presente na sociedade de relações mercantilizadas, o qual colocava em xeque o interesse geral, isto é a convivência pacífica dos homens. Através deste raciocínio lógico-dedutivo, desta construção do pensamento, chega-se à justificação do poder absoluto, do poder inquestionável. O poder soberano é legítimo, enfim, porque : a) é constituído a partir da vontade livre de indivíduos livres e iguais; e de comum acordo, ou seja, do consenso. b) assegura o interesse de todos que é viver em paz, com segurança, livre do medo da morte repentina e violenta. Se o poder soberano não conseguir realizar o interesse de todos, isto é, a abediência de todos ao contrato social, pode vir a ser deposto por uma rebelião. Concluir-se-á, nesse caso, que o soberano não era legítimo.


Informações Sobre o Autor

Thiago Alves Miranda

Mestrando em Constitucionalismo e Democracia pela Faculdade de Direito do Sul de Minas (FDSM/MG). Possui gradução em Direito pela Unisulbahia Faculdades Integradas, Especialista em Direito da Tecnologia da Informação pela Universidade Gama Filho. Possui Curso de Extensão em Direito da Tecnologia da Informação pela FGV – Fundação Getúlio Vargas. Membro do (IBDH) Instituto Brasileiro de Direitos Humanos. Palestrante e Conferencista.


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