Educação em Direitos Humanos: Pedagogia do Acesso à Justiça

EDUCATION ON HUMAN RIGHTS: PEDAGOGY OF ACCESS TO JUSTICE

MENDONÇA, F. R.¹, CHALITA, F. D.², COSTA, A. L. B.³

¹ ² ³ Centro Universitário Instituto de Educação Superior de Brasília – IESB

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RESUMO: O artigo apresentado tem o enfoque de levantamento bibliográfico.  Nota-se que a educação em direitos humanos que está garantida no currículo da educação básica através da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional apresenta falhas na prática do ensino escolar. A Constituição da República Federativa do Brasil e os Parâmetros Curriculares Nacionais são elementos de sustentação para uma educação voltada para formação do exercício da cidadania e da dignidade da pessoa humana. Diante da crise política e de valores que assombra o país, a temática surge na necessidade de compreender a educação em sua formalidade e informalidade, enfocando a Educação dos Direitos Humanos sob a ótica da cidadania, dos Direitos Humanos e da educação, em uma análise que busque analisar a prática escolar. Os objetivos do trabalho referem-se a analisar a educação em direitos humanos e avaliar a sua prática na atualidade, descrever as principais características do papel da educação e o acesso a justiça. A educação não pode se restringir apenas em ministrar conteúdos, mas precisa incluir o ensino de Direitos Humanos como forma de garantir a formação integral do cidadão.

Palavras-chave: Educação, Direitos Humanos, Legislação

 

ABSTRACT: This article presents the presentations of seminars and researches of the Professional Masters in Social Rights and Reinvestment Processes, in the approach of bibliographical survey. The guaranteed human rights education in the basic education curriculum through the National Education Guidelines and Bases Law presents flaws in the practice of school education. The Constitution of the Federative Republic of Brazil and the National Curricular Parameters are elements of support for an education aimed at training the exercise of citizenship and the dignity of the human person. Faced with the political crisis and values ​​that haunts the country, the theme arises from the need to understand education in its formality and informality.

Keywords: Education, Human rights, Legislation.

 

Sumário: Introdução. 1. Da titularidade ao direito à educação. 2. Dos princípios aos fins da educação. 2.1 Educação em Direitos Humanos. 2.2 O currículo escolar e o acesso à justiça. 3. Conclusão. 4. Referências.

 

 

 INTRODUÇÃO

O estudo surge da necessidade de se fazer uma análise da legislação brasileira sobre os direitos humanos, na perspectiva do acesso à justiça através da educação. A temática abordada pode ser dividida em dois pontos: a busca por normatizações existentes e a prática escolar. A temática é fundamental para que o olhar jurídico educacional seja a égide para a garantia do direito fundamental à educação.

Objetiva-se analisar a educação em direitos humanos na lei de Diretrizes da Educação Brasileira (LDB) n.º 9.394/96, contextualizando-a com a teoria da educação. As especificidades objetivas tratam de associar os fundamentos da República Federativa do Brasil ao direito à educação, bem como, os seus objetivos fundamentais e os princípios nas relações internacionais; analisar a educação em seu aspecto constitucional social como fonte de inclusão dos direitos humanos. A produção do estudo será organizada através de uma pesquisa qualitativa e exploratória com levantamento bibliográfico.

 

  1. DA TITULARIDADE AO DIREITO À EDUCAÇÃO

A educação é um processo formativo que é promovido pela família, pela escola, pela sociedade e garantido pelo próprio Estado. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) n.º 9.394/96 disciplinou a educação no artigo 1º: “A educação abrange os processos formativos que se desenvolvem na vida familiar, na convivência humana, no trabalho, nas instituições de ensino e pesquisa, nos movimentos sociais e organizações da sociedade civil e nas manifestações culturais”.

Observa-se que a palavra educação possui um sentido amplo, sendo enfocada  em três aspectos: informal, formal e não-formal.

A educação informal se evidencia por sua realização na família, pois é no meio familiar que o ocorre a primeira transmissão de cultura e valores com os quais a criança tem contato. A aprendizagem acontece na própria relação familiar, na relação entre amigos e nas diversas formas de comunicação. Portanto, a criança aprende (a cada momento espontâneo) a partir de suas vivências. Na leitura do artigo referenciado, detecta-se a presença da educação formal que apresenta características próprias, ofertada em instituições próprias para o processo formativo da educação escolar, com intencionalidade educativa e recursos metodológicos adequados para sua concretização. Já a educação não-formal se assemelha a própria educação formal, porém se diverge por não ser oferecida em estabelecimentos próprios. A mesma apresenta intencionalidade educativa e até mesmo de recursos metodológicos, a aprendizagem ocorre através de uma prática social com trabalhos coletivos nas igrejas, nas comunidades, nos movimentos sociais, nos grupos sociais oferecendo a alfabetização de adultos e, também, nas organizações não-governamentais (ONGs).

A Constituição Federal de 1988 (CF) inseriu a educação no rol dos direitos fundamentais enquanto direitos sociais, porém apenas a partir do artigo 205, a educação terá tratamento detalhado. Nesse aspecto normativo, é essencial compreender os elementos constitucionais que substanciam a educação como direito social de acordo com o artigo 6º da CF, a cidadania e a dignidade da pessoa humana.

A Constituição Federal em seu artigo 1º determina que a República Federativa do Brasil é constituída em Estado Democrático de Direito com os fundamentos da cidadania e da dignidade da pessoa humana, assim escrito: “Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: II – a cidadania; III – dignidade da pessoa humana(grifo nosso)”.

Iniciando pela extensão da palavra cidadania no texto constitucional, faz-se lembrar que o termo é utilizado no inciso LXXI do artigo 5º da CF – “conceder-se-á mandado de injunção sempre que a falta de norma regulamentadora torne inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania”. Também o inciso LXXIII do referido artigo referencia a palavra cidadão como parte legitima para propor ação popular. Já o inciso LXXVII estabelece gratuidade dos atos necessários para o exercício da cidadania. No artigo 22 e inciso XIII referente à competência de legislar da União sobre “nacionalidade, cidadania e naturalização”.

É preciso que se conheça a diversidade do uso da palavra cidadania na Constituição para a compreensão da educação no aspecto social. Evidentemente que este estudo se atentará ao inciso II do artigo 1º, pois com as fundamentações dispostas, entende-se que o cidadão é protegido por uma positivação que o inclui na sociedade para exercer seus direitos civis, políticos e sociais, ou seja, tem vínculo jurídico com o Estado.

A cidadania é uma das finalidades da educação brasileira, tendo base seu fundamento na República Federativa do Brasil. Sendo assim, apresenta-se a definição de educação para compreensão do direito à educação. Segundo José de Celso Mello Filho (1986, p. 533):

“O conceito de educação é mias compreensivo e abrangente que o da mera instrução. A educação objetiva proporcionar a formação necessária ao desenvolvimento das aptidões, das potencialidades e da personalidade do educando. O processo educacional tem por meta: a) qualificar o educando para o trabalho, e b) prepará-lo para o exercício da cidadania. O acesso à educação é uma das formas de realização concreta do ideal democrático”.

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Ampliando o conceito de educação, principalmente no viés jurídico, Anísio Teixeira (1996, p. 60) discorre sobre a educação como interesse público e promovido pela lei:

O direito à educação faz-se um direito de todos, porque a educação já não é um processo de especialização de alguns para certas funções na sociedade, mas a formação de cada um e de todos para a sua contribuição à sociedade integrada e nacional, que se está constituindo com a modificação do tipo de trabalho e do tipo de relações humanas.

Contudo, não são apenas a cidadania um dos elementos iniciais norteadores deste estudo. É necessário pensar na educação como elemento inclusivo dos indivíduos na sociedade democrática em que os direitos das minorias são respeitados. Para isso, recorre-se ao princípio da dignidade da pessoa humana para pensar na educação numa perspectiva social.

A educação brasileira é um direito social, garantida tanto na norma constitucional quanto na teoria da dignidade da pessoa humana. Sobre o assunto, o professor Celso Fiorillo (2004, p.60) leciona:

“Para que a pessoa humana possa ter dignidade (CF, art. 1º, III) necessita que lhe sejam assegurados os direitos sociais previstos no art. 6º da Carta Magna (educação, saúde, trabalho, lazer, segurança, previdência social, proteção à maternidade e à infância e assistência aos desamparados)”. (grifo nosso).

O princípio da dignidade da pessoa humana que é um dos fundamentos da República brasileira, disposto no artigo 1º e inciso III da Constituição, garante aos indivíduos direitos e deveres que devem ser respeitados pelo Estado e pela sociedade, obedecendo assim, os direitos dos humanos. Contribuindo, cita-se Ingo Wolfgang Sarlet: (2001, p.60): “Temos por dignidade da pessoa humana a qualidade intrínseca e distintiva de cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade”.     Para melhor entendimento, principalmente considerando-se o princípio da dignidade em âmbito internacional, Flávia Piovesan afirma (2004, p. 92):

“É no valor da dignidade da pessoa humana que a ordem jurídica encontra seu próprio sentido, sendo seu ponto de partida e seu ponto de chegada, na tarefa de interpretação normativa. Consagra-se, assim, dignidade da pessoa humana como verdadeiro super princípio a orientar o Direito Internacional e o Interno”.

Pelo que já foi exposto, nota-se que a educação é uma função operacional do Estado, que não exclui quem quer que seja, pois os elementos legais da cidadania e da dignidade da pessoa humana são princípios para uma educação social.

 

  1. DOS PRINCÍPIOS AOS FINS DA EDUCAÇÃO

A educação brasileira é estruturada no aspecto teórico e no aspecto normativo. O aspecto teórico inicia-se ao já apresentado na educação formal, informal e não-formal. Quanto ao aspecto normativo, considera-se o artigo 2º da LDB: “A educação, dever da família e do Estado, inspirada nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”.

Percebe-se que os princípios norteiam a organização da educação, já as finalidades objetivam a organização e o funcionamento do processo educativo. O Estado cumpre a função de oferecer o direito fundamental à educação promovendo o bem de todos e construindo uma sociedade livre, justa e solidária, já positivado no artigo 3º, inciso I e IV da Constituição de 1988. A família cumpre o dever de matricular os filhos na educação básica, educação infantil em pré-escola, a partir dos 4 (quatro) anos de idade, norma imposta pela lei n.º 9.394/96 (LDB).

Os pais ou responsáveis que se omitirem ao direito educacional das crianças, o Estado garante punibilidade aos mesmos em caso do abandono intelectual como versa o artigo 246 do Código Penal brasileiro, lei n.º 2.848/40: “Deixar, sem justa causa, de prover à instrução primária de filho em idade escolar: Pena – detenção de 15 (quinze) dias a 1 (um) mês, ou multa”. A relação família e escola são fundamentais para o desenvolvimento da criança, essas que são protegidas pelo Estado Democrático de Direito.

A educação de acordo com a LDB apresenta três finalidades: o pleno desenvolvimento do educando, preparo para o exercício da cidadania e qualificação para o trabalho.

O pleno desenvolvimento do educando é a formação cognitiva em processo de construção de conhecimentos que são essenciais para aprendizagem do aluno. É a formação da criança para a vida.  No preparo para o exercício da cidadania fica evidente a presença de uma educação que consolida a aprendizagem em uma formação de valores democráticos e culturais para que saiba o aluno dos seus direitos e deveres no exercício de sua cidadania. Já a qualificação para o trabalho está inserida no universo escolar através das disciplinas, conteúdos programáticos e dos projetos pedagógicos, ou seja, é a formação do aluno para o mundo do trabalho que visa despertar no educando um olhar crítico para as transformações sociais. Infere-se que a legislação educacional é norteada para uma educação de cunho social, uma educação para a vida em valores humanos. Os princípios e as finalidades da educação caminham juntos aos princípios e fundamentos da Constituição cidadã já citados neste texto. A educação sob o viés normativo apresentado é uma prática social. O autor Brandão (1995, p. 73-74) discorre:

“A educação é uma prática social (como a saúde, a comunicação, o serviço militar) cujo fim é o desenvolvimento do que na pessoa humana pode ser aprendido entre os tipos de saber existentes em uma cultura, para formação de sujeitos, de acordo com as necessidades e exigências de sua sociedade, em um momento da história de seu próprio desenvolvimento”.

De fato, entende-se com a citação que a educação constitui uma exigência da própria formação do ser humano, ou seja, a educação é um direito humano.

 

2.1 EDUCAÇÃO EM DIREITOS HUMANOS

A educação em direitos humanos é tema centralizador dos princípios do ensino e da aprendizagem da educação nacional, desde o ensino infantil ao ensino superior. É a valorização da vida de forma a respeitar o outro como elemento de direito e deveres na sociedade. De encontro ao entendimento, o artigo 3º e inciso IV da LDB inauguram uma compreensão jurídica de princípios educacionais: “O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios: IV – respeito à liberdade e apreço à tolerância”. Diante desta compreensão, o autor Moaci (2017, p.65) colabora:

“O respeito à liberdade e o apreço à tolerância são manifestações avançadas da evolução civilizatória e democrática. O ensino torna-se, assim, um veículo privilegiado de aprofundamento de uma pedagogia dos direitos humanos e caminho para aprendizagem de uma convivência democrática tranqüila entre as pessoas. O tema liberdade retorna como princípio de organização do espaço escolar, agora, no sentido do reconhecimento e do respeito à alteridade”. (grifo nosso)

Inicialmente, compreendem-se como direitos humanos, leis, costumes, doutrinas, jurisprudências, princípios, ou seja, um conjunto de direitos do ser humano. Ou seja, direitos esses conquistados através de um processo histórico de reivindicações sociais ao longo da humanidade.  O autor Norberto Boobio (2004, p.32) discorre sobre o assunto:

“Sabemos hoje que também os direitos ditos humanos são o produto não da natureza, mas da civilização humana; enquanto direitos históricos, eles são mutáveis, ou seja, suscetíveis de transformação e de ampliação. […] Como todos sabem, o desenvolvimento dos direitos do homem passou por três fases: num primeiro momento, afirmaram-se os direitos de liberdade, […] num segundo momento, foram promulgados os direitos políticos, […] finalmente, foram proclamados os direitos sociais, que expressam o amadurecimento de novas exigências – podemos dizer de novos valores”.

A educação em direitos humanos oferece aos alunos uma formação cidadã para que não aceitem passivamente as informações impostas sem que façam uma reflexão crítica. Tornando-os ativamente participativos das ações do Estado na sociedade civil, abrindo caminhos a fim de direcionar o ensino e a aprendizagem a partir do respeito aos direitos e as obrigações de cumprir deveres de forma a garantir a liberdade, a justiça e a igualdade. Conforme já disposto no terceiro Programa Nacional de Direitos Humanos – PNDH 3 (2006, p. 185):

“A educação e a cultura em Direitos Humanos visam à formação de nova mentalidade coletiva para o exercício da solidariedade, do respeito às diversidades e da tolerância. Como processo sistemático e multidimensional que orienta a formação do sujeito de direitos, seu objetivo é combater o preconceito, a discriminação e a violência, promovendo a adoção de novos valores de liberdade, justiça e igualdade”.

A sociedade brasileira passa por um período de fragilidade das instituições democráticas e a escola é a instância fortalecedora dos valores que fundamentam a sociedade. Sendo assim, o parágrafo 9º do artigo 26 da lei n.º 9.394/96 – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional afirma: “§9o Conteúdos relativos aos direitos humanos e à prevenção de todas as formas de violência contra a criança e o adolescente serão incluídos, como temas transversais, nos currículos escolares de que trata o caput deste artigo”.

A educação é um dos direitos sociais em que o estudo dos direitos humanos é fomentado com maior eficácia, pois os direitos são inerentes a dignidade da pessoa humana e forma o ser humano para o exercício pleno de sua cidadania. Dessa forma, a educação consolida com os direitos humanos uma educação em que o aluno seja inserido no processo educativo crítico, para que o mesmo seja capaz de se manifestar nas contradições do mundo político e capitalista.A educação em direitos humanos instrui para Costa e Reis (2009, p.70).

“O fortalecimento do respeito aos direitos e liberdades fundamentais do ser humano; ao pleno desenvolvimento da pessoa humana e sua dignidade; a prática da tolerância, do respeito à diversidade de gênero e cultura, da amizade entre todas as nações, povos indígenas e grupos raciais, étnicos e religiosos; e a possibilidade de todas as pessoas participarem efetivamente de uma sociedade livre”.

De fato, é uma educação que não apenas vise um ensino conteudista, a fim de preparar o aluno para o mercado de trabalho competitivo, mas sim de prepará-lo para a vida, com respeito ao próximo e com tolerância à diversidade. A aprendizagem acontece na sala de aula e o professor é o elemento direcionador do processo de ensino. O ensino de direitos humanos deve se basear em conteúdo reflexivo que leve os alunos a questionar as aflições da população perante o mundo globalizado e preparado para serem agentes inclusivos de transformação social.

 

2.2 O CURRÍCULO ESCOLAR E O ACESSO À JUSTIÇA

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O processo de ensinar e aprender nas escolas brasileiras se orienta através do currículo escolar com base nos valores fundamentais à vida humana. Para inserir o aluno ativamente na sociedade globalizada a fim de prepará-lo para o mundo trabalho, é necessário formá-lo para enfrentar as contradições presentes na modernidade. Assim sendo, o currículo das escolas deve apresentar, seja de forma transversal ou através de disciplina única o conteúdo voltado ao ensino jurídico. Caso seja transversal, os conteúdos permearão todas as disciplinas, caso seja através de disciplina única, o conteúdo será ministrado em apenas uma disciplina.

O autor Silva (2006, p. 16) colabora em uma abordagem constitucional sobre a relação entre educação e o acesso à justiça:

“É que um dos obstáculos sociais que impedem o acesso à Justiça está também na desinformação da massa da população a respeito de seus direitos. Isso é uma questão de educação, que promova o pleno desenvolvimento da pessoa e a prepare para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho, como determina a Constituição (Art. 205), mas que a prática não consegue efetiva”.

Na segunda citação o autor Cappelletti (1988, p. 8) contribui no reconhecimento da expressão “acesso à justiça”:

“A expressão “acesso à justiça” é reconhecidamente de difícil definição, mas serve para determinar duas finalidades básicas do sistema jurídico – o sistema pela qual as pessoas podem reivindicar seus direitos e/ou resolver seus litígios sob os auspícios do Estado. Primeiro, o sistema deve ser igualmente acessível a todos; segundo, ele deve produzir resultados que sejam individual e socialmente justos”.

As citações servem de base fundamental para o ensino jurídico nas escolas de educação básica, pois é nas instituições de ensino que a formalidade do educar em direitos humanos se torna essencial para formar alunos capazes de exercerem sua cidadania e também para reivindicar seus direitos. O cidadão ao desconhecer os seus direitos deixa de recorrer à justiça, principalmente os que têm menor poder aquisitivo. Nesse sentido, Marcos Henrique Caetano do Nascimento, no artigo “A ampliação do acesso à justiça e da cidadania por meio da educação em direitos promovida pela defensoria pública” cita (2013, p. 14):

“Como explica Maria Teresa AinaSadek,  apenas 30% dos indivíduos envolvidos em disputas procuram a justiça estatal, existindo uma clara relação entre índice de desenvolvimento humano e litigância, ou seja, é acentuadamente maior a utilização do Judiciário nas regiões que apresentam índices mais altos de desenvolvimento humano. Segundo a autora, as razões para a baixa utilização do Judiciário são inúmeras, indo desde a descrença na lei e nas instituições até a banalização da violência. Por outro lado, ainda que em menor grau do que no passado, é baixa a conscientização da população tanto sobre os seus direitos, como sobre os canais institucionais disponíveis para a solução de seus litígios”.

Observa-se a importância de se incluir no currículo da educação básica conteúdos de forma objetiva sobre os direitos humanos, pois é necessário para o exercício da cidadania e para contribuição de uma sociedade que luta por justiça social. Convém observar, que não se trata de uma formação dos alunos em nível de ensino superior e, sim, em garantir que os mesmo sejam inseridos no mundo do trabalho pautados em conhecimentos humanísticos.

Para garantir um ensino voltado para formação jurídica na educação básica, os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) são diretrizes aprovadas pelo Ministério da Educação a fim de dar suporte pedagógico na prática educativa do currículo educacional das escolas brasileiras, nos quais aborda a Pluralidade Cultural como tema transversal para o conteúdo curricular. Desta forma, o volume 10 dos PCNs (2001, p. 84) direciona teoricamente ao ensino jurídico:

“É claro que não se trata de oferecer um curso de legislação à criança, mas de colaborar para que ela aprenda que existem instrumentos jurídicos, saiba reconhecê-los e se familiarize com a possibilidade de consultá-los, para invocar e defender seus direitos. Em um país cuja história de opressão se fundou, entre outros elementos, no desconhecimento das bases do Estado Democrático de Direito, essa será uma contribuição para a consolidação democrática”.

Já os conteúdos a serem ministrados organizam-se a partir longo do texto dos PCNs (2001, p. 85):

  • Mecanismos de participação coletiva: partidos políticos, sindicatos, conselhos, movimentos sociais, centros comunitários, grêmios, assembléias, eleições e outros.
  • Instrumentos de vida coletiva: regulamentos, estatutos, cartas de intenção, legislação.
  • Declaração Universal dos Direitos da Pessoa Humana como uma conquista da humanidade para todos os seres humanos.
  • O papel de declarações, tratados, convenções internacionais na defesa e aperfeiçoamento da cidadania.
  • Constituição de 1988 como instrumentos jurídico fundamental do País: direitos e deveres individuais e coletivos; discriminação e racismo como crime; direitos culturais.
  • Repúdio às causas das injustiças sociais e às violações dos direitos humanos.

Consulta, com auxílio do professor, a documentos jurídicos referentes aos direitos da criança (especialmente os artigos. 5º, 6º e 227 da Constituição Federal; o Estatuto da Criança e do Adolescente e a Declaração Universal dos Direitos da Criança).

 Reconhecimento de que se vivem tempos de consolidação de direitos de minorias já reconhecidas e estabelecidas na Constituição Federal e no sistema legislativo como um todo; responsabilidades do Estado e da sociedade nesse processo..

Ao conteúdo citado nos PCNs evidencia que a educação em direitos humanos é a própria educação social prevista no artigo 6º da Constituição de 1988. Ensina-nos Silva (2010, p. 49) a essencialidade do ensino em direitos humanos:

“A educação em direitos humanos não se limita à contextualização e à explicação das variáveis sociais, econômicas, políticas e culturais que interferem e orientam os processos educativos. Faz parte dessa educação, apreender os conteúdos que dão corpo a essa área, ou seja: a história, os processos de evolução das conquistas e das violações dos direitos, as legislações, pactos e acordos que dão sustentabilidade e garantia aos direitos são conteúdos a serem trabalhados no currículo básico”.

Percebe-se que a educação em direitos humanos não se objetiva na profissionalização da educação, vai além, é o meio de formação para o exercício da cidadania e, nesse intuito é que surge a importância da temática para formação cidadã para o acesso à justiça. Dias e Oliveira (p. 17), no artigo Acesso à Educação Jurídica: Pela Inclusão do Ensino Jurídico na Grade Curricular do Ensino Regular, colaboram: “Tratando-se do estudo de noções de Direito, seria importante o estudo dos “Caminhos da Justiça”, conteúdo em que os estudantes poderão ser informados acerca dos órgãos públicos, aos qual, qualquer pessoa pode recorrer para lutar pelos seus direitos”. A educação em direitos humanos é de responsabilidade dos agentes de colaboradores do ensino e da aprendizagem, ou seja, diretores escolares, professores, coordenadores e orientadores escolares, pais e órgãos de controle social educacional.

 

  1. CONCLUSÃO

Diante do exposto, é necessário repensar a prática educativa escolar. O ensino nas escolas de educação básica deve preocupar não apenas na transmissão do conteúdo curricular para formar alunos mecânicos e, sim, em sujeitos reflexivos aptos a exercer sua cidadania e serem inseridos no mundo do trabalho, ou seja, capazes de serem agentes de transformação social.

 

  1. REFERÊNCIAS

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BRANDÃO, Carlos Rodrigues. O que é Educação. São Paulo: Editora Brasiliense, 1981.

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BRASIL. Constituição (1988). CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL. Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988.

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CARNEIRO, A. M. LDB Comentada. 23. ed. Rio de Janeiro: Vozes, 2015. p. 65

COSTA, M. M. M. da; REIS, S. da S. Educação em direitos humanos: perspectivas e possibilidades.   Ciência em movimento. v. 2, n. 22, 2009, p. 65-73.

FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. O direito de antena em face do direito ambiental no Brasil. São Paulo. 2000, p. 14.

MELLO Filho, José Celso. Constituição Federal anotada. 2 ed. São Paulo. 1986, p. 533.

NASCIMENTO, Marcos Henrique Caetano do. A ampliação do acesso à justiça e da cidadania por meio da educação em direitos promovida pela defensoria pública. Revista da AJURIS – Associação dos Juízes do Rio Grande do Sul. V. 4. N. 13 (2013).

SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. 2ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001.

SILVA, Ainda Maria Monteiro; TAVARES, Celma. Educação em direitos humanos no Brasil: contexto, processo de desenvolvimento, conquistas e limites. Educação (Porto Alegre, impresso). V. 36, n. 1, p. 50-58, jan/abr. 2013. Disponível em: http://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/index.php/faced/article/viewFile/12315/8740

SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 27 ed. São Paulo: Malheiros, 2006.

PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos, O Princípio da dignidade da pessoa humana e a Constituição de 1988. 2004.

TEIXEIRA, Anísio. Educação é um direito. Apres. de Clarice Nunes, 2ª edição. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, p. 60, 1996.

 

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