Se tem escrito sobre o erro médico e, nestas ocasiões, os autores citam a presença da culpa como necessária, no agir do médico, para ser este responsabilizado, no terreno da responsabilidade civil, em juízo, por danos eventualmente sofridos por um paciente, em decorrência de um tratamento médico. Por isto cabe uma análise desta culpa (no inglês: fault, e no francês: faute), ou seja, uma descrição do que o nosso ordenamento jurídico entende por culpa em sentido escrito nos casos de erro médico, no que tange à responsabilidade civil.
Sobre o que seja culpa, em sentido amplo (“lato sensu”), vamos encontrar na doutrina o que preleciona Francisco de Assis Toledo: “A palavra “culpa”, em sentido lato, de que deriva “culpabilidade”, ambas empregadas, por vezes, como sinônimas, para designar um dos elementos estruturais do conceito de crime, é de uso muito corrente. Até mesmo as crianças a empregam, em seu vocabulário incipiente, para apontar o responsável por uma falta, por uma travessura. Utilizamo-la a todo instante, na linguagem comum, para imputação a alguém de um fato condenável.” (PRINCÍPIOS BÁSICOS DE DIREITO PENAL. 5.ed., São Paulo: Saraiva, 1994, p.216). E diz mais, o mesmo autor: “O dolo e a culpa stricto sensu deixam de ser espécies da culpabilidade (nota do autor: a culpabilidade sendo aqui entendida como a culpa em seu sentido amplo) e passam a ser “elementos” dela.” (op. cit., p.223). Portanto a culpa em sentido amplo (“lato sensu”), pode se apresentar sob a forma de dolo e sob a forma de culpa em sentido estrito (“stricto sensu”). Sobre o que seja culpa em sentido amplo preleciona Sérgio Cavalieri Filho: “Chegamos, desta forma, à noção de culpa, que tem aqui, sentido amplo (lato sensu), abrangente de toda espécie de comportamento contrário ao Direito, seja intencional, como no caso do dolo, ou não como na culpa.” (PROGRAMA DE RESPONSABILIDADE CIVIL. 7.ed., São Paulo: Editora Atlas, 2007, p.29). No mesmo sentido vai José de Aguiar Dias: “A culpa, genericamente entendida, é, pois, fundo animador do ato ilícito, da injúria, ofensa ou má conduta imputável” (DA RESPONSABILIDADE CIVIL. V.1, 10.ed., Rio de Janeiro: Forense, 1995, p.108).
Sobre o que seja dolo nos valemos do Código Penal brasileiro, que em seu artigo 18, inciso I, o conceitua: “Diz-se o crime:
I – doloso, quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo”. Ainda para ilustrar o que seja o dolo nos valemos do escólio de Julio Fabbrini Mirabete: “Para a teoria da vontade, age dolosamente quem pratica a ação consciente e voluntariamente. É necessário para a sua existência, portanto, a consciência da conduta e do resultado e que o agente a pratique voluntariamente. (…)
Para a teoria do assentimento (ou do consentimento) faz parte do dolo a previsão do resultado a que o agente adere, não sendo necessário que ele o queira. Para a teoria em apreço, portanto, existe dolo simplesmente quando o agente consente em causar o resultado ao praticar a conduta.” (MANUAL DE DIREITO PENAL. v.1, 11.ed., São Paulo: Editora Atlas, 1996, p.134). O que diz Sérgio Cavalieri Filho sobre o dolo contribui para o entendimento: “Ressai desses conceitos que o dolo tem por elementos a representação do resultado e a consciência da sua ilicitude. Representação é, em outras palavras, previsão, antevisão mental do resultado. Antes de desencadear a conduta, o agente antevê, representa mentalmente, o resultado danoso e o elege como objeto de sua ação. E assim é porque somente se quer aquilo que se representa.
O agente que age dolosamente sabe também ser ilícito o resultado que intenciona alcançar com sua conduta. Está consciente de que age de forma contrária ao dever jurídico, embora lhe seja possível agir de forma diferente.” (PROGRAMA DE RESPONSABILIDADE CIVIL. 7.ed., São Paulo: Editora Atlas, 2007, p.31).
Para ilustrar o que seja culpa em sentido estrito (“stricto sensu”) nos valemos do ensinamento de Damásio E. de Jesus: “O agente não pretende praticar um crime nem sequer expor interesses jurídicos de terceiros a perigo de dano. Falta, porém com o dever de diligência exigido pela norma. (…)
Outro elemento é a ausência de previsão. É necessário que o sujeito não tenha previsto o resultado. Se o previu, não estamos no terreno da culpa, mas do dolo (salvo a exceção que veremos) [nota do autor: a exceção é a culpa consciente]. O resultado era previsível, mas não foi previsto pelo sujeito.” (DIREITO PENAL. v.1, 19.ed., São Paulo: Saraiva, 1995, p.256). Daí a culpa em sentido estrito poder ser chamada de involuntária, ao contrário do dolo, que é voluntário. Sobre a culpa consciente, exceção mencionada, nos ensina Paulo José da Costa Júnior: “Caracteriza-se a culpa consciente porque ao lado de uma previsão genérica positiva, se coloca uma previsão concreta negativa: o evento não se verificará. (…)
Na culpa consciente, não se apresenta tal adesão interior, já que o agente nutre uma forte esperança da não-verificação do evento previsto, confia que ele não se realize.
Na culpa consciente há um erro de cálculo” (CURSO DE DIREITO PENAL. V.1, São Paulo:Saraiva, 3.ed, 1995, p.86). Complemente-se com o escólio de João Monteiro de Castro, para quem a culpa consciente ocorre: “(…) quando a pessoa, por irreflexão, prevendo o resultado ilícito como um efeito possível da sua conduta, age na convicção leviana, precipitada ou infundada de que não se verificará ou que conseguirá evitá-lo” (RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO. São Paulo: Editora Método, 2005, p.46). Sobre a culpa consciente nos diz José Carlos Maldonado de Carvalho: “Posiciona-se ao lado dessa a culpa consciente, em que o resultado é previsto pelo agente, embora acredite sinceramente que não vá este efetivamente ocorrer.
Nesta última modalidade, o resultado danoso é previsto, apesar de acreditar o agente, levianamente, que o mesmo não vá ocorrer ou que, em última hipótese, poderá evitá-lo; é a culpa (nota do autor: culpa em sentido estrito) com previsão” (IATROGENIA E ERRO MÉDICO. Rio de Janeiro: Editora Lúmen Júris, 2005, p.39). Esta possibilidade, não se pode excluir, é até plausível que possa vir a ocorrer em um caso de erro médico.
O dolo geralmente não ocorre em casos de erro médico. Na maior parte das vezes o erro médico se caracteriza por comportamento culposo (culpa em sentido estrito) do médico. E, o mesmo Júlio Fabbrini Mirabete continua a nos esclarecer sobre o que seja um comportamento culposo (frise-se, culpa em sentido estrito), ensinamentos estes aplicáveis na íntegra às situações de erro médico: “Para a teoria finalista, o fulcro do crime culposo não é o resultado e sim o desvalor da ação, que é a violação do cuidado objetivo exigível, ou seja a inobservância do dever de diligência, do cuidado objetivo configurado na imprudência, imperícia ou negligência.” (MANUAL DE DIREITO PENAL. 13.ed., São Paulo: Editora Atlas, 1998, v.2, p.46). E, este comportamento culposo, no seu sentido estrito, em casos de erro médico, implicará, se ocorrer, em um delito culposo (leia-se, culposo no sentido estrito), que apresenta quatro componentes: 1. conduta, ação ou omissão, no caso culposa; 2. não cumprimento da obrigação (dever) de cuidados, geralmente, em casos de erro médico por negligência, imprudência ou imperícia do profissional; 3. resultado deletério involuntário, ou seja, um dano, prejuízo, ao paciente causado pelo atendimento médico; 4. previsível, o que implica que o médico podia prever, mesmo que não desejasse isto, que se agisse com imprudência, imperícia ou negligência o erro médico, dano ao paciente, poderia ocorrer. Sobre isto nos diz Sérgio Cavalieri Filho: “A inobservância deste dever de cuidado torna a conduta culposa – o que evidencia que a culpa é na verdade, uma conduta deficiente, quer decorrente de uma deficiência de vontade, quer de inaptidões ou deficiências próprias ou naturais. Exprime um juízo de reprovabilidade sobre a conduta do agente, por ter violado o dever de cuidado quando em face das circunstâncias específicas do caso, devia e podia ter agido de outro modo.” (PROGRAMA DE RESPONSABILIDADE CIVIL. 7.ed., São Paulo: Editora Atlas, 2007, p.33).
Para continuarmos abordando a culpa em sentido estrito, nos valemos dos ensinamentos sobre culpa de René Savatier: “Definition de la faute. – La faute est l’inexécution d’um devoir que l’agent pouvait connaitre et observer”, ou seja, em tradução livre do autor: “Definição de culpa. – A culpa é a não execução de um dever que o agente podia conhecer e respeitar.” (TRAITÉ DE LA RESPONSABILITÉ CIVILE – En Droit Français – Civil, Administratif, Professionnel, Procédural, v.1 – Les sources de la Responsabilité Civile, Paris: Librairie Générale de Droit et de Jurisprudence, 12.ed., p.5). Nos diz mais Savatier: “PREMIER ELEMENT DE LA FAUTE: LE DEVOIR VIOLÉ”, isto é, em tradução livre do autor: “PRIMEIRO ELEMENTO DA CULPA: O DEVER VIOLADO”, e diz ainda a seguir o mesmo autor: “Impossibilité de définir la faute sans partir de la notion de devoir. – (…) La faute est l’acte ou l’abstention que n’aurait pas commis um homme diligent, um homme avisé, um homme prudent“, ou seja, em tradução livre do autor: “Impossibilidade de definir a culpa sem partir da noção de dever. – (…) A culpa é a ação ou a omissão que não teria cometido um homem diligente, um homem ponderado, um homem prudente” (op. cit., p.7). A culpa em sentido estrito pode se apresentar sob a forma de negligência, imprudência ou imperícia, que permitem serem agrupadas na expressão culpa inconsciente, além da culpa consciente. Sobre elas, negligência, imperícia e imprudência, nos diz Damásio E. de Jesus: “São formas de manifestação da inobservância do cuidado necessário.
A imprudência é a prática de um fato perigoso. (…)
A negligência é a ausência de precaução ou indiferença em relação ao ato realizado. (…)
Enquanto na negligência o sujeito deixa de fazer alguma coisa que a prudência impõe, na imprudência ele realiza uma conduta que a cautela indica que não deve ser realizada. A doutrina ensina que a imprudência é positiva (o sujeito realiza uma conduta) e a negligência, negativa (o sujeito deixa de fazer algo imposto pela ordem jurídica). (…)
Imperícia é a falta de aptidão para o exercício de arte ou profissão. O químico, o eletricista, o motorista, o médico, o engenheiro, o farmacêutico etc. necessitam de aptidão teórica e prática para o exercício de suas atividades. É possível que, em face de ausência de conhecimento técnico ou de prática, essas pessoas, no desempenho de suas atividades venham a causar dano a interesses jurídicos de terceiros. Fala-se, então, em imperícia. (…) A imperícia não se confunde com erro profissional. É o caso do médico que emprega determinada técnica ao executar uma intervenção cirúrgica em face de escusável erro de diagnóstico.” (DIREITO PENAL. v.1, 19.ed., São Paulo: Saraiva, 1995, p.257-258). Sobre estas modalidades de culpa em sentido estrito preleciona Irineu Antônio Pedrotti: “Imprudência (do latim imprudentia) significa falta de atenção, descuido. (…)
Imprudência é a falta de cautela, a afoiteza ou a precipitação no modus agendi em contradição com as normas do procedimento racional.
Negligência (do latim negligentia, de negligere) significa desprezar, desatender. É a falta de diligência na prática ou realização de um ato. Em termos jurídicos pode-se concluir pela omissão ou não observância de um dever a cargo do agente, compreendido nas precauções necessárias para que fossem evitados danos não desejados e, por conseguinte, evitáveis. (…)
Imperícia (do latim imperitia, de imperitus) significa inexperiente, não hábil. Em termos jurídicos corresponde à falta de prática ou à ausência de conhecimentos que no exercício de determinada profissão ou de alguma arte, seriam necessários ou precisos.” (RESPONSABILIDADE CIVIL. v.1, 2.ed., São Paulo: Livraria e Editora Universitária de Direito – LEUD, 1995, p.14). Sobre a negligência cabe transcrever o escólio, perfeitamente aplicável também à imprudência e à imperícia, de Hans Kelsen: “Sob o conceito de responsabilidade pela culpa costuma também abranger-se a hipótese da chamada negligência. Esta surge quando a produção ou o não-impedimento de um evento (resultado), indesejável segundo a ordem jurídica, é proibido, mesmo que não tenha sido efetivamente previsto ou intencionalmente visado pelo indivíduo através de cuja conduta ele foi produzido ou não foi evitado, já que normalmente teria podido e devido prevê-lo e, portanto, teria podido e devido não o provocar ou evitá-lo.” (TEORIA PURA DO DIREITO. 6.ed., São Paulo: Martins Fontes, 1999, p.138).
E, referindo-se à atividade na área da saúde, ou seja, médica, a respeito destas três modalidades de culpa em sentido estrito preleciona Regina Beatriz Tavares da Silva: “A negligência é a culpa omissiva, oposto de diligência ou de ação cuidadosa. É a desatenção, distração, indolência, inércia, passividade. Assim, na área da saúde, podemos defini-la como a omissão de comportamentos recomendáveis pela prática e ciência médica. (…)
A imprudência é o oposto de previdência. É a leviandade, a irreflexão, o açodamento, a precipitação. Na área da saúde podemos defini-la como a utilização de procedimentos não recomendados pela prática e ciência médica. (…)
A imperícia é o oposto de perícia. É o despreparo ou a falta de habilidade. Na área da saúde pode ser definida como a deficiência de conhecimentos técnicos. (…)
À imperícia, hoje em dia, deve ser dada atenção redobrada na responsabilidade civil na área da saúde, já que em curtos espaços de tempo são criadas diversas especialidades médicas.” (Pressupostos da Responsabilidade Civil na Área da Saúde. In: Regina Beatriz Tavares da Silva [coordenadora]. RESPONSABILIDADE CIVIL NA ÁREA DA SAÚDE. São Paulo: Saraiva, 2007, p.26-28). Para reflexão cabe mencionar o aludido por Edmilson de Almeida Barros Júnior: “Infelizmente, o judiciário talvez por desinformação técnica em Medicina, também emite julgados no sentido de penalizar por imperícia o médico pelo simples fato de este não possuir a qualificação de especialista em determinada área do conhecimento médico.” (A RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO – Uma Abordagem Constitucional. São Paulo: Editora Atlas, 2007, p.105). E, diz mais sobre o mesmo tema: “Como derivado direto do princípio da legalidade, seja em Medicina, seja nas demais profissões regulamentadas por lei, uma vez praticado ato profissional dentro dos ditames legais, não há possibilidade de enquadramento por imperícia.” (op. cit., 107).
A culpa médica tem peculiaridades, nos diz João Monteiro de Castro: “A culpa médica assim como todas, supõe, de acordo com as regras gerais da responsabilidade civil, a inobservância de um dever que o agente tinha a possibilidade de conhecer e acatar. A fisionomia peculiar da culpa médica se dá em função dos caracteres próprios da arte médica e por lidar tão proximamente com a vida, saúde e morte do ser humano.
Como fonte de responsabilidade, a culpa médica pode se apresentar por três vias: a) violação dos deveres de humanismo, impostos pelo direito ao mister do médico; b) falha quanto às regras técnicas da medicina, acerca das quais o profissional há de estar sempre diligenciando para se manter atualizado; e c) imprudência ou negligência banais como qualquer pessoa” (RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO. São Paulo: Editora Método, 2005, p.46).
E, pelo menos, uma destas três modalidades de culpa em sentido estrito tem que estar presente no agir do médico, em termos de responsabilidade civil, para se caracterizar, em juízo, um erro médico, em caso de dano a um paciente. Sobre isto nos transmite ainda Regina Beatriz Tavares da Silva: “Quando é utilizada a expressão erro médico, o seu significado é de atuação negligente, imperita ou imprudente, isto é, de culpa em sentido estrito, que pode levar à aplicação do princípio da reparação de danos, conforme art. 186 do Código Civil.” (Pressupostos da Responsabilidade Civil na Área da Saúde. In: Regina Beatriz Tavares da Silva [coordenadora]. RESPONSABILIDADE CIVIL NA ÁREA DA SAÚDE. São Paulo: Saraiva, 2007, p.26). Presença esta, da culpa em sentido estrito na conduta do médico, cuja necessidade vem cogentemente determinada em nosso ordenamento jurídico, mais especificamente em nosso Direito Positivo. Na demonstração disto, cabe aqui transcrever o artigo 186, do nosso Código Civil, verbis: “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”, que explicita em seu comando legal duas das modalidades de culpa em sentido estrito: negligência e imprudência. No que é acompanhado pelo artigo 951, do mesmo Código Civil pátrio, verbis: “O disposto nos arts. 948, 949 e 950 aplica-se ainda no caso de indenização devida por aquele que, no exercício de atividade profissional, por negligência, imprudência ou imperícia, causar a morte do paciente, agravar-lhe o mal, causar-lhe lesão, ou inabilitá-lo para o trabalho”, que, referindo-se em seu texto especificamente ao “paciente”, relaciona, além da negligência e da imprudência, também uma terceira modalidade de culpa em sentido estrito: a imperícia. Estas três modalidades de culpa em sentido estrito também vêm especificadas no artigo 18 de nosso Código Penal, no seu seu inciso II, ao conceituar crime culposo (em sentido estrito), verbis: “Diz-se o crime:
II – culposo, quando o agente deu causa ao resultado por imprudência, negligência ou imperícia”. Encontramos as mesmas modalidades de culpa explicitadas no Código de Ética Médica (Resolução nº 1.246, do Conselho Federal de Medicina, de 26 de janeiro de 1988), em seu artigo 29, verbis: “CAPÍTULO III – RESPONSABILIDADE PROFISSIONAL. É vedado ao médico:
Art.29. Praticar atos profissionais danosos ao paciente, que possam ser caracterizados como imperícia, imprudência ou negligência”. A nossa legislação consumerista (Código de Defesa do Consumidor – lei nº8.048, de 11 de setembro de 1990) ao dispor sobre a responsabilização da atividade do profissional liberal, aqui o médico – que o é, consagrou a necessidade de se perquirir a presença de culpa no seu agir, em qualquer das modalidades que esta se faça presente no agir do médico, para responsabilizá-lo por eventuais danos causados ao consumidor, aqui o paciente – consumidor de serviço de saúde que é, estabelecendo, no parágrafo 4º, de seu artigo 14, verbis; “A responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação de culpa”.
Também cabe neste momento registrar, e adequado ao entendimento da culpa sob que forma ela se apresente, o que preleciona Caio Mário da Silva Pereira: “O conceito de culpa é unitário, embora sua ocorrência possa dar-se de maneiras diversas. São todas elas, entretanto, meras modalidades pelas quais pode caracterizar-se a violação do dever preexistente.” (RESPONSABILIDADE CIVIL. 9.ed., Rio de Janeiro: Forense, 1999, p.70). E continua, o mesmo autor, dizendo: “O que se salienta aqui é o princípio da unidade da culpa, deixando claro que as modalidades em que se desdobra não afloram mais que à sua superfície, deixando incólume o seu conceito ontológico. Intrinsecamente una, como sempre tenho sustentado, a terminologia usual que a desdobra em várias modalidades não passa de considerações acidentais – accidentalia negotii.” (op.cit., p.71).
A culpa em sentido estrito (“stricto sensu”) é a que geralmente está presente na conduta do profissional em casos de erro médico, no terreno da responsabilidade civil, mas não há porque não se estar atento e ter sempre presente que há possibilidade da eventual ocorrência de dolo na conduta do médico, integrante que é este – dolo – da culpa em sentido amplo (“lato sensu”). Em casos de erro médico, causador de dano a um paciente, as modalidades da culpa, em sentido estrito, negligência, imprudência e imperícia, que admitem ser agrupadas no termo culpa inconsciente, têm sua presença perquirida, em termos de averiguar a responsabilidade civil do médico por este dano, pelos tribunais, na conduta deste profissional, para caracterizar o agir culposo deste em sua atividade de atendimento ao paciente. Cabe mencionar que, em certos casos, o que pode estar presente é a modalidade da culpa em sentido estrito denominada culpa consciente, daí a necessidade de se averiguar também, em juízo, a possibilidade da sua presença na conduta do médico.
Informações Sobre o Autor
Neri Tadeu Camara Souza
Advogado e Médico – Direito Médico
Autor do livro: Responsabilidade civil e penal do médico – 2003 – LZN