Especificidades da espécie normativa lei delegada

Resumo: Este trabalho visa explicitar as características da espécie normativa chamada lei delegada, devido à sua pouca utilização no processo legislativo brasileiro.


Palavras-chave: Espécie normativa. Lei delegada. Especificidades.


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Abstract: This work aims to explain the characteristics of the specie named delegated regulatory law, due to its limited use in the Brazilian legislative process.


Keywords: Species regulations. Law delegated. Specificities.


Introdução:


Dentre as espécies de atos normativos brasileiros encontramse as leis delegadas, que são atos privativos do Chefe do Poder Executivo em decorrência de autorização do Poder Legislativo. Esta autoridade, na edição do referido ato normativo, deve respeitar os limites estabelecidos na resolução de delegação. Tem como objetivo alcançar a eficiência do Estado através de uma maior agilidade e celeridade.


1. Apanhado geral sobre processo legislativo.


1.1. Processo legislativo brasileiro.


O processo legis o conjunto gilslativo  Limites materiais.as provislativo é o conjunto coordenado de disposições que disciplinam o procedimento a ser obedecido pelos órgãos legislativos, componentes do Poder Legislativo, na produção de leis e atos normativos que derivam da Constituição Federal. Há também, neste caso, a função legislativa dos poderes Executivo e Judiciário, funcionando, porém, como funções atípicas.


De acordo com o art. 59 da Constituição Federal, as espécies legislativas são as seguintes: emendas constitucionais, leis complementares e ordinárias, leis delegadas, medidas provisórias, decretos legislativos e resoluções.


O desrespeito às normas de processo legislativo constitucionalmente previstas acarretará a inconstitucionalidade formal da lei ou do ato normativo produzido, possibilitando controle repressivo de constitucionalidade por parte do Poder Judiciário, tanto pelo método difuso quanto pelo concentrado. Mesmo durante o processo legislativo, os parlamentares têm o direito público subjetivo à fiel observância de todas as regras constitucionais para a elaboração de cada espécie normativa, podendo socorrerem-se ao Poder Judiciário, por meio de mandado de segurança.


Salienta-se que as normas sobre o processo legislativo dispostas na Constituição Federal são consideradas, pelo Supremo Tribunal Federal, normas centrais, isto é, de reprodução obrigatória nas constituições estaduais[1].


1.2. Espécies de processo legislativo.


Há três espécies de processos ou procedimentos legislativos: comum ou ordinário, sumário e especiais.


O processo legislativo ordinário é aquele que se destina à elaboração das leis ordinárias, caracterizando-se pela maior extensão.


O processo legislativo sumário diferencia-se do ordinário, uma vez que o Congresso Nacional tem prazo determinado para deliberação sobre determinado assunto.


Os processos legislativos especiais são estabelecidos para a elaboração das emendas à Constituição, leis complementares, leis delegadas, medidas provisórias, decretos-legislativos, resoluções e leis financeiras (lei de plano plurianual, lei de diretrizes orçamentárias, leis do orçamento anual e de abertura de créditos adicionais). Observa-se que para cada instrumento legislativo citado há um procedimento legislativo específico.


No que se refere ao tema proposto, parte-se diretamente à análise do instrumento legislativo denominado lei delegada.


2. Leis delegadas.


2.1. Justificativa e origem.


No ano de 1932, ocorreu na Grã-Betanha o Committee on Ministers Powers, que, no final de seus trabalhos, publicou um relatório contendo os seguintes motivos justificadores das leis delegadas:


I. Elas conferem maior eficiência ao Estado, minorando a falta de tempo do Poder Legislativo, que nem sempre tem condições de atender a todas as situações que dependem de regulamentação normativa. Como o andamento e a produção de atos normativos, imprescindíveis ao Estado, não podem parar, delegam-se atribuições legislativas ao Presidente da República, desde que sejam respeitados certos limites, impostos constitucionalmente.


II. Existem determinados assuntos da alçada do Poder Executivo que, por motivos de ordem técnica, devem ser normatizados por ele mesmo, mediante delegação legislativa.


III. A imprevisibilidade de certas matérias, envoltas em situações de emergência, exige a interferência direta do Presidente da República, por meio da edição de leis delegadas.


IV. Vários temas exigem flexibilidade na sua regulamentação, problema que as leis delegadas podem resolver. São assuntos específicos, alicerçados em situações de notória gravidade, que requerem a participação do Chefe do Poder Executivo Federal.


Apesar da simplicidade do procedimento, em virtude da estreiteza do rol de matérias sujeitas à delegação, as hipóteses são pouco utilizadas na realidade brasileira, uma vez que o Presidente da República tem à sua disposição medidas provisórias que, em tese, assemelham-se às leis delegadas, porém com maior agilidade na utilização, principalmente tendo em vista a execução imediata de seus comandos normativos, sendo que o Parlamento atua em momento posterior[2].


Suas principais características foram colhidas dos sistemas constitucionais francês, italiano e português, denominadas autorizações legislativas no sistema europeu.


A redução da separação de poderes e a ampliação da atividade do governo, mediante o exercício da confiança parlamentar, não somente na escolha dos ministros como também na entrega da atividade legislativa, são inerentes ao regime parlamentar.


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As leis delegadas existem no Brasil desde a Constituição de 1891. Tal existência era implícita, pois não havia base normativa expressa que a admitisse. Por força de uma velha praxe, o Executivo recebia autorização legislativa para operar reformas de maior ou menor profundidade nas leis e nas instituições. Foram introduzidas explicitamente no sistema legislativo brasileiro através da Constituição de 1946, com a implantação do regime parlamentar de governo cuja duração foi de setembro de 1961 a janeiro de 1963.


Na Constituição de 1967 admitiu-se a delegação a uma Comissão do Congresso Nacional (Comissão mista) ou a uma Comissão da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal. Não era propriamente delegação de um poder a outro, já que era transferência voluntária de atribuição.


Comparadas a medidas provisórias, as leis delegadas são mais seguras e detêm consigo coeficiente de legitimidade maior, considerando a participação do Poder Legislativo desde o início de sua elaboração.


2.2. Natureza jurídica.


São atos normativos primários, mesmo necessitando de resolução do Congresso Nacional. Encontram-se ao lado das demais espécies normativas previstas no art. 59 da Constituição Federal.


2.3. Processo legislativo.


O procedimento legislativo especial da lei delegada encontra-se rigorosamente demarcado pela Constituição Federal, cujas normas são de observância obrigatória na criação dessa espécie normativa primária[3].


O Presidente da República solicitará ao Congresso Nacional a delegação denominada iniciativa solicitadora.


A iniciativa solicitadora é um ato exclusivo e discricionário do Chefe do Poder Executivo. Isto é, nenhuma outra autoridade, ou órgão do Estado poderá exercê-la, sob pena de ferir a Constituição. O assunto a ser regulamentado deve ser indicado pelo Presidente da República.


Esta solicitação indicará o assunto referente à lei a ser editada.


Uma vez encaminhada a solicitação ao Congresso Nacional, esta será submetida à votação pelas Casas do Congresso Nacional, em sessão bicameral conjunta ou separadamente, devendo ser aprovada em maioria simples, através de resolução.


O Presidente da República não tem direito à delegação, ficando a cargo do Congresso Nacional a decisão política de anuir ou não ao pedido.


O ato correto de delegação é resolução, que não pode ser substituída nem por ato mais complexo ou mais rígido como a lei ordinária[4].


A referida resolução deverá especificar as regras sobre seu conteúdo e os termos de seu exercício, tais como o termo de caducidade da habilitação, as linhas gerais da lei, o período de vigência, entre outras.


A delegação tem caráter temporário e não poderá ultrapassar a legislatura, sob pena de abdicação ou renúncia ao Poder Legislativo na sua função constitucional, o que não é permitido. Além disso, a deliberação tomada por um Congresso não poderá vincular o seguinte.


Em razão da irrenunciabilidade da função legislativa, mesmo durante o prazo concedido ao Presidente da República para editar a lei delegada, o Congresso Nacional disciplinará a matéria por meio de lei ordinária. Poderá, ainda, revogar a delegação.


A resolução deve fixar se o Presidente da República poderá editar mais de uma lei sobre o assunto objeto da mesma. Salienta-se que o silêncio na resolução implica a proibição de mais de uma lei, sendo o ato de elaboração da lei consumativo e exaustivo. Há entendimento contrário, no sentido de que no silêncio, poderá o Presidente da República editar quantas leis entender necessário, desde que dentro do prazo estabelecido na resolução.


Observa-se que esta resolução está sujeita autonomamente a controle de constitucionalidade. A eventual declaração de inconstitucionalidade da resolução eiva de inconstitucionalidade também a lei delegada baseada nela.


O Presidente da República não é obrigado a editar a lei para a qual obteve a resolução delegatória. Esta o habilita a legislar, porém não o obriga a tanto.


Quanto à possibilidade da adoção pelas Constituições Estaduais e Leis Orgânicas Municipais de leis delegadas, não há vedação e nem crítica doutrinária ou jurisprudencial, pelo fato do pouquíssimo uso de tal instrumento legislativo. Porém, salienta-se que a redação da Constituição Federal faz referência ao Presidente da República e não Chefe do Poder Executivo, o que, em outras matérias, não consideradas de maior relevância, porém de maior ocorrência, leva a doutrina e a jurisprudência a debaterem o assunto, prevalecendo no caso de medidas provisórias, apesar da CF mencionar o Presidente da República, a possibilidade de edição em âmbito estadual/distrital e municipal[5].


Há julgado do Supremo Tribunal Federal que declara inconstitucional, em parte, lei estadual, a exemplo do caso do Governador do Estado do Tocantins que utiliza a lei delegada. Porém, a declaração de inconstitucionalidade se dá pelo modo e matéria tratados pela referida lei e não pelo instrumento legislativo utilizado no âmbito estadual. Entende-se, implicitamente, pelo cabimento deste instrumento legislativo em âmbito estadual[6].


2.4. Espécies de delegação.


A delegação poderá ser típica ou atípica.


Na delegação típica, também denominada de delegação própria, o Presidente da República poderá promulgar o projeto de lei e determinar sua publicação, não sendo necessário o retorno ao Congresso Nacional para aprovação.


Caso conste na resolução que o projeto de lei elaborado Presidente da República deverá retornar ao Legislativo para apreciação, a delegação é denominada de atípica ou imprópria.


No caso da delegação atípica ou imprópria, o projeto deverá retornar ao Legislativo e será apreciado em votação única, vedada a apresentação de qualquer emenda. Neste caso, ou o Congresso Nacional aprova o todo e envia novamente ao Presidente da República para promulgação, ou rejeita todo o projeto. No que se refere à rejeição, o projeto de lei é arquivado e somente poderá ser reapresentado mediante proposta da maioria absoluta dos membros de quaisquer Casas do Congresso Nacional, nos termos do art. 67 da Constituição Federal.


2.5. Controle de constitucionalidade das leis delegadas.


Caso o Presidente da República extrapole os limites fixados na resolução concedente da delegação legislativa, o Congresso Nacional poderá, através de decreto legislativo, sustar a lei delegada, paralisando seus efeitos normativos.


A sustação não será retroativa, surtindo efeitos ex nunc, a partir da publicação do Decreto Legislativo, uma vez que não há declaração de nulidade da lei delegada, mas sustação dos seus efeitos[7].


A existência desta espécie de controle político, criada pelo Poder Legislativo, não impedirá a eventual declaração de inconstitucionalidade pelo Poder Judiciário, por desrespeito aos requisitos formais e materiais do processo legislativo da lei delegada, expressamente previstos no art. 68 da CF.


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Conclui-se que há um duplo controle repressivo da constitucionalidade da edição das leis delegadas: legislativo e judiciário.


A diferença consiste no que, em eventual declaração de inconstitucionalidade da lei delegada pelo Supremo Tribunal Federal, terá efeitos retroativos, ex tunc, desde a edição da lei delegada.


2.6. Limites materiais à edição de leis delegadas.


De acordo com o § 1º do art. 68 da Constituição Federal, não serão objetos de delegação: os atos de competência exclusiva do Congresso Nacional, os de competência privativa da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal, a matéria reservada à lei complementar, nem a legislação sobre organização do Poder Judiciário e do Ministério Público, a carreira e a garantia de seus membros; nacionalidade, cidadania, direitos individuais, políticos e eleitorais e planos plurianuais, diretrizes orçamentárias e orçamentos.


Parte-se à análise dessas limitações materiais à edição das leis delegadas:


I. Matérias de competência exclusiva do Congresso Nacional: são as matérias elencadas no art. 49 da Constituição Federal. São atos exclusivos do Congresso Nacional, com impossibilidade de delegação.


Produzem efeitos externos ao Congresso Nacional.


Devem ser tratadas através de decreto legislativo.


II. Matérias de competência privativa da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal: são as matérias elencadas nos arts. 51 e 52 da CF. São atos privativos da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal.


Produzem efeitos internos às casas legislativas.


Devem ser tratadas através de resolução.


III. Matéria reservada à lei complementar: a vedação se dá uma vez que o legislador constituinte originário expressamente estabeleceu uma reserva de competência à edição de leis complementares, deliberada por maioria absoluta dos membros de ambas as Casas Legislativas, incompatível, pois, com o regime processual das leis delegadas.


IV. Organização do Poder Judiciário e do Ministério Público, a carreira e garantia de seus membros: objetiva a separação dos poderes, não permitindo que um ato unilateral de exceção de função atípica adentre ao Poder Judiciário e Ministério Público.


A organização do Ministério Público da União e da magistratura, ademais, é assunto de lei complementar, conforme, respectivamente, os artigos 128, § 5º, e 93 da CF, o que  implica também na vedação da edição em matéria reservada à lei complementar. Fica expressa, de toda sorte, a importância acordada ao tema, de acordo com as condições para a atuação independente do Parquet e da judicatura.


V. Nacionalidade, cidadania, direitos políticos e eleitorais: salienta-se que entre as matérias em comento existe um elo, ou seja, qualquer mudança implicaria diretamente no processo eleitoral. Procura-se evitar a intervenção direta e unipessoal do Chefe do Poder Executivo no processo eleitoral.


VI. Direitos individuais: a extinção, supressão, restrição, alteração dos direitos individuais, via lei delegada, é incompatível com a sua natureza, haja vista que se trata de cláusula pétrea ao legislador constituinte originário expressamente da intangibilidade de tais direitos e da sensibilidade no tratamento dos mesmos.


VII. Planos plurianuais, diretrizes orçamentárias e orçamentos: o legislador não poderia deixar nas mãos do Chefe do Poder Executivo a decisão única e exclusiva de todo o orçamento, seria uma arma muito poderosa e sujeita a muitos desvios.


A exceção quanto a créditos suplementares é a ressalva do art. 167, § 3º, que trata da abertura de crédito extraordinário para atender despesas imprevisíveis e urgentes, como as decorrentes de guerra, comoção interna ou calamidade pública. Ora, pela urgência e imprevisibilidade da medida, é razoável a utilização de um instrumento legislativo mais célere para obtenção de tal fim.


Esse rol de vedações substanciais à feitura de leis delegadas é taxativo. Não comporta exegese ampliativa, sob pena de se esvaziar o sentido dessa espécie normativa.


 


Referências:

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BULOS, Uadi Lamego. Constituição Federal anotada. 8. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2008. 1596 p.

CARRAZA, Roque Antônio. Curso de direito constitucional tributário. 26. Ed. rev., apl. e atual. até a Emenda Constitucional n, 64/2010. São Paulo: Malheiros, 2010. 1152 p.

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MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Martires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. 5. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva; Brasília, D.F.: IBDP, 2010. 1616 p.

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TORRES, Heleno Taveira; CARVALHO, Paulo de Barros. Tratado de direito constitucional tributário: estudos em homenagem a Paulo de Barros Carvalho São Paulo: Saraiva, 2005. 813 p.

 

Notas:

[1] “É improcedente a ação. Em primeiro lugar, não encontro ofensa ao princípio federativo, a qual, no entender da autora, estaria na feição assimétrica que a norma estadual impugnada deu a um dos aspectos do correspondente processo legislativo em relação ao modelo federal. Ora, a exigência constante do art. 112, § 2º, da Constituição fluminense consagra mera restrição material à atividade do legislador estadual, que com ela se vê impedido de conceder gratuidade sem proceder à necessária indicação da fonte de custeio. É assente a jurisprudência da Corte no sentido de que as regras do processo legislativo federal que devem ser reproduzidas no âmbito estadual são apenas as de cunho substantivo, coisa que se não reconhece ao dispositivo atacado. É que este não se destina a promover alterações no perfil do processo legislativo, considerado em si mesmo; volta-se, antes, a estabelecer restrições quanto a um produto específico do processo e que são eventuais leis sobre gratuidades. É, por isso, equivocado ver qualquer relação de contrariedade entre as limitações constitucionais vinculadas ao princípio federativo e a norma sob análise, que delas não desbordou. (…) Além disso, conforme sobrelevou a AGU, ‘os princípios constitucionais apontados como violados são bastante abrangentes (…). Realizando-se o cotejo entre o artigo impugnado nestes autos e os preceitos constitucionais adotados como parâmetro de sua constitucionalidade, não se vislumbra qualquer incompatibilidade, até porque se trata de disposições desprovidas de correlação específica’. Daí chegar-se, sem dificuldade, à conclusão de que a norma estadual não vulnera o princípio federativo, consagrado nos arts. 1º, caput, 18 e 25 da CF.” (ADI 3.225, voto do Rel. Min. Cezar Peluso, julgamento em 17-9-2007, Plenário, DJ de 26-10-2007.)

[2] No Brasil existem em vigência 13 (treze) leis delegadas, sendo que a última é de 27-8-92 (http://www.planalto.gov.br/legislacao/legislacao-1/leis-delegadas-1#content).

[3]: “Lei 215/90. Ofensa ao princípio da separação dos Poderes por norma que atribui ao Governador autorização para dispor, segundo sua conveniência, de bens públicos do Estado, sem especificá-los. Instrumento anômalo de delegação de poderes. Inobservância do processo legislativo concernente às leis delegadas. Ação, no ponto, julgada procedente.” (STF, ADI 425, Rel. Min. Maurício Corrêa, DJ de 19-12-2003)

[4] “A nova Constituição da República revelou-se extremamente fiel ao postulado da separação de poderes, disciplinando, mediante regime de direito estrito, a possibilidade, sempre excepcional, de o Parlamento proceder a delegação legislativa externa em favor do Poder Executivo. A delegação legislativa externa, nos casos em que se apresente possível, só pode ser veiculada mediante resolução, que constitui o meio formalmente idôneo para consubstanciar, em nosso sistema constitucional, o ato de outorga parlamentar de funções normativas ao Poder Executivo. A resolução não pode ser validamente substituída, em tema de delegação legislativa, por lei comum, cujo processo de formação não se ajusta a disciplina ritual fixada pelo art. 68 da Constituição. A vontade do legislador, que substitui arbitrariamente a lei delegada pela figura da lei ordinária, objetivando, com esse procedimento, transferir ao Poder Executivo o exercício de competência normativa primária, revela-se irrita e desvestida de qualquer eficácia jurídica no plano constitucional. O Executivo não pode, fundando-se em mera permissão legislativa constante de lei comum, valer-se do regulamento delegado ou autorizado como sucedâneo da lei delegada para o efeito de disciplinar, normativamente, temas sujeitos a reserva constitucional de lei. – Não basta, para que se legitime a atividade estatal, que o Poder Público tenha promulgado um ato legislativo. Impõe-se, antes de mais nada, que o legislador, abstendo-se de agir ultra vires, não haja excedido os limites que condicionam, no plano constitucional, o exercício de sua indisponível prerrogativa de fazer instaurar, em caráter inaugural, a ordem jurídico-normativa. Isso significa dizer que o legislador não pode abdicar de sua competência institucional para permitir que outros órgãos do Estado – como o Poder Executivo – produzam a norma que, por efeito de expressa reserva constitucional, só pode derivar de fonte parlamentar” (STF, ADI 1.296-MC, Rel. Min. Celso de Melo, DJ de 10-8-1995).

[5] “Podem os Estados-Membros editar medidas provisórias em face do princípio da simetria, obedecidas as regras básicas do processo legislativo no âmbito da União (CF, art. 62)” (STF, ADIn 425/TO, Rel. Min. Maurício Corrêa, DJ de 19.2.2003).

[6] “Lei 215/90. Ofensa ao princípio da separação dos Poderes por norma que atribui ao Governador autorização para dispor, segundo sua conveniência, de bens públicos do Estado, sem especificá-los. Instrumento anômalo de delegação de poderes. Inobservância do processo legislativo concernente às leis delegadas. Ação, no ponto, julgada procedente.” (STF, ADI 425, Rel. Min. Maurício Corrêa, DJ de 19-12-2003)

[7] “O decreto legislativo, editado com fundamento no art. 49, V, da Constituição Federal, não se desveste dos atributos tipificadores da normatividade pelo fato de limitar-se, materialmente, à suspensão de eficácia de ato oriundo do Poder Executivo. Também realiza função normativa o ato estatal que exclui, extingue ou suspende a validade ou a eficácia de uma outra norma jurídica. A eficácia derrogatória ou inibitória das consequências jurídicas dos atos estatais constitui um dos momentos concretizadores do processo normativo. A supressão da eficácia de uma regra de direito possui força normativa equiparável a dos preceitos jurídicos que inovam, de forma positiva, o ordenamento estatal, eis que a deliberação parlamentar de suspensão dos efeitos de um preceito jurídico incorpora, ainda que em sentido inverso, a carga de normatividade inerente ao ato que lhe constitui o objeto” (STF, ADI 748-MC, Rel. Min. Celso de Mello, DJ de 6-11-1992).


Informações Sobre o Autor

Lincoln Nolasco

Procurador Federal na Procuradoria Secional Federal em Uberlândia/MG; Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Uberlândia/MG; Pós graduando em Direito Previdenciário pelo Instituto Renato Saraiva e em Direito Público pela Universidade Federal de Uberlândia/MG


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