Este artigo trata da exclusão de contribuintes do Programa de Recuperação Fiscal (Refis) e do Parcelamento Especial (Lei n. 10.684/2003) (Paes) e dos seus direitos constitucionais ao devido processo legal, ao contraditório e à ampla defesa e à publicidade dos atos processuais.
No Brasil, o aumento sistemático da carga tributária, a edição desmedida de normas tributárias e o constante aperfeiçoamento dos órgãos incumbidos da arrecadação tributária, evidenciam a necessidade urgente de impor limites à avidez fiscal do Estado. No mínimo tornando efetivas as limitações constitucionais ao poder de tributar que já foram garantidas pela Constituição.
O Refis e seu sucessor imediato o Paes constituem exemplos do caótico sistema tributário brasileiro. Anunciados para promover a regularização de créditos tributários federais e proporcionar aos seus contribuintes retornarem à chamada economia formal, eles foram concebidos na verdade com objetivo único: aumentar ainda mais a arrecadação, atraindo contribuintes desavisados para verdadeiras armadinhas jurídicas.
Uma delas, objeto deste artigo, é relativa à exclusão dos contribuintes do Refis e do Paes.
As leis que instituíram o Refis e o Paes, respectivamente Lei n. 9.964, de 10 de abril de 2000 e Lei n. 10.684, de 30 de maio de 2003, dispõem sobre hipóteses de exclusão de contribuintes dos referidos programas. O art. 5º da primeira lei dispõe que a exclusão de contribuinte do Refis será efetivada “mediante ato do Comitê Gestor” e contempla onze hipóteses de exclusão. O art. 12 da segunda lei dispõe que a exclusão de contribuinte do Paes “independe de notificação prévia” e nos art. 7 º e art. 8 º contempla duas hipóteses de exclusão.
Com fundamento nessas disposições legais, o Comitê Gestor do Refis (CGR), a Secretaria da Receita Federal (SRF) e o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) excluem contribuintes do Refis e do Paes, sumariamente, e os notificam através de publicações no Diário Oficial da União (DOU) que contêm apenas os números dos processos administrativos dos contribuintes excluídos. Em determinadas hipóteses a exclusão ocorre independentemente de notificação. Os direitos dos contribuintes ao devido processo legal, ao contraditório e à ampla defesa e à publicidade dos atos processuais, garantidos pela Constituição, são solenemente ignorados pelo Poder Público. O assunto está submetido ao Poder Judiciário que não tem um entendimento unificado sobre o assunto.
A exclusão de contribuinte do Refis ou do Paes sem prévio processo administrativo fiscal que contemple o contraditório e o direito de defesa é ilegal ou inconstitucional da mesma forma que a intimação de contribuinte do Refis ou do Paes de decisão administrativa através de publicação do número do processo administrativo fiscal no DOU.
Ilegal se a Resolução n. 20 do CGR de 2001 for considerada ato normativo regulamentar dependente da Lei n. 9.964 de 2000. Nesse caso a resolução tal como foi expedida não está amparada pela referida lei uma vez que inovou e tratou de matéria que ela não contempla.
Inconstitucional se a Resolução n. 20 do CGR de 2001 for considerada ato normativo autônomo, hipótese em que ela afronta o princípio da reserva legal, os princípios do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, e o princípio da publicidade dos atos processuais, todos instituídos pela Constituição. Isso porque ela cria um processo administrativo fiscal específico, matéria reservada exclusivamente à lei, processo que tramita até o seu julgamento sem contraditório e sem defesa por parte do contribuinte, e sem publicidade dos atos processuais havidos até o julgamento.
Por outro lado, a intimação do contribuinte de sua exclusão do Refis ou do Paes através da publicação do número do processo administrativo no DOU e através da publicação do nome do contribuinte e das razões que determinaram a sua exclusão em página na Internet, conforme preconizado pela Resolução n. 20 do CGR de 2001, é ilegal, inconstitucional, irracional e completamente absurda. Lembre-se que os contribuintes desconhecem que existem processos administrativos fiscais com objetivo de excluí-los do Refis ou do Paes. Pois, para tomar conhecimento de eventual exclusão, um contribuinte deveria ler o DOU todos os dias e consultar na Internet todas as publicações encontradas no jornal, uma vez que elas contêm apenas os números dos processos administrativos, para verificar se, eventualmente, não foi excluído dos referidos programas. Como um contribuinte médio poderá consultar o DOU todos os dias? E se ele não tem computador? Como poderá consultar cada processo publicado na imprensa oficial na Internet para verificar se cada um deles não se refere à sua eventual exclusão? Só mesmo três burocratas ‘tapados’ – ou mal-intencionados – iguais aos que compõem o Conselho Gestor do Refis poderiam imaginar uma sistemática tão imbecil. Certamente, foi por esta razão que a Constituição, sábia, reservou tal assunto à lei.
Texto escrito em 10 de maio de 2006.
Advogado especializado em Direito Tributário, Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental pela Escola Nacional de Administração Pública.
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