Resumo: O presente artigo científico, busca trazer de forma resumida, alguns exemplos de limitações de garantias constitucionais no Brasil e que possuem no seu campo específico de atuação, certa legitimidade, ao menos atualmente para a limitação de determinadas garantias constitucionais.
Palavras-chave: direito penal; limitações de garantias; direito penal do inimigo; garantias constitucionais.
Abstract: This scientific article seeks to bring briefly, some examples of limitations of constitutional guarantees in Brazil and have in their specific field of activity, certain legitimacy, at least now for the limitation of certain constitutional guarantees.
Key-Words: criminal law; limitations of warranty; feindstrafrecht; constitutional guarantees.
Sumário: 1. Introdução; 2. Limitações legais de garantias constitucionais no Brasil, 2.1 Lei do Abate, 2.2 Regime Disciplinar Diferenciado, 2.3 Leis de combate ao Crime Organizado e o “Juiz sem rosto”, 2.4 Medida Provisória nº 699/2015, 2.5 Cadastro Nacional de Pedófilos PL nº 629/2015, 2.6 Execução provisória da pena: Habeas Corpus nº 126292, 2.7 Lei 13.260/2016 – Antiterrorismo; 3. Conclusão; 4. Bibliografia.
1. Introdução
A maior parte da população sempre foi objeto de limitações de garantias, a maior parte da população é quem sempre sofre com as consequências de uma política mal planejada e executada. Ao longo da história, inúmeras foram as vezes em que pessoas tiveram suas vidas modificadas ou ceifadas com violência, sendo que em determinadas épocas nem podemos falar em direitos ou garantias, pois esses direitos e garantias sempre estavam adstritos aos nobres e milionários. Durante séculos e muitas revoluções populares, enfim a pouco tempo atrás, os direitos e garantias foram estendidos para todo ser humano, não necessitando mais uma condição especial de sanguinidade para ser portador de tais direitos, bastando apenas ser humano. Contudo, como nem tudo são flores, estes direitos e garantias nunca foram absolutos, pois são muitas vezes colidentes com os direitos de outras pessoas, a sociedade evolui a passos muito lentos, isto a história nos mostra com uma riqueza de detalhes por vezes sombrios. E chegamos ao ponto destes direitos começarem a ser fatiados ou limitados, sob a roupa de tentar torná-los mais eficientes e eficazes do ponto de vista social, perde-se um pouco da liberdade, em troca de segurança, nos resta saber e estudar, para ver até que ponto é benéfico para a sociedade, limitar direitos e garantias fundamentais, como a vida, a imagem, a honra.
2. Limitações legais de garantias constitucionais no Brasil
Com o advento da Constituição cidadã em 1988, houve no cenário brasileiro uma quebra gigantesca no que concerne ao modelo de sociedade ao qual o povo brasileiro gostaria, a partir daquele momento desenvolver. É inegável a abissal distância que existe entre uma Ditadura Militar e uma Democracia; um Estado Democrático de Direito é sem dúvida um caminho longo e trabalhoso a ser desenvolvido, diria até ser eterno, pois é mais difícil se manter direitos conquistados do que simplesmente conquistá-los; o Brasil não se tornou um Estado Democrático de Direito por mágica, não se muda a cultura de um povo com uma Constituição de papel, mas sim com a força deste papel as instituições possam ter força para realizar o que está descrito no papel, pois sem transportá-las para a vida real, a nossa Constituição Cidadã, sem efetividade é somente um sonho. A nossa Constituição Federal possui muitas diretrizes a serem realizadas, o que demanda um esforço contínuo e ininterrupto de todos os cidadãos, que devem estar engajados na busca de dar efetividade a todos os direitos e garantias estabelecidas pelo legislador constituinte originário.
De certo que a constituição brasileira, é inovadora em inúmeros aspectos, e que pode ser considerada uma das mais garantistas, no que diz respeito as aplicações das normas e das instituições cada vez mais fortalecidas no engajamento desta aplicabilidade, contudo, por ser recente e vinda de uma ditadura militar recente, está constantemente sendo violada, pois estabelece em suas linhas iniciais um projeto futuro de sociedade, e convenhamos que uma democracia “quase” perfeita, não é tão fácil de se construir, são inúmeros os desafios enfrentados pelo povo e pelas instituições para dar cada vez mais efetividade as normas e aos preceitos nela contidos.
Não pretendo analisar a fundo, nem limitar o alcance do rol de normas limitadoras ora apresentado, pois seria materialmente impossível, e sim buscamos tão somente verificar algumas destas normas limitadoras de garantias, ou possivelmente limitadoras de garantias, a partir de um viés voltado à temática do Direito Penal do Inimigo, não procuramos enquadrar nenhum dos exemplos das normas citadas, mas sim, apenas verificar que, algumas das características destas normas, servem de exemplo didático, de uma maneira bem simplista, sobre normas que trazem consigo a semente do Direito Penal do Inimigo.
2.1 Lei do Abate
A Lei nº 9.614 de 5 de março de 1998, alterou a Lei nº 7.565 de 19 de dezembro de 1986, para incluir hipótese de destruição de aeronave, senão vejamos, o teor descrito na referida legislação;
“Art. 1º O art. 303 da Lei nº 7.565 de 19 de dezembro de 1986, passa a vigorar acrescido de um parágrafo, numerado como § 2º, renumerando-se o atual § 2º como § 3º, na forma seguinte:
"Art. 303. […]
§2º Esgotados os meios coercitivos legalmente previstos, a aeronave será classificada como hostil, ficando sujeito à medida de destruição, nos casos dos incisos do caput deste artigo e após autorização do Presidente da República ou autoridade por ele delegada.
§ 3º A autoridade mencionada no § 1º responderá por seus atos quando agir com excesso de poder ou com espírito emulatório." (BRASIL, 1998)
Verificado o tipo autorizador do “abate”, ou a “medida de destruição” conforme prevê a legislação, passamos a analisar alguns aspectos importantes no que tange este delicado tema. É de certo, e de bom tom, ter em mente que ninguém, ou nenhum Presidente ou eventual delegatário, sairá autorizando a derrubada de aeronaves aleatoriamente, contudo o próprio legislador teve que incluir, ou manter, pois o § 3º era o antigo § 2º, mas a legislação teve que mencionar que a autoridade será responsável pelos atos de autorização praticados “com excesso de poder ou com espírito emulatório”, esta seria uma espécie de “freio” da autorização de abater aeronaves classificadas como hostis, que adentrarem ao território nacional e não colaborarem com as medidas coercitivas legalmente previstas, as quais veremos em seguida, a Lei nº 12.432 de 29 de junho de 2011 estabelece a competência para julgamento do referido abuso ou excesso de poder.
As medidas coercitivas, as quais refere-se a legislação são descritas por intermédio de um artigo do Centro de Comunicação Social da Aeronáutica, aonde no link existe inclusive um vídeo explicativo, sobre as medidas realizadas, estas medidas envolvem basicamente 3 passos a serem seguidos, segundo a FORÇA AÉREA BRASILEIRA, 2016, :
“As aeronaves de interceptação da Força Aérea Brasileira, acionadas pelo Comando de Defesa Aeroespacial Brasileiro (COMDABRA), serão encarregadas da execução dessas medidas.
1º) MEDIDAS DE AVERIGUAÇÃO – primeiro nível das medidas busca determinar ou a confirmar a identidade de uma aeronave, ou, ainda, a vigiar seu comportamento. Engloba os seguintes procedimentos:
a) Reconhecimento à Distância, ocasião em que os pilotos da aeronave de interceptação, de uma posição discreta, sem serem percebidos, fotografam a aeronave interceptada e colhem informações de matrícula, tipo de aeronave, nível de vôo, proa e características marcantes;
b) Confirmação da Matrícula, que se dá quando as informações são transmitidas para a Autoridade de Defesa Aeroespacial, que entrará no sistema informatizado do Departamento de Aviação Civil (DAC) para verificar se a matrícula corresponde ao tipo de aeronave, o nome de seu proprietário, endereço, dados de identificação, validade do certificado de aeronavegabilidade, nome do piloto que normalmente a opera, licença, validade de exame médico, dados de qualificação e de localização, etc.
Caso a aeronave esteja em situação regular, será realizado apenas o acompanhamento;
c) Interrogação na freqüência prevista para a área, que é do conhecimento obrigatório de todo aeronavegante, consistindo na primeira tentativa de comunicação bilateral entre a aeronave interceptadora e a aeronave interceptada;
d) Interrogação na freqüência internacional de emergência, de 121.5 ou 243 MHz, iniciando pela de VHF 121.5 MHz, que é mostrada, através de uma placa, à aeronave interceptada pelo piloto do avião de Defesa Aérea, após ter estabelecido com ela contato visual próximo;
e) Realização de sinais visuais, de acordo com as regras estabelecidas internacionalmente e de conhecimento obrigatório por todo aeronavegante.
2º) MEDIDAS DE INTERVENÇÃO – caso o piloto da aeronave suspeita não responda e não atenda a nenhuma das medidas já enumeradas, passa-se ao segundo nível de medidas coercitivas, que é a Intervenção, caracterizada pela execução de dois procedimentos:
a) mudança de rota, determinada pela aeronave de interceptação, tanto pelo rádio, em todas as freqüências disponíveis, quanto por intermédio dos sinais visuais previstos nas normas internacionais e de conhecimento obrigatório;
b) pouso obrigatório, também determinado pela aeronave interceptadora de forma semelhante à tarefa anterior.
3º) MEDIDAS DE PERSUASÃO – o terceiro nível das medidas previstas, que entrará em execução somente se o piloto da aeronave suspeita não atender a nenhuma das medidas anteriores, consiste na realização de tiros de advertência, com munição traçante, lateralmente à aeronave suspeita, de forma visível e sem atingi-la.
No total, são nove os procedimentos a serem seguidos pelas autoridades de defesa aérea para o policiamento do espaço aéreo. Somente quando transgredidos os oito procedimentos iniciais é que a aeronave será considerada hostil, e estará sujeita à medida de destruição, que consiste na realização de disparo de tiros, feitos pela aeronave de interceptação, com a finalidade de provocar danos e impedir o prosseguimento do vôo da aeronave transgressora.”
Primeiramente, vemos neste dispositivo, que é plenamente possível aplicar a pena capital sem estarmos em guerra declarada, o que seria de uma inconstitucionalidade abissal, a menos que se possa “destruir”, vejam é o termo da definição legal, “destruir” a aeronave, bom se for possível destruir uma aeronave sem destruir junto quem está dentro, ai não teremos a pena capital, mas é improvável que uma pessoa que esteja em uma aeronave que “caia” ao solo por abatimento venha a sair ileso, os acidentes e as quedas de aviões demonstram que a morte em casos de queda é altíssima, isso é notório, basta acompanhar os noticiários quando da queda de aeronaves. Temos pois o primeiro grande problema, eis que Capez apud Silva, 2011 p.22, descreve que “o direito a vida é o maior dos direitos e o princípio fundamental da humanidade e que não pode ser interrompido senão pela morte espontânea e inevitável”. A constituição tutela a vida como sendo o mais importante bem do homem, proibindo a pena de morte, ressalvado em casos de guerra declarada e em casos específicos, mas assegurado o processamento.(CAPEZ, p.22, 2011). Ademais a proibição da pena de morte constitui limitação material explícita, sendo o núcleo constitucional intangível nos termos do artigo 60 §4ª, inciso IV da CF. A Constituição proíbe a imposição da pena de morte ao condenado, mesmo após o devido processo legal, ressalvado guerra declarada; o Estado tem o dever de garantir a vida do preso durante a execução da pena, como pode uma aeronave “hostil”, esgotadas as tentativas, mas se a aeronave não responder as solicitações, e não demonstrar “agressividade”, pode ser legalmente abatida, encontrando-se em plena vigência de um Estado Democrático de Direito.
Demonstra portanto, embasada na Carta da ONU, sob o princípio da autodefesa, que o policiamento do espaço aéreo, é um indício de um Estado de Polícia existente dentro do Estado Democrático de Direito, apesar de alguns considerarem a lei inconstitucional por em tese ferir princípios, a lei está vigente, sendo necessário o seu cumprimento principalmente por parte de pilotos de aeronaves, sob pena de não respondendo as solicitações serem considerados hostis e serem abatidos. É uma legislação, que merece cuidado, mas extremamente necessária a defesa da soberania nacional, e ao combate e diminuição à ocorrência de infrações. (COELHO, Jr, 2015)
Verificamos, que para emitirmos opinião sobre determinado assunto, é pois necessário um estudo esmiuçado sobre o tema, pois quem analisa e lê tão somente a frase “lei do abate”, pensa que a lei autoriza ao Estado abater qualquer aeronave, e de fato autoriza, contudo, todavia, é necessário o preenchimento de requisitos que precisam ser realizados de forma muito rápida, é necessária a prevenção e combate ao crime, principalmente os mais graves e que geram maiores danos, a aeronave somente será considerada hostil e será abatida se não obedecer nenhuma das determinações e não seguir os procedimentos mínimos de segurança, como diz o ditado popular “quem não deve não teme”.
A legislação alemã, após os atentados terroristas de 11 de setembro de 2001, foram modificadas em relação ao tráfego aéreo, contudo pouco tempo após foi recusada a hipótese de se abater aeronaves que estivessem sob domínio de terroristas, pois o Tribunal alemão entendeu ferir “princípios fundamentais do direito”. (JAKOBS, 2009, p.63-67)
2.2 Regime Disciplinar Diferenciado
O Regime Disciplinar Diferenciado, caracteriza-se primordialmente pelo isolamento total do apenado e teve sua introdução na legislação penal brasileira, primeiramente devido à uma megarrebelião ocorrida no início de 2001, quando 29 unidades prisionais rebelaram-se simultaneamente por ordem de chefes de facções criminosas exaradas de dentro das próprias penitenciárias, gerando uma resposta por parte do Estado de São Paulo, a Resolução 26/2001, resolução esta, que criou a possibilidade de isolar o preso por até 360 dias e aplicava-se aos líderes de facções criminosas ou portadores de comportamentos inadequados, O RDD é uma sanção administrativa.(COSTA, 2015)
Ainda, complementa o Juiz Baltazar Júnior que o Regime Disciplinar Diferenciado,
“foi criado, inicialmente, no Estado de São Paulo, veiculado pela Resolução SAP-026, de 4 de maio de 2001, publicada no DOE, v. 111, n. 84, de 5 de maio de 2001, a qual, segundo sua ementa, Regulamenta a inclusão, permanência e exclusão dos presos no Regime Disciplinar Diferenciado. A norma teria sido veiculada no exercício da competência estadual para legislar sobre direito penitenciário e foi considerada válida pelo TJSP (HC 400.000.3/8, 6ª Cam., 21.11.02). A experiência paulista motivou o Projeto de Lei nº 5.073/2001, do Poder Executivo Federal, que veio a ser aprovado, resultando na Lei nº 10.792/03, que introduziu em nosso ordenamento o regime disciplinar diferenciado, apesar da manifestação contrária do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, em sessão de 14 de abril de 2003, bem como na Resolução nº 10, de 12 de maio de 2003, que aprovou o Relatório da Comissão instituída para estudo da matéria”. (BALTAZAR JUNIOR, 2007)
Após decorrida esta rebelião em São Paulo, que deu o pontapé inicial no Regime Diferenciado; em outros estados, sucedeu-se do mesmo modo, como no Rio de Janeiro em 2002, com a rebelião do presídio de Bangu. COSTA, 2013, Esses fatos repercutiram tanto na mídia na época, que
“Após grande pressão popular e midiática, principalmente derivado do pânico causado pelo assassinato de dois juízes das varas de execuções criminais de São Paulo e Vitória a suposto mando de Fernandinho Beira-Mar, veio à tona a Lei 10.792 em 2003, dois anos depois da edição da resolução 26/2001, para introduzir o Regime Disciplinar Diferenciado, incluindo-o na Lei de Execução Penal (LEP), alterando o artigo 52 da LEP, que passou a descrever as hipóteses e requisitos em que o RDD poderá ser aplicado”. (COSTA, 2013).
Com o advento da Lei 10.792 de 1º de dezembro de 2003, foram alterados artigos da Lei de Execução Penal, que possibilitaram então, o Regime Disciplinar Diferenciado no território nacional por inteiro. Quando do seu advento, e até hoje, esta referida lei de alteração, sofreu e sofre duras críticas quanto da sua constitucionalidade, inclusive tendo sido apresentada pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, uma Ação Direta de Inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal, em 17 de outubro de 2008, sob o nº4162, com pedido de liminar, e que está aguardando julgamento até hoje, sobre a constitucionalidade ou não da referida lei do Regime Diferenciado, para detentos, que podem mesmo presos comandar ataques contra a manutenção da cidadania, e o bom funcionamento e romper com a paz social. (SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. ADI Nº4162).
Verificado o conceito e o posicionamento de alguns, eis que ousamos discordar sobre a inconstitucionalidade da referida medida, tendo em vista primordialmente que é uma medida prevista em lei e que pressupõe alguns requisitos para ser imposta, ou seja, não é uma medida imposta à qualquer preso, ademais não é durante todo o cumprimento da pena e sim por tempo determinado; entendemos que o Regime Disciplinar Diferenciado é, pois, necessário e constitucional; assim também é o entendimento de Capez, senão vejamos;
“Considerando-se que os princípios fundamentais consagrados na Carta Magna não são ilimitados (princípio da relatividade ou convivência das liberdades públicas), vislumbra-se que o legislador, ao instituir o Regime Disciplinar Diferenciado, atendeu ao princípio da proporcionalidade. Ademais é legítima a atuação estatal, tendo em vista que a Lei nº 10.792/2003, que alterou a redação do art. 52 da LEP, busca dar efetividade à crescente necessidade de segurança nos estabelecimentos penais, bem como resguardar a ordem pública, que vem sendo ameaçada por criminosos que, mesmo encarcerados, continuam comandando ou integrando facções criminosas que atuam no interior do sistema prisional – liderando rebeliões que não raro culminam com fugas e morte de reféns, agentes penitenciários e/ou outros detentos – e, também no meio social”. (STJ, 5ª T. HC 40300 RJ, rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, j. em 7-6-2005, DJU de 22-8-2005, p. 312, RT843/549).(CAPEZ, 2011, p.180)
Temos pois que uma liberdade individual do preso, não pode se sobrepor à liberdade individual do cidadão; cada um é livre, desde que respeite a liberdade do outro e a sua própria liberdade.
Verificamos agora um Agravo Regimental, na que o Superior Tribunal de Justiça confirma necessidade da existência do Regime Disciplinar Diferenciado.
“Ementa: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO DA PENA. REGIME DISCIPLINAR DIFERENCIADO. INCLUSÃO EM PRESÍDIO FEDERAL. ALEGAÇÃO DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. OBSERVÂNCIA DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. GARANTIA DA SEGURANÇA PÚBLICA. 1. Muito embora a Lei de Execução Penal assegure ao preso o direito de cumprir sua reprimenda em local que lhe permita contato com seus familiares e amigos, tal garantia não é absoluta, podendo o Juízo das Execuções, de maneira fundamentada, indeferir o pleito se constatar ausência de condições para o acolhimento no estabelecimento prisional pretendido ou a necessidade de submeter o condenado a regime disciplinar diferenciado. 2. Na hipótese dos autos, a inclusão do condenado em regime disciplinar diferenciado foi justificada por sua alta periculosidade e participação de liderança em movimento destinado a desestabilizar o sistema prisional, colocando em risco a vida de agentes penitenciários, motivos suficientes para justificar a medida excepcional e descaracterizar o constrangimento ilegal aduzido. 3. Agravo regimental desprovido”. (STJ, AgRg no RHC 46.314/MS, 5ª T., Rel. Min. Moura Ribeiro, j. em 05/08/2014)[1]
O Regime Disciplinar Diferenciado, é um regime gravoso, contudo, como o próprio nome diz, é diferenciado, para condenados diferenciados; o Superior Tribunal de Justiça, no Informativo nº 438/10, ao analisar competência para a transferência de presos, diz que presos do RDD, são indivíduos de alta periculosidade, vinculados a facções criminosas e ao narcotráfico, que exercem influência sobre outros detentos e se utilizam do medo como forma de intimidação às vítimas.[2]
Muitas são as restrições do regime disciplinar diferenciado, bastando o agente para tal, cometer alguma das possibilidades elencadas na legislação para ver sua liberdade praticamente isolada.
“EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. FALTA DISCIPLINAR DE NATUREZA GRAVE. ABANDONO DO CUMPRIMENTO DA PENA. INFRAÇÃO DISCIPLINAR NÃO HOMOLOGADA EM DATA ANTERIOR À PUBLICAÇÃO DO DECRETO PRESIDENCIAL. DECISÃO MANTIDA. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. A configuração da falta de natureza grave enseja vários efeitos, entre eles: a possibilidade de colocação do sentenciado em regime disciplinar diferenciado; a interrupção do lapso para a aquisição de outros instrumentos ressocializantes, como, por exemplo, a progressão para regime menos gravoso; a regressão no caso do cumprimento da pena em regime diverso do fechado, além da revogação em até 1/3 do tempo remido. 2. Para o reconhecimento da prática de falta disciplinar no âmbito da execução penal – no caso, fuga do estabelecimento prisional -, é imprescindível o reconhecimento da infração pelo juízo competente, mediante homologação de procedimento administrativo disciplinar, no prazo previsto no art. 5° do Decreto n. 8.172/2013, o que não ocorreu em data anterior à publicação do decreto presidencial. 3. Agravo regimental não provido”. (STJ, AgRg no HC 340.687/SP, 6ª T., Rel. Min. Rogério Schietti Cruz, j. em 17/12/2015)[3]
2.3 Leis de combate ao Crime Organizado e o “Juiz sem rosto”
São duas as principais legislações recentes em vigor no Brasil que se referem ao combate ao crime organizado, a Lei 12.694/2012 que dispõe sobre o processo e o julgamento colegiado em primeiro grau de jurisdição de crimes praticados por organizações criminosas, e a Lei 12.850/2013, que define o que é organização criminosa e dispõe sobre a investigação criminal, os meios de obtenção da prova, além das infrações penais correlatas e o procedimento criminal seguido.
Num primeiro momento analisaremos alguns pontos referentes a legislação que define o que é “organização criminosa”.
Segundo explicação dada em aula pelo professor Alexandre Rocha Almeida de Moraes, “a criminalidade organizada rompe o paradigma do direito penal clássico”, pois são pessoas e indivíduos que se preparam e se especializam, se unindo para cometerem crimes e por vezes utilizando métodos sofisticados e tecnológicos na execução dos atos delitivos.
As principais características do crime organizado são:
“A utilização de tecnologias;
Estrutura hierarquizada empresarialmente com divisões funcionais de atividade, com cadeias de comando e divisão de trabalho bem delineadas e revertidas por uma rígida subordinação hierárquica entre seus componentes;
Simbiose frequente com o poder público;
Alto poder de intimidação e violência;
Preferência pela prática de crimes rentáveis, como por exemplo, extorsão, pornografia, prostituição, jogos de azar, tráfico de armas e entorpecentes e crimes de internet;
Tendência em expandir suas atividades para outros países, sob a forma de multinacionais criminosas;
Diversidade de atividades, o que garante maior lucratividade”.
Um caso recente de utilização desta legislação de combate ao crime organizado ocorreu com a prisão do vice-presidente do Facebook na América Latina, a maior rede social virtual do mundo, aonde foi utilizado como fundamentação, o § 1º do artigo 2º da lei de combate ao crime organizado Lei nº 12.850/2013, no qual estaria em tese enquadrado o vice-presidente da empresa na América latina, por estar a empresa impedindo ou obstruindo investigação de prática criminosa. O grande problema iniciou-se quando a Justiça do Estado de Sergipe requisitou ao Facebook que é o responsável pelo aplicativo de celular Whatsapp no Brasil, que informassem os nomes ou informações de suspeitos de tráfico de drogas que estariam a utilizar o aplicativo para tal finalidade, a fim de que pudessem servir como provas ou como complemento das investigações; com as negativas de fornecimento das informações por parte da empresa eis que eram “imprescindíveis para a produção de provas a serem utilizadas em uma investigação de crime organizado e tráfico de drogas". Notadamente pelas características acima elencadas do crime organizado, enquadrou-se neste caso em concreto a referida legislação, contudo sabemos que em tese a empresa Facebook, proprietária do aplicativo Whattsapp, não possui configuração de organização criminosa, mesmo por tal razão fora posto em liberdade no dia seguinte, graças a um Habeas Corpus, mas resta uma delicada situação, pois se a empresa não possui mecanismos para guardar as informações dos usuários, por óbvio não há viabilidade em fornecê-las, contudo se faz imprescindível por vezes a consulta a eventual cadastro, a questão pode ter se mostrado extremada do ponto de vista coercitivo, este caso nos mostra que efetivamente a sociedade está em constante mudança, principalmente quando se trata de tecnologias, e empresas, e os conflitos continuarão ocorrendo.(SANTIAGO, 2016)
Passaremos agora para a legislação que trata do disciplinamento do processo e julgamento colegiado já no primeiro grau de jurisdição, dos crimes praticados por membros de organizações criminosas, que busca trazer medidas de proteção aos membros da Magistratura e do Ministério Público, (Lemes, 2016), essa lei é conhecida também por Lei Patrícia Acioli, que foi uma Juíza assassinada por policiais que estavam sendo objeto de investigação e processados perante o juízo na qual ela exercia a magistratura, que reprimia o crime organizado. (SENADO, 2012)
Com decorrer do prazo da vacatio legis de 90 dias, a legislação entrou em vigor, trazendo a principal possibilidade, qual seja, uma decisão colegiada, tomada em primeiro grau, para qualquer das decisões que precisariam ser tomadas no decorrer do processo, desde que motivadas e somente para aquele ato específico, não se perfazendo o devido processo legal perante o colegiado, este somente entra em cena após decisão motivada e unicamente para a realização daquele ato solicitado, senão vejamos alguns dos principais dispositivos que a legislação apresenta referente a este tema,
“Art. 1o Em processos ou procedimentos que tenham por objeto crimes praticados por organizações criminosas, o juiz poderá decidir pela formação de colegiado para a prática de qualquer ato processual, especialmente: […]
§ 1o O juiz poderá instaurar o colegiado, indicando os motivos e as circunstâncias que acarretam risco à sua integridade física em decisão fundamentada, da qual será dado conhecimento ao órgão correicional.
§ 2o O colegiado será formado pelo juiz do processo e por 2 (dois) outros juízes escolhidos por sorteio eletrônico dentre aqueles de competência criminal em exercício no primeiro grau de jurisdição.
§ 3o A competência do colegiado limita-se ao ato para o qual foi convocado.
§ 4o As reuniões poderão ser sigilosas sempre que houver risco de que a publicidade resulte em prejuízo à eficácia da decisão judicial.
§ 5o A reunião do colegiado composto por juízes domiciliados em cidades diversas poderá ser feita pela via eletrônica.
§ 6o As decisões do colegiado, devidamente fundamentadas e firmadas, sem exceção, por todos os seus integrantes, serão publicadas sem qualquer referência a voto divergente de qualquer membro.
§ 7o Os tribunais, no âmbito de suas competências, expedirão normas regulamentando a composição do colegiado e os procedimentos a serem adotados para o seu funcionamento.
Art. 2o Para os efeitos desta Lei, considera-se organização criminosa a associação, de 3 (três) ou mais pessoas, estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de crimes cuja pena máxima seja igual ou superior a 4 (quatro) anos ou que sejam de caráter transnacional.”
A grande questão envolvida com esta legislação não diz respeito a proteção dos magistrados e dos membros do ministério público que sem dúvida em um estado democrático de direito é essencialmente fundamental, mas sim da possível criação ou “legalização” da figura do “Juiz sem rosto” ainda que não explicitamente ou expressamente, tendo em vista que os atos que forem decididos coletivamente serão assinados por assim dizer, pelos três julgadores, não podendo a parte sequer ser revelado se houve voto divergente ou contrário aquela decisão que fora tomada em conjunto, sabe-se que existe a figura do juiz sem rosto na Colômbia e no Peru, que estabelecem uma espécie de proteção a identidade dos funcionários. (MORAES DA ROSA, 2012)
Conforme relata Alexandre Moraes da Rosa,
“Vivencia-se cada vez mais o discurso do “aumento da criminalidade” e da preocupação pública em relação à possibilidade de contenção desta periculosidade generalizada, embora esses argumentos sejam muitas vezes promovidos pela mídia e pelas estratégias de controle social, dissociados, de fato, dos mecanismos reais de violência, aliás, constitutiva. Assim, em virtude da pressão exercida pela população em geral em busca de políticas mais rigorosas, os Estados passam a adotar medidas de urgência que, muitas vezes, oferecem riscos às garantias dos indivíduos”. (MORAES DA ROSA, 2012)
Percebemos a influência popular e midiática que estão ocorrendo nas recentes legislações brasileiras, tendo em vista o endurecimento das penas e a relativização de princípios, o que necessita ser amplamente discutido, pois trata-se de um início de rompimento do estado de polícia que deveria existir como mero protetor da sociedade em geral e não como um estado repressor, quando mais se regula e se reprime, menos liberdade os indivíduos possuem para realizarem suas atividades da vida, obviamente essa liberdade não pode exceder a do outro, do contrário cria-se uma anarquia, verdadeiro caos social, o que provoca medidas extremadas, as quais vem ocorrendo nos demais países. As medidas de criação, ou estabelecimento da figura do “Juiz sem rosto”, em países como Colômbia e Peru, decorreram do brutal exercício criminal naqueles países, segundo Alexandre Moraes apud Goméz,
“A situação de poder e de liberdade por parte dos ditos “criminosos” era de tal gravidade, que em 6 de novembro de 1985, membros da guerrilha denominada M19 – ligada a Pablo Escobar – entraram no Palácio da Justiça (Bogotá), então sede da Corte Suprema e do Conselho de Estado, e mataram 11 magistrados, entre eles o presidente da Corte Suprema de Justiça, 22 funcionários, sete advogados auxiliares, 11 membros da Força Pública e 3 civis. Em face desta situação “alarmante”, em que o Estado se depara com fato tipicamente anárquico, criou-se a figura do juiz sem rosto por meio do Decreto nº 2700 de 1991”. (GOMEZ, 2008)
Fato demonstrativo de que na Colômbia a situação chegou, ou melhor dizendo, ultrapassou os limites do aceitável em termos de violência de rua em uma sociedade que busca a paz, o caos estava completamente estabelecido, pois quando o sistema de justiça não é respeitado pelos indivíduos, a sociedade carece de proteção, ficando absolutamente toda a população à mercê da violência e da criminalidade, e viu-se na figura do juiz sem rosto a possibilidade de que esses atos violentos contra magistrados pudessem diminuir, contudo conforme citado acima por Alexandre Moraes, as soluções urgentes que são tomadas para conter a criminalidade, por vezes não surtem o efeito desejado, tratando-se de mero engodo midiático, tratando-se de demasiada pirotecnia legislativa, tornando o cidadão muitas vezes a grande vítima da legislação criada as pressas para combater a criminalidade, por isso é necessário cautela na elaboração de leis, principalmente criminais, seguindo as resoluções e tratados das Nações Unidas, e partindo da interpretação da Constituição Federal Brasileira.
2.4 Medida Provisória nº 699/2015
A tecnologia, amplamente comercializada e distribuída, possui na atualidade um papel fundamental e importantíssimo no que tange a divulgação e propagação de informação de massa; cabendo a cada um, saber ou procurar saber identificar a fonte das informações antes de sair, propagando e divulgando conteúdos. Um caso recente que ocorreu com a edição de uma Medida Provisória por parte do Poder Executivo Federal, a MP nº699, que alterou uma parte do Cótigo de Trânsito Brasileiro, para em síntese elevar a pena administrativa para quem bloqueasse vias ou rodovias com veículos, multiplicando por 30 (trinta) vezes para quem o fizesse e multiplicando por 100 (cem) vezes para aqueles que seriam os “organizadores” do bloqueio, ocorre que tal medida é, e foi, pois, muitíssimo leviana do ponto de vista inclusive técnico, pois ao analisar a “justificativa”, esta não especifica por exemplo, em momento algum do porquê serem tão elevadas assim as infrações, porque serem multiplicadas por 30 ou por 100 em caso de bloqueio de estrada, não fora, pelo menos no site oficial do Planalto apresentados estudos que comprovassem a real necessidade de elevar a infração e ser elevada nestes termos, para um ato de bloqueio de estradas, tendo em vista que sendo em caso de embriaguez a infração é multiplicada “somente” por 10 (dez), e convenhamos que um motorista embriagado pode causar acidentes graves, e o bloqueio de estradas por mais que atrapalhe a vida dos cidadãos é mais um inconveniente, verificamos portanto que faltou razoabilidade e proporcionalidade, demonstrando desespero legislativo, por parte do Poder Executivo, que invocando dispositivo constitucional importantíssimo como é o caso da medida provisória, utilizou-se dela como uma subterfugiada retaliação ao protesto dos caminhoneiros que estava sendo feito em algumas rodovias do país, aonde estavam sendo propagados pelos meios de comunicação de massa, principalmente através da rede mundial de computadores a internet; é de certo lembrar que em vários pontos haviam sim bloqueios de estradas, mas jamais, motivos suficientes para se tomar estas medidas desesperadoras ainda mais em um estado Democrático de Direito, que é pautado pelo diálogo e solução pacifica dos conflitos, como está descrito inclusive na Constituição Federal, o Estado simplesmente tentou demonstrar poder, frente a manifestação de um movimento social, dever-se-ia por parte do Estado, buscar dentro do diálogo e da conciliação, os instrumentos necessários para a melhor resolução do impasse social, de certo que os bloqueios de estradas e rodovias atrapalharam inúmeras pessoas, centenas de veículos restaram impedidos de ir e vir, direito constitucional por sinal, contudo não pode o estado tratar de forma opressiva seus membros, esta medida se amoldaria dentro do conceito inimigo, pois com tal medida, buscou-se simplesmente a retaliação, o Estado Brasileiro tratou, naquele momento o protesto dos caminhoneiros, como os verdadeiros inimigos do Estado e da sociedade, segundo o momento social vivido, a MP699/2015 trouxe ou fez parecer como “inimigo” da sociedade, os caminhoneiros. (HUMBERT, 2015; DIAS, 2015)
2.5 Cadastro Nacional de Pedófilos PL nº 629/2015
A pedofilia sem sombra de dúvida, é um dos crimes mais graves que podem ocorrer, pois atingem os jovens, adolescentes e crianças, seres humanos em desenvolvimento social, psicológico e afetivo, seres que merecem e detém a proteção estatal em legislações gerais e especiais, contudo, infelizmente, ainda não foi possível evitar os crimes com a prevenção, que vem sendo feita mas carece de efetividade, pois a proteção, que também é prevista em leis, vem falhando substancialmente.
O debate acerca da criação de um cadastro de pedófilos, iniciou-se no estado de São Paulo, com a criação por parte da 4ª Delegacia de Repressão à Pedofilia no ano de 2013, realizando o primeiro cadastro, e desde então alguns estados da federação iniciaram os trâmites para a criação de cadastros estaduais, atualmente existe uma proposta para criar um cadastro nacional de pedófilos, unificando assim o cadastro, facilitando a identificação e a mais rápida resposta estatal decorrente da ocorrência destes crimes, para que possam os pedófilos cadastrados serem monitorados, tendo em vista a explicação médica a seguir descrita, inferir que pedofilia não tem cura, eis que já no estado do Mato Grosso surgiu o primeiro levantamento de possível inconstitucionalidade de tal medida, realizado pelo deputado Pery Taborelli (PV), que na votação do veto no estado do Mato Grosso, ao subir na tribuna, apontou a inconstitucionalidade da lei, afirmando que o cadastro criaria uma espécie de “pena perpétua”, algo proibido pela Carta Magna, ainda segundo Pery
“A Constituição diz que não haverá penas perpétuas. Isso é cláusula pétrea, ou seja, não pode ser mexida. Se essa lei for promulgada, ela será derrubada facilmente com uma Adin (ação direta de inconstitucionalidade). Aprovando esse cadastro, estamos colocando o nome de um ser humano em pena perpétua, ainda que seja infame o ato praticado.” (O POVO online, 2013)
Contudo, os demais parlamentares entenderam que “O interesse público é maior do que a alegada inconstitucionalidade”. Ademais havia dentre os parlamentares um médico psiquiatra, o Leonardo Albuquerque (PDT), que afirmou que a psiquiatria vê a pedofilia como uma doença que não tem cura nem tratamento, vejamos o que diz o Parlamentar Leonardo,
“Não existe remédio para tratar pedófilo. Essas pessoas não podem estar próximas de crianças, pois na grande maioria das vezes, elas vão ter recaídas. O Estado tem que tomar um atitude em relação a isso. Alguns países optam pela castração química, em outros os indivíduos condenados por abusar de crianças são monitorados”. (O POVO online, 2013)
Portanto se tomarmos com base, a dificuldade de se obter provas, pois muitas vezes o pedófilo, o abusador é próximo, ou muito próximo da vítima, sendo por vezes, pai, padrasto, vizinho, primo, tio, incluindo também, a mãe, madrasta, vizinha, prima, tia, enfim, muitas vezes o vilão é quem deveria proteger. (O POVO online, 2013)
Visando unificar os cadastros esparsos que estavam sendo criados nos estados, surgiu a ideia de unificar o cadastro em base nacional, tornando-se possível ampliar a cobertura e o acesso dos investigadores, para que possam ter ciência e trocar informações sobre os crimes e os perfis de pedófilos, pois se o cadastro for somente local, a prestação investigativa e posteriormente jurisdicional ficaria prejudicada, pois se o pedófilo cometeria crimes, abusos em vários estados, seria e o é, sem o cadastro, muito mais difícil de tomar conhecimento de que se trata de um pedófilo e que merece tratamento para que possa ter uma vida mais normal possível, sem colocar em risco a vida das crianças e adolescentes. Com o cadastro, muitos crimes poderiam ser evitados, através da utilização deste sistema de informações. Uma das questões, seria a de que o pedófilo andaria pelo resto da vida com este rótulo estampado na testa, triste, pois se realmente não existe cura, uma vez pedófilo, sempre pedófilo. Segundo a psiquiatra Maria da Conceição Nogueira, “o desejo deles por crianças é algo incontrolável, é um doente sem cura. Eles precisam ser tratados com medicamentos e acompanhamentos de psicólogos e psiquiatras. A pedofilia é um crime e os pedófilos devem ser presos, mas, infelizmente, eles saem dos cárceres ainda piores por falta de assistência adequada e das mutilações que acabam sofrendo. (ANDRADE, 2010)
Quando se trata de criação ou desenvolvimento de políticas públicas de combate ao crime, ou de realização de políticas criminais, sempre vem em mente do contribuinte, pagador de impostos, a quantidade de dinheiro que será desprendido, na realização, elaboração e implementação do sistema, o que segundo o deputado autor do projeto de lei Vitor Valim, a adaptação do sistema INFOSEG (Rede de Integração Nacional de Informações de Segurança Pública, Justiça e Fiscalização) não seria custosa pois este sistema referente a segurança pública já opera outros mecanismos, e este cadastro de pedófilos seria somente mais um mecanismo do sistema. Ocorre que este cadastro que a uma primeira vista parece ser a salvação das criancinhas, pode em tese futuramente caracterizar um abuso enorme do poder público, pois se este cadastro for permanente será esta a prove de que não existe recuperação após a prática de um crime, pois se alguém, (homem, mulher, cis, trans, for cadastrado no sistema como pedófilo, ou “possível” pedófilo, e seu nome do sistema nunca mais sair, estará demonstrado que uma vez suspeito pra sempre suspeito, uma vez pedófilo, sempre pedófilo, óbvio que provavelmente as almas iluminadas dos doutos legisladores, conhecedores e sabedores da lei que o são, terão a suavidade de analisar e fazes constar na referida legislação que o nome cadastrado será mantido somente durante o período de prescrição do delito; afinal após o cumprimento de pena, se o nome continuar cadastrado, estará configurada a pena perpétua, ou o cadastro perpétuo.
É de certo que este repugnante crime, mereça total reprovação social e criminal, devendo a segurança pública se empenhar em cada vez mais utilizar-se da tecnologia a serviço do bem estar social, contudo conforme está disposto na emenda nº 1 do Deputado José Priante, no Artigo 2º do ainda projeto 629/15, o pedófilo, será para o sistema sempre pedófilo, logo não mais poderá se recuperar, uma vez criminoso, sempre criminoso, parece do ponto de vista do Direito Penal do Inimigo, como uma marca, de que o pedófilo não mais terá a possibilidade de reinserção social, pois será pedófilo enquanto viver, alguns dirão que pedófilo não merece a condição de cidadão, contudo, a pena para o crime está prevista na legislação, e o cadastro do sistema informatizado não pode ser esta pena, este rótulo.
Se aprovado este projeto, será um importante instrumento para a polícia e para as vítimas, em fazer o reconhecimento dos agressores, facilitaria as investigações, aonde será possível estudar com uma maior eficiência os passos de um pedófilo, este ser, que ataca na inocência e na impossibilidade de defesa da vítima, criança ou adolescente, sendo seus atos repercutidos em todas as etapas da vida do indivíduo vítima e da cadeia social, pois se de um lado possuímos um pedófilo sem cura e sem o devido tratamento, se os abusos forem cometidos, teremos as vítimas, muitas mortas, ou com lesões físicas ou psicológicas para a vida toda, interferindo no seu bem estar social e da comunidade, que terá que arcar com os custos de tratamento, que por vezes são ineficientes. Contudo todo uso de tecnologia é bem vinda, desde que bem utilizada, ressaltando que o cadastro deverá ser mantido sempre em sigilo, cabendo o acesso ao sistema somente quem de direito, preservando a imagem do doente pedófilo e a imagem da vítima.
2.6 Execução provisória da pena: Habeas Corpus nº 126292
Cumpre inicialmente informar, de que não se trata de norma, mas de uma jurisprudência consolidada na mais alta Corte Jurídica do país, que muda seu entendimento, que desde 2009 entendia ser necessário o trânsito em julgado da sentença penal condenatória, para o início da execução da pena, uma jurisprudência que era basicamente fundada no Princípio basilar do direito, prevista constitucionalmente, qual seja o Princípio da presunção de inocência ou da não culpabilidade; constante do Artigo 5º, inciso LVII, da Constituição Federal de 1988, que tem como enunciado: “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”.
“Segundo o relator do caso, ministro Teori Zavascki, ressaltou em seu voto que, até que seja prolatada a sentença penal, confirmada em segundo grau, deve-se presumir a inocência do réu. Mas, após esse momento, exaure-se o princípio da não culpabilidade, até porque os recursos cabíveis da decisão de segundo grau, ao STJ ou STF, não se prestam a discutir fatos e provas, mas apenas matéria de direito. “Ressalvada a estreita via da revisão criminal, é no âmbito das instâncias ordinárias que se exaure a possibilidade de exame dos fatos e das provas, e, sob esse aspecto, a própria fixação da responsabilidade criminal do acusado”, afirmou.
Como exemplo, o ministro lembrou que a Lei Complementar 135/2010, conhecida como Lei da Ficha Limpa, expressamente consagra como causa de inelegibilidade a existência de sentença condenatória proferida por órgão colegiado. “A presunção da inocência não impede que, mesmo antes do trânsito em julgado, o acórdão condenatório produza efeitos contra o acusado”.
No tocante ao direito internacional, o ministro citou manifestação da ministra Ellen Gracie (aposentada) no julgamento do HC 85886, quando salientou que “em país nenhum do mundo, depois de observado o duplo grau de jurisdição, a execução de uma condenação fica suspensa aguardando referendo da Suprema Corte”.
Sobre a possibilidade de se cometerem equívocos, o ministro lembrou que existem instrumentos possíveis, como medidas cautelares e mesmo o habeas corpus. Além disso, depois da entrada em vigor da Emenda Constitucional 45/2004, os recursos extraordinários só podem ser conhecidos e julgados pelo STF se, além de tratarem de matéria eminentemente constitucional, apresentarem repercussão geral, extrapolando os interesses das partes”. (SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL HABEAS CORPUS 126.292)
O que muda, nesta importante decisão, é de que após a decisão colegiada de segundo grau, o réu já pode iniciar a execução provisória da pena, mesmo se recorrer às instâncias superiores, seja em recurso especial ou extraordinário, e ainda não tendo o trânsito em julgado da sentença penal condenatória, conforme expresso o mandamento constitucional.
Entro nesta seara de discussões, pois entendo que muito tem a ver esta decisão do Supremo Tribunal Federal, com o Direito Penal do Inimigo, pois a sociedade quer ver o condenado preso, por óbvio que por vezes o julgador de primeiro grau comete equívocos, e inúmeras vezes às decisões monocráticas são revistas por órgãos colegiados que reformam as sentenças. Escapa muito bem em sua fundamentação o Ministro relator Teori Zavascki, pois mitigar, ou limitar a constitucionalidade de um princípio expresso na constituição, ou no mínimo um mandamento a ser seguido por todos, inclusive por aqueles que tem o dever, também constitucional de Guardar a aplicabilidade da Constituição, é pois remar á favor de uma norma com aplicabilidade mais rápida, para dar uma resposta mais convincente para a sociedade, contudo sem esmagar por completo o princípio, saiu-se bem ao demonstrar que, o princípio da presunção de inocência, ou da não culpabilidade, não é absoluto, e que após passado pelo devido processo legal na primeira instância, e pela segunda instância formado por órgão colegiado, já resta fragilizado a presunção de inocência, e passa-se a uma presunção de sim, culpa, podendo, segundo o entendimento atualizado, o réu cumprir a pena provisoriamente, ainda que pendente julgamento de recurso e a sua sentença ainda não tenha transitado em julgado; felicidades para a sociedade, que simplesmente quer ver os réus presos e condenados, pouco se importando com o que está descrito na constituição, infelicidade dos defensores do Estado Democrático de Direito, que veem mais uma vez a sociedade de riscos, espremendo, através da massificação midiática, os princípios constitucionais. Certo ou errado, devemos pois seguir as orientações Supremas, no caso em concreto, se for possível, haverá sem sombra de dúvida, muitos pedidos suspensivos das decisões de segundo grau. Para o relator do caso, ministro Teori Zavascki, a manutenção da sentença penal pela segunda instância encerra a análise de fatos e provas do caso e concreto que assentaram a culpa do condenado, o que autoriza o início da execução da pena.
Obviamente que esta decisão do Supremo Tribunal Federal, que atuando no sentido do “inimigo” (ao querer dar uma resposta para a sociedade), mas ainda em um caráter informal, subterfugiado em argumentos, que para os defensores são pouco convincentes, surgiram inúmeras críticas, partindo claro sobretudo daqueles que tem o papel de garantir que o indivíduo punido penalmente, tenha o direito constitucional assegurado. O doutrinador Cesar Roberto Bitencourt, em um tom exacerbado comentou que:
“O STF rasgou a Constituição Federal e jogou no lixo os direitos assegurados de todo cidadão brasileiro que responde a um processo criminal, determinando que aproximadamente um terço dos condenados, provavelmente inocentes, cumpram pena indevidamente, segundo as estatísticas relativas a reformas pelos Tribunais Superiores. […], o STF passou a negar sua vigência, a partir dessa fatídica decisão, autorizando a execução antecipada de decisões condenatórias, mesmo pendentes os recursos aos Tribunais Superiores. Trata-se de um dia em que o Supremo Tribunal Federal escreveu a página mais negra de sua história ao negar vigência de texto constitucional expresso que estabelece como marco da presunção de inocência o trânsito em julgado de decisão condenatória. Trânsito em julgado é um instituto processual com conteúdo específico, significado próprio e conceito inquestionável, não admitindo alteração ou relativização de nenhuma natureza”. (BITTENCOURT, 2016)
Vemos nas palavras de Bitencourt, e de inúmeros defensores, críticas sendo proferidas de formas acintosas, como mencionado anteriormente quem comemorou a fatídica decisão da Suprema Corte foram os Promotores, Procuradores, quem lida diretamente com a (in)segurança pública, e claro, uma parcela significativa da sociedade. De certo que demore muito para quem pode constituir um bom defensor, a razoável duração do processo, vemos diariamente que todos os órgão de segurança hà tempos trabalha no limite da sua capacidade, e nele incluem-se polícias civis e militares que encontram-se sucateadas, polícias científicas, com inúmeras perícias atrasadas, o poder judiciário cada vez mais abarrotado de processos, que agora não mais físicos, mas virtuais, memórias de computadores abarrotados de dados e centenas de gigabyts de conteúdo para ser devidamente analisado e julgado, mas por óbvio que isso tudo não é motivo de jogar tudo para o alto, pois é neste momento de dificuldade, que uma nação mostra porque é constituída de princípios sólidos e de bases jurídicas sólidas, nessa mesma linha de pensamento, temos a manifestação do ministro Marco Aurélio que acompanhando a ministra Rosa Weber, e questionando os efeitos da decisão, que repercutiria diretamente nas garantias constitucionais, pontificou:
“Reconheço que a época é de crise maior, mas justamente nessa quadra de crise maior é que devem ser guardados parâmetros, princípios, devem ser guardados valores, não se gerando instabilidade porque a sociedade não pode viver aos sobressaltos, sendo surpreendida. Ontem, o Supremo disse que não poderia haver execução provisória, em jogo, a liberdade de ir e vir. Considerado o mesmo texto constitucional, hoje ele conclui de forma diametralmente oposta. O decano, ministro Celso de Mello, na mesma linha do ministro Marco Aurélio, também manteve seu entendimento anterior, qual seja, contrário à execução antecipada da pena antes do trânsito em julgado de decisão condenatória, afirmando que a reversão do entendimento leva à “esterilização de uma das principais conquistas do cidadão: de jamais ser tratado pelo poder público como se culpado fosse”. E completou seu voto afirmando que a presunção de inocência não se “esvazia progressivamente” conforme o julgamento dos processos pelas diferentes instâncias. O presidente do STF, Ricardo Lewandowski, também votou contra a possibilidade da execução provisória da pena e destacou que lhe causava “estranheza” a decisão da Corte. Lewandowski lembrou que a decisão do tribunal agora agravará a crise no sistema carcerário brasileiro, aliás, crise para a qual a Corte Suprema nunca olhou, e também nunca se preocupou com a inconstitucional violação da dignidade humana”. (BITTENCOURT, 2016)
Mesmo que não se trate de expressa manifestação do Direito Penal do Inimigo, vemos que estão sempre intrínsecas as ideias desta teoria, que vai, aos poucos limitando os direitos e as garantias constitucionais dos cidadãos, o maior dos problemas é que a população não enxerga o sistema jurídico como um todo, a população, somente enxerga aquilo que os meios de comunicação querem que ela veja, por exemplo, esta limitação, divulgada para a população através da mídia, dá uma ideia de que somente os criminosos perigosos serão condenados a cumprirem pena provisória, contudo a limitação da garantia constitucional é contra todos, pois vale para todos, atinge a todos, e aquela pessoa que é indiferente ao sistema jurídico, se escorregar nas regras e nas normas e for punida, certamente irá esbravejar aos quatro cantos, de que tem o direito à presunção de inocência, previsto expressamente na Carta Magna, só que por enquanto não mais, ao menos até a Suprema Corte mudar seu entendimento, tendo em vista que o posicionamento dominante até 2009, era de que poder-se-ia iniciar a execução provisória da pena mesmo sem o trânsito em julgado da sentença penal condenatória, pois no HC 68.726 (Rel. Min. Néri da Silveira), utilizaram-se à época da técnica da teoria geral do processo na qual os recursos superiores, qual sejam especial no STJ e extraordinário STF, não admitem em regra o efeito suspensivo, somente o efeito devolutivo, e não se trata mais do caso em concreto, logo, poder-se-ia iniciar a execução provisória da pena, vemos inúmeras críticas, contudo fica o conflito entra a técnica interpretativa e o princípio constitucional, a questão é que ainda está inseguro este entendimento pois desde a edição da Constituição Federal de 1988, resta conflituoso este entendimento, que pode durar até o próximo recurso, ou por décadas até ser novamente reformulado e reinterpretado. (MIGALHAS, 2016)
2.7 Lei 13.260/2016 – Antiterrorismo
A Lei 13.260 de 16 de março de 2016, veio para regulamentar um Mandado Expresso de Criminalização contido na Constituição Federal no seu artigo 5º, inciso XLIII, que estabelecia a punição para os delitos considerados como sendo de terrorismo.
Com o advento da referida lei, estabeleceu-se a possibilidade de inclusão no Regime Disciplinar Diferenciado dos indivíduos sobre as quais recaiam fundadas suspeitas de integrarem organizações terroristas, sendo que o método de interpretação sistemático teleológico nos apresente que as organizações terroristas da Lei 13.260/2016 são espécies, derivadas do gênero organizações criminosas; logo toda organização terrorista é uma organização criminosa, mas nem toda organização criminosa é uma organização terrorista.
A questão do terrorismo é muito mais complexa do que parece ser, pois terroristas são pessoas que se utilizam de violência para causar pânico e medo, visando destruir o modelo de sociedade organizada que temos, para implantar o caos, contudo este método de terror e pânico só causam mais repulsa e indignação por parte de população fragilizada.
A base social cultural humanitária da paz, não se conseguem com a propagação de guerras, a guerra só leva à guerra e jamais à paz; independentemente de religiões e crenças, ninguém pode ser morto em decorrência de um pensamento ou posicionamento diverso, caso assim seja, estaríamos em um mundo de todos contra todos e cada um sobrevive por si, e não é assim que uma sociedade racional evolui, somos seres dotados de capacidades de compreensões complexas racionalmente, tendo em vista que temos satélites em órbita, telescópios, ônibus espaciais, observamos estrelas e galáxias distantes em busca de vida semelhante ou superior a nossa, e estamos discutindo matar ou morrer em nome de crenças ou ideologias políticas e religiosas, ou como prevenir ou punir que isto aconteça de forma legal e constitucional; percebemos que ainda temos muito trabalho social que fazer, pois a tecnologia evoluiu, contudo a paciência e a empatia humana ainda não foram capazes de acompanharem a evolução científica.
O Direito é instrumento de unificação e tratamento igualitário, segundo o Artigo 5º da Constituição Federal; desta forma ninguém pode agir ou sentir-se acima da lei, mesmo sob pretextos religiosos ou filosóficos, nenhuma fé é superior à outra, nem mesmo a descrença é inferior à crença, juridicamente falando, e o mais difícil é convencer estes extremistas, que querem somente propagar a violência. Em nossa vida social, comunitária e global não existem infiéis, somente pessoas que pensam de maneira diferente.
O terrorismo precisa ser combatido de acordo com as leis e as normas, sejam elas internacionais ou nacionais, constitucionais ou infraconstitucionais, do contrário mais uma vez o ser humano deixará registrado na história humana que apesar de se autoproclamar inteligente e sábio, foi incapaz de conviver com as diferenças. Reiteramos que o problema não são às crenças pessoais e religiosas ou filosóficas, o problema reside na simples agressão por não ter o mesmo pensamento, lutar pela liberdade e igualdade como foi feito na história, ou lutar para deixar de ser escravo é uma coisa, agora é abominável lutar para obrigar outras pessoas à pensarem de forma igual; se continuar assim corremos um sério risco, enquanto civilização, de enfrentar mais um episódio nefasto, um conflito em escala global, pelo simples motivo da intolerância por parte dos terroristas. Vemos portanto que esta complexa questão, envolve não somente o Direito Penal, mas todo o conjunto de educação humana; o Direito Penal só deve agir depois que o delito ocorreu, punindo e tentando recuperar o criminoso, antes temos a atuação talvez da Polícia Ostensiva, em uma possível proteção visando evitar que o atentado ocorra, contudo a solução deste complexo problema de violência mundial, não deve ser penal, nem mesmo dos crimes comuns. Antes da atuação do Direito Penal deve haver a atuação de todas as outras disciplinas e matérias, que devem se empenhar cada vez mais em evitar que seja necessário a utilização do direito penal, tendo em vista que este é a última ratio, ou último recurso, contudo infelizmente a sociedade espera resolver os problemas do fim pelo começo, quando se deveria começar pelo começo visando evitar a atuação do Direito Penal. Eugênio Raúl Zaffaroni, resume em poucas palavras a complexa questão envolvendo o terrorismo e a matéria de Direito Penal,
“O que o Direito Penal pode fazer em relação aos terroristas? A resposta é bastante óbvia: se ninguém faz nada, o direito penal nada pode fazer; se delitos são cometidos, seus responsáveis devem ser individualizados, detidos, processados, julgados, condenados e levados a cumprir a pena. É isso que o Direito Penal pode fazer. Se os delitos tiverem a gravidade e as características de crimes lesa-humanidade, deverão receber o tratamento reservado para esses delitos; se não tiverem, deverão ser apenados conforme os tipos que a posse de explosivos pode acarretar, o homicídio como meio capaz de provocar grandes estragos, os estragos seguidos de morte, o assalto à mão armada, o sequestro, a falsificação e o uso de documentos falsos, a ocultação qualificada, a associação ilícita, etc., todos ampliados em cada caso, conforme as regras da participação, da tentativa e dos princípios que regulam o consumo material ou formal”. (ZAFFARONI, p.185, 2014)
Ainda segundo o mestre Zaffaroni, a crescente elaboração de leis e as demonstrações midiáticas, sobre as matérias criminais, fazem com que seja possível que futuramente as leis de combate ao terrorismo sejam inócuas, afinal existem leis em demasia e que não são cumpridas,
“A intervenção de burocracias e reformas penais, além de provocarem um avanço do Estado de Polícia ou autoritário (em troca de proteção), com o consequente debilitamento do Estado de Direito, – costuma ter efeitos paradoxais, visto que criar tipos penais de terrorismo pode dar origem à impunidade.” (ZAFFARONI, p.186, 2014)
Desta forma, não adianta o legislativo, com o subterfúgio de atender aos anseios midiáticos e da população, ficar parindo leis a reveria, se estas não puderem na prática serem cumpridas em sua totalidade e plenitude, com a eficiência necessária, para o bom funcionamento social, do contrário quem sofrerá, e arcará com as consequências de forma dupla, será a sociedade, uma vez castigada sendo vítima da agressão, e sofrerá outra vez, em não ver o Estado cumprindo com a sua obrigação de punir os transgressores, tendo em vista a falsa proteção de uma legislação ineficiente.
Martinelli, vê alguns defeitos técnicos na elaboração da lei, que ao que parece, foi feita às pressas e sem a devida e profunda análise que o caso complexo que é, merece e necessita, pois algumas figuras presentes na legislação são vagas, e nenhum tipo penal pode ser vago, a norma penal não pode dar margem para interpretações, a norma penalizadora deve ser em síntese oito ou oitenta, pois do contrário estaremos presos ao arbítrio do julgador, segundo análise de Martinelli,
“De acordo com o art. 2.o, “o terrorismo consiste na prática por um ou mais indivíduos dos atos previstos neste artigo, por razões de xenofobia, discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia e religião, quando cometidos com a finalidade de provocar terror social ou generalizado, expondo a perigo pessoa, patrimônio, a paz pública ou a incolumidade pública”. Assim, questiona-se: o que é terror social ou generalizado? Se um sujeito decide matar seu desafeto, com vários disparos, em via de grande circulação de pessoas, a conseqüência do seu ato pode ser considerado terror generalizado? Certamente, por causa dos disparos, os pedestres ficarão assustados, desesperados, correrão por todos os lados e poderá configurar um cenário semelhante ao de uma explosão. Portanto, terror social ou generalizado são conceitos vagos que devem ser provados no dolo específico do agente, caso contrário, exclui-se o crime de terrorismo”. (MARTINELLI, 2016)
Outra questão trazida pela nova legislação é uma exceção ao princípio da ofensividade, ou da lesividade, que prescreve que “não há crime sem lesão ou perigo de lesão”. Dispõe o Artigo 5º da Lei 13.260/2016 que,
“Art. 5o Realizar atos preparatórios de terrorismo com o propósito inequívoco de consumar tal delito:
Pena – a correspondente ao delito consumado, diminuída de um quarto até a metade.
§ lo Incorre nas mesmas penas o agente que, com o propósito de praticar atos de terrorismo:
I – recrutar, organizar, transportar ou municiar indivíduos que viajem para país distinto daquele de sua residência ou nacionalidade; ou
II – fornecer ou receber treinamento em país distinto daquele de sua residência ou nacionalidade.
§ 2o Nas hipóteses do § 1o, quando a conduta não envolver treinamento ou viagem para país distinto daquele de sua residência ou nacionalidade, a pena será a correspondente ao delito consumado, diminuída de metade a dois terços”. (BRASIL, 2016)
Analisando a sistemática jurídica penal brasileira, verificamos que via de regra absoluta, os atos preparatórios não são punidos, pois não teriam se iniciado a execução do verbo núcleo do tipo, ou o crime propriamente dito, contudo o legislador pode criar exceções autônomas de condutas e tipificar condutas que seriam preparatórias, mas que no conjunto social apresentariam um risco geral para a sociedade, e que desencadeariam a necessária punição, mesmo que ainda não se tenha iniciado a execução do crime, a doutrina chama de crimes de perigo abstrato, ou seja aqueles que não necessitam de uma lesão ao bem jurídico para se consumarem, apenas o perigo de lesão, muito embora tenha quem discorde. (OLIVEIRA FILHO, 2014)
Amaral apud Masson, explica de forma clara o que são atos preparatórios, vejamos,
“Preparação ou atos preparatórios: Correspondem aos atos indispensáveis à prática da infração penal, municiando-se o agente dos elementos necessários para a concretização da sua conduta ilícita. Precisa ir além do simples projeto interno (mínimo), sem que se deva, contudo, iniciar a imediata realização tipicamente relevante da vontade delitiva (máximo). Os atos preparatórios, geralmente, não são puníveis, nem na forma tentada, uma vez que não se iniciou a realização do núcleo do tipo penal. De fato, o art. 14, II, do CP vinculou a tentativa à prática de atos executórios. Em casos excepcionais, é possível a punição de atos preparatórios nas hipóteses em que a lei optou por incriminá-los de forma autônoma. São os chamados crimes obstáculo.” (AMARAL, 2016)
Para Amaral, aproxima-se, em verdade, do direito penal do inimigo, de Gunter Jakobs, no que tange à antecipação da punibilidade do agente, tendo em vista a escolha do legislador em estabelecer atos puníveis em que não se espera a realização efetiva do fato material, inferindo que a sua preparação já é considerada como ilícito penal. (AMARAL, 2016)
“[…] Dito de outro modo, o lugar do dano atual à vigência da norma é ocupado pelo perigo de danos futuros: uma regulação própria do Direito Penal do Inimigo. O que, no caso dos terroristas – em princípio, adversários – pode ser adequado, isto é, tomar como ponto de referência as dimensões do perigo, e não o dano à vigência da norma […]” (JAKOBS, p. 42, 2015)
Não se busca defender a teoria do direito penal do inimigo como um todo, nem criticá-la, apenas debater e estudar de forma a compreender em que aspectos podemos ter normas constitucionalmente aceitas, sendo que restringem ou limitam direitos fundamentais. Afinal não temos como negar que a tipificação de delitos de terrorismo especificamente, especialmente no que tange à antecipação da configuração do delito, mostra-se, a princípio, condizente com a gravidade e a complexidade de mencionado crime.
Contudo não é somente de leis que se combatem a crescente criminalidade, pois segundo Paulo Nader, 2000, p.49-57, vários são os fatores que influenciam o Direito, como a natureza, o clima, os recursos disponíveis, o território, a cultura, a economia, a moral, a religião, as ideologias, a família, propriedade, todos estes elementos influenciam na elaboração das leis.
Devemos preservar as diferenças sociais e culturais, afinal foram justamente as nossas diferenças que nos possibilitaram evoluir, pois pensando diferente e questionando os acontecimentos da vida, das mais diversas formas e crenças e dos mais diversos pontos de vista, é que conseguimos enfrentar os desafios do tempo e da evolução, sem o ceticismo da ciência, não seríamos capazes de compreender certos aspectos da vida que somente a religião respondia. Não podemos nos apegar somente uma fonte ou seguir apenas uma ideia fixa a ponto de nos tornarmos escravos desta ideia, praticando atos de violência contra os outros para impor opiniões, a diversidade é importante, e o respeito para com as diversidades e individualidades é fundamental para a manutenção da vida humana no planeta Terra.
Uma das possibilidades de se diminuir este choque cultural, e fazer com que todas as pessoas possam interagir de forma harmoniosa, politicamente e socialmente com as outras pessoas, provenientes dos mais diversos lugares com as mais diferentes opiniões e pensamentos, são os intercâmbios estudantis, que ocorrem principalmente em universidades; Carine Fernandes, editora da Educação em Revista, informa que
“[…] é grande a urgência de se fazer uma instituição internacional, que respire multiculturas, que possa socializar conhecimentos dos quatro cantos do mundo […], os intercâmbios, cada vez mais realizados estão possibilitando esta melhor convivência, sejam de professores e alunos.” (FERNANDES, p.8, 2012)
Contudo, estamos tratando de intercâmbios, ou seja, são trocas de conhecimentos culturais, se algum determinado povo vem para cá, o povo que é proveniente daqui, também pode ir para lá, e ambos deve ser tratados com o devido respeito, que os Direitos Humanos prescrevem.
Isto está sendo feito, ainda de forma inicial, mas é um caminho que não envolve a violência, nem o uso do Direito Penal, fato é que o Direito Penal moderno ou pós-industrial, através da política criminal e passados os castigos corporais como forma de punição e exemplo, busca atualmente, além de punir, incorporar na pena aspectos de ressocialização, transformando o ser humano animal em força útil de trabalho para a comunidade. (FOUCAULT, p.8-18, 2004)
Ribeiro apud Fragoso, adverte que “tem-se questionado sobre a autoridade e a responsabilidade do Estado para mudar coativamente as atitudes e o comportamento humano”, ao que parece, segundo o professor Heleno Fragoso estamos sendo escravizados pelas ideias, e não mais pelas correntes, somos obrigados a estudar, obrigados a trabalhar, obrigados a consumir, mas não de forma coercitiva, ou seja somos “induzidos” a fazer isto e nos parece que fazemos isso por vontade própria quando não o é. Dito isto, para trazer as palavras, de forma mais específica, aonde Ribeiro apud Bettiol, diz que a reeducação é um mito, tratamos de forma rápida em outro ponto deste escrito, contudo se perfaz pertinente a retomada do raciocínio, pois o ser humano deve ser induzido pelo Estado a praticar determinadas condutas, contudo este não pode obrigá-lo, logo, ainda somos livres para escolher o bem e o mal, assumindo todas as suas consequências, independente de religiões ou crenças, podemos ou não seguir a ordem social aplicada, vejamos,
“O homem tem a liberdade de fazer o bem, mas também é livre para se orientar no sentido do mal e persistir no mal, sujeitando-se a sofrer as consequências do mal perpetrado, Ninguém pode obrigar o homem ao bem, porque neste caso a acção perderia o seu mais precioso significado moral. Ninguém está autorizado a penetrar no íntimo da consciência humana, para procurar imprimir-lhe uma certa orientação. O sacrário da consciência é inviolável, e nem o fato de ter sido condenado, pode autorizar o Estado, a estabelecer leis que possam valer para a consciência de um valor,[…], O homem tem o arbítrio da sua orientação e não pode ser obrigado a acção, […]. O Estado não pode impor a virtude. Ele apenas pode, ou melhor, deve criar as condições para o homem poder levar uma vida virtuosa, de modo que o indivíduo – se – quiser – possa aproveitar-se dela (…)”. (RIBEIRO, p.49, 2011)
Contudo Ribeiro, ainda se referindo a obra de Bettiol, nos traz o alerta de que já na história humana,
“Houve um tempo em que o ideal era religioso e o herege era queimado vivo, caso não se arrependesse e adotasse a posição ortodoxa. Houve um tempo em que o ideal era o de uma sociedade sem classes, e o aristocrata era decapitado por ter assim nascido. No futuro, é perfeitamente possível que o ideal se constitua em ser sociável, disciplinado, colaborador, produtivo e, sobretudo “normal”, e aquele que for excêntrico e pouco sociável, bem como aquele que for manifestadamente antissocial, será submetido a tratamento, a menos que se adapte a esse modelo. Podemos estar no ponto crítico de uma dessas alterações do ideal social, […]”. (RIBEIRO, p.48-49, 2011)
Ademais, como em síntese abordado durante o presente trabalho, vemos que a sociedade pode estar passando por um momento de transição de seu ideal constitutivo, e todo aquele que for diferente sofrerá mais uma vez as consequências, pelo visto o ser humano ainda está muito longe de aprender a respeitar as diferenças, pois logo que surge alguém com pensamento diverso, ao invés de ouvir, a sociedade quer eliminar, exterminar, aniquilar, ainda estamos presos nas cavernas e não sabemos. (PLATÃO, p.232-266, 2014)
3. Conclusão
Considera-se ao final deste artigo, que existe uma tendência global em limitar de certa forma as garantias estabelecidas pelas legislações aos cidadãos, tendo em vista um certo abrandamento punitivo exacerbado de recentes legislações e um temor cada vez mais evidente de que os principais combates que o mundo organizado está travando, está perdendo aos poucos, qual sejam o combate as drogas e substâncias entorpecentes, o terrorismo, as organizações criminosas, que estão cada vez mais especializadas e organizadas para as práticas criminosas, além de alguns crimes serem muito difíceis de se provar, pois os indícios são aos poucos apagados, como por exemplo no crime de lavagem de capitais, que por vezes são quem financia as organizações criminosas e terroristas, e como estudantes e cidadãos nos cabe acompanhar as mudanças nas legislações para que estejamos atentos a qualquer violação das garantias duramente conquistadas pela sociedade, através de muitas lutas e a um custo de inúmeras mortes, pois nem a história é capaz de nos contar com certeza, quantas pessoas morreram para que tenhamos o simples direito de poder hoje, escrever este artigo. A sociedade muda, os fatos mudam, e o direito precisa se adequar a sociedade, por vezes progredindo, por vezes regredindo.
Advogado. Bacharel em Direito pela Universidade Regional Integrada URI Campus de Erechim/RS. Pós-graduando em Direito Penal pela Faculdade de Direito Damásio de Jesus
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