Exigência de depósito prévio como medida para redução de recursos na Justiça do Trabalho. Da inconstitucionalidade

Sumário: Introdução. Da inconstitucionalidade. Conclusão.


INTRODUÇÃO


O presente trabalho tem como escopo abordar juridicamente fundamentos contrários a exigência do depósito recursal para a interposição de recursos na Justiça do Trabalho, tendo como ponto de partida a notícia veiculada no sítio do Tribunal Superior do Trabalho[1], em 26/01/2011, que narra a redução dos recursos agravo de instrumento após a exigência de depósito pela lei 12.275/2010.


DA INCONSTITUCIONALIDADE


De acordo com a notícia veiculada no sítio do Tribunal Superior do Trabalho, após a publicação da lei 12.275/2010 (que passou a exigir o recolhimento do depósito prévio para esse tipo de recurso) ocorreu nos Tribunais Trabalhistas uma redução na quantidade de agravos de instrumentos interpostos.


Certamente, essa notícia seria para gerar entusiasmo em todo o mundo jurídico se essa política impeditiva de recursos, adotada, data venia, não fosse flagrantemente inconstitucional, por violação a direitos fundamentais dos jurisdicionados demandados em ações trabalhistas.


Veja bem! Ao ser criado mais um depósito para interposição do recurso de agravo de instrumento, a legislação pátria, com efeito, aumentou ainda mais a desigualdade entre os jurisdicionados que são demandados na Justiça do Trabalho. E o aumento na desigualdade não aconteceu primordialmente entre o Autor e Réu (cuja essência é quase sempre desigual face a presumida hipossuficiência do Obreiro), mas sim, entre os Réus (empresas de pequeno porte e empresas de grande porte).


Ora, como exigir de um pequeno empregador um desembolso prévio vultoso para ter direito a reapreciação pelos Tribunais ad quem de uma decisão contrária aos seus interesses, sem prejudicá-lo na condução do seu pequeno empreendimento? Urge destacar que o artigo 170, inciso IX da CR/88 destaca um tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País, entretanto, infelizmente, a criação de depósitos recursais não lhes favorecem em nada.


Com efeito, dispõe o artigo 170, inciso IX da CR/88, verbis:


Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: (…)


IX – tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País.[2]


Acresça-se que, para as grandes empresas, que faturam milhões, não há qualquer obstáculo a criação de mais um depósito recursal, uma vez que estas podem suportar tranquilamente o desembolso prévio para a interposição de recurso.


Diante disso, somente elas poderão utilizar-se das Instâncias Superiores Trabalhista para verem reapreciadas decisões contrárias aos seus interesses, o que acarreta uma flagrante violação ao Princípio da Igualdade, prevista no artigo 5º, caput da CR/88.


“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:”[3]


Data venia, não há como ser vislumbrada outra hipótese senão a inconstitucionalidade da exigência de depósito recursal, para qualquer recurso, após a promulgação da Constituição da República de 1988, por violação aos Princípios: da Igualdade (artigo 5º, caput); do acesso ao Poder Judiciário (artigo 5º, inciso XXXV); do devido processo legal (artigo 5º, inciso LIV); do contraditório e da ampla defesa (artigo 5º, inciso LV) e, porque não, do favorecimento do pequeno empregador (artigo 170, IX). Tecnicamente analisando, a inconstitucionalidade é fato!


Art. 5º (…)


XXXV – a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito;(…)


LIV – ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal;


LV – aos litigante, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;”[4]


Entretanto, por medidas de política jurisdicional, a exigência de depósito recursal ganhou e ganha outras interpretações e cada vez mais vem sendo utilizada como estratégia impeditiva de recursos.


Cabe salientar que não é de desconhecimento que o crédito trabalhista é especial, tem natureza alimentar e merece proteção. Bem como não é desconhecido que o artigo 5º, inciso LXXVIII da CR/88 garante a duração razoável do processo. Contudo, tanto a proteção ao credor trabalhista, quanto a duração razoável do processo deve ser respaldada dentro do ordenamento jurídico pátrio e não afrontando a Constituição da República, como é atualmente, data venia.


Hoje, diante de modernas normas processuais, é possível garantir ao credor trabalhista o recebimento do seu crédito, sem afrontar aos preceitos constitucionais.


Para tanto, cita-se as medidas cautelares previstas no livro III do CPC e até mesmo a hipoteca judiciária disposta no artigo 466 do CPC. Verbis:


“Art. 466 – A sentença que condenar o réu no pagamento de uma prestação, consistente em dinheiro ou em coisa, valerá como título constitutivo de hipoteca judiciária, cuja inscrição será ordenada pelo juiz na forma  prescrita na Lei de Registros Públicos.”[5]


Acresça, ainda, os convênios feitos pelos Tribunais com o Banco Central, com a Receita Federal, com os Detran’s, com os cartórios de protestos e até com o Serasa, instituindo o Bacenjud, Infojud e Renajud e a possibilidade da desconsideração da personalidade jurídica.


Portanto, verifica-se que o credor trabalhista encontra-se hoje resguardado face às modernas normas, não sendo necessária a criação e a manutenção de exigências de depósitos recursais, flagrantemente inconstitucional.


Por fim, para se combater o uso abusivo de recursos com intuito meramente protelatórios e dar efetividade ao artigo 5º, inciso LXXVIII da CR/88, cabe aos Tribunais Trabalhistas utilizarem dos mecanismos processuais próprios previstos, para a inibição desses recursos, ad exemplum, os artigos 17, 538, parágrafo único, 557, §2º do CPC, ao invés de apoiarem medidas criadas, sabidamente inconstitucionais, data venia,


Art. 5º. (…)


LXXVIII – a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.[6]


Art. 17. Reputa-se litigante de má-fé aquele que: (…)


IV – opuser resistência injustificada ao andamento do processo; (…)


VII – interpuser recurso com intuito manifestamente protelatório”[7]


Art. 538. (…)


Parágrafo único. Quando manifestamente protelatórios os embargos, o juiz ou o tribunal, declarando que o são, condenará o embargante a pagar ao embargado multa não excedente de um por cento sobre o valor da causa. Na reiteração de embargos protelatórios, a multa é elevada a até dez por cento, ficando condicionada a interposição de qualquer outro recurso ao depósito do valor respectivo.[8]


Art. 557. (…)


§2º. Quando manifestamente inadmissível ou infundado o agravo, o tribunal condenará o agravante a pagar ao agravado multa entre um e dez por cento do valor corrigido da causa, ficando a interposição de qualquer outro recurso condicionada ao depósito do respectivo valor.[9]


Assim, deve ser acompanhada com reservas a notícia veiculada, em 26.01.2011, por ser flagrantemente inconstitucional a política adotada de impedimento de recursos com a criação de ônus para o jurisdicionado demandado na Justiça do Trabalho.


CONCLUSÃO


Por todo o exposto acima, pode ser verificado que a exigência de depósito prévio para a interposição de recurso na Justiça do Trabalho, tão enraizado hoje no ordenamento jurídico, carece de uma reanálise pelo Tribunal guardião da Constituição, ante a manifesta inconstitucionalidade.


 


Notas: 

[1] BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. Notícias. Disponível na Internet:  http://ext02.tst.gov.br/pls/no01/NO_NOTICIASNOVO.Exibe_Noticia?p_cod_area_noticia=ASCS&p_cod_noticia=11698. Acesso em 27 de janeiro de 2011.

[2] ______. Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm. Acesso em 27 de janeiro de 2010

[3] ______. Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm. Acesso em 27 de janeiro de 2010

[4] ______. Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm. Acesso em 27 de janeiro de 2010.

[5] ______. Lei nº 5869, de 11 de janeiro de 1973. Instituio Código de Processo Civil. Disponível na intenet: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L5869.htm. Acesso em 27 de janeiro de 2011.

[6] ______. Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm. Acesso em 28 de janeiro de 2010.

[7] ______. Lei nº 5869, de 11 de janeiro de 1973. Instituio Código de Processo Civil. Disponível na intenet: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L5869.htm. Acesso em 28 de janeiro de 2011.

[8] ______. Lei nº 5869, de 11 de janeiro de 1973. Instituio Código de Processo Civil. Disponível na intenet: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L5869.htm. Acesso em 28 de janeiro de 2011

[9] ______. Lei nº 5869, de 11 de janeiro de 1973. Instituio Código de Processo Civil. Disponível na intenet: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L5869.htm. Acesso em 28 de janeiro de 2011


Informações Sobre o Autor

Rosendo de Fátima Vieira Júnior

Advogado Trabalhista em Belo Horizonte/MG. Membro efetivo do Instituto dos Advogados de Minas Gerais – IAMG. Pós-Graduado em Direito Social e Pós-Graduando em Educação a Distância.


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