Resumo: O presente trabalho desenvolve-se partindo do conceito da expressão federalismo. Apresenta características de um Governo Federal, com o propósito de esclarecer definições do federalismo e suas peculiaridades. O desenvolvimento do trabalho é centrado na República Federativa do Brasil: sua história, atual funcionamento, conclusões e comentários. O objetivo é permitir que o leitor absorva conhecimento sobre a forma de governo a qual é atualmente submetido.
Palavras-chave: República Federativa do Brasil; Constituição; democracia.
Abstract: The work presented has its development initiated by the concept of the expression federalism. It presents characteristics of a Federal Government, proposing the clarification of federalism definitions and its particularities. The development of this work is centered on the Brazilian´s Federal Republic: its history, actual operation, conclusions and comments. The goal is to permit the reader to absorb knowledge about the government that he is currently subjected to.
Keywords: Brazilian Federal Republic; Constitution; democracy.
O QUE É O FEDERALISMO?
Se fossemos recorrer ao dicionário, federalismo é tido como “uma forma de governo pela qual vários estados se reúnem numa só nação, sem perda de sua autonomia fora dos negócios de interesse comum.” Em termos estritamente jurídicos, e conforme o magistério do jurista Pedro Nunes, Federação é a “união de várias províncias, Estados particulares ou unidades federadas, independentes entre si, mas apenas autônomas quanto aos seus interesses privados, que formam um só corpo político ou Estado coletivo, onde reside a soberania, e a cujo poder ou governo eles se submetem, nas relações recíprocas de uns e outros.”
A princípio, não se encontram dúvidas relacionadas à sua definição, mas o complexo significado político-filosófico que a palavra federalismo apresenta abre alas para um estudo aprofundado de sua natureza e de suas características.
Federalismo é uma expressão muito usada nos discursos políticos para representar a união nacional, apesar de apresentar uma força descentralizadora, dificilmente destacada.
Uma federação representa o reconhecimento às diferenças individuais, estaduais, regionais e locais que, mesmo apresentando uma grande variedade, tem a possibilidade de manter a unidade de um país. A idéia de federalismo nasceu com uma longa tradição, a favor dos governos locais dos Estados Unidos da América. O respeito à liberdade individual e aos direitos de propriedade já existia a longa data antes da elaboração da Constituição Federal. Segundo Alexis de Tocqueville, em sua obra “Democracia na América”, a essência dessa tradição política já era existente e confirma os princípios gerais que fundamentam as constituições modernas: “Na América, pode dizer-se que o município foi organizado antes da comarca, a comarca antes do estado e o estado antes da união.”
Os princípios do federalismo são de grande importância para o entendimento da história dos Estados Unidos, assim como são decisivos para a compreensão da história de países como a República Federal da Alemanha (1871). Essa corrente ideológica constitui um poder complexo, ao passo que os estados ou territórios federados se entregam à União e com ela coexistem, mesmo possuindo esferas de decisão autônomas. Simultaneamente, as unidades de federação compartilham outras esferas de poder ou de ação com a União, que exerce a função de supra-ordenadora. Assim, cada unidade de federação deve gerir seus assuntos internos, e os assuntos que os limites cabem à União são geridos por essa, atuando assim em sua função de coordenadora. Desse modo cada unidade política pode desenvolver livremente seu governo, com suas próprias leis, tributos, código civil, penal e trabalhista, sistemas de educação e saúde, etc. O governo central cuidará, por exemplo, da defesa do território nacional, da emissão da moeda e das relações exteriores. Um modelo de federalismo onde os Estados sejam completamente independentes e tenham controle sobre seus representantes federais causaria uma ameaça à democracia e seria um problema que afetaria o bem estar de todas as partes.
A Suíça foi o primeiro país a adotar um governo federal, embora tenha sido definido apenas em 1848. No ano de 1787, onze anos após a Declaração da Independência, a Convenção Federal, em Philadelphia, propôs a Constituição dos Estados Unidos da América. Esses anos pós-independência foram fundamentais para realçar a necessidade de criação de um governo que não viole os direitos individuais – através do abuso do poder pelas legislaturas dos estados – e que seja eficaz. Os poderes da confederação eram insuficientes, mas também havia uma necessidade de limitar os poderes do governo. Entre discussões e propostas, os líderes convencionais concluíram por optar pela organização de uma “nação com estrutura federal na qual os Estados continuam a existir com seus direitos gerais, mas o Governo Federal passa a ter determinados poderes de legislação e taxação, tratando, na execução desses poderes não somente com os estados, mas com as pessoas também e, no caso de resistência, através de cortes de justiça.” A partir desse momento, pela primeira vez a organização federativa moderna foi proclamada.
Com esta base, pode-se relevar a grande qualidade do federalismo: a descentralização dos poderes. Fato que impede os excessos de mando e possibilita o emprego conjunto e coordenado de diferentes poderes. Há duas teorias jurídicas básicas que tentam explicar a união, baseadas nos aspectos das relações entre os elementos que compõe a federação: a da co-soberania (com origem em Alexis de Tocqueville), segundo a qual os estados membros cedem uma fração de sua soberania à União; e a teoria que parte do princípio que a soberania é indivisível. John c. Calhou, americano autor dessa teoria, considera que apenas cada um dos membros da União é verdadeiramente estado e soberano.
Qualquer sistema federativo possui características específicas destacando, inevitavelmente, a existência de uma constituição escrita com um caráter geral, a divisão territorial e a existência de diferenças e componentes culturais que sustentam tanto a federação como a descentralização. O sistema político do federalismo assegura as tradições jurídicas e administrativas locais, solução que assegura o respeito e a preservação de minorias étnicas.
Viver em um Estado Democrático significa viver em um estado onde o poder emana do povo. Pode-se afirmar que a democracia é a “institucionalização da liberdade”, ou “a arte da convivência dos contrários”. Os cidadãos têm o dever de participar no sistema político, que por sua vez, protege os direitos e liberdades do cidadão.
Um fator importante de uma democracia é a proteção que ela oferece contra governos centrais muito poderosos. Além de respeitar a vontade da maioria, a democracia protege, acima de tudo, os direitos fundamentais dos indivíduos e das minorias.
No Brasil a democracia tem a sua estabilidade ameaçada, visto que o sistema não facilita o que tange o ápice de seu funcionamento: “…a combinação de presidencialismo, sistema multipartidário, indisciplina partidária e federalismo gera um excesso de pontos de veto no processo decisório, elevando exponencialmente os custos de aprovação de reformas no Congresso. Os impasses entre o Executivo e o Legislativo, derivados dessa engenharia institucional, seriam a principal ameaça à estabilidade democrática no Brasil.”
O Brasil é um país que tem como marca a diversidade. É constituído de uma nação formada por povos distintos e dona de uma vasta cultura que se diversifica acompanhando o considerável território nacional. Sendo o país herdeiro de diferentes hábitos e costumes, a adaptação dos brasileiros a um modelo de pensamento que identifique essa miscigenação ocorre sem fadiga.
O federalismo no Brasil surgiu principalmente devido às próprias condições geográficas do país, que possui 8.547.403,5 km², e das condições naturais que essa vastidão proporciona, o que ocasiona uma descentralização, típica desse sistema de governo. Assim a pluralidade das regiões se mantém.
Durante o período em que o Brasil estava em mãos da administração do português Dom Pedro I, ocorreram criações sociais correspondentes às aspirações descentralizadoras, como a Guerra dos Farrapos (1835 – 1845) e a Revolução Praieira (1848 – 1852). Como a administração portuguesa ameaçava ser um perigo à unidade nacional, o Império deu origem aos Atos Adicionais, que outorgavam autonomia aos Conselhos-Gerais, entre outros. As províncias permaneceram com essa estrutura até 1889, quando foram transformadas em Estados-Membros. Com a Constituição Federal de 1891, art.63, instituiu-se que cada Estado-Membro seria regido pela Constituição e pelas leis que adotar, respeitados os princípios constitucionais da União. Assim, a Federação pressupunha a existência de várias ordens jurídicas autônomas, mas relacionadas com o Governo Central, o que acontece até hoje.
A República Federativa do Brasil é atualmente dividida em 26 estados, um Distrito Federal e 5.563 municípios. Sendo uma democracia, o exercício do Poder é atribuído a órgãos distintos e independentes, cada qual com uma função, assim prevenindo que a ação de algum deles não esteja de acordo com a Constituição.
O chefe do Poder Executivo Federal é o Presidente da República, que é auxiliado pelos Ministros de Estado. Na estrutura da Presidência, os órgãos estão classificados, legalmente, como essenciais (como a Casa Civil, que atua na integração e coordenação das ações do Governo); de assessoramento imediato ao Presidente (Conselho de Governo, Advocacia-Geral da União e Secretaria de Imprensa e Divulgação); consultivos (Conselho de República e de Defesa Nacional) e integrantes. Vinculada ao Presidente, a Comissão de Ética Pública tem como competência a revisão das normas sobre conduta ética na Administração Pública Federal, elaboração e proposta da instituição do Código de Conduta das Autoridades.
Quanto ao sistema tributário na Federação Brasileira, a constituição define a atribuição de receitas tributárias a cada esfera do governo, de modo que a sobreposição de competências relacionadas aos impostos e contribuições sociais não ocorra. Ou seja, cada nível do governo tem o direito de instituir impostos que pertençam à sua competência privada e que sejam, claro, atribuídos pela Constituição.
A distribuição das bases tributárias entre os governos e a repartição da receita tributária tende a ser o principal problema de qualquer federação, pois o modelo federativo permite a possibilidade de competição tributária entre seus diferentes governos. Contudo, a atribuição de competências tributárias privativas para o nível local de governo (representados pelos municípios) e a considerável participação desses governos nas receitas públicas faz do Brasil uma das mais abertas e descentralizadas federações do mundo, sobretudo se comparado com outros países em desenvolvimento. Por outro lado, a Constituição não é precisa ao definir a responsabilidade dos gastos públicos entre as esferas do governo. Por esse motivo o modelo de federação descentralizada ainda precisa de importantes ajustes, com destaque à maior harmonização entre os níveis governamentais e uma clara definição das responsabilidades de cada um deles.
Para entender a Federação Brasileira hoje, é necessário entender suas fontes, e uma importante particularidade da história do federalismo no Brasil é o fato de este ter sido uma concessão do Estado Brasileiro, ao contrário dos Estados Unidos. Os estados independentes do Reino Unido tinham soberania, mas, para construir uma Federação que fosse mais poderosa que os estados independentes, estes abriram mão dessa soberania, para assim criar um poder mais forte e concreto. Portanto, pode-se dizer que essa forma de governo veio “de baixo para cima”, ao contrário do Federalismo Brasileiro, que veio “de cima para baixo”.
Considerando que o Brasil foi modelado de acordo com os interesses econômicos das elites agrárias existentes no contexto da Independência, em 1822, e que essa elite permitiu a manutenção do regime monárquico com um poder político e administrativo central, preservando assim o seu poder e procurando expandi-lo pelo território nacional, entende-se por que o Brasil Republicano não é genuinamente uma Federação.
Além de a Independência ter sido nada mais que um conceito, sem a realização de medidas necessárias e uma maior igualdade de direitos, no século XIX e início do século XX o que deveria ter ocorrido era uma consolidação do território brasileiro que respeitasse as diversidades culturais e políticas nas diferentes partes do país, mas isso não se concretizou. Durante todo o Período Imperial, o Poder Central sempre teve muito poder sobre os poderes locais e regionais. As revoltas ocorridas em várias regiões durante o Período Regencial (1831-1840) e o início do Segundo Reinado (1840-1889), que foram brutalmente reprimidas pelo governo da época, sem que esse traçasse considerações à autonomia política, econômica e cultural dessas regiões comprovam esse fato. Na Proclamação na República (1889) as estruturam políticas também não sofreram alterações significantes, por ter sido a consequência não de um movimento popular, mas sim de um simples golpe militar. Tudo isso desrespeita os conceitos de federação, sendo plenamente aceitável questionar a veracidade da aplicação do sistema federativo no Brasil.
Toda Constituição é obra do Poder Constituinte, que elabora e promulga a Constituição, e tem como características ser autônomo, incondicionado e inicial.
Desde a Independência do Brasil, foram promulgadas sete Constituições: 1824; 1891; 1934; 1937; 1946; 1967 e 1988. A Constituição de 1946 foi nominada “Constituição dos Estados Unidos do Brasil”. Era bastante avançada para a época e foi um grande passo para as liberdades individuais do cidadão brasileiro, na teoria. A situação política da época não permitiu grandes avanços, mas o primeiro passo é ter uma constituição escrita.
A última (1988), sob a presidência de José Sarney, surge como reação ao período do Regime Militar. Foi batizada por Ulysses Guimarães como “Constituição cidadã” devido à ênfase da garantia dos direitos humanos e sociais. Cada fase de mudanças na Constituição Brasileira trouxe benefícios relacionados aos direitos individuais. É uma evolução da sociedade e uma vitória para muitos, principalmente para os que presenciaram o Regime Militar. A atual Constituição possui 250 artigos e 68 emendas constitucionais. Rompendo com a lógica autoritária da Constituição de 1967, a Carta qualificou a tortura e as ações armadas contra o estado democrático e a ordem constitucional como crimes inafiançáveis, criando assim dispositivos constitucionais para bloquear golpes de quaisquer naturezas. Determinou a eleição direta do presidente da República, dos governadores dos Estados e dos prefeitos, além de prever as responsabilidades fiscais. Com isso a nova Constituição de 1988, promulgada em 05 (cinco) de outubro, ampliou os poderes do Congresso Nacional tornando o Brasil um país mais democrático e com maior ênfase à descentralização dos poderes governamentais.
Considerado uma de suas cláusulas pétreas, o pacto federativo brasileiro está estabelecido na atual Constituição do País. Portanto, a forma federativa de Estado não pode ser abolida mediante Emenda Constitucional por ser considerada matéria de alta relevância para a estabilidade da nação. A própria Constituição define a independência e autonomia política, administrativa e financeira dos três níveis de governo.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Federalismo consiste na relação entre as diversas unidades de uma Federação. No caso do Brasil, a relação está entre os 26 estados e o Distrito Federal, sendo esses relacionados também com o Governo Federal.
Para garantir a funcionalidade de um governo federal, é importante que o sistema haja uma constituição escrita. Desse modo, as responsabilidades de cada nível ou parte do sistema federal são garantidas pela autoridade da Constituição.
Independentemente do nível, os cidadãos podem se candidatarem para diferentes cargos, conquistando assim posições no governo. Além disso, o federalismo cede oportunidades para os partidos políticos servirem seus eleitores. Os partidos podem participar a nível local e regional mesmo que não detenha a maioria dos votos.
Vivemos e somos submetidos a um modelo de governo que não teve suas raízes no Brasil. A influência americana foi determinante na formulação de um sistema de governo federal aplicado no país, mas há uma grande diferença histórica que diverge as raízes do federalismo nos Estados Unidos da América daquela brasileira. Uma diferença marcante é a Constituição Federal. Ainda há importantes mudanças a serem feitas para que o Governo caminhe de forma mais adequada.
A República Federativa Brasileira se caracterizaria verdadeiramente como uma Federação se existisse – e esperamos que isso se realize – uma integração sócio-econômica, política e principalmente jurídica que abrangesse todo o território nacional. Deve haver um equilíbrio entre os que constituem a federação, e esse equilíbrio deve ser fundamentado por mecanismos jurídicos. “…temos que por em prática o quando antes um projeto de integração internacional que leve em consideração os interesses do país como um todo e não somente os interesses dessa ou daquela região, sem descuidarmos, é claro, da soberania nacional e do bem comum.”
Um exemplo de melhoria que pode incrementar para o projeto de integração nacional está no contexto das competências tributárias. As competências são distribuídas entre a União (Governo Federal), os Estados e Distrito Federal (Governos Intermediários) e Municípios (Governos Locais). Apesar das características tributárias que o país apresenta, que permite a grande descentralização dos poderes, o sistema deve ainda passar por modificações, visando uma melhor definição das responsabilidades de cada nível governamental. Essas modificações devem ser realizadas por meio de reformas na atual Constituição.
Vivemos em um Estado Democrático, ou seja, onde o poder emana do povo. É certo que o povo elege seus candidatos para que estes os representem defendendo seus direitos e interesses, mas também não é errado afirmar que os eleitos se aproveitam do poder para defender interesses particulares. A descentralização que uma federação proporciona ameniza esse fato, ao menos na teoria, pois impede que somente uma pessoa ou um partido tome posse de todo o poder de um país e o centralize.
Partindo da Constituição de 1891, todas as Constituições Republicanas afirmam a tese de que o Brasil é uma Federação. Contudo, sem excluir a forma jurídica e política da expressão, é de se questionar se as normas constitucionais que abrangem o fato eram coerentes com a realidade política do Brasil. Sabe-se que existem distorções e que apesar da existência das leis, os diferentes níveis de governo utilizam o poder para benefício individual ao invés de administrar e beneficiar a parcela da federação que o elegeu. O sistema de uma federação é complexo e poderia ser muito mais eficaz e funcional, mas devido ao fato de ceder autonomia a muitos, torna-se ainda mais difícil o controle desses governos. A corrupção é um sério problema e a Constituição ainda não atingiu a perfeição, talvez nunca atinja. Ainda assim, mais benefícios à nação possuir uma República Federativa a uma Ditadura, e caminhamos para mais revisões e modificações que tendem a democratizar cada vez mais a Federação Brasileira.
Informações Sobre o Autor
Larissa Trento
Bacharel em Direito na Faculdade Assis Gurgacz (FAG), em Cascavel/PR, Servidora Pública Federal – Ministério da Justiça