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FGTS Digital, eSocial e a escassez de profissionais no Brasil

Por Beatriz Neves*

Eliminar gargalos burocráticos e agilizar processos para que o trabalhador tenha acesso a seus direitos de forma ágil e eficaz. Em linhas gerais, esse foi o objetivo da criação do eSocial, há quatro anos. De lá para cá, muita coisa mudou, a legislação foi alterada diversas vezes e as etapas para a automação de outras partes dos processos de folha de pagamento e recursos humanos foram superadas. Um dos mais importantes marcos – ao lado da substituição da DIRF, prevista para 2024 – ocorrerá em 2023, quando entrará em vigor o FGTS Digital, que integrará ao ecossistema do eSocial um dos três grandes encargos da folha de pagamento, o FGTS, representando mais uma peça da engrenagem na digitalização das relações trabalhistas e da automação completa do processo.

A partir desta data, as empresas acessarão o portal web do FGTS Digital para emitir suas guias de pagamento do FGTS, o que representará um enorme passo em direção à eliminação da SEFIP e da GRRF, processos antigos, complexos e pouco eficientes. Essas guias serão geradas direta e exclusivamente a partir dos dados e valores do eSocial. É importante ressaltar que não haverá nenhuma possibilidade de ajuste diretamente na guia. Quaisquer ajustes deverão ser feitos no eSocial, que realimentará o FGTS Digital para emissão da guia ajustada.

O eSocial consiste em mais de 55 arquivos diferentes, que permitiu a substituição de pelo menos 12 obrigações acessórias. É um ganho de escala para o País, que arrecadará mais impostos; para as empresas, que terão previsibilidade para seus tributos; e, principalmente, para o trabalhador, que passa a ter, na palma da mão, todo o seu histórico profissional e os pagamentos de impostos feitos para ele.

Outra mudança trazida é o novo prazo para o pagamento. Atualmente, as empresas depositam o FGTS até o dia 7 do mês. Com a entrada do FGTS Digital, esse vencimento será alterado para o dia 20, unificando assim, a data de vencimento do FGTS com os demais tributos (INSS, IRRF etc.). Enquanto o prazo maior representa vantagem para o cargo da empresa, há uma sobreposição com os calendários das demais obrigações e o cálculo do quinzenal, o que pode representar um problema e uma pressão a mais para o RH.

O eSocial contribui em agilidade na liberação de serviços e direitos do trabalhador, como a aposentadoria, na mesma medida em que torna o processo de encargos e cumprimento das obrigações das empresas mais padronizado e previsível. A empresa submete os dados uma vez só seguindo um padrão único, e os diversos órgãos acessam o eSocial para obter as informações.

Mas há algo intangível, difícil de mensurar, que vai gerar impacto na realidade das empresas, de todos os portes e setores: antigamente, as múltiplas obrigações encontravam-se desalinhadas, em vários formatos e algumas até em papel. Os erros eram mais frequentes, mas a fiscalização era mais rarefeita –limitada pela disponibilidade e tempo de fiscais visitarem a empresa e executarem a auditoria. A digitalização “elevou a barra” da acuracidade e dos prazos na submissão das obrigações acessórias e barateou o custo da fiscalização, além de permitir a detecção de problemas em massa. Com os dados homogeneizados e os prazos registrados e controlados de forma eletrônica, qualquer deslize expõe a empresa imediatamente a fiscalização e multa. A consequência deste cenário é a necessidade de, a todo momento, ter pessoas especializadas que realmente entendam como esse novo mecanismo funciona, e preparadas para 1) garantir a continuidade da conformidade da legislação (sempre mutante), 2) adequar a empresa aos novos requisitos que afetam tecnologia e 3) pessoas na operação de recursos humanos que garantam que nenhum dos prazos seja perdido.

O que torna esta tarefa ainda mais difícil é o fato de sermos um país com escassez de profissionais qualificados, agravada pelo aumento do turnover pós-pandemia. Como um exemplo, o levantamento Escassez de Talentos da ManpowerGroup alerta para o fato de que o Brasil está entre as dez nações com mais dificuldades de preencher vagas em áreas como tecnologia e dados. Se reunirmos na mesma linha de pensamento a capacitação específica com as novas demandas do ecossistema eSocial (eSocial, DCTFweb, FGTS Digital…), chega-se ao ponto sobre a necessidade de as empresas repensarem sobre qual é a melhor solução para se adequar à norma.

São vários os caminhos a escolher. O que não muda são os prazos: para o FGTS Digital, o ano de 2023. A partir desse ponto, todos terão que cadastrar e gerenciar os tributos repassados aos empregados pela ferramenta do eSocial.

O FGTS Digital vem para ficar e é muito bem-vindo. Todos ganham. Mas vai ganhar mais quem se organizar e tiver as melhores ferramentas para tal.

*Beatriz Neves é gerente de conformidade legal de produtos para a América Latina na multinacional de capital humano ADP

Âmbito Jurídico

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