Fundamentos e características gerais sobre o direito de propriedade romana e o direito de propriedade atual no Brasil

Resumo: Esta pesquisa pressupõe sobre o tema direito de propriedade. Procuramos falar de forma direta utilizando palavras concisas, para melhor apreensão do leitor. Dividimos este trabalho em seis partes. Primeiramente, iremos trabalhar em torno dos fundamentos e da natureza da propriedade, posteriormente, faremos a distinção entre três institutos: propriedade, posse e detenção. A terceira parte irá remontar através de auxilio doutrinário o aspecto histórico da evolução da propriedade trazendo-nos até os dias atuais. Ulteriormente achamos conveniente inserir na pesquisa o conceito de condomínio ou co-propriedade. A Quinta parte deste trabalho abordará sobre os elementos que caracterizam a propriedade romana. E por fim, trataremos sobre os meios de proteção da mesma. É importante lembrar, portanto, que esperamos apresentar um desenvolvimento que forneça aos leitores um mínimo de conhecimento


Sumário: Introdução; 1.0 Fundamentos e Natureza da Propriedade; 2.0 Propriedade, Posse e Detenção; 3.0 Evolução do Direito de Propriedade; 3.1 Propriedade Quiritária; 3.2 Propriedade Pretoriana ou Bonitária; 3.3 Propriedade Provincial; 3.5 Propriedade no Período Pós-Clássico: Justinianeu; 3.6 Direito de Propriedade Atualmente no Brasil; 4.0 Co-Propriedade ou Condomínio; 5.0 Elementos Caracterizadores da Propriedade Romana; 6.0 Proteção da Propriedade; 6.1 Rei Vindicatio; 6.2 Actio Negatória; 6.3 Meios Tuteladores dos Direitos de Vizinhança; 7.0 Conclusão; 8.0 Bibliografia


INTRODUÇÃO


Esta pesquisa pressupõe sobre o tema direito de propriedade. Procuramos falar de forma direta utilizando palavras concisas, para melhor apreensão do leitor.


Dividimos este trabalho em seis partes. Primeiramente, iremos trabalhar em torno dos fundamentos e da natureza da propriedade, posteriormente, faremos a distinção entre três institutos: propriedade, posse e detenção.


A terceira parte irá remontar através de auxilio doutrinário o aspecto histórico da evolução da propriedade trazendo-nos até os dias atuais. Ulteriormente achamos conveniente inserir na pesquisa o conceito de condomínio ou co-propriedade.


A Quinta parte deste trabalho abordará sobre os elementos que caracterizam a propriedade romana. E por fim, trataremos sobre os meios de proteção da mesma. É importante lembrar, portanto, que esperamos apresentar um desenvolvimento que forneça aos leitores um mínimo de conhecimento.


1.0 FUNDAMENTOS E NATUREZA DA PROPRIEDADE


Sabendo que esta pesquisa tratará sobre a órbita da propriedade é indispensável que seja destacado o seu respectivo conceito, inclusive a sua natureza. Tamanhas são as fontes doutrinárias que nos mostram a conceituação de propriedade, senão, vejamos.


A princípio, demonstra Jairo Coelho Moraes, que “o direito antigo constitui-se em face da predominante influência da religiosidade (…) como dimensão legitimadora de sua aplicação à ordem social” (MORAES, p.31,) ao tratar de direito de propriedade notamos que não é distinto desta visão.


Nesse mesmo sentido afirma Fustel de Coulanges em sua grande obra o seguinte:


“Entre a maior parte das sociedades primitivas, foi pela religião que se estabeleceu o direito de propriedade (…). Não foram as leis que a princípio garantiram o direito de propriedade; foi à religião” (COULANGES (1830-1889), São Paulo, 1961)


Não restando dúvida da presença religiosa sobre a propriedade, tentaremos através das exposições de Coulanges formar nossos próprios conceitos sobre os principais pensamentos religiosos no que tange o direito de propriedade. Vejamos.


Notamos que a propriedade era primeiramente baseada entre uma profunda ligação com os ancestrais de uma determinada família (nota-se que a propriedade não é individual), estes eram venerados em seus túmulos e considerados como Deuses. Somente a família poderia prestar os rituais, ninguém mais que não fosse ligado por agnição poderia presenciar o culto ritualístico.


O Deus Termo limitava o local, e os deuses ancestrais, já mencionados protegiam o território contra ingerências de outrem. Importante notar, que devido os túmulos serem irremovíveis, em regra, a família era obrigada a permanecer e tomar posse do solo. A terra torna-se inseparável da família. Somente esta poderia ter este direito, a seqüência é clara: um deus, um tumulo, uma família. Daí surge à idéia de propriedade. Não deixando duvida que “não se podia adquirir a propriedade sem o culto, nem o culto sem a propriedade” (COULANGES (1830-1889), São Paulo, 1961)


A propriedade se traduzia “como a dominação do homem sobre a coisa e se reveste dos atributos dominais de poder usar, gozar dispor, e reivindicar a coisa onde que ela se encontre” (MOREIRA, p.40, 2003). Ela é considerada como tal, quando há “uma relação direita e imediata entre a pessoa, titular do direito e a coisa” (MARKY, p. 65, 1995).


O doutrinador Thomas Marky menciona que a propriedade possui dois sentidos, temos, portanto, o sentido positivo e o negativo. No sentido positivo “a propriedade confere ao titular o direito de usar, gozar e dispor da coisa e, no sentido negativo, exclui toda e qualquer ingerência alheia” (MARKY, p. 65, 1995). Por tal motivo, dominium proprietas, é “um poder jurídico absoluto e exclusivo sobre uma coisa corpórea (…) Impõe a todos a obrigação de respeitá-la” (MARKY, p. 65, 1995)


Nota-se grande dificuldade pelos estudiosos do Direito Romano para encontrar as primeiras definições de propriedade. Poderia afirmar que José Carlos Moreira Alves, às encontra, em um escrito e em fragmentos de Digestos. Vejamos a que o autor pronuncia.


“Com base em um escrito de Constantino (C.IV,35,21), relativo à gestão de negócios, definiram o proprietário como suae rei moderator et arbiter (regente e árbitro de sua coisa); de fragmento do Digesto (V,3,25,11), sobre o possuidor de boa-fé, deduziram que a propriedade seria o ius utendi et abutendi re sua (direito de usar e de abusar da sua coisa); e de outra lei do Digesto (I,5pr.), (…) à propriedade que então seria a naturalis in re facultas eius quod cuique facere libet, nisi si quid aut oure prohibetur (faculdade natural de fazer o que se quiser sobre a coisa, exceto aquilo que é vedado pela força ou pelo direito.” (ALVES, p.281, 2004)


Em suma, propriedade é a dominação do homem sobre a coisa, dela, podendo usar, gozar/abusar, dispor e reivindicar, enfim, exercer o seu poder jurídico sobre a coisa, fazendo o que bem entender, exceto aquilo que a lei proíba ou limita.  É importante ressaltar também, que a propriedade é um direito absoluto devendo ser respeitado por todos.


2.0 PROPRIEDADE, POSSE E DETENÇÃO.


Coloquemos aqui nossos esforços para distinguir três instituições: propriedade, posse e detenção.


Os romanos “distinguiam a posse, claramente do direito da propriedade. No Digesto (XLI,2,12; e XLIII,17,1,2) lêem-se: nihil commune habet proprietas cum possessione (a propriedade nada tem em comum com a posse)” (ALVES, p. 261, 2004). A posse segundo Marky é


“um poder de fato sobre uma coisa corpórea: a efetiva subordinação física da coisa a alguém. Distingue-se da propriedade que é poder jurídico absoluto sobre a coisa. O primeiro é uma fato, o segundo é um direito” (MARKY, p. 74, 1995) (grifo nosso)


Alves trabalha neste mesmo sentido ao diferenciar posse de propriedade, porém articula uma posição mais ampla, proferindo que


“a posse é poder de fato sobre uma coisa; a propriedade é poder de direito. Em geral, posse e propriedade se apresentam reunidas; por via de regra, o proprietário (que tem o poder de direito sobre a coisa) é também seu possuidor (tem poder de fato sobre ela).” (ALVES, p. 261, 2004)


Fica claro, portanto, que posse e propriedade se diferem, tanto que os romanos distinguiram estas duas instituições. Propriedade é um poder jurídico, posse é um poder de fato.  Mas podemos observar que, em geral, quem exerce um poder de direito carrega consigo o poder de fato, denominado posse.


Para que possamos diferenciar posse de detenção, é necessário que saibamos sobre os dois elementos que compõe a posse: material (corpus), intencional (animus).


Segundo as explicações doutrinárias de Direito Romano, Marky prega que o primeiro elemento:


 “é o fato material de a coisa estar subordinada fisicamente a alguém. Chama-se corpus. (…) O segundo elemento da posse é o intencional, chamado animus. É preciso a intenção de possuir, animus possidende; não basta a proximidade real. ” (MARKY, p. 75, 1995)


Corpus era, portanto, “o elemento objetivo, o corpo, a matéria, o objeto físico” (ROLIM, p.207, 2000). Animus compõe o “elemento subjetivo, a intenção, à vontade, o ânimo de possuir a coisa” (ROLIM, p.207, 2000)


A instituição Detenção está muito próxima da instituição da Posse. Ambas são poder de fato sobre a coisa, porém estes não se equivalem. A distinção é analisada pela intenção ou reconhecimento do sujeito e pelos efeitos jurídicos que produzem. Vejamos, segundo José Carlos Moreira Alves, existiria


“posse (isto é, o poder de fato exercido sobre uma coisa, e devidamente tutelado pelo Estado), (…) existiria a nomenclatura moderna, detenção,(ou seja, o poder de fato exercido sobre uma coisa, sem a proteção jurídica)” (ALVES, p. ,264; 2004)


Sabe-se que no Direito romano “tiveram posse todos aqueles que possuíram a coisa com a intenção de tê-la como própria” (MARKY, p. 75, 1995) (grifo nosso), esta situação independe se aquele que possuía tinha ou não direito de comportar-se como o dono da coisa. E tiveram no Direito romano a detenção, aqueles que exerciam “o poder de fato reconhecendo a propriedade de outrem não possuem, mas detêm, a coisa. A sua intenção (…) não vai além de ter a coisa em seu próprio poder, mas em nome do proprietário” (MARKY, p. 76, 1995). (grifo nosso).


Nesse sentido, Saving citado por José Carlos Moreira Alves em sua obra relata que o diferencial “posse da detenção era circunstância de que, na posse, havia animus domini (a intenção de ser proprietário), o que não ocorria na detenção” (ALVES, p. 264, 2004).


Observamos, portanto, que propriedade é um poder jurídico. Posse é um poder de fato exercido sobre a coisa com a vontade de tê-la como sua, e, produz efeitos jurídicos. Detenção ou possessio naturalis, é um poder de fato sem nenhuma proteção do Estado, ou seja, “é destituído de conseqüências jurídicas“ (MARKY, p.76, 1995). O detentor exerce um poder sobre a coisa, porém reconhece que a propriedade não lhe pertence.


3.0 EVOLUÇÃO DO DIREITO DE PROPRIEDADE


Com a evolução do Direito de Propriedade, podemos encontrar várias espécies tais como: Quiritária, Pretoriana ou Bonitária, Provincial, Peregrina, Propriedade no período Justianeu, e por fim Propriedade Atual.


Destacaremos os pontos principais de cada uma destas espécies de propriedade, pela ordem demonstrada acima.  Primeiramente para uma melhor apreensão, torna-se necessário fazermos um breve panorama histórico.


  Sabe-se que “no período pré-classico, os romanos só conheceram uma espécie de propriedade: a propriedade quiritária (ex iure Quiritium)” (ALVES, p. 282, 2004). Posteriormente, no período clássico, além da propriedade quiritária podemos visualizar três novas espécies “às quais os romanistas, em geral denominam propriedade bonitária (também chamada pretoriana), propriedade provincial e propriedade peregrina” (ALVES, p. 282, 2004).


Já no período pós-clássico, essas diferentes espécies de propriedade vão desaparecendo. Em Justiniano, só vamos encontrar um tipo.


Atualmente, veremos que a propriedade está assegurada nas Constituições e em outras leis de hierarquia inferior, e que com a evolução histórica, esta sofreu uma série de restrições, ou seja, limitações, dentre outros fatos e características.


3.1 PROPRIEDADE QUIRITÁRIA


Segundo a Rolim, a propriedade quiritária “era aquela que já existia nos primeiros séculos de Roma. Era regulada pelas normas rígidas e formais do jus civile ou direito quiritário” (ROLIM, p.187, 2000).


Uma de suas características principais, reconhecida pelos romanos é que “o titular de uma propriedade quiritária devia ser obrigatoriamente um cidadão romano, ou seja, gozar do status civitatis” (ROLIM, p.188, 2000).


Nesta mesma orientação, proferi Marky, porém, detalhadamente o que seria uma propriedade quiritária, esta, portanto.


“pressupõe naturalmente que o seu titular seja cidadão romano. Outro pressuposto é que a coisa, sobre que recaía a propriedade quiritária, possa ser objeto dela. Estão nesta condição todas as coisas corpóreas in comercio, exceto os terrenos provinciais” (MARKY, p. 69,1995)


Para a propriedade quiritária, é importante que “tenha sido adquirida, pelo seu titular, por meio reconhecido pelo ius civile. Tais meios eram: 1) os modos de aquisição originários; 2) o usucapião (…)” (MARKY, p. 69, 1995). Verifica-se, porém, que este sistema “era rígido e complicado demais para o rápido desenvolvimento dos negócios, exigência natural do comércio” (MARKY, p. 69, 1995).


Além de rígido e intricado a aplicação do direito quiritário, desfavorecia os as pessoas que não se encaixavam no sistema ius civile, “atentou, em muitos casos, contra a eqüidade, principio que foi ganhando vulto na segunda metade da Republica” (MARKY, p. 69, 1995).


3.2 PROPRIEDADE PRETORIANA OU BONITÁRIA


Posteriormente à propriedade quiritária, podemos destacar a propriedade pretoriana ou bonitária, esta “surgiu com o direito pretoriano, ou seja, já no período da Republica, e veio amenizar o rígido conceito de propriedade previsto pelo jus civile” (ROLIM, p.188, 2000)


Segundo Alves, a propriedade aqui trabalhada “surgiu quando o pretor passou a proteger a pessoa que, comprando uma res mancipi, a recebia do vendedor por meio da simples traditio” (ALVES, p. 283, 2004),


Percebemos a seguinte curiosidade, este tipo de propriedade “podia ser adquirida não só pelos cidadãos romanos, mas também pelos estrangeiros e os modos de aquisição nem sempre eram solenes e formais” (ROLIM, p.188, 2000).


Portanto a propriedade pretoriana surgiu no período da Republica, com o intuito de amenizar as rígidas leis/condições da propriedade quiritária.


3.3 PROPRIEDADE PROVINCIAL


A título de curiosidade, sabe-se que os terrenos situados nas províncias “eram chamados praedia stipendiaria e praedia tributaria” (MARKY, p. 71, 1995). Douto Luiz Antônio Rolim, expõe que:


“os bens situados na província eram propriedade exclusiva do Estado romano, mas podiam ser usados pelos particulares através do usus, do fructus, do possessio ou herbere possidare” (ROLIM, p.189, 2000)


Como vimos acima, apesar de serem terras províncias, de poder pleno do Estado, este concedeu o gozo aos particulares. Segundo a ótica de Marky foi uma “concessão semelhante, mas não idêntica, à propriedade” (MARKY, p. 71,1995). Alves diz que os cidadãos romanos ou não, só poderiam exercer a posse neste território, através da seguinte afirmação.


Nessas províncias, o proprietário do solo é o povo romano (se se trata de província senatorial) ou o príncipe (se trata de província imperial); os particulares – fossem, ou não, cidadãos romanos – não podiam ter mais do que a posse (…) sobre esse solo” (ALVES, p.284, 2004)


Uma observação importante que Rolim faz, é que o “possuidor dessas terras, no entanto devia pagar ao Estado pelo seu uso, um tributo anual denominado agri stipendiarii ou agri tributarii” (ROLIM, p.189. 2000).


3.4 PROPRIEDADE PEREGRINA


Em síntese, antes de conseguirem amplos direitos de propriedade os peregrinos sofreram várias injustiças. Graças a contribuições (proteção, reconhecimento) por parte dos pretores ou governadores, conquistaram seus direitos. Senão, vejamos.


A primeiro momento, quando os peregrinos “adquiriam qualquer bem, móvel ou imóvel, não tinham sobre eles um direito de propriedade, mas somente a posse” (ROLIM, p.189, 2000). Esta propriedade de fato “foi sendo protegida pelo pretor peregrino (em Roma) e pelos governadores (nas províncias)” (ALVES, p. 284, 2004).


A segunda e ultima ocasião, os peregrinos foram considerados pelos governadores ou pelo pretor peregrino “legítimos proprietários de suas terras, quando situadas fora de Roma, nas províncias” (ROLIM, p.189, 2000)


A proteção admitida à propriedade peregrina (simples dominium) surgiu basicamente “em contraposição ao dominium ex iure Quiritium e admitiam para ela meios processuais de defesa que imitavam os da defesa da propriedade quiritária” (MARKY p. 71, 1995)


3.5 PROPRIEDADE NO PERIODO PÓS-CLÁSSICO: JUSTINIANEU


Sabe-se que no período pós-clássico, as diferentes espécies de propriedade a qual trabalhamos acima, vão desaparecendo até que, no tempo de Justiniano, “só vamos encontrar – como no direito moderno – uma única disciplina por normas” (ALVES, p. 285, 2004). Justiniano unificou “o instituto, uma vez que as causas da distinção já haviam desaparecido em sua época” (MARKY p. 71, 1995)


Poderíamos dizer que não houve o desaparecimento das outras propriedades, já trabalhadas, o que houve, foi simplesmente a unificação das mesmas em uma espécie de propriedade. Vejamos as seguintes analogias relatadas por Alves.


“no direito Justianeu, era transferida pela traditio (no direito clássico isso ocorria com relação à propriedade pretoriana) estava sempre sujeita ao pagamento de impostos (no período clássico,  só a propriedade provincial o estava);e sobre ela pesava uma série de limitações impostas por necessidade da administração pública” (ALVES, p. 285, 2004)


Portanto, não resta dúvida que este período se caracteriza, pela unificação de “de dominium ou proprietas, surgindo então um único conceito de direito de propriedade” (ROLIM, p.189, 2000). Estabelece ainda, limitações de caráter público administrativo sobre a propriedade daquele que a detém.


3.6 DIREITO DE PROPRIEDADE ATUALMENTE NO BRASIL


A propriedade atual seja no Brasil ou não é um direito assegurado pelas Constituições e por leis hierarquicamente menores. Não foi fácil a conquista do direito de propriedade. É importante mencionar que para se chegar ao conceito e a tutela que a propriedade/proprietário tem nos dias de hoje, percorreu um árduo caminho, que abrange incansáveis lutas por dignidade plena e pela preservação dos direitos indispensáveis ao homem, simplesmente por ser homem, digo, por ser incompleto. Mas é importante lembrar que a propriedade não se assenta exclusivamente no direito natural, é mais do que isso.


No Direito Brasileiro, a propriedade é tratada no Novo Código Civil, mais especificamente no art. 1128 como faculdade que têm o proprietário de “usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de revaê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha” (CC, citado por TEPEDINO, p. 305, 2004). Veja que a definição é quase a que verificamos no Direito Romano, porém o Código Civil trata o assunto com mais severidade, garantindo, a principio, a propriedade somente daqueles que a possuem justamente.


A Constituição no Capítulo I, Dos Direitos e Deveres Individuais e Coletivos, no Art. 5٥, inciso XXII diz que “é garantido o direito de propriedade” (CF, 1988), e o inciso ulterior, regra que “a propriedade atenderá a sua função social” (CF, 1988).


Como vimos ganhou novas atribuições a propriedade: sua função social. Esta na visão de Tepedino é a:


“capacidade do elemento funcional em alterar a estrutura do domínio (…) e atuando como critério de valoração do exercício do direito, o qual deverá ser direcionado para o ‘massimo sociele’” (TEPEDINO, p.319, 2004)


Sem dúvida a propriedade deve atender a sua função social. A Introdução desta função “implica a superação de contraposição entre público e privado, isto é, implica a evolução da propriedade em sentido social, (…) destinada à satisfação de exigências sociais” (Ana de Vita citada por MALUF, p.55, 1997).


Várias proteções da propriedade existente no direito da antiguidade, principalmente no Romano, ainda estão presentes no direito atual, em algumas das vezes veremos de forma diferente, devido à experiência histórica que trouxe benefícios e conhecimento para o homem corrigir seus erros e ineficiências. Algumas das proteções existente no direito atual são: ação negatória, a cauti damni infect, operis noui nuntiatio, reivindicação dentre outras.


Uma série de limitações foi posta a propriedade, assim como ocorria no Direito Romano, porém atualmente obedecendo a princípios de justiça.


4.0 CO-PROPRIEDADE OU CONDOMÍNIO


Limitamos neste tópico apenas a conceituar a co-propriedade ou condomínio, e não resolver questões doutrinárias que tange este tema.


Co-propriedade ocorre quando há “existência de duas propriedades ao mesmo tempo sobre a mesma coisa” (MARKY, p. 72, 1995). Pressupõe, portanto, que cada co-proprietário tem direito a uma parte da coisa. Contribui-nos Alves dizendo que havendo “comunhão de direito de propriedade sobre a coisa corpórea, há condomínio ou co-propriedade” (ALVES, p. 289, 2004). Tal comunhão de direito “surge sem que haja interferência da vontade dos sujeitos (…), ou deriva da vontade deles – é a societas  (ALVES, p. 289, 2004)


Importante lembrar que a coisa “não é dividida entre os proprietários, mas cada um deles tem direito, na proporção de sua parte, a cada uma das parcelas da coisa inteira” (MARKY, p. 72, 1995).


A guise de conclusão, co-propriedade ou condomínio, ocorre quando duas ou mais pessoas são proprietárias da mesma coisa, estas, congregam os seus direitos e cada uma delas possuem direitos na sua parte. 


5.0 ELEMENTOS CARACTERIZADORES DA PROPRIEDADE ROMANA


Sobre os elementos caracterizadores do direito da propriedade romana através da obra de Coulanges, podemos destacar os seguintes dados: inalienável, imprescritível, indivisível, coletiva, absoluta.  


 Em sua primeira afirmação Coulanges diz que o solo o donde habitavam os mortos “é inalienável e imprescritível” (COULANGES (1830-1889), São Paulo, 1961). Pertencia ao proprietário e a ele sempre pertenceria. Posteriormente o autor trabalha com a indivisibilidade da propriedade dizendo que:


“propriedade, por sua própria natureza, era indivisível. Em cada família não podia haver mais de um proprietário, que era a própria família, nem mais de um usufrutuário, que era o pai”. (COULANGES (1830-1889), São Paulo, 1961).


Como vimos a proprietária era da família, porém quem detinha o poder supremo sobre o bem (inclui, o solo, a mulher, os filhos, escravos, dinheiro) era o pai, mulher e filhos, direito nenhum detinham. Mas, posteriormente, a indivisibilidade torna-se uma visão errônea.


Por fim, implicitamente, notamos um caráter absoluto do direito da propriedade quando Coulanges cita Platão, este diz:


Nossa primeira lei deve ser esta: Que ninguém toque no marco que separa seu campo do vizinho, porque ele deve continuar imóvel. Que ninguém cuide em deslocar a pequena pedra que separa a amizade da inimizade, a pedra que, por juramento, deve permanecer em seu lugar(28).” (Platão citado por COULANGES, São Paulo, 1961)


Logo é absoluto porque todos devem respeitar o direito de propriedade. Ninguém deve mover o marco da propriedade de outrem. Está é a lei que Platão apenas repete as palavras do legislador.


Carlos Alberto Dabus Maluf define que os elementos caracterizadores compõem por: Direito absoluto, Direito exclusivo, e Direito perpétuo.  


Absoluto, pois é “oponível a todos os outros indivíduos” (MALUF, p.11, 1997), e devido a sua “ilimitabilidade”.


È exclusiva, pois “o mesmo solo não pode haver mais de uma propriedade” (MALUF, p.12, 1997). Por fim é perpetua, pois não podiam “os romanos conceber uma propriedade que fosse adquirida por um determinado período ou a titulo provisório, ou ainda sob condições” (MALUF, p.12, 1997).


Em resumo os elementos caracterizadores, no direito início do Direito Romano, são: absoluto, coletivo, indivisível, exclusivo/indivisível, perpétuo/imprescritível.


6.0 PROTEÇÃO DA PROPRIEDADE


Veremos neste capítulo que não bastava à instalação e o reconhecimento da propriedade era necessário que a coisa fosse protegida integralmente ou as suas partes. Estes meios de proteção advém do Estado que garantia tutela ao proprietário da coisa. 


A proteção do direito de propriedade se dava através das “actiones in rem, que são assim chamadas porque na sua fórmula, tem como objeto um direito sobre a coisa” (MARKY, p. 87, 1995). Sabe-se que no Direito Romano o Estado “colocava à disposição do proprietário vários tipos de ações em juízo para defender a sua propriedade” (ROLIM, p.189, 2000).


A partir da seguinte frase podemos verificar a existência da ação negatória, reivindicatória, tutela dos direitos de vizinhança e outras. Vejamos. 


“Além da ação tuteladora por excelência, do direito de propriedade – a rei uindicatio (utilizável quando o proprietário é privado da posse da coisa intenta recupera-la) -, da actio negatória (de que se vale o proprietário para negar a existência de direito real de outrem sobre sua coisa) e dos diferentes meios de tutela dos direitos de vizinhança, dispõe ainda, o proprietário dos interditos possessórios, de ações de caráter penal (…) e de outras ações” (ALVES, p. 316, 2004).


Como vimos acima, há uma série de ações tuteladoras, porém, nos limitaremos em destacar sucintamente os meios processuais que consideramos mais importantes e mais utilizados pelos estudiosos do Direito Romano. 


6.1 REI VINDICATIO


Em síntese, a reivindicação é o meio “de proteção contra lesão do direito de propriedade na sua totalidade” (MARKY, p. 87,1995), Sua exclusiva finalidade é de obter a devolução da coisa que lhe pertence, que lhe é sua por direito. Formidável é o seguinte exemplo apresentado por José Carlos Moreira Alves


“Alguém se apodera de terreno alheio; o usurpador tem a posse (o poder de fato de utilizar-se da coisa), e o proprietário tem o direito de propriedade sobre o imóvel (o poder de direito sobre ele, o que lhe possibilita intentar contra o possuidor uma ação de reivindicação, para que lhe seja restituído o poder de fato sobre o terreno)” (ALVES, p. 261,262; 2004)


Portanto, quando alguém exerce o poder de fato sobre o terreno do proprietário de direito da coisa, este pode se amparar através da ação de reivindicação e restabelecer o seu poder sobre o terreno, cessando assim, a posse daquele.


6.2 ACTIO NEGATÓRIA


A ação negatória é também um meio de proteção contra o direito de propriedade, diferentemente da ação reivindicatória, este meio protege contra lesão parcial. Tratava-se, portanto, de “ação do proprietário possuidor contra quem, alegando ter um direito real sobre a coisa, violava, parcialmente, o exercício do direito de propriedade daquele(MARKY, p. 88, 1995).


Por esta ação é que o proprietário “obtém a cessação das turbações por parte do que se diz titular do direito real sobre a coisa dele” (ALVES, p. 319, 2004). Vejamos o exemplo que nos trás Luiz Antônio Rolim.


“se alguém alegasse que tinha o direito de servidão ou o usufruto sobre uma propriedade alheia, o proprietário desta podia lançar mão da ação negatória para que fosse declarada oficialmente a inexistência do usufruto ou da servidão propagada” (ROLIM, p.204, 2000)


Portanto, aquele que alega possuir a coisa de outrem, esta sujeito às penas da lei quando o real proprietário utiliza-se da ação negatória para confirmar que aquele não tem direito.


6.3 MEIOS TUTELADORES DOS DIREITOS DE VIZINHANÇA


O Direito Romano já tratava sobre as relações entre vizinhos, assegurando proteção aquele proprietário que corresse algum tipo de risco ocasionado pelo seu adjacente. Destacaremos algumas das ações que regulava os direitos de vizinhança, temos, então: cauti damni infect, operis noui nuntiatio, dentre outras a qual não iremos trabalhar.


A cauti damni infecti, proteção já mencionada, a princípio teve o objetivo de “proteger o proprietário de um imóvel contra o risco de a casa do vizinho cair; posteriormente, passou a protegê-lo, também, contra riscos oriundos de obras realizadas pelo vizinho (ALVES, p. 319, 2004)


A operis noui nuntiatio é uma “intimação do magistrado do vizinho, para que se abstenha de realizar, em seu terreno, construção ou demolição” (ALVES, p. 320, 2004). Construção ou demolição que viria a por em perigo ou que cause dano aquele. 


7.0 CONCLUSÃO


Concluímos com a presente pesquisa que foi no direito antigo que a propriedade se constitui devido à influência da religiosidade. Não restando dúvida que foi pela religião que se estabeleceu o direito de propriedade


A propriedade se traduzia como o poder que o homem tem sobre a coisa podendo este, gozar, usar, dispor, e reivindicar (reaver) a coisa. A propriedade também excluía o poder de outrem, por ser um poder jurídico absoluto todos deviam respeitar-la.


Verificamos também, que a posse é um poder de fato sobre a coisa, é a subordinação física com a vontade de tê-la como sua, e, produz efeitos jurídicos. Propriedade é um poder jurídico absoluto sobre a coisa, é um direito. Já a Detenção, é um poder de fato sem nenhuma proteção, pois o detentor reconhecesse que a propriedade não lhe pertence, este não possui animo de tê-la como sua. O detentor apenas detém a coisa.


 A propriedade quiritária surgiu no direito quiritário nos primeiros séculos de Roma. Esta era reconhecia somente aos cidadãos romanos e desfavorecia aos que não se encaixavam no sistema ius civile, atentando, portanto contra a eqüidade. Posteriormente, surgiu no período da Republica, a propriedade bonitária com o intuito de amenizar as rígidas leis da propriedade quiritária. Este tipo de propriedade podia ser adquirida não só pelos cidadãos romanos, mas também pelos estrangeiros.


A propriedade provincial era localizada nos terrenos das províncias sob o poder do Estado, porém este concedeu o gozo as pessoas que poderiam exercer a posse no local, através de pagamento de tributos. 


Concluímos que a propriedade peregrina surgiu graças à proteção dos pretores onde os peregrinos foram considerados legítimos proprietários de suas terras. Esta proteção surgiu para contrapor a propriedade quiritária. Por fim, a propriedade no período de Justiniano se caracterizou pela unificação de todas as propriedades já conhecidas.


A propriedade atual no Brasil é tratada no Novo Código Civil e na Constituição mais especificamente no Capítulo I, Dos Direitos e Deveres Individuais e Coletivos, esta ganha uma nova idéia que é o dever de atender a sua função social. Percebemos, na propriedade atual que várias proteções existentes no direito da antiguidade, ainda estão presentes, tais como: ação negatória, a cauti damni infect, reivindicação, etc. Porem observa-se também, uma série de limitações.


Por fim, concluímos que não basta o reconhecimento da propriedade era necessário que a coisa fosse protegida integralmente ou suas partes e que tais meios de proteção era proporcionada pelo Estado.  


 


Bibliografia

ALVES, José Carlos Moreira, Direito Romano – Rio de Janeiro; Forense, p. 261, 2004.

COULANGES, Fustel, www.eBooksBrasil.org, A Cidade Antiga, Título original La Cité Antique – Étude sur Le Culte, Le Droit, Les Institutions de la Grèce et de Rome, Tradução © 2006 Frederico Ozanam Pessoa de Barros, Versão para eBookeBooksBrasil, Fonte Digital Digitalização do livro em papel, Editora das Américas S.A. – EDAMERIS, São Paulo, 1961.

MALUF, Carlos Alberto Dabus, Limitação ao direito de Propriedade, 1997.

MARKY, Thomas, Curso Elementar de direito romano, Saraiva, 8º ed, p. 65, São Paulo, 1995.

MORAES, Jairo coelho, O fenômeno jurídico na Antiguidade. (esta obra ainda não foi publicada pelo autor)

MOREIRA, Márcio Martins, Noções Introdutórias de direito Romano e Legislação Vigorante, Livraria Paulista, São Paulo, p.40, 2003.

ROLIM, Luiz Antonio, Instituições de Direito Romano, Editora Revista dos Tribunais ltda, São Paulo, p.207, 2000.

TEPEDINO, Gustavo, Temas de Direito Civil, 3º edição, Revista e Atualizada, Renovar, Rio de Janeiro, 2004. 


Informações Sobre o Autor

Davi Souza de Paula Pinto

Acadêmico de Direito da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais – Betim


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