Garantismo e transação penal: estrita jurisdicionariedade como um intangível pressuposto à aplicação de sanção penal


Resumo: O artigo propõe uma reflexão do instituto transação penal à luz do princípio da estrita jurisdicionariedade, tendo como paradigma o sistema garantista de Luigi Ferrajoli.  Visa-se demonstrar que o instituto em relato solicita revisão, de maneira a se compatibilizar com a estrutura normativa de um Estado Democrático de Direito, apto à tutela dos direitos fundamentais com devida racionalidade, pois aplica sanção penal em procedimento desprovido de diversas garantias processuais penais e penais conquistadas ao longo da história, como a presunção de inocência, a ampla defesa e o contraditório.   Pretende-se por fim, transparecer que o direito criminal deva tratar das infrações que realmente exijam sua atuação, atendendo-se à exigência de uma política criminal centrada na intervenção mínima. 


Palavras-chave: Transação penal; garantismo; estrita jurisdicionariedade; direitos fundamentais, racionalidade.  


Abstract: This article proposes a reflection of the institute criminal transaction under the principle of strict jurisdicionariedade, with the paradigm of the system ensures Ferrajoli Luigi. The aim is to demonstrate that the institute report calls for review in order to be compatible with the normative framework of a democratic state, fit the protection of fundamental rights due to rationality, it applies to criminal sanction procedure devoid of various criminal procedural guarantees criminal and conquered throughout history, such as the presumption of innocence, the legal defense and contradictory. It is intended eventually transpired that criminal law should address the violations that actually require his performance, taking into consideration the requirement of a criminal policy focused on minimum intervention.


Keywords: criminal transaction, guarantee; jurisdicionariedade strict, fundamental rights, rationality. 


Sumário: 1 Introdução; 2 Princípio da estrita jurisdicionariedade; 3 A transação penal;  4 Análise crítica; 5 Considerações finais; 6 Referências.


1 Introdução


Aborda-se a garantia da submissão à estrita jurisdicionariedade, objetivando a promoção de uma análise crítica do instituto transação penal, sob o sistema garantista de Luigi Ferrajoli.


Pretende-se demonstrar que o instituto em tela aplica em verdade, sanção penal sem a observância de garantias processuais penais conquistadas ao longo da história, como a presunção de inocência, a ampla defesa e o contraditório.


A princípio discorremos sobre o sistema garantista do autor, evidenciando que o princípio da submissão à estrita jurisdicionariedade deva ser visto como pressuposto indispensável a evitar aplicação de sanções penais arbitrárias.


Fomentamos ainda, algumas questões afetas a transação penal. Procuramos salientar sua natureza jurídica, procedimento e a posição do suposto autor do fato quando da proposição ministerial, de modo a analisar a possibilidade ou não de sua adequação ao principio e ora indagado, comparando-a ao sistema norte americano do plea bargaining, inspirador desta medida.


Por derradeiro, expusemos nossa posição acerca do trabalho proposto, identificando a transação penal como sanção penal apta a excluir garantias fundamentais do cidadão. Aduzimos ainda, que a intervenção penal, por sua extrema violência, apenas é tolerada quando compatível à estrutura de um Estado Democrático de Direito, que requer racionalidade na sua atuação. O direito criminal mínimo deve cuidar das infrações lesivas aos bens jurídicos mais importantes por sua tamanha violência (privação de liberdade e restrição de direitos), subentendendo-se, que demais ilícitos ensejem a atuação cível e/ou administrativa.


2 Princípio da estrita jurisdicionariedade


Na trajetória do direito, desde Roma e Grécia antigas até os dias a lume, nos diversos ordenamentos, vislumbrou-se a opção pelos sistemas inquisitório ou acusatório, bem como foram aplicados de forma mista.


A história nos mostra que sempre houve meios de punição autoritários, impondo sanções ao indivíduo sem um mínimo de garantias, sob fundamentos políticos, de defesa social e de segurança jurídica.


Almejando limitar o poder punitivo, em homenagem ao máximo grau de racionalidade e confiabilidade do juízo, protegendo a pessoa humana contra a arbitrariedade déspota, buscando ensejo a efetividade de um Estado Democrático de Direito pautado na garantia dos direitos fundamentais, Luigi Ferrajoli elaborou um sistema garantista, baseado em princípios processuais penais e penais contemplados nos mais modernos ordenamentos jurídicos[1].






Cada um desses princípios, conforme Ferrajoli:


“compõe uma garantia jurídica para afirmação da responsabilidade penal e sucessiva aplicação da pena. Não se trata de uma condição suficiente, na presença da qual esteja permitido ou obrigatório punir, mas de uma condição necessária, na ausência da qual não está permitido ou está proibido punir, pois a função das garantias no direito criminal não é tanto permitir ou legitimar, senão muito condicionar ou vincular e, portanto, deslegitimar o exercício absoluto da potestade punitiva” (FERRAJOLI, 2006, p. 90-91).


Trata-se de um esquema moldado em dois elementos. Um concernente à definição legislativa (estrita legalidade) e outro destinado à comprovação jurisdicional do desvio punível (estrita jurisdionariedade).


O primeiro (convencionalismo penal) deriva da determinação abstrata da conduta punível, exigindo:


“uma condição de caráter formal ou legal do critério de definição do desvio, que em homenagem à fórmula nulla poena et nullem crimen sine lege considera como punível aquela conduta humana indicada pela lei como pressuposto indispensável à aplicação de pena, e não, características intrínsecas ou ontológicas tidas em cada ocasião como imoral, naturalmente anormal ou socialmente lesivo. Além disso, exige o referido elemento, em atributo a máxima nulla poena sine crimine et sine culpa, que a indicação do desvio punível incida sobre figuras empíricas e objetivas de comportamento, rechaçando determinações subjetivas de status ou de autor” (FERRAJOLI, 2006, p. 38-39). 


O segundo elemento, chamado de cognitivismo processual na determinação concreta do desvio punível, é ligado ao primeiro, sendo sua condição de efetividade. “É relativo aos pronunciamentos jurisdicionais, consubstanciando-se nas razões de fato e de direito justificadoras das suas motivações” (FERRAJOLI, 2006, p. 40).


Este requisito deve ser assegurado pelo que Ferrajoli chama de estrita jurisdicionariedade, vinculando-se a ideia verificabilidade ou refutabilidade das hipóteses acusatórias de modo a galgar sua comprovação empírica.


Grande importância reside neste requisito, pois o desvio punível deve estar prévia e exaurientemente determinado de modo a evitar que “desvios penais sejam constituídos e não regulados pelo sistema jurídico penal. Figuras delituosas de abertura semântica, segundo a premissa, devem ser repelidas, por incidir valorações de ordem discricionárias do juiz” (FERRAJOLI, 2006, p. 40).


Enfim, há de se exigir do Estado no que pertine a imposição “legítima” de uma sanção penal, o cumprimento de dois pressupostos. Que a conduta do imputado seja descrita no corpo de norma imperativa, cujo teor preveja de forma abstrata e direta figuras típicas de desvio penal, sendo indevidas e, principalmente, inconstitucionais, previsões legais atinentes a figuras delituosas de juízo valorativo abertos. Ou seja, o princípio da legalidade estrita requer que as infrações penais sejam prévia e taxativamente determinadas. Que a norma incumbida de produzi-los aponte certa e claramente quais condutas humanas devam ser punidas, e que tais objeções sejam impostas a todos sem distinções quanto à raça, etnia, credo, etc.


Contudo, para que tais sanções figurem na órbita dos direitos fundamentais do indivíduo, cerceando-os, necessário que haja a apuração da prática de uma conduta descrita normativamente como infração penal por meio de uma verdade processual, vislumbrada quando da oportunidade da prestação da tutela jurisdicional, pois o processo judicial deve ser o objeto por meio do qual almeja-se apurar uma verdade,






resultado de um procedimento cristalino, donde as regras do “jogo” são iguais a todos e previamente determinadas em lei (devido processo legal)[2].





Para que haja em matéria penal investigação e repressão dos delitos, necessário que essa atribuição seja exercida por um juízo legal, de um sujeito imparcial e independente, considerando-se arbitrária toda sanção aplicada à margem do sistema garantista de submissão a esta estrita jurisdicionariedade.


Em suma, para haver persecução criminal bem como aplicação de uma sanção penal mister se faz uma acusação. Que esta seja formulada por órgão diverso do julgador, que seja dada a oportunidade de produção de provas, e que tais provas se submetam ao contraditório da parte acusatória bem como da defensiva, de sorte que, transcorrido todo este procedimento tenhamos a prolação de uma decisão mais próxima possível da verdade. 


3 A transação penal


A conquista de um processo penal mais ágil, economicamente benéfico e com a mitigação de formalidades é uma grande preocupação jurídica.


Uma prestação jurisdicional mais efetiva é exigida, com especial atenção à instrumentalidade processual perante o direito material e aos valores sociais e políticos, além da tutela dos direitos fundamentais (real papel do processo penal).


Neste diapasão, acompanhando as tendências de modelos de justiça consensual de diversos países, quebrando com a estrutura processual penal rígida, o constituinte originário atribuiu, no corpo da Constituição da República 1988, em seu art. 98, inciso I, a criação dos Juizados Especiais à União, ao Distrito Federal, aos Territórios e aos Estados. Os juizados deveriam ser providos por juízes togados, ou togados e leigos, competentes para a conciliação, o julgamento e a execução de causas cíveis de menor complexidade e infrações penais de menor potencial ofensivo, mediante os procedimentos oral e sumaríssimo, permitidos, nas hipóteses previstas em lei, a transação e o julgamento de recursos por turmas de juízes de primeiro grau.


Buscou-se com esta norma Constitucional pormenorizar procedimentos, tratando-se de forma distinta infrações consideradas de menor gravame, que poderiam ser solucionadas pela via consensual.


A edição da Lei nº. 9.099/1995, seguindo o mandamento Constitucional ora evidenciado, criou os Juizados Especiais em âmbito estadual, cuidando a partir do art. 60 da seara criminal.


Seu artigo 61 previu que as infrações penais de menor potencial ofensivo seriam as contravenções penais e os crimes a que a lei não comine pena máxima não superior a 1 (um ) ano, excetuando-se os casos em que a lei preveja procedimento especial. Todavia, referido conceito de infração penal de menor potencial ofensivo foi ampliado, sob a égide do parágrafo único do art. 2º da Lei dos Juizados Especiais Federais, nº 10.259/2001, passando a abarcar além das contravenções penais, quaisquer infrações apenadas com até 2 (dois) anos de prisão.


Uma das grandes inovações da Lei nº. 9.099/1995, todavia, foi a previsão da transação penal (art. 76)[3].


O instituto causou grandes discussões, principalmente, no que toca sua constitucionalidade, natureza jurídica e natureza da sentença que homologa o acordo entre Ministério Público e suposto autor do fato, bem como eventual descumprimento da transação penal.


Aponta-se como principais fundamentos para questionar-se a constitucionalidade da transação penal a eventual aplicação de pena sem processo e sem reconhecimento de culpa de modo a infringir o inciso LIV do art. 5º da Constituição Federal (devido processo legal), bem como ofensa à garantia da presunção de inocência prevista no art. 5º, inciso LVII da Magna Carta[4].


De outro modo, diversos autores defendem a superação da controvérsia e a constitucionalidade do instituto por estar em conformidade com a ordem Constitucional.


Linda Dee Kyle (2002) afirma que o procedimento, mesmo que breve para a imposição da pena acordada já é o devido processo previsto constitucionalmente e em lei infraconstitucional.


Ada Pellegrini Grinover (2005) argumenta que a própria Constituição, por meio do art. 98, inciso I[5], possibilitou de forma expressa a transação penal para as infrações penais de menor potencial ofensivo, deixando livre o legislador federal para impor-lhe parâmetros. Para a autora (GRINOVER, 2005), a mesma Constituição que estabeleceu o princípio da necessidade do processo para a privação da liberdade, admitiu a exceção, configurada pela transação penal.


Também em defesa da constitucionalidade da transação penal, Maria Lúcia Karan argumenta que:


“em efetuando-se uma interpretação conforme a Constituição, pode-se notar que a moderna doutrina Constitucional prima pela manutenção da norma no ordenamento, só retirando-a quando impossibilitada qualquer interpretação que se conforme com a Constituição (KARAN, apud, KYLE, 2007, 111).


Nós, particularmente, vemos a transação penal brasileira como Constitucional, tendo em vista que o art. 98, I da Constituição Federal possibilitou-a expressamente, deixando livre o legislador infraconstitucional para regulá-la, o qual o fez, criando para ela um procedimento apto a ensejar imposição de pena, que é o “devido processo legal” estipulado em lei infraconstitucional, a despeito de ferir garantias constitucionais, mas que, conforme informou-nos Maria Lúcia Karan, “em obediência à interpretação conforme a Constituição e à moderna doutrina, há um aconselhamento pela manutenção da norma no ordenamento só retirando-a quando impossibilitada de qualquer interpretação em conformidade com a Constituição” (KARAN, apud, KYLE, 2007, p. 111).


Quanto à interpretação conforme a Constituição afirma Alexandre de Moraes:


“A Supremacia das normas constitucionais no ordenamento jurídico e a presunção de constitucionalidade das leis e atos normativos editados pelo poder público competente exigem que, na função hermenêutica de interpretação do ordenamento jurídico, seja sempre concedida preferência ao sentido da norma que seja adequado à Constituição Federal. Assim sendo, no caso de normas com várias significações possíveis, deverá ser encontrada a significação que apresente conformidade com as normas constitucionais, evitando sua declaração de inconstitucionalidade e conseqüente retirada do ordenamento jurídico. Extremamente importante ressaltar que a interpretação conforme a Constituição somente será possível quando a norma apresentar vários significados, uns compatíveis com as normas constitucionais e outros não, ou, no dizer de Canotilho, “a interpretação conforme a constituição só é legítima quando existe um espaço de decisão (= espaço de interpretação) aberto a várias propostas interpretativas, umas em conformidade com a constituição e que devem ser preferidas, e outras em desconformidade com ela”. Portanto, não terá cabimento a interpretação conforme a Constituição quando contrariar texto expresso da lei, que não permita qualquer interpretação em conformidade com a Constituição […]” (MORAES, 2009, p. 16-17).


De tal modo, por apresentar falhas, mas não se encontrar em total desconformidade com a Constituição Federal de 1988, pensamos como melhor alternativa a manutenção do instituto no ordenamento, desde que com a promoção de devidos “ajustes”.


Relativamente ao que deva ser feito quando do descumprimento, pelo suposto autor do fato da transação penal, há dúvidas no Direito pátrio, tendo em vista a Lei nº. 9.099/1995 silenciar-se à respeito. Não estabeleceremos comentários neste ponto, por envolver questão que fugiria ao objeto do trabalho. Indicamos o tema, de toda forma, para outra pesquisa.


Quanto à classificação das sentenças observaremos que autores como Lauria Tucci, segundo Geraldo Prado (2001) entendem que a sentença que homologa o acordo entre Ministério Público e o suposto autor do fato seja meramente declaratória, enquanto outros, como sendo condenatória, condenatória de tipo sumário, ou simplesmente homologatória.


Importante registrar uma vez mais os dizeres de Ada Pellegrini Grinover (2005), a qual sustenta não poder a sentença ser classificada como absolutória, já que ela aplica uma sanção de natureza penal. Em seu entendimento, é também inoportuno afirmar ser a sentença condenatória, tendo em vista a ausência de acusação, bem como o fato de a aceitação da pena não ter conseqüências na seara criminal (salvo, para impedir novo benefício no prazo de cinco anos). Além disso, afirma Grinover (2005), falta, exame dos elementos da infração, da prova, da ilicitude ou culpabilidade. Por isso, em seu entendimento, não pode ser a sentença homologatória de transação penal classificada como “condenatória imprópria”, pois isso fugiria à questão mediante um circunlóquio que nada significa. Trata-se, portanto, de simples sentença homologatória de transação.


Outra discussão que envolve a transação penal concentra-se nos argumentos que defendem sua natureza de faculdade do Ministério Público e naqueles que impõem tratar-se de um direito subjetivo do suposto autor do fato.


O termo “poderá”, presente no art. 76 da Lei nº. 9.099/1995 causa grande dúvida no direito penal pátrio, pois fazendo-se uso de uma interpretação eminentemente literal, conceber-se-á o oferecimento da transação penal como sendo uma faculdade do Ministério Público, podendo o mesmo num juízo de conveniência e oportunidade decidir quanto a sua incidência. Por outro lado, tal expressão poderá levar-nos a entender o exercício do oferecimento da transação penal como um poder-dever, sob o fundamento de o legislador ter mal empregado o termo, devendo o Ministério Público, ante a um caso que o suposto ofensor preencha seus requisitos, promovê-la, eis que seria um direito subjetivo do autuado[6].


Nesse diapasão decidiu o Superior Tribunal de Justiça:


“BRASIL. Superior Tribunal de Justiça – Hábeas Corpus – apesar de ser direito subjetivo do acusado, a transação penal deve obedecer aos limites do tempo e à discussão no processo, de forma a evitar-se seja sedimentada a decisão indeferitória pelo transcurso do tempo. In casu, o Ministério Público bem ou mal justificou a não proposta de transação penal, sendo que a defesa não intentou contra o indeferimento qualquer espécie de contestação nas fases posteriores, mas apenas em sede revisional e quando já em curso o procedimento executório, o que torna inevitável a retroação para novo exame. Ordem denegada” (BRASIL, 2004).


Nem mesmo nossas cortes superiores têm uma posição pacifica sobre o assunto, conforme vislumbramos em outro julgado do referido Tribunal, que de forma contrária firmou o seguinte entendimento:


“BRASIL. Superior Tribunal de Justiça – Recurso Especial – A terceira Seção da Egrégia Corte firmou o entendimento no sentido de que, com o advento da lei nº. 10.259/2001, em obediência ao princípio da isonomia, o rol dos crimes de menor potencial ofensivo foi ampliado, porquanto o limite da pena máxima foi alterado para 02 anos; é vedado ao juiz oferecer o proposta de transação penal ex ofício ou a requerimento da parte, uma vez que tal prerrogativa é exclusiva do Ministério Público acerca do oferecimento da benesse legal, os autos devem ser encaminhados ao Procurador Geral de Justiça, por analogia ao disposto no art. 28 do CPP” (BRASIL, 2003).


Nos moldes deste acórdão do Superior Tribunal de Justiça, poder-se-á aludir, não haver direito subjetivo do suposto autor do fato à transação penal, sendo esta um ato discricionário do Ministério Público, que pode propô-la quando o suposto autor do fato preencher os requisitos atinentes a esta, sob pena dos autos serem remetidos ao Procurador Geral de Justiça, tendo como referência o art. 28 do Código de Processo Penal[7].


Da mesma maneira, expressa o enunciado 37 dos Enunciados Jurídicos Criminais Consolidados que: “a transação penal é atribuição exclusiva do Ministério Público, como titular da ação penal. Ante a inércia do Ministério Público na formulação da proposta, cabe ao juiz aplicar analogamente o art. 28 do Código de Processo Penal” (TJ/RJ., 2005, p. 01).


Entendendo também ser a transação penal uma faculdade do Ministério Público, afirma Afrânio Silva Jardim (2002) que no caso das infrações penais de menor potencial ofensivo, pode o promotor de justiça, no interesse da sociedade e do réu, desde que preenchidos os requisitos legalmente estipulados, oferecer uma pena menor. Afirma ainda que, em tais casos, o Ministério Público não tem o dever de oferecer a denúncia, abrindo mão assim do exercício da obrigatoriedade quando desta espécie de ação penal. Não vê ele, portanto, a transação como direito subjetivo do réu.


Quando utiliza o autor, o termo “faculdade” do Ministério Público em oferecer ao suposto autor infracional penal a transação penal, o faz avaliando ser uma mitigação, ou seja, uma diminuição dos efeitos do Princípio da Obrigatoriedade da ação penal pública. Entende que o legislador, nos casos inerentes ao art. 76 da Lei nº. 9.099/1995, com a flexibilização desse princípio, proporcionou ao promotor de justiça a livre escolha em agir. Anteriormente, este tinha o dever de denunciar, eis que era impedido, pelo aduzido princípio, de manter-se inerte quando presentes os requisitos a ensejar propositura da ação penal pública. Agora, no entanto, tem ele a opção de não promover a denúncia, outrossim, transacionar com o suposto autor da infração penal de menor potencial ofensivo a possibilidade de uma pena mais branda e não restritiva a sua liberdade.


Ada Pellegrini Grinover, por sua vez, sustentando ser a transação penal uma fase administrativa, afirma não haver acusação:


“pois o processo jurisdicional não se iniciou e, não se sabe se o suposto autor do fato, em havendo processo, seria absolvido ou condenado. Por isso, a transação penal se situa, para referida autora, fora do âmbito do direito penal punitivo, e assim, de seus esquemas e critérios” (GRINOVER, 2005, p. 157-158).


Como a autora citou, há quem entenda ser a transação penal uma fase pré-processual, administrativa, posto não haver implemento da relação jurídico processual penal. Não se ofereceu denúncia[8], não se tem colheita de provas nem discussão acerca da culpabilidade. Igualmente, ter-se-á uma proposta ao suposto autor do fato para que este escolha, entre duas alternativas uma delas, ou seja: ou aceita a transação proposta pelo Ministério Público, o que não é confissão de culpa, e assim, quando da homologação por parte do juiz obtém a extinção da punibilidade; ou não aceita e se submete a um processo, que dar-se-á quando do oferecimento da denúncia por parte do promotor de justiça, onde sempre haverá a dúvida sobre uma eventual condenação.


4 Análise crítica


A Constituição da República de 1998 promoveu uma mudança de paradigma, ao romper com a estrutura rígida do processo penal e com o formalismo exacerbado em busca de alternativas simplificadoras, para as infrações penais de menor potencial ofensivo. No inciso I, de seu art. 98[9], permitiu a instituição de um procedimento sumaríssimo, predominantemente oral, no qual seria possível a promoção de uma transação entre o Ministério Público e o suposto autor do fato.


Competiu à Lei nº. 9.099/95, posteriormente, regulamentar os Juizados Especiais Criminais, inaugurando o modelo de justiça consensual no Brasil, trazendo como novidades os institutos da composição civil dos danos e da transação penal, além da possibilidade da suspensão condicional do processo.


Justificou a adoção dessas alternativas simplificadoras, segundo Fernandes (2005) o aumento da criminalidade e, conseqüentemente, do número de processos, a necessidade de descongestionar a máquina judiciária, de melhorar a eficiência do sistema, de maior rapidez na solução das causas e de diminuir o custo do sistema judiciário.


Vale apreciar as palavras de Linda Dee Kyle, no que tange os motivos acima elencados:


“A crise na justiça tem atingido indistintamente todos os países, principalmente aqueles que adotam a democracia como bússola para seu regime político. […]. Tem sido também apontada como uma das grandes causas de tal crise a ampla gama de direitos relacionados nos atuais textos constitucionais, que, segundo seus críticos, tem despertado nos indivíduos mais confiança na justiça. E não é por outra razão que a simples ameaça de violação a esses direitos tem provocado nos cidadãos incentivo para buscarem nos tribunais a solução de seus conflitos. Na contramão dessa conscientização de cidadania, tem-se verificado um aumento alarmante no índice de criminalidade decorrente dos processos de desenvolvimento. A inflação legislativa, o maior acesso à informação e a seletividade do mercado têm provocado um vertiginoso aumento de processos nos tribunais, e, por conta disso, esses fatores levaram diversos países a adotar formas alternativas de solução de conflitos, como meio de absorver o aumento da demanda nas instâncias judiciais […]” (KYLE, 2007, p. 63-64).


No que se refere especificamente ao instituto da transação penal, merece realizar-se breve comparação com o plea bargaining norte-americano (inspirador do instituto), dada sua longa tradição nas soluções consensuais penais. Esta comparação permitirá identificar alguns pontos que serão bastante úteis no desenvolvimento da análise crítica.


Conforme Fernandes (2005), nos Estados Unidos, a transação (plea barganining), como buscou-se adotar aqui no Brasil, também é efetuada entre acusado (no Brasil, consideramos como suposto autor do fato) e Ministério Público. Porém, há preocupação que o autuado tenha absoluto conhecimento do conteúdo da acusação posta contra si, das conseqüências de uma eventual condenação e dos direitos a que renuncia ao optar pela transação com o Ministério Público (a denúncia é oferecida e antes de o juiz recebê-la há possibilidade da transação). Nesse sistema, o acusado transaciona com o Ministério Público com intuito de obter vantagens em troca de sua declaração de culpa, tais como, a retirada de uma acusação conservando-se outra (charge bargaining); alteração da acusação inicial para outra punida com crime menos grave (charge bargaining); concordância com pena reduzida (sentence bargaining); redução de pena e concessão de benefícios como a probation (sentence bargaining); e por fim, que o acusado testemunhe contra pessoa com atuação de maior relevância no grupo em que age. 


Em nosso país o procedimento é bem diferente. Na audiência preliminar (não há oferecimento da denúncia), o Ministério Público oferece ao suposto autor do fato a proposta de transação penal, consistente na aplicação imediata de pena restritiva de direitos ou multa, sem que haja declaração de culpa, sem inclusão em certidão de antecedentes criminais, sem os efeitos normais de uma sentença condenatória.


Nesse momento não há acusação formalizada. Somente quando não se realizam a composição civil dos danos e a transação penal, é que se deduz a acusação, com vistas à instauração do processo. No Brasil, o suposto autor do fato opta pela transação sem conhecer a exata dimensão da responsabilidade que o Estado lhe imputa. Mais do que uma alternativa consensual, a transação se caracteriza como medida unilateral imposta ao suposto autor do fato, dentro de uma política de desprocessualização.


A partir dessas diferentes realidades, pretendemos desenvolver a análise crítica da transação penal, tendo como referência a garantia de submissão à estrita jurisdicionariedade.


Percebe-se que a aplicabilidade da transação penal no direito pátrio não se amolda à essência do instituto inspirador do plea bargaining, que se perfaz pela mútua concessão.


As partes (Ministério Público e Acusado), no momento da audiência cedem parcela de seu “interesse” em respeito ao do outro, obtendo-se assim, de fato, uma transação. No no nosso ordenamento, entretanto o instituto não passa de imposição de pena desprovida de garantias fundamentais asseveradas em nossa Constituição da República de 1988, eis que parte alguma cede parcela de seu interesse, outrossim, aplica-se uma pena restritiva de direitos ao suposto autor do fato sem o devido processo legal (art. 5º, inciso LIV, da Constituição da República de 1988)[10], que fica restrito a aceitá-la ou recusá-la. 


São violadas, da maneira que a transação penal é aplicada em nosso país garantias como jurisdicionalidade, inderrogabilidade do juízo, separação das atividades de julgar e acusar, presunção de inocência, contraditório e motivação das decisões.


A primeira abarcada pela máxima Nulla poena, nulla culpa sine iudicio aduz a necessidade do processo penal para aplicação de sanção, e também, em sentido amplo, como garantia orgânica da figura e do estatuto-juiz. Representando a exclusividade do poder jurisdicional, direito ao juiz natural, independência da magistratura e exclusiva submissão à lei.


A segunda é a inderrogabilidade do juízo no sentido de infungibilidade e indeclinibilidade da jurisdição, fazendo-nos entender que só deva haver aplicação de pena ao indivíduo quando de pronunciamento jurisdicional a respeito após trâmite processual.  


A terceira é a separação das atividades de julgar e acusar, transmitidas pelo brocardo Nullum iudicium sine accusation, o qual legitima o Ministério Público como órgão detentor do poder de exercer a função acusatória, garantindo-se assim, a imparcialidade do juiz e submetendo sua atuação a prévia provocação por meio da ação penal (o que resta ausente na justiça consensual brasileira tendo em vista ausência de invocação da ação penal por meio da denúncia, exercendo o Ministério Público papel de Juiz às portas do judiciário por aplicar pena sem o devido processo legal).


A quarta garantia é a da presunção de inocência que deve ser mantida até o trânsito em julgado da sentença condenatória, implicando diversas conseqüências no tratamento da parte passiva, inclusive na carga da prova (ônus da acusação) e na obrigatoriedade de que a constatação do delito e a aplicação da pena dar-se-ão por meio de um processo com todas as garantias e através de uma sentença. Muitas vezes o suposto autor do fato aceita a proposta ministerial ainda que inocente com medo de que em não aceitando enfrente quando do processo, verdadeiros “inimigos” no que se refere aos representantes do Estado.


A quinta garantia é a do contraditório que também não integra a justiça consensual brasileira, que se perfaz pela aplicação de pena sem mínima discussão de culpa bem como verdade formal. Não há acusação, tão pouco defesa (de fato de direito) pelo imputado.


Por fim, a sexta garantia é a da fundamentação das decisões judiciais para o controle da racionalidade da decisão. A motivação é importante, ainda, para verificação do contraditório e de que exista prova suficiente para derrubar a presunção de inocência. É fundamental o princípio da motivação de todas as decisões judiciais, pois só ele permite avaliar se a racionalidade da decisão predominou sobre o poder. O que na justiça consensual é inoperante tendo em vista a atuação burocrática do Juiz.


Por derradeiro, afirmamos tratar-se a transação penal, pela maneira a qual é aplicada em nosso país, como pudemos vislumbrar no desentranhar do presente trabalho, de sanção penal violadora das garantias outrora aduzidas.


O suposto autor do fato não está absolutamente ciente da acusação que lhe é imposta (nulla judicium sine accusatione) antes de tomar a decisão se transaciona ou não com o Ministério Público, de sorte que, a formalização da acusação integra o devido processo legal.  


A transação penal deve se compatibilizar com o contraditório e o direito a defesa. O que prepondera impossibilitado, tendo em vista que o suposto autor do fato não sabe o que lhe é imputado, não participando ativamente na negociação, de maneira a apresentar discórdias quanto ao fato objeto da questão, eventual valor de prestação pecuniária, ou da natureza de pena restritiva de direito.


Neste sentido Linda Dee Kyle fomenta que:


“[…] um dos fatores que mais têm contribuído para que os Juizados Especiais traduzam o sentimento de injustiça decorrente das soluções adotadas é pouca ou nenhuma informação que alguns conciliadores dão às partes” (KYLE, 2007, p. 120).


Ora, se o suposto autor do fato não tem a plena compreensão do que lhe é imputado, da dimensão de uma condenação se enfrentar o processo, não há como decidir racionalmente, se lhe é satisfatório ou não, aceitar pagar uma multa ou se submeter a pena restritiva de direito transacionando com o Ministério Público.


5 Considerações finais


Entendemos que a aplicação de sanção penal desprovida das essenciais garantias fundamentais do cidadão (transação penal) não se justifica pelo utilitarismo da velocidade na prestação do serviço, muito menos pela vã potencialidade da infração que não merece intervenção penal. Pois a ineficiência do sistema estatal jamais poderá legitimar a diminuição de garantias constitucionais, sob pena de reduzirmos a nossa Constituição da República a mero folhetim.


Se determinadas infrações não merecem a atenção do Estado, não se deve, simplesmente, oferecer possibilidade alternativa de controle sobre essas, outrossim, serem descriminalizadas e afetas ou à justiça cível ou a via administrativa.


Seguindo Geraldo Prado (2001), constata-se que o implemento da transação penal no direito brasileiro pela Lei 9.099/1995, procurou acompanhar grandes movimentos ideológicos, políticos e culturais motivadores de ramos mais progressistas da criminologia no Mundo Ocidental. Sua singular aplicação é diferente de tudo o que existia até então, o que nos atuais dias faz realçar o nosso despreparo para sua aplicabilidade.  


Por fim, sustentamos que o procedimento transacional penal aqui estipulado não se amolda ao princípio da estrita submissão á juriscionariedade desenvolvido por Luigi Ferrajoli, devendo ser repensado e lapidado, de forma a integrar-se à estrutura normativa de um Estado Democrático de Direito dando-se ênfase a efetividade dos direitos fundamentais (real papel do processo penal) do cidadão.


 


 


Referências  bibliográficas:

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Processual Penal. Recurso Especial. nº. 2003.0107731-1. Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça. Rel. Min. Laurita Vaz. Decisão em 11/11/2003. Disponível em: http://www.stj.gov.br. Acesso em: 06 de abril de 2006.

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Notas:

1 O sistema garantista de Ferrajoli se funda em dez axiomas: nulla poena sine crimine (princípio da retributividade ou da consequencialidade); nullum crimen sine lege (princípio da legalidade); nulla lex (poenalis) sine necessitate (princípio da necessidade ou da economia no direito penal); nulla necessitas sine injuria (principio da lesividade ou da ofensividade do evento); nulla injuria sine actione (princípio da materialidade ou da exterioridade da ação); nulla actio sine culpa (principio da culpabilidade ou da responsabilidade pessoal); nulla culpa sine judicio (principio da jurisdicionariedade); nullum judicium sine accusatione (princípio acusatório ou da separação entre juiz e acusação); nulla accusatio sine probatione (princípio do ônus da prova ou da verificação); nulla probatio sine defensione (princípio do contraditório ou da defesa, ou da falsealidade) (FERRAJOLI, 2006, p. 91).

[2] O princípio do devido processo legal encontra-se previsto no art. 5º, LIV da Constituição Federal de 1988: art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: LIV – ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal.

[3] art. 76. Havendo representação ou tratando-se de crime de ação penal pública incondicionada, não sendo caso de arquivamento, o Ministério Público poderá propor a aplicação imediata de pena restritiva de direitos ou multas, a ser especificada na proposta. § 1º Nas hipóteses de ser a pena de multa a única aplicável, o Juiz poderá reduzi-la até a metade. § 2º Não se admitirá a proposta se ficar comprovado:

I – ter sido o autor da infração condenado, pela prática de crime, à pena privativa de liberdade, por entença definitiva; II – ter sido o agente beneficiado anteriormente, no prazo de cinco anos, pela aplicação de pena restritiva ou multa, nos termos deste artigo; III – não indicarem os antecedentes, a conduta social e a personalidade do agente, bem como os motivos e as circunstâncias, ser necessária e suficiente a adoção da medida. § 3º Aceita a proposta pelo autor da infração e seu defensor, será submetida à apreciação do Juiz. § 4º Acolhendo a proposta do Ministério Público aceita pelo autor da infração, o Juiz aplicará a pena restritiva de direitos ou multa, que não importará em reincidência, sendo registrada apenas para impedir novamente o mesmo benefício no prazo de cinco anos. § 5º Da sentença prevista no parágrafo anterior caberá a apelação referida no art. 82 desta Lei. § 6º A imposição da sanção de que trata o § 4º deste artigo não constará de certidão de antecedentes criminais, salvo para os fins previstos no mesmo dispositivo, e não terá efeitos civis, cabendo aos interessados propor ação cabível no juízo cível.

[4] O Art. 5º, inciso LIV da Constituição Federal prevê que: ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal. O inciso LVII deste mesmo dispositivo Constitucional reza que: ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória.

[5] Seguindo este raciocínio Alessandra de La Vega Miranda sustenta ser infecunda a discussão sobre a transação penal no plano de sua constitucionalidade, eis que o discurso jurídico-positivo lhe dá suporte, em virtude do amparo que lhe dá o Art. 98, I, norma Constitucional de eficácia limitada, a qual necessitou de legislação complementar posterior MIRANDA, 2004, p. 233, apud, KYLE, Linda Dee. Transação penal: revisão crítica á luz do acesso à justiça. Curitiba: Juruá, 2007, p. 111.

[6] Neste sentido, Ronaldo Leite Pedrosa suscita que a lei dos juizados especiais fixa critérios a serem preenchidos pelo agente, e que, presentes todos os requisitos, surgirá para o suposto autor do fato um direito subjetivo à proposta de transação penal[6] PEDROSA, Ronaldo Leite. Juizado Criminal: Teoria e Prática. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 1997, p. 84.

[7] art. 28 do Código de Processo Penal: Se o órgão do Ministério Público, ao invés de apresentar a denúncia, requerer o arquivamento do inquérito policial ou de quaisquer peças de informação, o juiz, no caso de considerar improcedentes as razões invocadas, fará remessa do inquérito ou peça de informação ao procurador-geral, e este oferecerá a denúncia, designará outro órgão do Ministério Público para oferecê-la, ou insistirá no pedido de arquivamento, ao qual só então estará o juiz obrigado a atender.

[8] O art. 72 da Lei 9.099/1995 regula o referido rezando que na audiência preliminar, presente o representante do Ministério Público, o autor do fato e a vítima e, se possível, o responsável civil, acompanhados por seus advogados, o juiz esclarecerá sobre a possibilidade da composição dos danos e da aceitação de proposta de aplicação imediata de pena não privativa de liberdade. Ademais, o art. 73, caput, da mesma Lei, dita que a conciliação será conduzida pelo juiz ou conciliador sob sua orientação.  

[9] art. 98: A União, no Distrito Federal e nos Territórios, e os Estados criarão: I – juizados especiais, providos por juízes togados, ou togados e leigos, competentes para a conciliação, o julgamento e a execução de causas cíveis de menor complexidade e infrações penais de menor potencial ofensivo, mediante os procedimentos oral e sumaríssimo, permitidos, nas hipóteses previstas em lei, a transação e o julgamento de recursos por turmas de juízes de primeiro grau.

[10] art. 5º, inciso LIV da Constituição da República do Brasil de 1988 prevê que ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal.


Informações Sobre o Autor

Hugo Garcez Duarte

Mestre em Direito pela UNIPAC. Especialista em direito público pela Cndido Mendes. Coordenador de Iniciação Científica e professor do Curso de Direito da FADILESTE


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