Legitimidade Ativa na Lei Nº 27.275/2016 da Argentina e na Lei Nº 12.527/2011 do Brasil e o Direito de Acesso à Informação Pública na Jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos

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Caso Claude Reyes Vs. Chile em comparação com as previsões do Artigo 13 do Pacto de San José da Costa Rica

Raquel Almeida Mendonça 1

Resumo: O principal objetivo da Lei de Acesso à Informação é garantir a todos os cidadãos o acesso à informação pública, de forma transparente, clara e em linguagem de fácil compreensão, pois que independente de solicitação, o Estado deve fornecer informações de interesse geral ou coletivo, garantindo a confidencialidade prevista no texto legal. A Lei determina que estejam acessíveis na internet dados relacionados à gestão e ao trabalho da Administração Pública, o que é denominado de Transparência Ativa. O Caso Claude Reyes Vs. Chile foi um fato preponderante à criação da Lei de Acesso à Informação nos países como Argentina e Brasil.

Palavras-chave: Informação Pública. Legitimidade. Direitos Humanos. Claude Reyes Vs. Chile.

Resumen: El principal objetivo de la Ley de Acceso a la Información es garantizar a todos los ciudadanos el acceso a la información pública, de forma transparente, clara y en lenguaje de fácil comprensión, pues que independiente de solicitud, el Estado debe proporcionar información de interés general o colectivo, garantizando la confidencialidad prevista en el texto legal. La Ley dispone que los datos relacionados con la gestión y el trabajo de la administración pública estén disponibles en Internet, lo que se denomina transparencia activa. El Caso Claude Reyes Vs. Chile fue un hecho preponderante a la creación de la Ley de Acceso a la Información en países como Argentina y Brasil.

Palabras clave: Información Pública. Legitimidad. Derechos Humanos. Claude Reyes Vs. Chile.

Sumário: Introdução. 1. A Informação Pública como Bem Jurídico. 2. Legitimidade Ativa no Direito de Acesso à Informação Pública. 3. Caso Claude Reyes Vs. Chile em comparação com as previsões do Artigo 13 do Pacto de San José da Costa Rica. Conclusão. Referências.

Introdução

As normas contidas em determinado ordenamento jurídico vigente devem refletir aos anseios da sociedade e serem capazes de solucionar os diversos problemas que porventura venham a existir, é dizer, as normas devem ter eficácia. E, claro, na esfera da Administração Pública não poderia ser diferente, uma vez que as normas de direito administrativo são, por excelência, as normas que regem a relação existente entre os administrados e o Estado.

O Princípio da Transparência consagra a exigência de que haja não apenas a mera publicidade dos atos da administração pública, mas uma efetiva possibilidade de consulta e compreensão dos mesmos. Por outro lado, o acesso à informação é uma ferramenta para a construção da cidadania, uma ferramenta útil para o exercício bem informado dos direitos da pessoa.

Foi com a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (1789), da França, que os cidadãos passaram a ter direito à prestação de contas efetuada pelo Estado sobre a gestão pública, como decorrência implícita do dever da Administração Pública de prestar contas de suas atividades, em seu artigo 15 que diz: “Todo o indivíduo tem direito à liberdade de opinião e de expressão, o que implica o direito de não ser inquietado pelas suas opiniões e o de procurar, receber e difundir, sem consideração de fronteiras, informações e ideias por qualquer meio de expressão” (Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, 1789). Mais recentemente, a Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948), em seu artigo 19, consagrou, aos cidadãos, o direito: “Todo o indivíduo tem direito à liberdade de opinião e de expressão, o que implica o direito de não ser inquietado pelas suas opiniões e o de procurar, receber e difundir, sem consideração de fronteiras, informações e ideias por qualquer meio de expressão” (Organização das Nações Unidas, 1948).

Sobre este tema, a Corte Interamericana de Direitos Humanos tem em suas jurisprudências, como no Caso Claude Reyes VS. Chile, que o acesso à informação é relevante para o sistema interamericano de direitos humanos.

A Corte Interamericana de Direitos Humanos é uma instituição judiciária autônoma, cujo objetivo é a aplicação e a interpretação da Convenção Americana de Direitos Humanos (1969) – Pacto de San José da Costa Rica – (artigo 1º do Estatuto da Corte Interamericana de Direitos Humanos) e exerce suas funções em conformidade com as disposições da aludida Convenção e do Estatuto específico. Com efeito, assevera-se, que a Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) é órgão jurisdicional criado pela Convenção Americana de Direitos Humanos para solucionar as violações aos direitos humanos apenas dos países que reconheceram a competência contenciosa da CIDH (COELHO, 2008).

Para tanto, a fim de que se cumpra o seu objetivo e até mesmo garantir o efetivo direito à dignidade da pessoa faz-se necessário o devido acesso à informação pública, direito este consagrado como direito fundamental protegido pelo artigo 13 2 da Convenção Americana (1969).

Nesse contexto, tem-se que o direito de acesso à informação pública como decorrência do direito à informação e à liberdade de expressão.

Em 1966, foi aprovado, nos Estados Unidos, o “Freedom of Information Act” (Lei da Liberdade de Informação) que passou a garantir o acesso a grande parte dos documentos oficiais produzidos pelo Estado. Na América Latina, a Colômbia foi o primeiro país a garantir legalmente o acesso aos documentos oficiais, em 1988 e, em 2002, o México criou uma lei que previa mecanismos ágeis de acesso, supervisionados por órgãos independentes tornando-se referência nesse tipo de legislação (Santos, Fernández Molina e Guimarães, 2017).i

Mais recentemente, foi aprovado, no Brasil e na Argentina, em 2011 e em 2016, respectivamente, e muitos anos após a promulgação de suas Constituições (1988 e 1994, respectivamente), criaram leis que garantem o direito de acesso à informação pública.

De início é possível se verificar que o Direito de Acesso à Informação nas perspectivas da Legislação Brasileira, Legislação Argentina e do Sistema Interamericano de Direitos Humanos verifica-se a proteção a este direito fundamental, proteção esta fundamentada no 13 da Convenção Americana. Trata-se de um direito particularmente importante para a consolidação, o funcionamento e a preservação dos sistemas democráticos. Pode-se dizer que por este motivo recebe atenção tanto pelos Estados-Membros da Organização dos Estados Americanos (OEA) 3 quanto pela doutrina e a jurisprudência internacionais.

O Comitê Jurídico Interamericano da OEA prescreve que:

“O acesso à informação é um direito humano fundamental que estabelece que todos podem acessar a informação detida por órgãos públicos, sujeito somente a exceções limitadas, de acordo com uma sociedade democrática e proporcionais ao interesse que as justifique. Os Estados devem assegurar o respeito ao direito de acesso à informação, adotando legislação apropriada e colocando em prática os meios necessários para a sua implementação.” 4

O objeto deste artigo é de tratar especificamente sobre a legitimidade ativa no acesso à informação pública, sobretudo em aspectos relacionados à sentença do Caso Claude Reyes vs. Chile, ato da Corte Interamericana de Direitos Humanos, bem como citando jurisprudências da Suprema Corte de Justiça da Nação Argentina, a Lei Argentina nº 27.275/2016, o artigo 13 do Pacto de San José da Costa Rica e Lei Brasileira nº 12.527/2011, sendo este trabalho dividido em 3 capítulos

  1. A Informação Pública como Bem Jurídico

A relevância de um bem é dada pela titularidade do interesse no qual se reforça, na proteção reservada ao titular e na tutela do bem, reservada a terceiros qualificados que recebem de qualquer modo uma utilidade, não necessariamente econômica, da sua conservação. Tem-se o direito de acesso à informação pública como direito democrático de os cidadãos obterem todos os tipos de informações públicas que estão sob tutela do Estado.

O direito de acesso à informação pública está amparado na Constituição da Argentina e na Constituição Brasileira. A Constituição do Estado de Direito sendo o veículo introdutor de normas criou a legislação infraconstitucional para tratar do Acesso à Informação, logo os países, Argentina e Brasil, possuem lei específica que versa sobre o acesso à informação.

A Constituição dos Países e a Sentença da Corte fortalece o direito fundamental pertencente a toda pessoa, sendo um direito que integra a dignidade da pessoa no Estado Democrático de Direito.

A Constituição Argentina (1994) reconheceu a informação como bem jurídico, uma vez que em seu artigo 41 prevê a obrigação por parte das autoridades de “prover a informação”. Isto significa que o Estado deverá fornecer as informações necessárias para que os cidadãos possam exercer eficazmente a função de controlo do cumprimento dos orçamentos ambientais mínimos, que surgem claramente da Carta Magna. 5 E em seu artigo 42 transcreveu o seguinte: “Os consumidores e utilizadores de bens e serviços têm direito, na relação de consumo, à proteção da sua saúde, segurança e interesses econômicos; a uma informação adequada e verdadeira […]” Nesse sentido, pode-se dizer que o acesso à informação pública é um direito fundamental, para ser mais preciso um direito dos cidadãos.

De acordo com a Lei Argentina, se entende por “Informação Pública”: “a possibilidade de buscar, solicitar, receber, copiar, analisar, reprocessar, reutilizar e redistribuir livremente a informação sob custódia dos sujeitos obrigados enumerados no Artigo 7° da presente lei, com as únicas limitações e exceções que estabelece esta Norma” (artigo 2º da Lei Argentina nº 27.275/16).

A contribuição fundamental desta Lei Argentina para essa causa em que o mero objeto da mesma consiste em assegurar o pleno exercício de um direito que, em si mesmo, constitui uma ferramenta fundamental para a participação cidadã 6.

A Constituição Brasileira (1988) reconheceu a informação como bem jurídico, uma vez que em seu artigo 5º, inciso XXXIII, transcreveu o seguinte: “Todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado”.

De acordo com a Lei Brasileira, se entende por “informação pública”, direitos de obter: I – orientação sobre os procedimentos para a consecução de acesso, bem como sobre o local onde poderá ser encontrada ou obtida a informação almejada; II – informação contida em registros ou documentos, produzidos ou acumulados por seus órgãos ou entidades, recolhidos ou não a arquivos públicos; III – informação produzida ou custodiada por pessoa física ou entidade privada decorrente de qualquer vínculo com seus órgãos ou entidades, mesmo que esse vínculo já tenha cessado; IV – informação primária, íntegra, autêntica e atualizada; V – informação sobre atividades exercidas pelos órgãos e entidades, inclusive as relativas à sua política, organização e serviços; VI – informação pertinente à administração do patrimônio público, utilização de recursos públicos, licitação, contratos administrativos; e VII – informação relativa: a) à implementação, acompanhamento e resultados dos programas, projetos e ações dos órgãos e entidades públicas, bem como metas e indicadores propostos; b) ao resultado de inspeções, auditorias, prestações e tomadas de contas realizadas pelos órgãos de controle interno e externo, incluindo prestações de contas relativas a exercícios anteriores” (artigo 7º da Lei Brasileira nº 12.527/11).

  1. Legitimidade Ativa no Direito de Acesso à Informação Pública

Se reconhece a legitimidade ativa a este direito a qualquer pessoa, independentemente de sua raça, cor, sexo, idioma, religião, opiniões políticas ou de qualquer outra natureza, origem nacional ou social, posição econômica, nascimento ou qualquer outra condição social.

Na Legislação Brasileira, a Legitimidade Ativa é tratada no artigo 10 da Lei Específica, que diz: “qualquer interessado poderá apresentar pedido de acesso a informações aos órgãos e entidades referidos no art. 1º desta Lei, por qualquer meio legítimo, devendo o pedido conter a identificação do requerente e a especificação da informação requerida”. Logo, esse dispositivo disciplina quem pode pretender acesso a informações ou dados públicos

Como todas as normas devem serem interpretadas de acordo com o texto constitucional (por ser uma primeira premissa em termos de teoria geral das normas), entende-se que o artigo 10, caput, da Lei Brasileira nº 12.527/2011, deve ser interpretado conforme o artigo 5º, inciso XXXIII, da Constituição Brasileira (1988). Significa dizer que o termo “interessado” liga-se com as três espécies de interesse dispostos pelo referido dispositivo constitucional: interesse coletivo, geral ou particular. Eis um paradigma hermenêutico fundamental no âmbito de proteção da regra ora comentada. Aliás, a inserção da palavra “interessado” evita eventuais interpretações “restritivas”, o que bem poderia ocorrer se fossem alocados termos do tipo “cidadão”, “habitante” etc. A palavra em questão exige a prova da pertinência a um determinado interesse, ainda que seja desnecessário motivar o pedido. Essa solicitação deve ter vocação a estar ligada a uma utilidade, a um viés prático, enfim, que “agregue algo” ao legitimado. Significa dizer que o artigo 10, caput, ao fazer uso da palavra “interessado”, não quer que sejam permitidos pedidos que visem satisfazer o mero deleite pessoal, calcado em sentimentos espúrios, inúteis e despidos de razoabilidade.

Qualquer pessoa, natural ou jurídica, pode solicitar dados e informações dos entes sujeitos à Lei Brasileira nº 12.527/2011. Ressalva-se que as pessoas naturais que sejam acometidas de alguma incapacidade civil, relativa ou absoluta — artigos 3º e 4º do Código Civil Brasileiro —, devem formular pedido de acesso representadas ou assistidas. Para as pessoas jurídicas, entende-se que devem estar devidamente constituídas.

A partir da visualização do direito comparado, a Lei Argentina nº 27.275/2016 em seu artigo 4º reconhece a Legitimidade Ativa quando expressa: “Toda pessoa humana ou jurídica, pública ou privada, tem direito a solicitar e receber informação pública, não podendo exigir-se ao solicitante o motivo da solicitação, que sendo direito subjetivo o interesse é legítimo”.

Pode-se observar que o acesso à informação pela Lei Argentina (2016) é mais ampla em comparação à Lei Brasileira (2011), visto que na Argentina permite uma legitimidade despida da prova de interesse, ou seja, a pessoa interessada não precisa apresentar motivo, fundamentação, para se ter o acesso à informação.

A Corte Suprema de Justiça da Nação Argentina, em 2014, afirmou que a “obrigação de garantir o acesso à informação por mandamento constitucional está a cargo do Estado”7 e que a Constituição “estabelece o direito de acesso à informação pública como uma condição necessária para organizar uma república democrática”8, sendo indubitável que, a fim de que o direito à informação seja efetivamente garantido,“o Estado deve ditar urgentemente uma lei que, salvaguardando as normas internacionais sobre a matéria e o princípio da razoabilidade, regule de maneira exaustiva o modo como as autoridades públicas devem satisfazer esse direito”.9

Entretanto, de um modo geral, a legitimidade para formular um pedido de acesso é universal, ou seja, aos cidadãos e não cidadãos, não se tendo maiores restrições nesse sentido. Aliás, a solicitação não se restringe a quem é cidadão, ou seja, a quem detém pleno gozo da capacidade eleitoral ativa. Quanto à pessoa jurídica, deve-se ter o cuidado no sentido de que o pedido seja formulado pelo seu representante legal.

Por fim, é importante dizer que as exigências não inviabilizam o pedido de acesso à informação. Ao contrário, elas pautam condições mínimas para que o cidadão possa receber a resposta à sua pretensão de maneira ágil e objetiva.

  1. Caso Claude Reyes Vs. Chile em comparação com as previsões do Artigo 13 do Pacto de San José da Costa Rica

O Caso Marcel Claude Reyes VS. Chile trata de uma causa que la Comissão Interamericana de Direitos Humanos submeteu ante a Corte uma demanda contra o Estado do Chile, demanda com o fim de que a Corte declare que o Estado é responsável pela violação dos direitos consagrados nos Artigos 13 (Liberdade de Pensamento e Expressão) e 25 (Direito à Proteção Judicial) da Convenção Americana, em relação com as obrigações estabelecidas nos Artigos 1.1 (Obrigação de Respeitar os Direitos) e 2 (Dever de Adotar Disposições de Direitos Internos) da mesma, em prejuízo do Senhor Marcel Claude Reyes.10

Uma breve análise do caso: Marcel Claude Reyes pediu informações ao Comitê de Investimentos Estrangeiros do Chile sobre um projeto de desflorestamento que se realizaria no Sul do Chile – e que poderia prejudicar o meio ambiente –, e grande parte da informação que tinha pedido não lhe foi entregue. O Estado não ofereceu razões ou fundamentos para subtrair essas informações do conhecimento público. Reyes levou o seu pedido perante diferentes Tribunais do Chile e não foi resolvido positivamente tal questão. Por fim, decidiu recorrer ao Sistema Interamericano com um variado conglomerado de organizações de direitos humanos da América Latina, decididas a avançar a causa do acesso e da transparência. Por meio da sentença prolatada no Caso Claude Reyes vs. Chile, a Corte Interamericana de Direitos Humanos se converteu no primeiro tribunal internacional a reconhecer que o direito de acesso à informação pública é um direito humano fundamental, protegido por tratados de direitos humanos que obrigam os países a respeitá-lo. Desde então, o Chile se tornou um dos países líderes da região em políticas de acesso à informação, com a promulgação da Lei de Transparência e a criação do Conselho para a Transparência em 2009.

O direito de acesso à informação na Constituição do Chile previa a liberdade de emitir opiniões, de informar sem censura prévia e de apresentar requerimentos sobre informações públicas ou privadas. No entanto, a legislação infraconstitucional, na época do fato, não trazia dispositivos acerca da publicidade das informações, tampouco sobre transparência na gestão pública. É a partir de 1994, posteriormente em 1999 e 2001 que o Chile desenvolve leis e decretos, com o objetivo de desenvolver uma gestão pública voltada para a eficiência dos serviços prestados. Em 2005, inclui-se Constituição Chilena, a previsão de que somente lei com quórum qualificado poderá impor limitações as informações (MINISTÉRIO DA JUSTIÇA E SEGURANÇA PÚBLICA, 2014) 11.

Segundo a Comissão Interamericana de Direitos Humanos ocorreram violações ao artigo 13 da Convenção Americana de Direitos Humanos, pois não foi observado o princípio da máxima divulgação, que preconiza que a divulgação das informações de caráter geral e coletivo deve ser a regra. Assim, cabe ao Estado definir as restrições ao direito de acesso à informação, conforme os ditames do Sistema Interamericano descrevendo se “[…] a divulgação constitui uma ameaça de causa substancial prejuízo a esse objetivo e que o prejuízo ao objetivo deve ser maior que o interesse público em dispor da informação […]” (MINISTÉRIO DA JUSTIÇA E SEGURANÇA PÚBLICA, 2014) 12

Por sua vez, a decisão da Corte Interamericana de Direitos Humanos assegurou que o direito de acesso à informação viabiliza uma atuação estatal baseada nos (MINISTÉRIO DA JUSTIÇA, 2014) 13:

“[…] princípios de publicidade e transparência na gestão pública, o que faz possível que as pessoas que se encontram sob sua jurisdição exerçam o controle democrático da gestão estatal, de forma tal que possam questionar, indagar e considerar se está sendo realizado um adequado cumprimento das funções públicas. O acesso à informação sob controle do Estado, que seja de interesse público, pode permitir a participação na gestão pública, através do controle social que se pode exercer com este acesso […]”.

Como dito anteriormente, o direito de acesso à informação é considerado o instrumento imprescindível para uma boa gestão pública transparência da atuação pública, isso decorre do controle exercido pelo indivíduo quando questiona o funcionamento da Administração Pública.

De igual modo, somente através do direito de acesso à informação devidamente regulado é que se impede os (COMISSÃO AMERICANA DE DIREITOS HUMANOS, 2011) 14:

“[…] abusos por funcionários públicos, promover a prestação de contas e a transparência na gestão estatal, e prevenir a corrupção e o autoritarismo.

Por outro lado, o livre acesso à informação é um meio para que, em um sistema democrático representativo e participativo, a cidadania possa exercer adequadamente os seus direitos políticos. Certamente, os direitos políticos têm como pressuposto a existência de um debate amplo e vigoroso, para o qual é indispensável contar com informações públicas que permitam avaliar com seriedade os avanços e as dificuldades das realizações das diferentes autoridades. Somente por meio do acesso à informação sob o controle do Estado é possível que os cidadãos saibam se as funções públicas estão tendo um cumprimento adequado […]”.

A sentença, proferida pela Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) em 19 de setembro de 2006, condenou o Chile por violar três artigos da Convenção Americana de Direitos Humanos, sendo: o artigo 13 da Convenção, o artigo 8º da Convenção e o artigo 8.1 e 25 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos.

A CIDH declarou que a violação do artigo 13 da Convenção que garante o direito à liberdade de pensamento e de expressão. A obrigação consistia em reparar o dano imaterial através de meios de satisfação e garantias de não repetição correspondente a entrega da informação requerida ou a explicação fundamentada da recusa em fornecê-la; a publicação de determinados pontos da sentença em jornal de grande circulação e no diário oficial do país; adoção de medidas que garantam o direito de acesso à informação sob poder do Estado; a instrução dos funcionários públicos acerca do direito de acesso à informação. As custas e gastos foram definidas no valor de 10 mim dólares a ser pago pelo Chile, às vítimas, a título de reembolso pelas despesas com o processo (CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS, 2006) 15.

A CIDH declarou a violação do artigo 8º da Convenção que dispõe sobre as garantias judiciais, tendo em vista a não fundamentação da negativa da informação solicitada ao Comitê de Investimentos Estrangeiros (CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS, 2006) 16.

A CIDH declarou, por fim, a violação do artigo 8.1 e 25 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos, violação dos direitos e garantias judiciais e a proteção judicial, quando no recurso judicial interposto pela vítima foi tratado apenas da existência de um caso concreto sobre o direito de acesso à informação, não julgando acerca da recursa em fornecer informações (CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS, 2006).

O caso foi arquivado pelo cumprimento das obrigações impostas ao Chile em 24 de novembro de 2008.

Conclusão

Diante do exposto, é possível aclarar que a aprovação de uma legislação que regulamenta como as autoridades públicas devem disponibilizar documentos e informações é uma tendência mundial a partir do reconhecimento de que a transparência pública é indispensável em qualquer contexto democrático. Ao dar condições para maior participação e acompanhamento da sociedade na ação governamental, uma legislação de acesso à informação também pode promover a eficiência do serviço público. Ao se preparar para responder a pedidos de informação ou divulgar ativamente dados de interesse público, o órgão melhora também sua capacidade de comunicação com outros órgãos, além de se beneficiar internamente de uma melhor gestão do conhecimento.

O artigo 13 da Convenção Americana trata da obrigação positiva a cargo do Estado, de permitir aos cidadãos o acesso à informação em seu poder, de acordo com a Corte Interamericana de Direitos Humanos 17. Por este mesmo artigo foi reconhecido o Princípio da Máxima Divulgação no sistema interamericano como um princípio orientador do direito a buscar, receber e difundir informações.

O livre acesso à informação é um meio para que, em um sistema democrático representativo e participativo, a cidadania exerça seus direitos políticos; com efeito, o pleno exercício do direito de acesso à informação é necessário para evitar abusos pelos funcionários públicos, promover a prestação pública de contas e a transparência na gestão estatal, e permitir um debate público sólido e bem informado que assegure a garantia de recursos efetivos contra os abusos governamentais e previna contra a corrupção. É somente por meio do acesso à informação de interesse público sob o controle do Estado que os cidadãos podem questionar, inquirir e considerar se está acontecendo o cumprimento adequado das funções públicas.18

Se observa, por fim, a efetividade da Administração Pública, em geral, para dar efetividade do direito de acesso à informação pública, onde se vê leis expressas que regulamentam tal direito, decisões judiciais e estratégias políticas para desenvolver a viabilização da proteção a este direito humano. Evidenciando uma conexão particular existente entre a informação pública e os direitos sociais, sobretudo a necessidade do acesso à informação pública como forma de exigibilidade dos direitos humanos, direitos sociais, além do exercício da liberdade de expressão.

A Lei de Acesso à Informação vem para proteger o direito que tem toda pessoa a solicitar a informação, a fim de se buscar ainda o controle do Estado. A Lei regulamenta a obrigação positiva do Estado, de forma tal que toda pessoa pode receber uma resposta fundamentada quando por algum motivo permitido, salvo nos casos em que se aplique uma legítima restrição. Tendo o deslinte que o direito à Liberdade de Pensamento e de Expressão contempla a proteção do Direito de Acesso à Informação.

Referências

Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão. Paris, França, 1789. <http://www.direitoshumanos.usp.br/index.php/Documentos-anteriores-%C3%A0-cria%C3%A7%C3%A3o-da-Sociedade-das-Na%C3%A7%C3%B5es-at%C3%A9-1919/declaracao-de-direitos-do-homem-e-do-cidadao-1789.html > Acesso em 25 de outubro de 2020.

Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão. Paris, França, 1948. <http://www.direitoshumanos.usp.br/index.php/Documentos-anteriores-%C3%A0-cria%C3%A7%C3%A3o-da-Sociedade-das-Na%C3%A7%C3%B5es-at%C3%A9-1919/declaracao-de-direitos-do-homem-e-do-cidadao-1789.html> Acesso em 25 de outubro de 2020.

Convenção Americana de Direitos Humanos. Paris, França, 1969.

Constituição Federal do Brasil. Brasília/DF, 1988.

Constituição Federal da Argentina. Buenos Aires, CABA, Argentina. <http://servicios.infoleg.gob.ar/infolegInternet/anexos/0-4999/804/norma.htm> Acesso em 25 de outubro de 2020.

COELHO, Rodrigo Meirelles Gaspar. Proteção Internacional dos Direitos Humanos: A Corte Interamericana e a Implementação de suas Sentenças no Brasil. Curitiba: Juruá, 2008.

CAMPOS, Fhillipe de Freitas. A Construção da Lei de Acesso à Informação no Legislativo Federal Brasileiro: Sistematização dos Trâmites no Congresso Nacional e análise dos seus principais aspectos. Brasília/DF, 2018.

Lei nº 27.275/2016. Lei De Acesso À Informação Pública. Buenos Aires, Argentina, 2016. <http://servicios.infoleg.gob.ar/infolegInternet/anexos/265000-269999/265949/norma.htm> Acesso em 25 de outubro de 2020.

Lei nº 12.527/2011. Lei De Acesso À Informação Pública. Brasília, Brasil, 2011. <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/lei/l12527.htm> Acesso em 25 de outubro de 2020.

Corte Interamericana de Derechos Humanos. Caso Claude Reyes Y Otros Vs. Chile. Sentencia de 19 de septiembre de 2006. <https://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/Seriec_151_esp.pdf> Acesso em 26 de outubro de 2020.

MINISTÉRIO DA JUSTIÇA E SEGURANÇA PÚBLICA, Secretaria Nacional de Justiça. Jurisprudência Da Corte Interamericana De Direitos Humanos: Direito À Liberdade De Expressão. Brasília: Ministério da Justiça e Segurança Pública, 2020. <https://www.justica.gov.br/news/mj-lanca-colecao-jurisprudencia-da-corte-interamericana-de-direitos-humanos>. Acesso em 27 de outubro de 2020.

Organização Dos Estados Americanos. Assembleia Geral n.º 1932. Resolução aprovada em a quarta sessão plenária, realizada em 10 de junho de 2003. <http://www.oas.org/juridico/portuguese/ag03/agres1932.htm> Acesso em 27 de outubro de 2020.

COURTIS, Christian y ABRAMOVICH, Victor. El Umbral De La Ciudadanía. El Significado De Los Derechos Sociales En El Estado Social Constitucional. 1 ed. Buenos Aires: Del Puerto. 2006. Capítulo VI, p. 171.

1 Mestranda em Direito Administrativo e Administração Pública pela Universidade de Buenos Aires, Argentina. Graduada pela Universidade Luterana do Brasil – Campus Palmas/TO. Advogada e Escritora. E-mail: [email protected]

2 Convenção Americana de Direitos Humanos, artigo 13 – Liberdade de pensamento e de expressão:

1. Toda pessoa tem o direito à liberdade de pensamento e de expressão. Esse direito inclui a liberdade de procurar, receber e difundir informações e ideias de qualquer natureza, sem considerações de fronteiras, verbalmente ou por escrito, ou em forma impressa ou artística, ou por qualquer meio de sua escolha.

2. O exercício do direito previsto no inciso precedente não pode estar sujeito à censura prévia, mas a responsabilidades ulteriores, que devem ser expressamente previstas em lei e que se façam necessárias para assegurar:

a) o respeito dos direitos e da reputação das demais pessoas;

b) a proteção da segurança nacional, da ordem pública, ou da saúde ou da moral, públicas.

3. Não se pode restringir o direito de expressão por vias e meios indiretos, tais como o abuso de controles oficiais ou particulares de papel de imprensa, de frequências radioelétricas ou de equipamentos e aparelhos usados na difusão de informação, nem por quaisquer outros meios destinados a obstar a comunicação e a circulação de ideias e opiniões.

4. A lei pode submeter os espetáculos públicos a censura prévia, com o objetivo exclusivo de regular o acesso a eles, para proteção moral da infância e da adolescência, sem prejuízo do disposto no inciso 2.

5. A lei deve proibir toda propaganda a favor da guerra, bem como toda apologia ao ódio nacional, racial ou religioso que constitua incitamento à discriminação, à hostilidade, ao crime ou à violência.

3 A Assembleia Geral da OEA reconhece o direito de acesso à informação como “um requisito indispensável para o próprio funcionamento da democracia”. Todos os Estados-Membros da OEA “têm a obrigação de respeitar e fazer respeitar o acesso à informação pública a todas as pessoas e promover a adoção das disposições legislativas ou de outro caráter que forem necessárias para assegurar seu reconhecimento e aplicação efetiva”. Assembleia Geral da OEA. Resolução 1932 (XXXIII‐O/03).

4 Principles on the right of access to information. Ponto resolutivo 1.

5 Ley de Acceso a la Información Pública Comentada

6 Así lo han entendido también la Convención de la Naciones Unidas contra la Corrupción (Preámbulo, párr. 5, arts. 10 y 13) y la Convención Interamericana contra la Corrupción (artículos III.11 y XIV). Ley de Acceso a la Información Pública Comentada.

7 Corte Suprema de Justicia de la Nación. CSJN, Fallos, C. 830. XLVI, 2014. § 25. Sentença de 26 de março de 2014. Buenos Aires, 2014. CIPPEC c/ EN – Mº Desarrollo Social – dto. 1172/03 s/amparo, lei 16.986. Disponível em: <http://bit.ly/1Uu9e23>. Acesso em: 11 fev. 2016.

8 Corte Suprema de Justicia de la Nación. CSJN, Fallos, C. 830. XLVI, 2014. § 25. Sentença de 26 de março de 2014. Buenos Aires, 2014. CIPPEC c/ EN – Mº Desarrollo Social – dto. 1172/03 s/amparo, lei 16.986. Disponível em: <http://bit.ly/1Uu9e23>. Acesso em: 11 fev. 2016. § 30.

9 Corte Suprema de Justicia de la Nación. CSJN, Fallos, C. 830. XLVI, 2014. § 25. Sentença de 26 de março de 2014. Buenos Aires, 2014. CIPPEC c/ EN – Mº Desarrollo Social – dto. 1172/03 s/amparo, lei 16.986. Disponível em: <http://bit.ly/1Uu9e23>. Acesso em: 11 fev. 2016. § 32.

10 Corte I.D.H. Caso Claude Reyes y otros Vs. Chile. Sentencia de 19 de septiembre de 2006

11 Ministério da Justiça e Segurança Pública do Brasil, 2014 <https://www.gov.br/mj/pt-br>

12 Ministério da Justiça e Segurança Pública do Brasil, 2014. p. 239 <https://www.gov.br/mj/pt-br>

13 Ministério da Justiça e Segurança Pública do Brasil, 2014. p. 246 <https://www.gov.br/mj/pt-br>

14 Corte I.D.H., 2011. p. 02. <http://www.oas.org>

15 Corte I.D.H. <http://www.corteidh.or.cr>

16 Corte Interamericana de Direitos Humanos <http://www.corteidh.or.cr>

17 Corte I.D.H., Caso Claude Reyes e outros Vs. Chile. Sentença de 19 de setembro de 2006. Série C, N° 151, § 58 a) e b).

18 Corte I.D.H., Caso Claude Reyes e outros Vs. Chile. Sentença de 19 de setembro de 2006. Série C, N° 151, § 86 e 87.

i SANTOS, Fernández Molina e Guimarães. CAMPOS, Fhillipe de Freitas. A construção da lei de acesso à informação no Legislativo Federal Brasileiro: Sistematização dos trâmites no Congresso Nacional e análise dos seus principais aspectos. Brasília, DF, 2018. p. 50.