Sumário: 1. Liberdade de manifestação de pensamento e a Internet. 2. O trabalho desenvolvido pela Open Net Initiative, pela Reporters Sans Frontières e pela Human Rights In China. 3. O caso Shi Tao. 4. Caso Wang Xiaoning. 5. O caso do blogger Hao Wu. 6. Conclusões.
1. Liberdade de manifestação de pensamento e a Internet.
O direito à liberdade de manifestação de pensamento sempre foi reconhecido pelos países democráticos, algumas vezes com certas reservas, tal como no caso brasileiro, que expressamente prevê, no artigo 5º, inciso IV da Constituição Federal, ser livre a manifestação do pensamento, porém vedado o anonimato.
No Direito Internacional, o artigo 19 da Declaração Universal dos Direitos Humanos estabelece que “todo homem tem direito à liberdade de opinião e expressão; este direito inclui a liberdade de, sem interferências, ter opiniões e de procurar, receber e transmitir informações e idéias por quaisquer meios, independentemente de fronteiras”.
A Internet é, hoje, um dos meios mais importantes para o recebimento e a transmissão de informações e idéias. Ela revolucionou os meios de comunicação entre os povos e, em razão de seu alcance global, facilita a pesquisa, o trabalho e o desenvolvimento humano.
Evidentemente, a disseminação de informações de modo instantâneo entre milhões de pessoas não traz apenas benefícios. Como qualquer nova tecnologia, a Internet também criou oportunidades inéditas para a prática de atos ilícitos. Corretamente utilizada, porém, é ferramenta de enorme utilidade para denunciar abusos, manifestar opiniões e obter mudanças concretas na sociedade.
Em razão disto, cada vez mais observa-se um crescimento no interesse de controlar a Internet, manifestado por diversos Estados. Os argumentos são sedutores – “proteger a segurança nacional”, “preservar valores culturais e religiosos”, “proteger direitos de propriedade intelectual”, “proteger crianças da pornografia” – mas não justificam a implementação de sistemas de censura controlados pelos Estados, sob pena de violação dos direitos humanos dos cidadãos.
A China destaca-se como uma das principais nações que implementou mecanismos legais e tecnológicos de censura, de modo a impedir o acesso de seus cidadãos a certas informações que considera perigosas ou ilícitas.
Além disso, a China é, também, o país recordista em perseguir dissidentes políticos que manifestaram suas opiniões através da Internet. De acordo com a organização não-governamental “Reporters Sans Frontières”, até o momento 51 dissidentes políticos chineses foram presos em virtude de terem manifestado suas opiniões políticas através da Internet.[1]
O objetivo deste trabalho é, assim, analisar alguns desses casos e refletir o que eles representam para o direito internacional da pessoa humana.
2. O trabalho desenvolvido pela Open Net Initiative, pela Reporters Sans Frontières e pela Human Rights In China.
A OpenNet Initiative – ONI – é uma instituição de pesquisa que conta com a colaboração de quatro entidades acadêmicas de grande prestígio: o Citizen Lab at the Munk Centre for International Studies da Universidade de Toronto, Canadá; o Berkman Center for Internet & Society da Harvard Law School, Estados Unidos da América, a Advanced Network Research Group at the Cambridge Security Programme da Universidade de Cambridge, Inglaterra, e o Oxford Internet Institute da Universidade de Oxford, Inglaterra.
Seu objetivo é pesquisar, expor e analisar práticas de monitoramento e implementação de filtros na Internet, de forma a demonstrar os potenciais problemas e conseqüências indesejadas de tais práticas e auxiliar na criação de políticas públicas nesta área. Para alcançar tais objetivos, a ONI utiliza uma abordagem multidisciplinar que inclui ferramentas tecnológicas e o trabalho local de pesquisadores e peritos. As pesquisas da instituição são publicadas em seu web site[2].
Com relação à China, as conclusões da ONI são alarmantes. O relatório[3] destaca que o sistema chinês de censura à Internet é um dos mais sofisticados do mundo. Comparado a sistemas similares de outras nações, o sistema de censura chinês é invasivo, sofisticado e eficiente. Constitui-se de diversos níveis de regulamentação legal e controle técnico. Envolve diversas agências estatais e milhares de funcionários, públicos e da iniciativa privada. O sistema censura conteúdo transmitido através de diversos meios, incluindo web pages, web logs, fóruns de discussão online, fóruns de discussão de universidades, e mensagens de correio eletrônico. Os testes da ONI constataram que o sistema impede o acesso a diversos temas considerados sensíveis, tais como pornografia, material religioso e oposição política. Exemplificativamente, cidadãos chineses têm, como regra, acesso bloqueado a web sites que falem a respeito dos seguintes assuntos: independência de Taiwan e do Tibete, Falun Gong, Dalai Lama, massacre da praça da Paz Celestial (Tiananmen Square), partidos políticos de oposição e movimentos anti-comunismo.
A ONI constatou que a maioria dos web sites de notícias norte-americanos, tais como CNN, MSNBC e ABC, estão geralmente disponíveis para acesso por parte de cidadãos chineses (já o site da BBC, por sua vez, encontra-se bloqueado). Também podem ser acessados normalmente conteúdos relativos a direitos humanos, e sites que permitem ao usuário utilizar um anonymizer[4].
De acordo com o relatório da ONI, ao contrário do que ocorre em outros países, o sistema de controle chinês sobre a Internet é dinâmico e efetuado em diversos pontos de controle, variando ao longo do tempo. Este sistema dificulta uma conclusão precisa a respeito de como funciona o sistema. Sabe-se que os filtros são implementados no backbone[5] da rede, ainda que os provedores de acesso locais possam também implementar seus próprios filtros. Os principais mecanismos de busca chineses também bloqueiam o acesso a certos resultados, dependendo da palavra-chave pesquisada, ou mesmo da própria palavra-chave. Do mesmo modo, os provedores de conteúdo que oferecem serviço de blogs aos usuários também impedem a divulgação de mensagens com certas palavras-chave, ou editam o conteúdo publicado para removê-las dos sites. Outras palavras-chave são bloqueadas diretamente pela infra-estrutura de Internet chinesa, e não pelos mecanismos de busca. Os cibercafés, que são um dos principais meios de acesso à Internet para milhões de chineses, são obrigados por lei a manter registros e monitorar a utilização da Internet por seus usuários pelo prazo de sessenta dias. Em diversas ocasiões, a ONI constatou que certos endereços eletrônicos (URLs) não podiam ser acessados.
O relatório da ONI também indica que, apesar de não existir uma lei específica na China para tratar da Internet, um emaranhado de normas é aplicável à rede, tais como leis relativas à imprensa, proteção de segredos estatais, regras específicas para cibercafés, entre outras, e como tal permite ao governo chinês manter um eficiente sistema de controle, e conclui observando que a China opera o maior, mais abrangente e mais sofisticado sistema de censura à Intenet em todo o mundo.
A organização não-governamental Reporters Sans Frontières (RSF), defensora da liberdade de imprensa, também publica relatórios periódicos a respeito da censura aos meios de comunicação ao redor do mundo, incluindo a situação chinesa. Em dezembro de 2005, a RSF publicou o “Handbook for Bloggers and Cyber-Dissidents”[6], um manual que fornece detalhes técnicos a respeito de como manter um blog de modo anônimo e evitar censura.
A organização não-governamental Human Rights In China (HRIC)[7] foi fundada em março de 1989 por cientistas e pesquisadores chineses, e tem a missão de promover e buscar efetivação aos direitos humanos internacionalmente reconhecidos dentro daquele país. Seu corpo diretivo é composto de cidadãos chineses, norte-americanos e europeus.
A HRIC publica diversas notícias em seu web site, divididas por temas gerais (Globalização Ética, Tecnologia e Direitos Humanos, Reforma Legal e Defensores de Direitos Humanos), bem como divulga sentenças de casos judiciais envolvendo potenciais violações de direitos humanos dos cidadãos chineses.
3. O caso Shi Tao
Antes de sua prisão, Shi Tao era um jornalista chinês, chefe da divisão de notícias do Dangdai Shangbao (Contemporary Business News) em Changsha, província de Hunan. Ele já havia escrito alguns artigos em fóruns de discussão na Internet. Em um ensaio publicado em abril de 2004, intitulado “O dia mais repugnante”, Shi Tao criticou o governo chinês em virtude da prisão de Ding Zilin, um defensor e ativista das “Tiananmen Mothers”, grupo de mães de estudantes que foram mortos no massacre da Praça da Paz Celestrial ocorrido em 4 de junho de 1989.
No dia 20 de abril de 2004, Shi Tao participou de uma reunião no jornal em que trabalhava, ocasião em que o foi discutido o conteúdo de um documento produzido pela Diretório Central de Propaganda do Partido Comunista Chinês, relativo a questões de segurança e preparação para o 15º ano do massacre da Praça da Paz Celestial. Naquela noite, em sua sala, Shi Tao usou sua conta pessoal de e-mail do provedor de serviços Yahoo! para enviar suas anotações pessoais a respeito da reunião para um colega em Nova Iorque, para posterior publicação em um fórum de discussão na Internet, intitulado “Democracy Forum”.
De acordo com a sentença de seu julgamento, Shi Tao usou sua conta pessoal de e-mail (huoyan-1989@yahoo.com.cn), em seu escritório, para enviar as anotações que havia feito a respeito do documento para Hong Zhesheng (caryhung@aol.com), um dos fundadores da “Asia Democracy Foundation”, situada em Nova Iorque, e editor-chefe do web site “Democracy Forum” e da publicação eletrônica “Democracy News.” Shi Tao forneceu o pseudônimo “198964” como a pessoa que forneceu o docuemnto e pediu a Zhesheng que encontrasse um meio de distribuí-lo o mais rápido possível, sem utilizar seu nome. No mesmo dia, o resumo do documento foi publicado no “Democracy Forum”, assinado por “198964”, e posteriormente republicado em outros web sites, como “Boxun News” e “China Democracy & Justice Party.”
Shi Tao foi preso no dia 24 de novembro de 2004 e processado por “fornecer ilegalmente segredos de Estado a um agente estrangeiro”, de acordo com o artigo 111 do Código Penal chinês. Ele foi condenado em 27 de abril de 2005 a dez anos de prisão. Seu recurso de apelação foi negado em 2 de junho de 2005.
O conteúdo integral do e-mail[8] demonstra que Shi Tao nada mais fez do que passar a um colega no estrangeiro suas próprias anotações a respeito do que havia escutado na reunião realizada no jornal em que trabalhava. No entanto, a sentença considerou que Tao “forneceu informações para elementos hostis fora da China”, e que o fez de modo intencional e ilegal, pois tinha conhecimento de que se tratava de um documento contendo segredos de Estado.
Por ter “colocado em risco a segurança do Estado”, Shi Tao foi condenado por ter fornecido segredos de Estado para um elemento estrangeiro, e condenado a dez anos de prisão e perda dos direitos políticos pelos dois anos subseqüentes ao cumprimento de sua pena.[9]
Interessante observar que a colaboração do provedor de serviços Yahoo! com as investigações das autoridades chinesas foi determinante para a condenação de Shi Tao. Em razão disto, a empresa sofreu severas críticas por ter fornecido as informações capazes de identificá-lo e localizá-lo.
Até mesmo a Anistia Internacional chegou a escrever uma carta oficial à empresa[10], exigindo explicações a respeito do caso e cobrando respeito às normas relativas a Direitos Humanos para empresas, reconhecida pela Organização das Nações Unidas. A resposta[11] apresentada pelo Yahoo!. não convenceu a organização, que mantém sua postura de indignação.[12]
4. Caso Wang Xiaoning
Outro caso recentemente divulgado diz respeito ao dissidente político Wang Xiaoning, que foi condenado em virtude da publicação e disseminação de artigos de sua autoria através da Internet.
Wang Xiaoning, nascido em 1951, foi preso em 1º de setembro de 2002, suspeito de ter praticado o crime de “incitação à subversão do poder estatal”. Em 12 de setembro de 2003, a corte municipal de Pequim sentenciou Wang a dez anos de prisão e perda dos direitos políticos pelos dois anos subseqüentes ao cumprimento da pena.
A acusação relacionava-se a diários eletrônicos publicados por Wang entre os anos de 2000 a 2002, os quais eram distribuídos por e-mail e em grupos de discussão anônimos criados por Wang na China e em Hong Kong, mantidos pelo provedor de serviços Yahoo!. Os diários, intitulados “Fórum para a Livre Reforma Democrática” e “Comentário Político Atual”, incluíam artigos escritos por Wang, alguns assinados em seu nome, outros , e também artigos escritos por outras pessoas, todos defendendo uma reforma democrática e um sistema pluripartidário. Além disso, Wang também publicou artigos em diversos web sites hospedados na China e no exterior.
A sentença que condenou Wang[13] menciona alguns frases em tais artigos que seriam ofensivas, tais como “Sem um sistema pluripartidário, eleições livres e separação dos poderes, qualquer reforma política é fraudulenta”; “Nunca esqueçam que a China ainda é uma ditadura autoritária”; “Os Quatro Princípios Fundamentais (manter o caminho socialista, a ditadura democrática das pessoas, a lideração do Partido Comunista Chinês e o pensamento Marxista-Leninista-Mao Zedong) são os maiores obstáculos ao estabelecimento de um sistema democrático na China”; “Olhe para a China hoje – trabalhadores e camponeses foram relegados à última camada da sociedade. Dezenas de milhões de trabalhadores estão desempregados e muitos trabalhadores são cruelmente explorados e oprimidos; eles não tem direito de greve nem de estabelecer sindicatos, e nenhuma proteção aos seus direitos mais básicos”; “A principal razão pela qual o Partido Comunista Chinês consegue manter-se no poder, apesar de ser tão corrupto, é que a China ainda não tem um partido que possa substituir o Partido Comunista”.
Wang também foi acusado de apoiar a criação do “Partido Chinês da Terceira Via” e de comunicar-se por e-mail com Liu Guokai, líder no exterior do Partido Democrata-Social chinês, considerado uma “organização hostil” pelo governo chinês.
Entre as provas existentes contra Wang, citadas no julgamento, encontram-se as informações fornecidas pelo provedor de serviços Yahoo!, declarando que o grupo de discussão “aaabbbccc” foi criado por Wang através do e-mail bxoguh@yahoo.com.cn. O provedor de serviços Yahoo! Também confirmou que o endereço de e-mail ahgq@yahoo.com.cn, através do qual Wng enviou mensagens para o grupo, era chinês (a sentença, porém, não aponta se o provedor Yahoo! forneceu ou não informações específicas a respeito da identidade de Wang). A decisão também observou que, no ano de 2001, os administradores do grupo de discussão notaram o conteúdo político dos textos de Wang e não permitiram que ele continuasse a distribuir seus artigos através do grupo. Wang, então, passou a distribuir seus textos diretamente para e-mails individuais.
A sentença aponta que, através de buscas realizadas em 1º de setembro de 2002, os artigos considerados ofensivos e subversivos foram encontrados no computador pessoal de Wang, bem como registros de seus e-mails. Duas pessoas também testemunharam contra ele, declarando que haviam recebido as mensagens. Wang apelou à Suprema Corte chinesa, mas seu recursou foi negado em dezembro de 2004.
A condenação de Wang Xiaoning evidencia os riscos a que estão submetidos os cidadãos chineses que pretendam exercer sua liberdade de manifestação de pensamento com relação a assuntos políticos, além de mostrar que a China ignora princípios elementares de proteção aos direitos humanos consgrados no Direito Internacional.
Em 18 de abril de 2007, Shi Tao e a esposa de Xiaoning, Yu Ling, ajuizaram ação indenizatória contra a empresa Yahoo!, acusando-a de violar as convenções internacionais de direitos humanos. Entre outros argumentos, acusaram a empresa de ter agido de modo irresponsável, pois sabiam, ou deveriam saber, que a entrega dos dados às autoridades chinesas levaria à prisão de Tao e Xianoning.
Jim Cullinan, porta-voz da Yahoo, destacou que a empresa condena a censura, porém não poderia se recusar a cumprir uma ordem do governo chinês, sob pena de sofrer severas penalidades, entre as quais ter suas atividades encerradas naquele país.
Algum tempo depois, as partes chegaram a uma composição amigável, cujos termos são sigilosos.
5. O caso do blogger Hao Wu
Hao Wu, também conhecido como Tian Yi, era cineasta, documentarista e mantinha um blog na Internet. Ele foi preso pelo governo chinês em 22 de fevereiro de 2006, sem quaisquer explicações. Supõe-se que a prisão estaria relacionada a um documentário que ele produzia a respeito de movimentos secretos cristãos na China.
Hao Wu viveu nos Estados Unidos de 1992 a 2004. Ele iniciou sua carreira de cineasta em 2004, quando saiu de seu emprego na empresa Earthlink, em Atlanta, EUA, e voltou à China para filmar “Beijing or Bust”, uma compilação de entrevistas com descendentes de chineses, nascidos nos Estados Unidos da América, que voltaram a viver em Pequim. Antes de trabalhar na Earthlink, Hao foi diretor de produtos para o portal Excite de 2000 a 2001 na Califórnia, e teve outros empregos antes disso.
Hao esteve em contato telefônico com Gao Zhisheng, um advogado especializado em casos de proteção a direitos humanos. Gao confirmou para umdos amigos de Hao que ambos mantinham contato telefônico e que planejavam se encontrar no dia 22 de fevereiro, mas o encontro não chegou a acontecer após Gao desaconselhar a reunião.
Dois dias depois, em 24 de fevereiro, os equipamentos de edição e diversas fitas de vídeo foram removidas do apartamento onde Hao residia. Sua família chegou a manter contato com ele, mas pelo teor das conversas, Hao não podia falar livremente. Um dos amigos de Hao foi interrogado duas vezes pela polícia desde sua prisão. A polícia de Pequim, por sua vez, confirmou que Hao foi preso, mas nega-se a fornecer quaisquer detalhes a respeito do caso.
A razão para a prisão de Hao é desconhecida. Especula-se que as autoridades chinesas pretendiam utilizar as filmagens realizadas para processar os membros secretos das igrejas católicas chinesas.
Hao tinha também um blog ativo, também chamado “Beijing or Bust”, mesmo nome de seu filme, onde assinava com o pseudônimo “Beijing Loafer”. Em fevereiro de 2006, Hao passou a contribuir para o Global Voices Online, uma rede de blogs hospedada pelo Berkman Center for Internet & Society da Harvard Law School. Utilizando o pseudônimo Tian Yi, as contribuições de Hao tinham por objetivo falar a respeito da China para os leitores do idioma inglês.
Hao Wu foi solto apenas em 11 de julho de 2006, sem quaisquer explicações sobre os motivos de sua detenção. É bem possível que a publicidade do caso tenha contribuído para sua liberação, notadamente o trabalho de Ethan Zuckerman – pesquisador do Berkman Center for Internet and Society da Universidade de Harvard e co-fundador do mencionado projeto Global Voices Online –, que mantinuma um blog[14] a respeito de Hao.
Este caso demonstra o desprezo do governo chinês pelo artigo 9º da Declaração Universal dos Direitos do Homem, pelo qual ninguém será arbitrariamente preso, detido ou exilado. Hao Wu ficou arbitrariamente preso por cinco meses, sendo que as autoridades chinesas sustentam que questões de “segurança nacional” e a suposta necessidade de “sigilo das investigações” impedem a divulgação dos motivos de sua prisão.
6. Conclusões.
Assim como a maioria dos governos não-democráticos ao redor do mundo, o governo da China demonstra enorme preocupação com o potencial da Internet para a livre disseminação de idéias e busca, sem medir esforços, controlar ou bloquear o acesso de seus cidadãos a conteúdos considerados ofensivos.
Além disto, as autoridades estão continuamente prendendo e condenando cidadãos que divulgam conteúdo considerado “subversivo” ou que constitua “segredo estatal”, ainda que, sob a ótica ocidental-democrática, esse conteúdo represente apenas o exercício pleno da liberdade de manifestação de pensamento.
Os interesses econômicos em jogo fazem com que os provedores de serviços de Internet que atuam globalmente, interessados no enorme potencial do mercado chinês, tal como é o caso da empresa Yahoo!, submetam-se às exigências das autoridades chinesas, fechando os olhos para eventuais violações de direitos humanos perpetradas pelo governo local.
Diversas organizações não-governamentais exercem um papel extremamente importante para alertar o resto do mundo a respeito da situação dos cidadãos que utilizam a Internet na China. Como destacado, além da Open Net Initiative, merece ser destacado o trabalho da organização Reporters sans frontières (RSF) e Human Rights In China (HRIC).
A única solução que se vislumbra para evitar que casos como os de Shi Tao, Wang Xiaoning e Hao Wu se repitam é a efetiva pressão política, por parte dos países democráticos, sobre o governo chinês. Resta saber se o interesse social e os intrincados caminhos da diplomacia conseguirão prevalecer perante os interesses econômicos que uma nação com mais de um bilhão de pessoas representa.
Bacharel, Mestre e Doutorando em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Autor da obra “Responsabilidade Civil dos Provedores de Serviços de Internet” (Editora Juarez de Oliveira). Professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV-SP), nos cursos de pós-graduação da GVLaw. Professor da Escola Superior de Advocacia (ESA-SP), no curso de especialização em Direito de Informática. Professor dos cursos de Direito das Novas Tecnologias e Direito dos Contratos do Centro de Extensão Universitária (CEU-SP). Membro integrante da Comissão de Informática Jurídica da OAB/SP.
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