Mediação: um novo olhar para o tratamento de conflitos no Brasil

Resumo: O presente trabalho tem por escopo investigar especificadamente o instituto da mediação, a fim de melhor compreendê-lo como meio alternativo de tratamento de conflitos disponível aos cidadãos brasileiros. Revisando importantes obras sobre o tema pretende-se perceber de que forma a mediação pode se afirmar como instituto de eficácia considerável perante as controvérsias que se lhe apresentam. Para tanto, buscou-se elucidar seu conceito e contextualizá-la a partir de sua evolução histórica, bem como traçar uma breve comparação entre o referido instituto e o processo judicial tradicional a partir do estudo sobre os princípios estruturantes do procedimento de mediação. Por fim, buscou-se evidenciar o papel do mediador como figura facilitadora do diálogo indispensável no contexto da mediação.


Palavras-chave: conflito; mediação; processo judicial; mediador


Abstract: The scope of this study is to investigate specifically the institute of mediation in order to better understand it as an alternative means of dealing conflict available to Brazilians. Reviewing important works on the theme aims to understand how mediation can be stated as an institute of effectiveness in the face of considerable controversies which arise. To this end, we sought to elucidate its concept and contextualize it from its historical development as well as draw a brief comparison between this institute and the judicial process, studying the structural principles of the mediation procedure. Finally, we sought to highlight the role of mediator as facilitator of dialogue indispensable figure in the context of mediation.


Keywords: conflict; mediation; judicial process; mediator


1. INTRODUÇÃO


A concretização do Estado Democrático de Direito proposto na (re)constitucionalização de 1988 levou à consequente ampliação de um sem número de demandas junto ao Poder Judiciário. Esse crescimento, aliado à complexidade das relações sociais, contribui deveras ao repensar da jurisdição enquanto efetiva aliada da sociedade, haja vista que o Poder Judiciário, atualmente, não tem vencido sua função de exercer a jurisdição estatal de modo eficaz e eficiente.


Assim, a impotência do Estado em atender de forma satisfatória – e em consonância aos preceitos constitucionais – os anseios sociais na resolução dos litígios leva à construção do entendimento que os próprios envolvidos nas demandas teriam melhor legitimidade para resolvê-las, o que também leva ao o repensar sobre a jurisdição hoje experienciada.


Sob essa perspectiva (re)surge a mediação, não só como mecanismo que colabora com o abarrotamento do Poder Judiciário, mas como instrumento de exercício de cidadania através da busca por uma decisão autônoma e consensual por aqueles que jamais deveriam ter deixado de ocupar o papel protagonista na demanda: os indivíduos diretamente envolvidos no conflito.


2. Mediação: conceito e evolução


A mediação, em linhas gerais, pode ser definida como uma técnica que, através da linguagem, permite a criação ou recriação da relação humana; para isso, se utiliza da figura de um intermediário – o mediador – que intervém de forma imparcial com a facilitação da comunicação entre os indivíduos. (LASCOUX, 2006). Assim, sua aplicabilidade não se restringe à Ciência do Direito, mas se estende a uma infinidade de outras áreas. O termo mediação procede do latim mediare, que significa mediar, intervir, dividir ao meio (ROBERTS; PASTOR apud MORAIS; SPENGLER, 2009, p. 147).


O que se pretende aqui, entretanto, é o estudo da mediação aplicada à área do Direito como via alternativa à jurisdição estatal então vigente. Neste sentido, a mediação representa um mecanismo no qual não há a imposição de uma decisão por outrem [Estado-juiz], mas a construção, pelos próprios envolvidos na contenda, com o auxilio de um facilitador do diálogo, de uma saída para o problema que vivenciam.


Assim, enquanto espécie do gênero justiça consensual, pode ser definida, de acordo com Luis Alberto Warat (apud MORAIS; SPENGLER, 2008, p. 133), como “[…] a forma ecológica de resolução dos conflitos sociais e jurídicos, na qual o intuito de satisfação do desejo substitui a aplicação coercitiva e terceirizada de uma sanção legal”. Ao mencionar o termo ecológico, refere-se o autor à ecologia política enquanto possibilidade de transformação dos conflitos que aponte pra uma melhor qualidade de vida aos envolvidos (ALBERTON, 2008, p. 86).


Neste sentido, por meio da mediação os envolvidos buscam compreender as fraquezas e fortalezas de seu problema a fim de tratar o conflito de forma verdadeiramente satisfatória (MORAIS; SPENGLER, 2008, p. 132); o acordo final aborda o problema com uma proposta consensual dos envolvidos e será estruturado de modo a manter a continuidade de suas relações.


Destarte, cumpre destacar que a mediação se preocupa, não só com o acordo em si, mas com o modo como ele será construído, já que isso influencia diretamente no relacionamento dos indivíduos de forma positiva ou negativa. Assim, ocupa-se com a busca não apenas da resolução do problema momentâneo que se impõe [como faz o Poder Judiciário ao dar uma resposta processual aos conflitos], mas com um tratamento adequado à relação que os envolvidos no conflito estabelecem. É, portanto, um instituto que incentiva a autonomia da pessoa, exercita a cidadania e atua como método de progressiva pacificação social.


Nas palavras de José Luis Bolzan de Morais e Fabiana Marion Spengler (2009, p. 139):


“[…] os objetivos da mediação dizem respeito ao restabelecimento da comunicação, mas também à prevenção e ao tratamento dos conflitos (através de uma visão positiva na pretensão de encará-lo como meio de sociação, de transformação e evolução social), como meio de inclusão social objetivando promover a paz social.”


     Assim, percebe-se na mediação o enfrentamento do conflito sob um viés positivo, o qual consistindo este na sobreposição de ideias necessária à evolução e é inerente à sociedade. Não só, a mediação considera importante tratá-lo em sua essência [desde o modo de percebê-lo ao de gerí-lo] no intuito de que não se faça necessário trabalhar, especificamente, com seu tratamento.


Ademais, as circunstâncias apontam para a utilização da mediação [como complemento da atividade jurisdicional] especialmente quando verificada a inadequação das estruturas tradicionais para o tratamento dos conflitos no que tange à questão dos interesses transindividuais, excesso de demandas, e na busca por uma justiça mais comunitária, fundada sobre o consenso e não sobre a sanção (MORAIS, SPENGLER, 2009, p. 139).


Na verdade, a mediação – assim como os demais métodos extrajudiciais de solução de conflitos[1] – não constitui fenômeno novo; como forma de comunicação entre os seres humanos, ela existe desde o tempo em que há a intervenção de terceiros nos conflitos de outrem (LASCOUX, 2006) – o que remonta a própria existência do homem na Terra. Evidentemente que não se trata da mediação tal qual como se tende a defini-la desde o fim do século XX (CENTRO BRASILEIRO DE MEDIAÇÃO, 2011), mas o instituto, com o passar do tempo, passa a ser redescoberto e sua eficiência reconhecida para o Direito em meio a uma crise profunda do sistema judiciário de regulação dos litígios (MORAIS, SPENGLER, 2008, pp. 113-134)[2].


De acordo com Christoper Moore (1998, p. 32-34), a mediação já era praticada para tratar os litígios bíblicos, especialmente nas comunidades judaicas; após, seu uso se difundiu em várias culturas, dentre elas a islâmica, a hindu, a chinesa e a japonesa. Segundo o autor “foi nos últimos 25 anos que a mediação se expandiu exponencialmente no mundo, ganhando espaço e tornando-se reconhecida como meio de tratamento de litígios alternativo às práticas judiciais” (MOORE 32-34).


Na Antiguidade, a mediação era conhecida na Grécia, foi utilizada na China e também pela Civilização Romana (CENTRO BRASLEIRO DE MEDIAÇÃO, 2011).


Na China desde a década de 50, é aplicada à resolução de conflitos familiares e, atualmente, consiste no principal meio de solução de conflitos utilizado no País através dos Comitês Populares de Conciliação e dos Tribunais de Conciliação (MOORE, 1998, p. 41).


Com a emigração dos chineses para os Estados Unidos da América e para a Europa, a mediação ganha espaço, à medida em que, a partir da década de 70, o instituto se consolida nos Estados Unidos (AMARAL et. al., 2007, p. 15), difundindo-se, posteriormente, para o Canadá e para alguns países da Europa (FONKERT, 2011, p. 01).


Conforme destaca o Centro Brasileiro de Mediação (2011) no ano de 1913, nos Estados Unidos, foram nomeados mediadores na Secretaria de Trabalho para a função de comissários de conciliação. Em 1946, com o objetivo precípuo de resolver conflitos trabalhistas, criou-se o Serviço Federal de Mediação e Conciliação [Federal Mediation and Conciliation Service – FMCS], que consolidou a figura do mediador como profissional, o qual, nesse sentido, possuía mínimas oportunidades de atuação fora deste departamento.


Apenas a partir de 1970, os americanos passaram a ver de fato nos meios alternativos de solução de conflitos [Alternative Dispute Resolutions – ADR’s] uma saída para desafogar o Judiciário, que se encontrava com acúmulo de processos oriundos do movimento de acesso à justiça daquele país (AMARAL et. al., 2007, p. 15). Em 1974, o psicólogo e advogado Dr. Coogler desenvolveu estudos sobre a mediação como forma de resolução de quaisquer disputas (AMARAL et. al., 2007, p.15).


Em 1976, como resultado da Conferência de Roscoe Pound, evento que reuniu acadêmicos de Direito para discutir opções e buscar melhorias para o sistema jurídico americano, tendo em vista a emergência de se encontrar alternativas ao contencioso, o desenvolvimento da mediação se dividiu em duas direções: uma baseada na noção de que representa uma extensão do sistema jurídico [devido a qual muitas pessoas ainda a vêem apenas como meio eficaz de reduzir problemas de litígios nos tribunais]; outra, desassociada do sistema jurídico, que apresenta a mediação como um processo tendencioso a produzir melhores resultados do que aqueles alcançados no sistema contraditório, justamente por se separar da burocracia legal – essa última, vale dizer, configura-se a maior tendência mundial (CENTRO BRASILEIRO DE MEDIAÇÃO, 2011). Além disso, em decorrência desta conferência, foi alterado o Regimento Federal de Processo Civil norte-americano, no sentido de modificar consubstancialmente a concepção de justiça legal para a até então vigente, ao reconhecer a mediação como uma prática valiosa (CENTRO BRASILEIRO DE MEDIAÇÃO, 2011).


Cumpre destacar, conforme José Morais e Fabiana Spengler (2009, p. 138), que o emprego da mediação nos processos de família, utilizados inicialmente nos Estados Unidos, teve a Inglaterra como porta de entrada na Europa. A mediação obteve tamanho êxito no país norte-americano que considerável número de seus Estados já a tornaram obrigatória em questões relativas a divórcio (MORAIS; SPENGLER, 2009, p. 138).


Já no Reino Unido, a primeira vez em que foi empregada a mediação familiar foi em Bristol, em 1976, com o objetivo de ajudar casais a reduzir os problemas no relacionamento, especialmente quando houvesse filhos provenientes da relação dos (ex)cônjuges (CENTRO BRASILEIRO DE MEDIAÇÃO, 2011). Desde já, a mediação se caracterizava por ser um procedimento voluntário, tendo como objeto a melhora da comunicação dos indivíduos, dependendo apenas dos envolvidos a decisão sobre o conflito e contando com um terceiro imparcial na colaboração ao estabelecimento da comunicação (CENTRO BRASILEIRO DE MEDIAÇÃO, 2011). Foi também no Reino Unido, especificamente na Grã-Bretanha, que, em 1978, foi fundado o primeiro Serviço de Mediação Familiar, o qual se alastrou por todo o País com o movimento Parents Forever (AMARAL et. al., 2007, p.16)


Na França, por sua vez, a mediação surgiu no início dos anos 80, através do contato dos franceses com a interdisciplinaridade (AMARAL et. al., 2007, p. 16), configurando-se como um método de resolução de conflitos em que os mediandos, além do dever de optar de maneira voluntária pelo procedimento, deveriam também realizar a escolha do mediador (LASCOUX, 2006). Com o passar do tempo, a prática passou a exigir maior regulamentação, o que ocorreu com o Código de Processo Civil de 1995, pelo qual adveio a mediação ordenada no curso do processo pelo juiz, que também passou a ser responsável pela designação do mediador dependendo para isso da anuência dos envolvidos (LASCOUX, 2006).


Na Holanda, no inicio dos anos 90, a mediação se caracterizou, essencialmente, por consistir numa sistematização de técnicas baseada, sobretudo, em pesquisas americanas e numa maior profissionalização do procedimento (CENTRO BRASILEIRO DE MEDIAÇÃO, 2011). No ano de 1992, foi criado o Instituto de Mediação Holandês (The Netherlands Medation Institute – NMI), sinalizando a institucionalização do procedimento da mediação no País; o Instituto estabeleceu o código disciplinar para os mediadores e o caráter confidencial da mediação; além disso, a regulamentou quanto aos pressupostos de voluntariedade dos envolvidos e neutralidade do mediador (CENTRO BRASILEIRO DE MEDIAÇÃO, 2011).


Também em 1990, a Austrália passou a desenvolver a mediação através da elaboração de um relatório que indicava a extensão dos meios alternativos de composição de conflitos ao trabalho dos Tribunais (AMARAL et. al., 2007, p.16).


Em 1997, no Canadá, o Governo de Quebec promulgou uma lei que assegurava ao casal e às crianças envolvidas em conflito familiar uma sessão de informação e cinco sessões gratuitas de mediação, acabando por incentivar a utilização do instituto no país (AMARAL et. al., 2007, p. 16).


No tocante aos países europeus, é possível afirmar que os Alternative Dispute Resolutions têm sido amplamente utilizados. Em 1998, foram publicados os Princípios Europeus sobre Mediação Familiar [Recomendação n° 98 do Conselho da Europa], cujo texto foi elaborado pelos representantes dos 40 Estados membros do Conselho Europeu, consagrando-se como princípios da mediação a voluntariedade dos participantes, a confidencialidade do mediador, a resolução baseada no interesse dos envolvidos, o mediador como facilitador e não como árbitro de decisões e o interesse em preservar determinada instituição para tornar possível uma relação continuada.


Dentre os países da America Latina, a Argentina se destaca na aplicação da mediação, já que esta é ministrada há anos nas Universidades e tem a profissão do mediador legislação especial (AMARAL et. al., 2007, p. 16). Em 1996, foi editada a Lei Federal n° 24.573, que regulamentou as atividades do mediador, as questões éticas da profissão, tornou a mediação pré-requisito para o ajuizamento de ação judicial em alguns casos e regulamentou a sua aplicação, no sentido de só poder ser exercida por advogados (AMARAL et. al., 2007, p. 16).


No Brasil, tem-se notícia sobre a mediação desde o século XII (AMARAL et. al., 2007, p. 16); todavia, há poucos resultados em termos de legislação, uma vez que o instituto é aplicado, mormente, como meio alternativo ao Poder Judiciário.


O surgimento de projetos abordando a mediação como método ao tratamento de conflitos, principalmente relacionados à área de família, tem sido crescente e as experiências obtidas com a mediação se mostram cada vez mais exitosas (ALBERTON, 2008, pp. 89-91). Da mesma forma se percebe a disseminação do instituto, através da realização de eventos tendo como foco o estudo, a troca de experiências e a divulgação da mediação.


No Ordenamento Jurídico, a mediação foi recepcionada pelo Decreto n° 1.572/95, que a regulamentou nas negociações coletivas de natureza trabalhista (LEAL, 2010, p. 45)[3]. Ademais, estão em tramitação no Congresso Nacional projetos de lei que pretendem uma maior inserção da mediação como método judicial de resolução de litígios[4].


Por fim, é possível afirmar que as duas últimas décadas do século passado foram sobremaneira marcadas pela expansão da mediação. De acordo com Morais e Spengler (2009, p. 147), naquele período observou-se o uso exacerbado do termo, o que levou justamente à sua banalização. Atualmente, tendo em vista a necessidade de comunicação – já que os indivíduos não conseguem restabelecer o liame rompido pelo litígio (MORAIS; SPENGLER, 2009, p. 147) – emerge a necessidade de situar a mediação na nossa sociedade; (re)surge, assim, a mediação como uma forma de tratamento de conflitos que possa responder a esta demanda.


3. Princípios básicos da mediação


A mediação como método alternativo à solução de conflitos que representa ao lado da arbitragem e da conciliação é, não raro, confundida com esta última. Portanto, cumpre estabelecer, de pronto, as principais diferenças entre os referidos institutos.


Enquanto na arbitragem as partes interessadas escolhem um terceiro, diverso do Juiz, para dirimir as divergências entre elas e emitir decisão sobre o conflito que vivenciam [considerando que a resolução da controvérsia depende dos envolvidos apenas na medida em que optam por esse meio de solução de disputas e pelos mecanismos que serão utilizados pelo terceiro, para tanto], a conciliação e a mediação dependem do envolvimento direto dos envolvidos no litígio, através do diálogo, para dirimir a controvérsia.


As diferenças primordiais entre os dois institutos [conciliação e mediação], contudo, concretizam-se no sentido que, enquanto na conciliação o papel do conciliador é incentivar e propor o acordo; na mediação, como foi visto, o mediador atua como um mero facilitador do diálogo, dependendo a solução do conflito, fundamentalmente, da iniciativa das pessoas envolvidas.


De acordo com Cintra, Dinamarco e Grinover (2006, p. 34):


“[…] em ambos procedimentos os interessados utilizam a intermediação de um terceiro, particular, para chegarem à pacificação de seu conflito. Entretanto, ao passo que a conciliação busca sobretudo o acordo entre as partes, a mediação objetiva trabalhar o conflito, surgindo o acordo como mera conseqüência.”


Neste sentido, observa-se que a mediação se estabelece, primordialmente, como um modelo consensual de solução de controvérsias que visa o beneficiamento de todos os envolvidos sem a busca de um culpado pela contenda. Não só, é um mecanismo que pressupõe a identidade das pessoas: sua cultura, escolaridade, características e laços, bem como seu deslocamento para o espaço de decisão.


Destarte, tem a mediação como princípios fundamentais a voluntariedade e a total autonomia das decisões. Conforme estabelece o Regulamento de Mediação do Conselho Nacional das Instituições de Mediação e Arbitragem – CONIMA (2011b):


“A Mediação é um Processo não-adversarial e voluntário de resolução de controvérsias por intermédio do qual duas ou mais pessoas, físicas ou jurídicas, buscam obter uma solução consensual que possibilite preservar o relacionamento entre elas.”


Cumpre destacar que a voluntariedade diz respeito não só à pré-disposição de todos os envolvidos no conflito para a utilização do método como opção viável à solução do litígio, mas é o que garante e legitima o poder dos envolvidos de administrá-lo, de estabelecer diferentes procedimentos e de tomar as próprias decisões durante o processo (CONIMA, 2011a). Mais do que isso, é o que comprova o verdadeiro anseio dos envolvidos pela resolução do problema que vivenciam e pela continuidade da relação que estabelecem; é a disponibilidade que demonstram para o diálogo.


A solução consensual, por sua vez, determina que o procedimento só ensejará um acordo se todas as partes consentirem sobre os termos desse. A busca pelo consenso tem como pressuposto a autonomia dos envolvidos em relação às decisões sobre as questões que envolvem o conflito, partindo da ideia de que cabe às partes a escolha do que for melhor para si; essa autonomia é o que afiança o caráter emancipatório e democrático da mediação.


Assim, ao mediador caberá a intervenção como facilitador do diálogo, orientador das melhores alternativas e mantenedor da regularidade do processo, jamais manifestando [menos ainda impondo] sua opinião pessoal (AMARAL et. al., 2007, p. 21). Após chegarem a um entendimento sobre as questões conflituosas, os mediandos terão produzido a decisão do conflito, a qual será redigida na forma de acordo, que poderá ser homologado pelo juiz[5]. Ainda, o acordo final poderá ser refeito mesmo depois do término do procedimento [caso algum dos envolvidos se sinta prejudicado], ou o Judiciário poderá intervir a pedido de qualquer dos interessados, inclusive anulando eventual decisão resultante de má-fé (AMARAL et. al., 2007, p. 21).


Ademais, através do consenso, a mediação pretende a aproximação das partes não só para a decisão sobre um conflito específico, mas para a restauração de toda a relação existe por trás deste, zelando pela manutenção do relacionamento dos envolvidos. O processo judicial, por outro lado, com a solução de litígios pontuais não pretende resolver a fragilidade em que se encontra, muitas vezes, o relacionamento dos litigantes, o que dá margem para o surgimento de novos conflitos. 


A reaproximação das partes e a restauração de suas relações têm como conseqüência precípua a facilitação do andamento do procedimento e a solução definitiva do conflito (AMARAL et. al., 2007, p. 22). Ainda, em consequência da descoberta da capacidade de resolverem os seus próprios conflitos é comum os indivíduos chegarem ao final do processo se sentido mais capazes, seguros e adaptados ao diálogo; por tudo isso, a mediação atua como uma forma de prevenção de conflitos.


Assim, ao tratar do tema harmonização das relações, fala-se não somente em encerramento daquele dilema discutido, mas sim da final pacificação dos conflitos entre as pessoas (MORAIS; SPENGLER, p. 137). Busca-se, na verdade, que, após o processo, os envolvidos não somente se vejam ressarcidos dos prejuízos sofridos, mas também sintam que aquele conflito pelo qual passaram esteja superado, satisfazendo tanto a lide colocada em discussão como eventuais conflitos sociais subjacentes (MORAIS; SPENGLER, p. 137)


Para que a mediação obtenha êxito, faz-se necessário que haja equilíbrio nas relações entre os envolvidos, considerando ser fundamental que a todos seja conferida a oportunidade de se manifestar, bem como garantida a compreensão das ações que forem sendo desenvolvidas ao longo do procedimento (MORAIS; SPENGLER, 2009, p. 137).


No Judiciário, observa-se com frequência, que, além da disparidade [econômica e cultural] entre as partes, há um descaso com a explicação adequada [leia-se compreensível] dos procedimentos aos litigantes. Entretanto, manter a transparência do procedimento e a igualdade dos participantes, além de ser um pressuposto de validade para um acordo contribui para que as pessoas aceitem decisões que não partam de si (AMARAL et. al., 2007, p. 22).


Em oposição à publicidade do processo judicial, a mediação se caracteriza pela privacidade ou confidencialidade do procedimento, já que nas sessões só se fazem presentes o mediador e os envolvidos; via de regra, a divulgação das reuniões só ocorre por vontade dos participantes (MORAIS; SPENGLER, 2008, p. 134).


Essa privacidade dedicada à mediação permite que os envolvidos se sintam mais à vontade, facilitando o contato entre os mediandos e o diagnóstico do real problema fomentador da discórdia [o qual, muitas vezes, não é o que se apresenta num primeiro momento]. Entretanto, nos casos em que o interesse público se sobrepõe ao interesse dos envolvidos em razão da garantia à ordem social, o sigilo às informações prestadas pelos mediandos, por decisão judicial, legal ou por atitude de política pública, poderá ser quebrado (MORAIS; SPENGLER, 2007, p. 134).


Ainda, por ser um procedimento que tem como objetivo a construção do entendimento através da comunicação entre os envolvidos, evidentemente tem como característica a oralidade. Nesse sentido, apesar da dificuldade emocional gerada pela crise, é através da linguagem e do diálogo que os envolvidos conseguirão superá-la: somente a partir daí será possível delinear a compreensão recíproca dos participantes do procedimento, o que é pré-requisito ao entendimento.


No processo judicial, a oralidade pouco tem espaço, concentrando-se, mormente, no papel desempenhado pelos advogados, os quais são limitados pelos ritos e procedimentos previamente estabelecidos pelo Direito Processual. Nas oportunidades que os envolvidos no conflito têm de se expressarem, via de regra, não há tempo nem ambiente adequado para exporem suas opiniões pessoais acerca do problema que vivenciam (AMARAL et. al., 2007, p. 22).


A bem da verdade, a oralidade só é possível com razoável amplitude na mediação, tendo em vista que o procedimento também se caracteriza pela informalidade.  Esta, por sua vez, refere-se às exigências processuais mínimas que oportunizam a flexibilidade do procedimento para que os mediandos possam comunicar suas preocupações e prioridades básicas em relação à disputa, bem como definir o que pretendem como acordo conforme sua própria visão de justiça.


Não menos relevante é a economia financeira e de tempo oportunizada pelo procedimento da mediação em contrapartida aos processos judiciais que, em razão de serem eminentemente morosos, mostram-se mais custosos. Pelo fato de os litígios levados à discussão através da mediação tenderem a ser resolvidos em tempo inferior ao que levariam se fossem debatidos no Judiciário, há uma diminuição de seu custo indireto [já que, quanto mais se alongar a pendência, maiores serão os gastos com sua resolução] (MORAIS; SPNGLER, 2009, p. 134).


Fato é que tanto o custo quanto a demora dos processos se afiguram barreiras ao acesso à justiça: quando estão na busca de um direito lesado as pessoas procuram uma solução rápida para o seu problema de modo que a certeza na demora de tal solução faz com que tais direitos muitas vezes sejam ignorados por seus detentores os quais preferem abdicá-lo a enfrentar trâmites lentos, burocráticos e dispendiosos (MORAIS, SPENGLER, 2009, p. 135); os altos custos, por sua vez, ainda são empecilhos para que as camadas menos favorecidas financeiramente [sobretudo essas] tenham acesso ao Judiciário, já que não têm condições de arcar com as despesas processuais, além de, muitas vezes, desconhecerem os casos em que são dispensadas de pagá-las. Não bastasse, os próprios serviços e procedimentos gratuitos, por vezes, mostram-se dificultados.


Ademais, o fato de o processo judicial delimitar o assunto demandado nas suas peças iniciais, como se vê, não é o bastante para que tenha seu tempo reduzido de maneira eficiente; a mediação não delimita o(s) assunto(s) que irá abordar – até porque isso iria de encontro à sua proposta – o que faz é a otimização do tempo que dispõe; na verdade, a mediação é um processo de sensibilidade que institui um novo tipo de temporalidade, de fazer do tempo um modo específico da auto-alteração (WARAT, 2001, p. 38), o que é possibilitado pelas circunstancias criadas e pela pré-disposição de todos ao consenso.


Destarte, tem-se de um lado o processo judicial delimitando o tema e o tempo dos procedimentos e, consequentemente, mitigando a participação de todos os envolvidos no processo; de outro, a mediação, democratizando o campo discursivo do litígio com um tempo diferenciado, de maneira a aproveitá-lo de forma mais vantajosa ao indivíduo. Assim, o que se percebe hoje é a mediação proporcionando maior aproveitamento do tempo e gerando [muito] menos custo com a efetiva participação dos envolvidos para a resolução do litígio, o que tende a gerar maior satisfação às pessoas.


Quanto à sua aplicação, é possível que aconteça em quaisquer conflitos que versarem sobre direitos disponíveis, desde que haja interesse dos indivíduos na sua discussão dessa forma. As principais matérias levadas à discussão através da mediação dizem respeito aos problemas relacionados a um sem número de questões cotidianas, tais como discordâncias entre membros de instituições de ensino ou lazer, discussões familiares e entre vizinhos e conflitos sobre o meio ambiente (MORAIS; SPENGLER, 2009, p. 137).


Assim, observa-se que a mediação consiste num procedimento simples, mas bastante significativo, a partir do momento em que atua no tratamento de conflitos a curto e longo prazo por meio da participação efetiva dos envolvidos na demanda, visando a inclusão social à medida que colabora para a o acesso à justiça e desperta nos indivíduos a capacidade de autodeterminação.


4. A mediação e a função do mediador na resolução dos conflitos


Cumpre identificar a mediação num espaço reconhecidamente democrático, já que não se pretende a imposição de normas prontas, mas se trabalha com a construção da solução para o conflito. Para tanto, o procedimento conta com a ajuda da figura do mediador, o qual, ao invés de se posicionar em local superior aos envolvidos na contenda [tal como é feito pelo juiz], encontra-se no meio deles, partilhando um espaço comum participativo voltado à construção do consenso num pertencer comum (MORAIS; SPENGLER, 2008, p. 149).


Neste sentido, o mediador não pode se preocupar em intervir no conflito, mas com seu dever intrínseco de oferecer liberdade aos indivíduos para tratá-lo.


Mais do que isso, a fim de que possa colaborar para o estabelecimento de um ambiente fraterno – necessário à busca pelo entendimento – é importante que o mediador esteja de acordo com os procedimentos que irão facilitar o diálogo e o consenso, como a teoria que preconiza o instituto e as técnicas[6] interdisciplinares aplicáveis no seu exercício. É imprescindível, entretanto, que esteja ligado à vida, pois é só através da sensibilidade em relação aos problemas alheios que se conseguirá garantir um espaço de fato comprometido com transformação social.


De acordo Amaral (et. al., 2007, p. 26), é fundamental a delimitação do papel do mediador como:


“[…] um facilitador da comunicação entre os mediados, uma vez que ele passa a trabalhar em conjunto com eles no sentido de auxiliá-los na busca incessante de seus reais interesses em razão de um trabalho cooperativo, que deverá ser comum entre todos os envolvidos.”


Assim, o mediador não é um juiz porque não impõe um veredicto, nem tem o poder outorgado pela sociedade para decidir pelos demais; também não é um negociador que toma parte na negociação como interessado pelo resultado: via de regra, sequer cabe a ele a proposta de acordo, limitando-se sua função à garantia aos envolvidos, de um espaço saudável, com vistas a facilitar o diálogo entre os envolvidos e a sua consequente (re)aproximação ao consenso acerca da decisão sobre o conflito e ao restabelecimento da relação que possuem.


Neste sentido, a função do mediador vai desde a avaliação sobre a conveniência da utilização do procedimento ao caso concreto à tentativa do estabelecimento de um tratamento igualitário aos envolvidos durante a execução do procedimento – o que compreende as mesmas oportunidades para falarem, a garantia da compreensão dos fatos e dos procedimentos em si por todos os participantes. Ademais, o estabelecimento de uma relação baseada na confiança, concretizada na imparcialidade, entre a sua pessoa e a dos mediandos é primordial para que se estabeleça um ambiente em que estes se sintam à vontade para falar sobre seus problemas pessoais de maneira sincera. Essa relação de confiança da é, pois, pressuposto ao êxito do procedimento.


Durante a mediação, tanto os mediandos quanto o mediador vão recebendo informações e novos conhecimentos necessários ao desenvolvimento do processo que possibilitam a elaboração de solução, ou possíveis soluções, para o conflito. Ao final, essas pessoas terão adquirido, de forma intuitiva ou pragmaticamente, conhecimentos que não dispunham no início do processo. Independentemente do resultado, ou seja, obtendo-se ou não uma solução para o conflito ao final do procedimento, todos têm oportunidade de reflexão e crescimento (AMARAL et. al., 2007, p. 26).


O mesmo ocorre com os mediadores, em consequência não só da prática repetitiva das técnicas, mas pelo contato com diferentes conflitos, pois a própria noção sobre diferentes temas aumenta seu campo de conhecimento e, por óbvio, a sua visão crítica sobre a realidade que os cerca. Evidentemente que tais conhecimentos não serão utilizados para decidir ou influir na decisão final dos envolvidos no conflito, mas para uma melhor estruturação do processo através da compreensão e identificação do objeto da contenda conflito (AMARAL et.al., 2007, p. 26).


No desenvolvimento de suas atividades, o mediador deverá observar os princípios de imparcialidade [deverá compreender a realidade dos mediandos sem que nenhum preconceito ou valores pessoais venham a interferir no seu trabalho], credibilidade [na sua postura e nos seus posicionamentos deverá ser independente, franco e coerente], competência [deverá possuir a capacidade de efetivamente mediar a controvérsia existente, ao passo que só deverá aceitar a tarefa quando tiver as qualificações necessárias para satisfazer as expectativas razoáveis dos indivíduos], confidencialidade [deverá obrigatoriamente manter o sigilo sobre todo conteúdo do procedimento, não podendo ser testemunha do caso, respeitando o princípio da autonomia da vontade, nos termos por elas convencionados – desde que não contrarie a ordem pública] e diligência [deverá ter cuidado e prudência para a observância da regularidade, assegurando a qualidade do processo e cuidando ativamente de todos os seus princípios fundamentais] (CONIMA, 2011a).


Da análise dessas características, identifica-se a reiteração de alguns dos caracteres básicos da mediação, como a autonomia da vontade – desde que esta não contrarie os princípios da ordem pública –, a simplicidade e flexibilidade da linguagem e dos procedimentos – a fim de atender à compreensão e às necessidades do mercado para o qual se volta –, e a confidencialidade do processo – com o fito de oferecer segurança em contraponto à eventual perturbação gerada pelo processo público.


De acordo com o CONIMA (2011a), a credibilidade da mediação no Brasil como processo eficaz para solução de controvérsias se vincula diretamente ao respeito que os mediadores conquistaram por meio de um trabalho de alta qualidade técnica, embasado nos referidos princípios éticos. De acordo com o referido Conselho:


“O mediador é um terceiro imparcial que, por meio de uma série de procedimentos próprios, auxilia as partes a identificar os seus conflitos e interesses, e a construir, em conjunto, alternativas de solução visando o consenso e a realização do acordo. O mediador, no desempenho de suas funções, deve proceder de forma a preservar os princípios éticos.”


Ainda, deve ser admitida a mediação num espaço com a participação de terceiros não ligados necessariamente à área jurídica, mas habilitados no assunto objeto do litígio. Sob diferentes formas associativas, categorias profissionais de vários segmentos estão se reunindo, ora somente entre seus pares, ora com categorias profissionais variadas, para o desenvolvimento dessa forma de acesso à justiça (AMARAL et. al., 2007, p. 27)


De acordo com Breitman (apud AMARAL et. al., 2007, p. 27) o perfil ideal do mediador seria, pela interdisciplinaridade do procedimento, o profissional com conhecimento na área do direito e da psicologia, já que “[…] psicólogos e advogados tendem a integrar seus conhecimentos, essa integração ‘cooperativa’ atende eficazmente aos propostos de uma boa mediação”. Entretanto, de acordo com o CONIMA (2011a), não há proibição de que profissional de qualquer outra área realize a mediação, desde que detenha conhecimento e treinamento específico de técnicas próprias para o tratamento do conflito nos termos pelos quais preza a mediação.


Atualmente, ainda que exercida por operadores do Direito, infelizmente a grande maioria dos profissionais desta área não está familiarizada com o tema (AMARAL et. al., 2007, p. 29). Esta falta de conhecimento gera um sentimento de insegurança ou até mesmo de desconfiança, além da preocupação com a hipotética perda de lugar no mercado de trabalho (AMARAL et. al. 2007, p. 29).


Outra questão importante se refere à capacitação do mediador com o objetivo de institucionalizar a pratica da mediação através da sua regulação jurídica. Sobre o assunto, não há unanimidade de opiniões: em que pese sua necessidade ser apontada pelos mesmos motivos que advogam a certificação de qualquer outro profissional [como pelo fato da população ter direito à proteção da certificação e licenciamento, como forma de protegê-las dos incompetentes que poderão oferecer seus serviços como mediadores], há quem entenda que a profissionalização excessiva da mediação pode levar ao aumento dos custos para a sua prática, fazendo com que o público que a procura alternativamente ao sistema tradicional se desiluda com um procedimento cada vez mais semelhante a um sistema alternativo.


Por fim, consoante Boaventura Souza Santos (apud ALBERTON, 2009, p. 88) é preciso admitir e construir espaços sociais públicos legítimos para que haja a atuação dos participantes em conflito com a construção de praticas democráticas, não exclusivamente sob a responsabilidade de juristas. Sob essa perspectiva cumpre reconhecer a importância da figura do mediador, independente da modalidade, enquanto facilitador do diálogo e propulsor do entendimento das pessoas no procedimento de mediação; mais do que isso enquanto ser, humano e sensível, que serve de instrumento na busca pela paz.


5. CONCLUSÃO


Pelo fato do individuo e da sociedade estarem em frequente transformação, se faz necessária a constante atualização dos meios de solução de conflitos, o que não necessariamente significa retroagir, mas repensá-los e adaptá-los conforme as necessidades impostas.


Neste sentido, a mediação aposta na concretização de um espaço aberto ao diálogo, em que os indivíduos de maneira autônoma escolham e acordem sobre o que considerarem mais benéfico a eles. Assim, o instituto não pretende exatamente desafogar o Poder Judiciário, mas trabalha o conflito para que não ele fique sobrecarregado. Destarte, a partir de uma dinâmica democrática/participativa, visa não apenas a solução do conflito que se impõe, mas o verdadeiro tratamento para a relação dos indivíduos, de modo a atuar como método de prevenção de conflitos.


Ademais, cumpre destacar que o resultado da mediação, pelo modo como é conduzido o procedimento, é sempre positivo, independente dos mediandos terem chegado a um acordo, isso porque pressupõe o envolvimento e o enfretamento das pessoas frente ao seus próprios problemas, o que contribui à evolução.  


Na verdade o que a mediação pretende é o reconhecimento e o respeito acerca da alteridade do outro [que é igual em direitos enquanto pessoa humana e que muitas vezes é similar em anseios] em um espaço democrático, porque apesar de mais habitual o processo não se mostra o mais democrático meio de resolução de conflitos. Sobretudo por isso é necessário que os indivíduos se admitam capazes no espaço de decisão.


Nesse aspecto salienta-se a importância da figura do mediador enquanto profissional facilitador do procedimento e o qual, apesar de não ser responsável por emitir decisão, tem em suas mãos o dever ainda mais complexo de manter um espaço saudável entre os envolvidos para que estes cheguem num consenso.


O que se propõe não é a extinção do Poder Judiciário, mas sua complementação com maior espaço aos métodos consensuais, tal como a mediação. Com isto pretende-se que os indivíduos, ao optarem por determinada estratégia, renunciando a terem uma decisão proferida eminentemente pelo Estado, o façam de maneira realmente voluntária e não devido à inacessibilidade ao Poder Judiciário como frequentemente acontece hoje.


 Por outro lado é evidente que existem barreiras à ampliação do instituto como medida eficaz de acesso à justiça, entretanto, é necessário que estas sejam superadas. Para tanto, mostra-se imprescindível a mudança da lógica do modelo do conflito ganha/perde para a lógica discursiva do entendimento, eis que o conflito sempre foi e pra sempre será parte do cotidiano e o modo como será enfrentado é que determina os diferentes resultados que produzirá na vida humana. 


Por fim, cumpre observar que se legitima a medição a partir da interdisciplinaridade que propõe ao perceber o Direito não como Ciência estática, mas que por ser Ciência Humana deve estar em consonância não só com o conflito, mas com o cotidiano de qualquer existência.


Assim, pode-se concluir que a mediação, é um método que tende a corroborar com a cidadania e com a busca por um repensar da jurisdição vigente por meio da jurisconstrução, a qual caminha rumo a uma justiça emancipatória, digna de cidadãos que pretendem um verdadeiro Estado Democrático de Direito.   


 


Referências

ALBERTON, Genacéia da Silva. Repensando a jurisdição conflitual. Revista Brasileira de Direito, Passo Fundo, v. 4, n. 1, p. 53-98, jan./dez. 2009.

AMARAL, Alan Marins et al. Mediação Familiar como Alternativa de Acesso à Justiça. Programa Conhecimento Prudente para uma Vida Decente: Construção de Saberes na Prática Jurídica Contemporânea e a Questão do Pluralismo Jurídico (Artigo Científico). Faculdade Anhanguera Educacional – Atlântico Sul: Pelotas, 2007.(artigo inédito)

BREITMAN, Stella; PORTO, Alice Costa. Mediação Familiar: Uma Intervenção em busca da paz. Porto Alegre: Criação Humana, 2001.

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WARAT, Luis Alberto (org.) Em nome do acordo: A mediação no direito. Florianópolis: ALMED, 1998.

 

Notas

[1] Como a conciliação e a arbitragem.

[2] Conforme apontam José Morais e Fabiana Spengler (2009, p. 113): “A sociedade, consciente das limitações estatais frente aos seus reclamos, jamais deixou de reservar outros métodos de tratamento dos conflitos, embora o Estado detivesse o monopólio da Jurisdição”.

[3] De acordo com a referida lei, no caso de resultar frustrada a negociação direta, as partes poderão escolher, de comum acordo, um mediador para a composição do conflito; discordando quanto à pessoa deste ou não estando as partes em situação de equilíbrio para participar da negociação direta, poderão solicitar, a designação de mediador pelo Ministério Trabalho. O mediador, por sua vez, será pessoa previamente credenciada conforme regulamentação, ou servidor do referido Ministério.

[4] São exemplos: projeto de lei n° 4.827/98 de iniciativa da Deputada Zulaiê Cobra, o qual pretende institucionalizar e disciplinar a mediação como método de prevenção e solução consensual de conflitos com aplicação em toda matéria que admita conciliação, reconciliação, transação, ou acordo; projeto de lei n° 5.696/01 o qual pretende ampliar a competência do Juizado Especial Civel [Lei n° 9.099/95] para que julgue as ações de família cujo patrimônio não exceda um imóvel, bem como introduzir a mediação em tais demandas de maneira antecedente à conciliação devendo ser conduzida por equipe multidisciplinar, responsável por realizar o trabalho de sensibilização das partes.

[5] O procedimento de mediação não produz título com força executiva; caso às partes queiram dar ao acordo força de título de natureza judicial [sentença] deverão requerer sua homologação por juiz competente.

[6] Dentre as diversas téncias utilizadas na mediação, podem ser citadas: a arte de perguntar, o resumo, o destaque dos aspectos positivos nas falas dos envolvidos, a validação do entendimento, a identificação de soluções, o afago, o silêncio e a inversão de papéis [esta  última utilizada apenas em reuniões unilaterais.


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Daniela Torrada Pereira


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